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Eduardo Koetz

Setores se reorganizam diante da automação, exigindo de advogados e gestores uma reflexão crítica sobre adaptar modelos de negócio, requalificar equipes e adotar governança tecnológica responsável.

A IA – inteligência artificial deixou de ser promessa distante para se tornar protagonista no presente.

Cada dia surgem novas ferramentas capazes de realizar atividades antes restritas à intervenção humana, alterando radicalmente a forma como trabalhamos. O discurso recorrente de que “a tecnologia substituirá os empregos no futuro” já não corresponde à realidade: a transformação está em curso, visível tanto nos escritórios de advocacia quanto nas linhas de produção, nas empresas de serviços e até nas relações cotidianas com clientes.

O foco desta análise está nos impactos da IA no mercado de trabalho, destacando os setores mais impactados, os desafios da adaptação da força de trabalho e a responsabilidade de advogados, gestores e líderes empresariais nesse processo de transição. Mais do que modismo, a IA é motor de uma mudança estrutural que redefine competências, remodela negócios e exige novas formas de governança tecnológica.

A inevitabilidade da transformação tecnológica

A história do trabalho sempre foi acompanhada por ondas de transformação tecnológica. Da Revolução Industrial do século XVIII à difusão da informática no século XX, os empregos se reinventaram conforme novas máquinas e métodos de organização surgiram. A diferença central da era da IA é a velocidade.

O relatório da PwC aponta queaté 30% dos empregos podem ser automatizados até o início da década de 2030. Já o Fórum Econômico Mundial projeta que 85 milhões de postos de trabalho devem ser eliminados até 2025, mas que 97 milhões de novas funções serão criadas no mesmo período. Esse dado revela um ponto crucial: o problema não é apenas a eliminação de funções, mas a necessidade de rápida adaptação e requalificação da força de trabalho.

Diferente de outras revoluções tecnológicas, a IA não se limita a mecanizar tarefas físicas ou administrativas. Ela se expande para o campo cognitivo, analisando informações, tomando decisões preditivas e, em alguns casos, produzindo textos, imagens e até códigos de programação. Essa abrangência explica por que setores historicamente protegidos da automação agora sentem o impacto direto.

Setores mais impactados pela inteligência artificial

Os efeitos da IA não se distribuem de forma homogênea. Profissões de baixa renda e com menor escolaridade são as mais vulneráveis à substituição, mas até funções intermediárias e especializadas começam a ser remodeladas.

Atendimento ao cliente e suporte administrativo

Chatbots, sistemas de resposta automática e assistentes virtuais já reduzem a necessidade de grandes equipes de atendimento. Plataformas de gestão com IA respondem dúvidas, registram solicitações e encaminham demandas sem intervenção humana.

Transporte e logística

Veículos autônomos e sistemas inteligentes de roteirização estão em fase de teste em várias partes do mundo. No Brasil, empresas de logística já utilizam algoritmos de IA para reduzir custos de combustível, otimizar rotas e prever falhas mecânicas.

Setor jurídico

Nos escritórios de advocacia, softwares de IA realizam tarefas como triagem de processos, elaboração de peças iniciais, gestão de prazos e análise de jurisprudência. O advogado deixa de ser um “operador de repetição” para assumir o papel de estrategista, consultor e mediador de riscos.

Saúde, educação e tecnologia

Paradoxalmente, enquanto muitos postos são substituídos, outros ganham relevância. A medicina personalizada, a educação mediada por IA e o desenvolvimento de sistemas tecnológicos são áreas em franca expansão. Nelas, o fator humano, seja na empatia ou na criatividade, permanece insubstituível.

A nova geografia das profissões

Ao contrário da narrativa apocalíptica que prevê o fim do trabalho humano, a realidade é mais complexa: empregos não simplesmente desaparecem, mas são redesenhados. Um assistente administrativo pode se tornar gestor de fluxos automatizados. Um advogado júnior, antes sobrecarregado de tarefas repetitivas, pode dedicar mais tempo à análise estratégica e ao relacionamento com clientes.

Esse fenômeno pode ser descrito como migração funcional: trabalhadores não deixam de existir, mas mudam de posição dentro da engrenagem produtiva. No entanto, essa transição não é automática, exige formação, políticas públicas e visão empresarial de longo prazo.

O desafio da requalificação da força de trabalho

O maior gargalo da era da IA não é tecnológico, mas humano. A criação de novas funções não compensa automaticamente a destruição das antigas, porque exige competências distintas. Enquanto milhões de trabalhadores desempenham atividades manuais ou repetitivas, o mercado exige habilidades em análise de dados, pensamento crítico, criatividade e colaboração interdisciplinar.

Isso coloca empresas e governos diante de uma tarefa urgente: investir em requalificação profissional. Não se trata apenas de ensinar a programar, mas de desenvolver competências adaptativas que permitam aos indivíduos transitar entre funções em um cenário de constante mutação.

Nesse ponto, o setor jurídico desempenha papel estratégico. Advogados trabalhistas e gestores de RH precisam revisar modelos de contratação, políticas de treinamento e formas de garantir a empregabilidade em meio à disrupção tecnológica. A ausência dessa reflexão pode ampliar desigualdades e gerar insegurança jurídica, com disputas sobre direitos em ambientes cada vez mais híbridos entre humano e máquina.

Responsabilidade empresarial e governança tecnológica

A adoção de IA não pode ser tratada apenas como estratégia de redução de custos. Há riscos éticos, jurídicos e sociais envolvidos. Entre eles

Transparência algorítmica: decisões automatizadas que afetam trabalhadores e consumidores precisam ser explicáveis e auditáveis;
Proteção de dados: sistemas de IA dependem de grandes volumes de informações, exigindo conformidade com legislações como a LGPD;
Inclusão social: empresas que automatizam funções devem considerar contrapartidas de requalificação para evitar exclusão massiva.
Aqui, gestores jurídicos têm papel central. É sua responsabilidade orientar lideranças empresariais sobre os limites legais da automação e sobre práticas de governança que conciliem eficiência tecnológica com direitos fundamentais.

O caso da advocacia: entre automação e estratégia

No universo jurídico, a IA já provoca mudanças significativas. Ferramentas de análise de jurisprudência, como as integradas em plataformas de legaltechs, reduzem o tempo de pesquisa e aumentam a precisão argumentativa. Escritórios que antes destinavam horas de trabalho de advogados juniores para leitura de autos agora contam com relatórios sintéticos produzidos por IA.

Esse modelo se alinha à tendência apontada por estudos globais: funções repetitivas serão absorvidas pela tecnologia, enquanto habilidades humanas, criatividade, estratégia, empatia e negociação, se tornarão diferenciais competitivos.

Para além da ameaça: a IA como oportunidade

É comum tratar a IA como inimiga dos trabalhadores, mas a história sugere um caminho mais equilibrado. A automação do século XX não eliminou o trabalho humano, mas o reconfigurou. O desafio, portanto, é adotar uma postura crítica, mas também propositiva.

Empresas que enxergam a IA como ferramenta de empoderamento humano, e não como simples substituição, saem na frente. O ganho não está apenas em cortar custos, mas em liberar talentos para criar, inovar e resolver problemas complexos.

No campo jurídico, isso significa menos tempo em petições padronizadas e mais dedicação à construção de soluções personalizadas para clientes. No setor empresarial, implica liberar gestores de tarefas burocráticas para focar em estratégia e inovação.

Reflexões críticas para gestores e líderes jurídico

A ascensão da IA exige uma postura de liderança fundamentada em três pilares:

Visão estratégica: enxergar a IA como instrumento de longo prazo, não como modismo;
Gestão humana: investir em requalificação, bem-estar e valorização da inteligência criativa;
Governança responsável: adotar políticas de transparência, ética e conformidade legal na implementação de sistemas inteligentes.
Essa tríade não é apenas moralmente desejável, mas economicamente inteligente. Organizações que alinham tecnologia, pessoas e governança tendem a ser mais competitivas, inovadoras e resilientes em cenários de incerteza.

O presente já chegou

A inteligência artificial não é uma promessa distante, mas uma realidade que redefine o mundo do trabalho em tempo real. Escritórios de advocacia, empresas de serviços, indústrias e governos já vivem os impactos da automação inteligente.

O futuro que antes parecia distante agora se apresenta como urgência. O desafio não é escolher se vamos ou não adotar a IA, mas como vamos fazê-lo de forma responsável, equilibrando ganhos de produtividade com valorização da inteligência humana.

Para advogados, gestores e líderes empresariais, o caminho é claro: compreender as transformações, antecipar riscos, preparar equipes e implementar modelos de governança tecnológica capazes de transformar a IA em aliada da inovação e da justiça social.

Eduardo Koetz
Eduardo Koetz é advogado, sócio-fundador da Koetz Advocacia e CEO do software jurídico ADVBOX . Especialista em tecnologia e gestão, ele também se destaca como palestrante em eventos jurídicos.

MIGALHAS
https://www.migalhas.com.br/depeso/440937/ia-e-empregos-reflexoes-para-advogados-e-gestores