Christiano Sobral
A substituição de trabalhadores locais por mão de obra remota estrangeira, enfatizando a influência da IA generativa e a necessidade de reformular a legislação para garantir a competitividade do Brasil.
A substituição de trabalhadores locais por mão de obra remota estrangeira está crescendo, especialmente em setores de serviços básicos como atendimento ao cliente e hospitalidade. Recentemente, relatos de restaurantes em Nova York mostraram que trabalhadores asiáticos estão sendo contratados em massa devido à sua disposição de trabalhar por salários menores e à flexibilidade proporcionada pela tecnologia, como as interações via Zoom. Com a inteligência artificial generativa, que elimina barreiras de linguagem, em breve esses trabalhadores irão poder atender a clientes de qualquer parte do mundo, sem o empecilho do idioma.
Porém, essa tendência não afeta apenas o mercado americano; ela também traz desafios e oportunidades para o mercado de trabalho brasileiro. É crucial considerar ambas as perspectivas: a ameaça da substituição de trabalhadores locais por estrangeiros e a possibilidade de o Brasil se tornar um polo competitivo de mão de obra qualificada e acessível no cenário internacional.
Ameaça ao mercado de trabalho brasileiro
O avanço da IA generativa está eliminando barreiras de idioma, facilitando que empresas estrangeiras contratem trabalhadores de países com menores custos laborais. No Brasil, o impacto disso pode ser significativo, especialmente em setores que tradicionalmente dependem de interações humanas diretas, como call centers, atendimento ao cliente e suporte técnico.
Com os trabalhadores de países asiáticos aceitando salários mais baixos e a IA fornecendo tradução simultânea e dublagem automática, empresas brasileiras que oferecem serviços nesses setores podem sentir uma pressão maior para reduzir custos. Isso pode resultar na substituição de trabalhadores locais por estrangeiros, que oferecem as mesmas habilidades a um custo reduzido, especialmente em funções que podem ser desempenhadas de maneira remota.
A legislação trabalhista brasileira, ancorada na CLT, protege fortemente os trabalhadores locais, mas não tem mecanismos específicos para impedir a contratação de mão de obra estrangeira por meio de contratos de prestação de serviços ou como freelancers. Isso pode resultar em uma situação onde empresas brasileiras, especialmente as que operam no mercado digital, busquem contratar prestadores de serviço de outros países, sem a obrigação de seguir as regras rígidas da CLT, o que coloca os trabalhadores brasileiros em desvantagem.
A competitividade do Brasil como fornecedor de mão de obra remota
Se por um lado o mercado de trabalho brasileiro enfrenta a ameaça da competição estrangeira, por outro, o Brasil pode se posicionar como um grande fornecedor de mão de obra qualificada para o mercado global. Com uma população jovem, bem-educada e cada vez mais fluente em outros idiomas, o país pode aproveitar a tecnologia e a IA para exportar serviços remotos, competindo diretamente com trabalhadores de outros países.
Com a IA generativa removendo a barreira linguística, brasileiros poderiam atender clientes internacionais com a mesma fluidez que trabalhadores de países de língua inglesa ou asiática, ampliando o leque de oportunidades em setores como marketing, suporte ao cliente, TI, design gráfico e consultoria. Além disso, o Brasil oferece um custo de vida relativamente mais baixo do que muitos países desenvolvidos, o que torna a mão de obra brasileira competitiva em termos salariais. Empresas internacionais, cientes do nível de qualificação dos trabalhadores brasileiros e de seu custo-benefício, podem preferir contratar brasileiros em vez de pagar mais caro por mão de obra local.
Impacto nas relações trabalhistas e a reação da CLT
Do ponto de vista legal, a CLT protege os trabalhadores brasileiros, mas não tem o mesmo impacto em relações trabalhistas internacionais. No entanto, se o Brasil se tornar um grande fornecedor de mão de obra remota para o exterior, será necessário que a legislação se adapte para garantir que esses trabalhadores tenham os mesmos direitos e garantias de proteção social que têm ao trabalhar para empresas brasileiras.
Por outro lado, a contratação de mão de obra estrangeira no Brasil também precisaria ser regulamentada de maneira mais clara. Em termos tributários, o governo poderia implementar medidas para garantir que empresas brasileiras que contratem trabalhadores estrangeiros de forma remota contribuam de maneira justa para a economia local, equilibrando a competição no mercado de trabalho.
Já os tribunais brasileiros, que têm uma postura historicamente protecionista, podem ser convocados a decidir sobre a regulamentação de novos tipos de contratos de trabalho e prestação de serviços remotos. Questões como evasão de encargos trabalhistas, proteção do trabalhador e equilíbrio entre os direitos dos empregados e a flexibilidade empresarial serão centrais nas discussões jurídicas dos próximos anos.
Conclusão
O avanço do trabalho remoto e da IA generativa apresenta tanto desafios quanto oportunidades para o Brasil. Se, por um lado, existe o risco de que trabalhadores brasileiros sejam substituídos por mão de obra mais barata de outros países, por outro, o Brasil tem a chance de se posicionar como um grande exportador de serviços qualificados. Para que isso aconteça de maneira justa e equilibrada, será fundamental que a legislação trabalhista e tributária se adapte às novas realidades do mercado global, garantindo que os trabalhadores brasileiros não apenas sejam protegidos, mas também possam competir em pé de igualdade em um cenário internacional.
Christiano Sobral
Diretor-executivo do escritório Urbano Vitalino Advogados, especializado em marketing, economia e negócios.
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