OPINIÃO
Este artigo tem por finalidade analisar o Tema 542 julgado pelo STF e sua aplicabilidade ao contrato de trabalho temporário regido pela Lei nº 6.019/74.
O Pleno no STF julgou em 5 de outubro de 2023 o Recurso Extraordinário com Agravo número 842844 , em que se discute, à luz do artigo 2º, do inciso XXX do artigo 7º, do caput, e dos incisos II e IX do artigo 37 da Constituição, bem como da letra ‘b’ do inciso II do artigo 10 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias — ADCT, o direito, ou não, de gestante, contratada pela administração pública por prazo determinado ou ocupante de cargo em comissão demissível ad nutum, ao gozo de licença-maternidade e à estabilidade provisória, desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto.
Segundo o voto do relator, ministro Luiz Fux, a estabilidade gestante é aplicável a todas as empregadas independentemente do regime de contração, seja administrativo ou contratual.
A tese firmada no julgamento não é nova no Supremo Tribunal Federal. Em 28 de junho de 2005, quando do julgamento do Recurso Extraordinário nº 287.905, de relatoria da ministra Ellen Gracie, com acórdão relatado pelo ministro Joaquim Barbosa, a 2ª Turma o tribunal tem firmado posicionamento no sentido de que a empregada sob regime de contratação temporária tem direito à licença-maternidade, nos termos do artigo 7º, XVIII da Constituição e do artigo 10, II, b do ADCT, especialmente quando celebra sucessivos contratos temporários com o mesmo empregador.
Dentre os precedentes do STF sobre o tema, destacamos:
RECURSO EXTRAORDINÁRIO 287.905-3 SANTA CATARINA:
“CONSTITUCIONAL. LICENÇA-MATERNIDADE. CONTRATO TEMPORÁRIO DE TRABALHO. SUCESSIVAS CONTRATAÇÕES. ESTABILIDADE PROVISÓRIA. ART. 7º, XVIII DA CONSTITUIÇÃO. ART. 10, II, b do ADCT. RECURSO DESPROVIDO. A empregada sob regime de contratação temporária tem direito à licença-maternidade, nos termos do art. 7º, XVIII da Constituição e do art. 10, II, b do ADCT, especialmente quando celebra sucessivos contratos temporários com o mesmo empregador. Recurso a que se nega provimento.” (RE 287905, Relator(a): Min. ELLEN GRACIE, Relator(a) p/ Acórdão: Min. JOAQUIM BARBOSA, Segunda Turma, julgado em 28/06/2005, DJ 30-06-2006 PP-00035 EMENT VOL-02239-03 PP-00466 LEXSTF v. 28, n. 331, 2006, p. 247-268)
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO 600.057-0 SANTA CATARINA:
“AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. SERVIDORAS PÚBLICAS E EMPREGADAS GESTANTES. LICENÇA-MATERNIDADE. ESTABILIDADE PROVISÓRIA. ART. 7º, XVIII, DA CONSTITUIÇÃO. ART. 10, II, “B”, do ADCT. O Supremo Tribunal Federal fixou entendimento no sentido de que as servidoras públicas e empregadas gestantes, inclusive as contratadas a título precário, independentemente do regime jurídico de trabalho, têm direito à licença-maternidade de cento e vinte dias e à estabilidade provisória desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto, nos termos do art. 7º, XVIII, da Constituição do Brasil e do art. 10, II, “b”, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. Precedentes. Agravo regimental a que se nega provimento.” (RE 600057 AgR, Relator(a): Min. EROS GRAU, Segunda Turma, julgado em 29/09/2009, DJe-200 DIVULG 22-10-2009 PUBLIC 23-10-2009 EMENT VOL-02379-10 PP-02124)
Agravo Regimental no Recurso Extraordinário 597.989 Paraná:
“CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. LICENÇA MATERNIDADE. MILITAR. ADMISSÃO EM CARÁTER TEMPORÁRIO. ESTABILIDADE PROVISÓRIA. POSSIBILIDADE. ISONOMIA. ART. 7º, XVIII, DA CONSTITUIÇÃO E ART. 10, II, b, DO ADCT. AGRAVO IMPROVIDO. I – As servidoras públicas e empregadas gestantes, independentemente do regime jurídico de trabalho, têm direito à licença-maternidade de cento e vinte dias e à estabilidade provisória desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto, conforme o art. 7º, XVIII, da Constituição e o art. 10, II, b, do ADCT. II – Demonstrada a proteção constitucional às trabalhadoras em geral, prestigiando-se o princípio da isonomia, não há falar em diferenciação entre servidora pública civil e militar. III – Agravo regimental improvido.” (RE 597989 AgR, Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Primeira Turma, julgado em 09/11/2010, DJe-058 DIVULG 28-03- 2011 PUBLIC 29-03-2011 EMENT VOL-02491-02 PP-00347)
Agravo Regimental no Recurso Extraordinário 634.093 Distrito Federal:
“SERVIDORA PÚBLICA GESTANTE OCUPANTE DE CARGO EM COMISSÃO – ESTABILIDADE PROVISÓRIA (ADCT/88, ART. 10, II, “b”) – CONVENÇÃO OIT Nº 103/1952 – INCORPORAÇÃO FORMAL AO ORDENAMENTO POSITIVO BRASILEIRO (DECRETO Nº 58.821/66) – PROTEÇÃO À MATERNIDADE E AO NASCITURO – DESNECESSIDADE DE PRÉVIA COMUNICAÇÃO DO ESTADO DE GRAVIDEZ AO ÓRGÃO PÚBLICO COMPETENTE – RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO. – O acesso da servidora pública e da trabalhadora gestantes à estabilidade provisória, que se qualifica como inderrogável garantia social de índole constitucional, supõe a mera confirmação objetiva do estado fisiológico de gravidez, independentemente, quanto a este, de sua prévia comunicação ao órgão estatal competente ou, quando for o caso, ao empregador. Doutrina. Precedentes. – As gestantes – quer se trate de servidoras públicas, quer se cuide de trabalhadoras, qualquer que seja o regime jurídico a elas aplicável, não importando se de caráter administrativo ou de natureza contratual (CLT), mesmo aquelas ocupantes de cargo em comissão ou exercentes de função de confiança ou, ainda, as contratadas por prazo determinado, inclusive na hipótese prevista no inciso IX do art. 37 da Constituição, ou admitidas a título precário – têm direito público subjetivo à estabilidade provisória, desde a confirmação do estado fisiológico de gravidez até cinco (5) meses após o parto (ADCT, art. 10, II, “b”), e, também, à licença-maternidade de 120 dias (CF, art. 7º, XVIII, c/c o art. 39, § 3º), sendo-lhes preservada, em consequência, nesse período, a integridade do vínculo jurídico que as une à Administração Pública ou ao empregador, sem prejuízo da integral percepção do estipêndio funcional ou da remuneração laboral. Doutrina. Precedentes. Convenção OIT nº 103/1952. – Se sobrevier, no entanto, em referido período, dispensa arbitrária ou sem justa causa de que resulte a extinção do vínculo jurídico-administrativo ou da relação contratual da gestante (servidora pública ou trabalhadora), assistir-lhe-á o direito a uma indenização correspondente aos valores que receberia até cinco (5) meses após o parto, caso inocorresse tal dispensa. Precedentes. (RE 634093 AgR, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Segunda Turma, julgado em 22/11/2011, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe- 232 DIVULG 06-12-2011 PUBLIC 07-12-2011 RTJ VOL-00219-PP-00640 RSJADV jan., 2012, p. 44-47)
Agravo Regimental no Recurso Extraordinário 669.959 Paraná:
“AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL. SERVIDORA PÚBLICA GESTANTE. CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA. DIREITO À ESTABILIDADE PROVISÓRIA – ART. 10, INC. II, ALÍNEA B, DO ATO DAS DISPOSIÇÕES CONSTITUCIONAIS TRANSITÓRIAS – ADCT. PRECEDENTES. AGRAVO REGIMENTAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO.” (RE 669959 AgR, Relator(a): Min. CÁRMEN LÚCIA, Segunda Turma, julgado em 18/09/2012, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe- 195 DIVULG 03-10-2012 PUBLIC 04-10-2012)
REPERCUSSÃO GERAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO 674.103 SANTA CATARINA:
“DIREITO CONSTITUCIONAL, ADMINISTRATIVO E TRABALHISTA. CONTRATOS POR PRAZO DETERMINADO E OCUPANTES DE CARGOS EM COMISSÃO NÃO OCUPANTES DE CARGOS EFETIVOS. GRAVIDEZ DURANTE O PERÍODO DA PRESTAÇÃO DOS SERVIÇOS. DIREITO À LICENÇA- MATERNIDADE E À ESTABILIDADE PROVISÓRIA. ARTIGO 7º, XVIII, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. ARTIGO 10, INCISO II, ALÍNEA B, DO ATO DAS DISPOSIÇÕES CONSTITUCIONAIS TRANSITÓRIAS.” (ARE 674103 RG, Relator(a): Min. LUIZ FUX, julgado em 03/05/2012, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-115 DIVULG 17-06-2013 PUBLIC 18-06-2013)
Em que pesem os ilustres posicionamentos no sentido que que a decisão do STF tornou a tese firmada no IAC superada, os regimes de contratação são diversos.
Inclusive, o ministro Alexandre Luiz Ramos, ao exarar seu voto no já citado IAC, faz esta diferenciação:
“Por fim, sigo no entendimento de que o STF ainda não tem precedente específico sobre a matéria, uma vez que os trazidos no voto condutor do eminente Ministro relator contemplam situação envolvendo a Administração Pública, como são processos AgR-AI 804.574/DF, Rel. Min. Luiz Fux, em que é parte a União; RE 600.057/AgR/SC, Rel. Min. Eros Grau, Estado de Santa Catarina; RE 287.905/SC, Rel. Min. Joaquim Barbosa, também Estado de Santa Catarina – SC, RMS 24.263, Rel. Min. Carlos Velloso, União; RE 435.759, Rel. Min. Dias Toffoli, Universidade Federal do Espírito Santo; RE 368.460, Rel. Min. Dias Toffoli, União; RE 597.807, Rel. Min. Celso de Mello, Município; RE 509.775, Rel. Min. Cármen Lúcia, também Município como parte; AI 675.851/SC, Rel. Rel. Min. Gilmar Mendes, Estado de Santa Catarina- SC. Cabe anotar que eventual reconhecimento de estabilidade da gestante para servidoras públicas e empregadas públicas, todas vinculadas à Administração Pública, direta ou indireta, parte de premissa jurídica diversa, pois os fundamentos da responsabilidade do Poder Público, gestor primordial do interesse público, são diversos dos da iniciativa privada, bastando ter presente o disposto no art. 37, § 6º, da Constituição Federal.”
E também o Ministro Hugo Carlos Scheuermann:
Destaco, por exemplo, o julgamento proferido no RE 287905 / SC, em que designado redator para o acórdão o Exmo. Min. Joaquim Barbosa. Nesse julgado, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal fixou a tese de que “a empregada sob regime de contratação temporária tem direito à licença-maternidade, nos termos do art. 7º, XVIII da Constituição e do art. 10, II, b do ADCT”, no entanto, o fez com base na premissa que celebrados sucessivos contratos temporários com o mesmo empregador. Além disso, na hipótese, discutia-se contratação temporária de professor, sob regime administrativo especial.
O regime jurídico contratual abordado no tema 542 do STF se refere à contratação temporária por excepcional interesse público, prevista no artigo 37, inciso IX, da Constituição, realizada pela administração pública, e em nada se equipara ao regime de contratação temporária previsto na Lei nº 6.019/74.
Posto isto, até que o Agravo Interno interposto pela Procuradoria Geral da República contra decisão monocrática que negou seguimento ao Agravo em Recurso Extraordinário (ARE 1331863 ARE-AgR) que desafia a tese firmada no Incidente de Assunção de Competência nº 5639-31.2013.5.12.0051, o posicionamento do TST encontra-se plenamente vigente, no sentido de que “é inaplicável ao regime de trabalho temporário, disciplinado pela Lei nº 6.019/74, a garantia de estabilidade provisória à empregada gestante, prevista no artigo 10, II, b, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias”.