As novas estimativas de população dos estados, divulgadas há 2 semanas na prévia do Censo 2022, devem pressionar a Câmara dos Deputados a recalcular a divisão do número de cadeiras por estado para as eleições de 2026. Na Folha de S.Paulo
Plenário da Câmara dos Deputados em sessão deliberativa | Foto: MyKe Sena -14.jun.23 / Câmara dos Deputados
Projeção realizada a pedido da Folha pelo Diap (Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar) aponta para mudanças na atual distribuição das 513 cadeiras das Câmara, com perdas de vagas em sete estados e ganhos em outros sete.
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Perde e ganha
O Rio de Janeiro lideraria a perda de assentos na Câmara, caindo de 46 para 42 vagas. Bahia, Rio Grande do Sul, Piauí e Paraíba perderiam 2 vagas cada um. Já os estados de Pernambuco e de Alagoas teriam menos 1 cadeira na Câmara.
Por outro lado, as bancadas de Santa Catarina e Pará cresceriam, com mais 4 vagas para cada estado. O Amazonas ganharia mais 2 vagas, enquanto Minas Gerais, Ceará, Goiás e Mato Grosso teriam um assento a mais cada. Os demais estados e o Distrito Federal manteriam o mesmo número de vagas.
Mínimo de 8 máximo de 70
A Constituição Federal determina que a representação na Câmara dos Deputados deve ser proporcional à população de cada estado. Mas os constituintes definiram o mínimo de 8 e o máximo de 70 deputados por Unidade da Federação.
O número de cadeiras por estado, contudo, não é alterado desde dezembro de 1993, ano em que ocorreu o último redesenho das vagas na Câmara a partir da aprovação de lei complementar. Não houve atualização do tamanho das bancadas a partir dos dados dos Censos de 2000 e 2010.
Resolução do TSE
Em 2013, o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) chegou a emitir resolução sobre a redistribuição das vagas por estado na Câmara com base no Censo anterior, realizado em 2010.
No ano seguinte, porém, o STF (Supremo Tribunal Federal) declarou que a resolução era inconstitucional e definiu que caberia à própria Câmara fazer esta divisão por meio de lei complementar, o que nunca ocorreu.
“Mexer em questões regionais sempre tem um aspecto político muito forte. Quem ganha vai pressionar para mudar o cálculo, quem perde vai trabalhar para manter tudo como está”, avalia Neuriberg Dias, analista político e assessor do Diap.
Representação dos estados e do DF
Na esteira dos dados do novo Censo, o deputado federal Rafael Pezenti (MDB-SC) protocolou nos últimos dias projeto de lei complementar que altera a representação dos estados e do Distrito Federal na Câmara dos Deputados a partir da legislatura que inicia em fevereiro de 2027.
A proposta prevê ainda mecanismo permanente de reconfiguração das bancadas, de forma que novo projeto de lei complementar se tornasse desnecessário a cada Censo.
Pezenti justifica a proposta argumentando que há sub-representação na Câmara Federal dos estados cuja população mais cresceu nos últimos 30 anos e que é preciso corrigir as distorções.
O estado de Santa Catarina, por exemplo, possui população de 7,7 milhões de habitantes segundo o Censo de 2022 e apenas 16 deputados federais. O tamanho da bancada é inferior ao de estados com menor população, caso do Maranhão, que tem 6,8 milhões de moradores e 18 deputados federais.
“Só quero fazer justiça e garantir que os estados tenham uma representação mais igualitária. O voto do catarinense não pode valer menos do que o dos eleitores de outros estados”, argumenta Pezenti, lembrando que o menor número de deputados também representa menos recursos em emendas.
Tema espinhoso
Ele reconhece que o tema é espinhoso por mexer diretamente nos interesses dos parlamentares que devem tentar a reeleição em 2026. Mas se diz otimista e destaca que quem sai perdendo no recálculo é minoria: os 7 estados que perderiam vagas têm 172 deputados.
Os estados cujas bancadas cresceriam somam 141 votos e outros 200 são de unidades da Federação que não teriam mudanças no tamanho. O projeto precisa de maioria simples para ser aprovado.
A expectativa, contudo, é de forte oposição das bancadas dos estados que teriam redução, caso de Rio de Janeiro, Bahia e Pernambuco.
Coordenador da bancada federal do Rio de Janeiro, o deputado federal Áureo Ribeiro (Solidariedade) questiona a confiabilidade dos dados do Censo 2022 e diz ver dificuldades para redistribuição das vagas: “É um tema muito sensível, seria um consenso muito difícil de construir”.
O deputado federal Carlos Veras (PT), um dos coordenadores da bancada de Pernambuco, diz não acreditar na possibilidade de alteração na composição por estado. “A última modificação é de 1993, o que revela a dificuldade de o tema ser apreciado na Câmara dos Deputados.”
Outro possível obstáculo para colocar o projeto em pauta pode ser o próprio presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). Isso porque o estado de Alagoas seria um dos prejudicados com o recálculo: a bancada do estado seria reduzida de 9 para 8 deputados federais.
Maioria favorável ao projeto
O deputado Rafael Pezenti diz acreditar que Lira não vai colocar os próprios interesses à frente da vontade do plenário, caso se construa maioria favorável ao projeto.
A bancada catarinense já começou a discutir estratégias para convencer os líderes dos partidos e tentar emplacar o projeto no retorno do recesso parlamentar.
Na avaliação do cientista político Cláudio André de Souza, professor da Unilab (Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira), o Congresso não deveria postergar o recálculo das vagas: “Quanto maior a defasagem, mais brusca será uma possível mudança no futuro”.
Novas federações partidárias
Caso a proposta seja aprovada, haverá aumento do quociente eleitoral e maior competição em 2026 nos estados em que o número de cadeiras for reduzido. Com isso, diz Souza, a tendência é de maior dificuldade para pequenos partidos nas disputas legislativas destes estados, o que pode impulsionar novas federações partidárias.
A mudança também tende a dar maior força às bancadas de estados com perfil mais conservador, caso de Santa Catarina, Mato Grosso e Goiás. Por outro lado, haveria perda de 6 deputados na bancada nordestina, que nas últimas legislaturas tem se alinhado mais aos governos de esquerda.
Possível alteração no tamanho das bancadas federais dos estados também se refletiria nas assembleias legislativas. O número de vagas segue a mesma proporção da Câmara dos Deputados, mas com mínimo de 24 e máximo de 94 deputados estaduais.
DIAP