O Estado pode punir empresas envolvidas em trabalho escravo, desde que conceda a elas ampla defesa e que fique claro que essas companhias tinham como desconfiar da prática.
Com esse entendimento, o Plenário do Supremo Tribunal Federal declarou nesta quarta-feira (9/4) a constitucionalidade de lei do estado de São Paulo que prevê a cassação da inscrição no ICMS de empresas envolvidas em trabalho análogo à escravidão.
Nove ministros seguiram o voto do relator, Nunes Marques, pela validade da norma. O ministro Dias Toffoli ficou vencido.
A autora da ação alegou também que a lei paulista invade a competência constitucional reservada à União para executar a inspeção do trabalho ao delegar à Secretaria da Fazenda, órgão responsável pela gestão financeira do estado, a competência para apurar as condições a que estão submetidos os trabalhadores.
Voto-vista
O julgamento foi concluído nesta quarta com a apresentação do voto-vista do ministro Gilmar Mendes, seguindo o relator para validar a lei paulista.
Dessa maneira, disse Gilmar, preserva-se a competência privativa da União para organizar, manter e executar a inspeção do trabalho, prevista no artigo 21, XXIV, da Constituição Federal.
Voto do relator
Nunes Marques votou para conferir interpretação conforme a Constituição ao artigo 1º da Lei 14.946/2013, para exigir a comprovação, em processo administrativo sob as garantias do contraditório e da ampla defesa, de que o preposto do estabelecimento comercial saiba ou tenha como suspeitar da participação de trabalho escravo na cadeia de produção das mercadorias adquiridas.
O ministro também se manifestou para aplicar interpretação conforme a Constituição ao artigo 4º da norma, de forma a exigir comprovação, após processo administrativo no qual tenham sido observadas as garantias do contraditório e da ampla defesa, de que o sócio a ser punido tenha participado, comissiva ou omissivamente, dos atos aquisitivos de mercadorias de origem espúria, ou seja, aquelas fabricadas com o emprego de trabalho em condições análogas à escravidão.
O magistrado também entendeu que a norma estadual não invadiu a competência legislativa da União para tratar de Direito Comercial e apuração de condições de trabalho.
“Sob o ponto de vista material, compete tanto à União como aos estados, ao Distrito Federal e aos municípios combater as causas da pobreza e os fatores de marginalização, a fim de promover a integração social dos setores desfavorecidos (CF, art. 23, X). Se a ordem do constituinte originário era dirigida também aos entes subnacionais, por óbvio a eles é permitido legislar para o atingimento dos objetivos fundamentais programados pela Carta Cidadã. Foi isso, exatamente, que o estado de São Paulo fez.”
Dias Toffoli votou pela inconstitucionalidade da lei. Conforme o magistrado, o estado de São Paulo invadiu a competência da União ao estabelecer normas de fiscalização e punição para companhias envolvidas com trabalho escravo.
No Plenário Virtual, o ministro Alexandre de Moraes havia votado no mesmo sentido. Porém, o magistrado alterou o seu entendimento, ressaltando que a lei paulista não impôs obrigação a órgão federal.
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ADI 5.465