NOVA CENTRAL SINDICAL
DE TRABALHADORES
DO ESTADO DO PARANÁ

UNICIDADE
DESENVOLVIMENTO
JUSTIÇA SOCIAL

Marcos Roberto Hasse

Breve análise acerca da redução da jornada de servidores públicos com filhos autistas, destacando a importância do Decreto 10.598/2015 e sua base legal na proteção aos direitos do TEA.

O decreto 10.598/15, trouxe uma grande conquista para os servidores públicos do âmbito municipal de Jaraguá do Sul, estabelecendo normas e procedimentos para a redução da carga horária para acompanhamento e tratamento de dependentes portadores de necessidades especiais.

Entre os beneficiados, destacam-se os pais de crianças e adolescentes diagnosticados com TEA – Transtorno do Espectro Autista, que passaram a ter direito ao horário especial de trabalho, sem exigência de compensação de jornada. Desse modo este artigo tem por objetivo analisar a aplicação dessa norma à luz da proteção aos direitos das pessoas com autismo e da garantia do cuidado familiar.

Primeiramente, cumpre esclarecer que o autismo é um problema no desenvolvimento neurológico que prejudica a organização de pensamentos, sentimentos e emoções, sendo definido pela OMS como “um diverso grupo de condições caracterizadas por algum grau de dificuldade na interação social e na comunicação”.

Ainda, o ministério da saúde brasileiro considera o TEA “um distúrbio caracterizado pela alteração das funções do neurodesenvolvimento do indivíduo, interferindo na capacidade de comunicação, linguagem, interação social e comportamento”.

Em razão do Espectro, a lei 12.764/12, que institui a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista, assegura como um de seus pilares fundamentais o direito ao desenvolvimento pleno e à vida digna. Nesse sentido, o art. 3º da referida norma dispõe expressamente:

São direitos da pessoa com transtorno do espectro autista:

I – a vida digna, a integridade física e moral, o livre desenvolvimento da personalidade, a segurança e o lazer;

II – a proteção contra qualquer forma de abuso e exploração;

III – o acesso a ações e serviços de saúde, com vistas à atenção integral às suas necessidades de saúde, incluindo:

a) o diagnóstico precoce, ainda que não definitivo;

b) o atendimento multiprofissional;

c) a nutrição adequada e a terapia nutricional;

d) os medicamentos.

A norma equipara a pessoa com TEA – Transtorno do Espectro Autista à pessoa com deficiência para todos os efeitos legais, garantindo o acesso à proteção e aos benefícios destinados a esse grupo. De acordo com a legislação, a criança com TEA tem direito ao pleno desenvolvimento, bem como à atenção integral às suas necessidades de saúde.

No mesmo sentido, a lei 8.069/1990 – ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente, também garante o acesso integral às linhas de saúde, para os serviços de promoção, proteção e recuperação.

Art. 11º É assegurado acesso integral às linhas de cuidado voltadas à saúde da criança e do adolescente, por intermédio do Sistema Único de Saúde, observado o princípio da equidade no acesso a ações e serviços para promoção, proteção e recuperação da saúde.

De igual modo, a Constituição Federal de 1988, em seu art. 227, estabelece ser dever da família, da sociedade e do Estado assegurar, com absoluta prioridade, os direitos da criança e do adolescente, entre eles o direito à saúde, à dignidade, ao respeito e à proteção contra toda forma de negligência, discriminação, violência, crueldade e opressão.

Art. 227º É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

É amplamente reconhecido que crianças com TEA – Transtorno do Espectro Autista demandam cuidados específicos e diferenciados em relação às demais, sendo imprescindível o acompanhamento contínuo de pais e responsáveis como condição essencial para a promoção de seu desenvolvimento intelectual, emocional e social.

Nesse contexto, merece destaque o disposto no decreto municipal 10.598/15, o qual estabelece à concessão de redução de carga horária a servidores públicos municipais que necessitem acompanhar e prestar cuidados a pessoas com deficiência ou acometidas por doenças graves que resultem em incapacidade. Nos termos do art. 1º do referido decreto, é assegurada a possibilidade de diminuição da jornada de trabalho, conforme os critérios e condições ali estabelecidos.

Ao servidor efetivo e estável que comprovadamente seja pai, mãe, tutor, curador ou responsável pela criação, educação e proteção de pessoa com deficiência, considerada dependente sob o aspecto sócio-educacional e em situação que exija o atendimento direto pelo servidor, será concedida redução da jornada normal de trabalho para 20 (vinte) horas semanais, sem perda de remuneração, enquanto perdurar a situação.

Dessa forma, os servidores públicos que possuem filhos com diagnóstico de TEA se enquadram na previsão do decreto 10.598/15, podendo solicitar jornada especial de trabalho sem a necessidade de compensação de horas. A única exigência é a comprovação da deficiência por laudo médico oficial, acompanhado do pedido formal ao órgão de lotação.

A concessão da redução de carga horária possibilita ao servidor público dedicar maior atenção e cuidado ao dependente com deficiência, promovendo um acompanhamento mais efetivo de seu desenvolvimento. Tal medida contribui para a ampliação da autonomia da pessoa assistida, reduzindo gradualmente sua condição de dependência.

Atualmente, a CLT não possui dispositivos que tratem diretamente da redução da jornada de trabalho, contudo, o TRT da 12ª região adota entendimento favorável à aplicação da analogia com os servidores públicos no que se refere ao tema. Vejamos:

ECT. empregada pública. filho ou dependente com deficiência. transtorno do espectro autista. Redução de jornada sem redução da remuneração. art. 98, §§ 2º e 3º da lei 8.112/1990. aplicabilidade. conforme arts. 8º da CLT e 4º da LINDB, havendo omissão legislativa, é cabível a aplicação da analogia. assim, diante da ausência de norma trabalhista que disponha sobre horário de trabalho especial para empregado que necessite em função de filho ou dependente com deficiência, aplica-se, também, aos empregados celetistas o disposto no art. 98, §§ 2º e 3º da lei 8.112/1990 (TRT da 12ª Região; Processo: 0000525-04.2024.5.12.0059; Data da assinatura: 26/11/2024; Órgão Julgador: Gab. des. Roberto Basilone Leite – 2ª turma).

Portanto, o decreto 10.598/15 representa um avanço significativo na proteção dos direitos das famílias de pessoas com deficiência, especialmente no caso de filhos autistas, não somente do Município de Jaraguá do Sul, mas sim, como espelho para demais cidades e estados. Ao permitir o horário especial de trabalho sem compensação, é reconhecido a importância do papel dos cuidadores e contribui para a inclusão e o bem-estar das pessoas com TEA. É fundamental que os órgãos públicos adotem uma postura sensível e humanizada na análise desses pedidos, promovendo efetividade aos direitos garantidos em lei.

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https://solides.com.br/blog/reducao-de-jornada-para-pais-de-autistas/

https://www.conjur.com.br/2024-dez-18/reducao-de-jornada-para-servidor-publico-com-filho-autista-independe-de-previsao-em-lei-local/

https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2012/lei/l12764.htm

https://bvsms.saude.gov.br/transtorno-do-espectro-autista-tea-autismo/#:~:text=O%20Autismo%20(Transtorno%20do%20Espectro,de%20pensamentos%2C%20sentimentos%20e%20emo%C3%A7%C3%B5es.

https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/noticias/2022/abril/tea-saiba-o-que-e-o-transtorno-do-espectro-autista-e-como-o-sus-tem-dado-assistencia-a-pacientes-e-

https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm

https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm

Marcos Roberto Hasse
Advogado (OAB/SC 10.623) com 30 anos de experiência, sócio da Hasse Advocacia e Consultoria, com atuação ampla e estratégica em diversas áreas jurídicas.

MIGALHAS
https://www.migalhas.com.br/depeso/433371/jornada-de-trabalho-e-inclusao-um-olhar-sobre-o-decreto-10-598-15