Boletim do Dieese revela mercado de trabalho tensionado, desigualdade tributária persistente e mobilização crescente. Trata-se de alerta sobre os limites de o modelo econômico atual
O Boletim de Conjuntura # 49 do Dieese, de setembro de 2025, traça panorama crítico da conjuntura brasileira. Focaliza 3 eixos centrais: tributação, trabalho e mobilização dos trabalhadores.
O documento destaca o PL (Projeto de Lei) 1.087/25 que trata da reforma do IRPF (Imposto de Renda das Pessoas Físicas), com objetivo de torná-lo mais progressivo.
Apesar das mudanças recentes — como a EC 132/23 — que isentaram produtos essenciais e taxaram bens de alto valor, o boletim aponta que o sistema continua regressivo: quem recebe mais de 320 salários mínimos acaba pagando alíquota efetiva menor (4,9%) do que quem recebe entre 5 e 7 salários mínimos.
O Dieese alerta: sem reforma profunda e bem calibrada, a desigualdade fiscal seguirá minando a justiça social.
Demissões voluntárias crescem
No primeiro semestre de 2025, os desligamentos a pedido cresceram 9,6% em relação ao mesmo período de 2024, totalizando 4,7 milhões.
Esse fenômeno é interpretado como sintoma, segundo o Dieese, de 2 forças cruzadas:
- empregos de qualidade questionável, que levam trabalhadores a pedir demissão; e
- cenário mais favorável para buscar melhores condições.
Os desligamentos foram mais frequentes entre:
- jovens de 18 a 24 anos;
- trabalhadores com ensino superior (45%); e
- setores de educação (48%) e saúde (46%).
Greves explodem, especialmente nas estatais
As greves saltaram 17% no primeiro semestre de 2025 em comparação ao mesmo período de 2024 (de 451 para 529 movimentos). A alta foi puxada por:
- estatais (+89%); e
- serviços privados (+48%).
As pautas se ampliam: além de reajuste salarial, envolvem condições de trabalho, segurança, contratações e infraestrutura. A classe trabalhadora sinaliza que o limite da deterioração laboral foi ultrapassado.
Inflação aliviada, juros e CV ainda pressionam
Em agosto de 2025, o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) registrou -0,11%, impulsionado pela queda nos alimentos e energia.
O acumulado em 12 meses chegou a 5,13%. Para famílias com até 5 salários mínimos, o INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor) apresentou -0,21% no mês e 5,05% em 12 meses.
Apesar da desaceleração inflacionária, o boletim alerta que os juros seguem elevados, e restringe crédito, consumo e investimentos. Com crescimento econômico modesto, há risco de pressões inflacionárias no futuro.
País em ponto de inflexão
O boletim mostra um Brasil em tensão:
- trabalhadores rejeitam empregos ruins e se mobilizam;
- sistema tributário continua injusto; e
- inflação dá trégua, mas a vida ainda pesa no bolso.
Sem avanço estrutural na reforma fiscal e nas negociações coletivas, a frustração pode substituir a esperança. E o potencial de crescimento ser engolido pela estagnação social.
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Câmara avança na ampliação do BPC e libera avaliação por videoconferência
Mudanças ampliam acesso ao benefício para idosos e pessoas com deficiência e flexibilizam critérios de renda. Proposta segue agora para o plenário
A Comissão de Defesa dos Direitos das Pessoas com Deficiência da Câmara dos Deputados aprovou, na terça-feira (11), o PL (Projeto de Lei) 1.624/22, do deputado Ivan Valente (PSol-SP), que altera critérios de acesso ao BPC (Benefício de Prestação Continuada). A informação é da Agência Câmara.
O relator, deputado Duarte Jr. (PSB-MA), recomendou a aprovação do texto original e de projetos anexados, e rejeitou o substitutivo — texto novo — da Comissão de Defesa dos Direitos da Pessoa Idosa.
Critério de renda mais amplo
Atualmente, o BPC é concedido às famílias com renda per capita inferior a ¼ do salário mínimo. O novo texto eleva esse limite para ½ salário mínimo, ampliando o universo de beneficiários — especialmente famílias pobres que ficavam acima do critério tradicional.
O projeto também permite deduzir até 1 salário mínimo do cálculo da renda quando houver mais de um idoso ou pessoa com deficiência na mesma casa.
Hoje, o BPC recebido por morador é totalmente contabilizado na renda familiar, o que impede outro integrante de acessar o benefício.
Com a mudança, 2 pessoas com deficiência ou 2 idosos poderão receber simultaneamente o BPC, e assim corrige-se distorção histórica da regra atual.
Avaliação por videoconferência
O projeto autoriza que avaliações sociais e médicas do BPC ocorram por videoconferência, desde que a equipe técnica — assistentes sociais e peritos médicos — considere o formato adequado.
A medida ajusta a Loas (Lei Orgânica da Assistência Social), a Nova Lei do Bolsa Família e a Lei 14.176/21, abrindo caminho para procedimentos mais ágeis e menos custosos para famílias vulneráveis.
Trâmite legislativo
A proposta ainda será analisada pelas comissões de Saúde, Finanças e Tributação e Constituição e Justiça.
Como recebeu pareceres conflitantes em comissões anteriores, seguirá também para o plenário da Câmara, etapa decisiva antes de eventual envio ao Senado.
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TST reage à onda de pejotização e alerta para rombo bilionário na proteção social
Em audiência na Câmara, presidente do TST denuncia perdas à Previdência e defende centralidade da Justiça do Trabalho diante da precarização crescente
Em audiência pública na Câmara dos Deputados, na última terça-feira (11), o presidente do TST (Tribunal Superior do Trabalho), ministro Vieira de Mello Filho, afirmou que a expansão da pejotização fragiliza direitos trabalhistas, compromete o financiamento da Seguridade Social e ameaça o futuro do País.
O debate ocorreu nas comissões de Constituição e Justiça (CCJ) e de Trabalho, durante discussão sobre “Novas Relações de Trabalho e o Papel do Judiciário”.
O TST acendeu o alerta contra o avanço da pejotização no Brasil.
Rombo bilionário na Previdência, FGTS e ‘Sistema S’
O ministro citou dados do Ministério do Trabalho e Emprego que mostram o impacto da substituição de vínculos formais por contratação como pessoa jurídica.
Cerca de 5,5 milhões de trabalhadores migraram da CLT para PJ entre 2022 e 2025, e provocou perdas estimadas em:
- R$ 70 bilhões na Previdência Social;
- R$ 27 bilhões no FGTS; e
- R$ 8 bilhões no “Sistema S”
Segundo ele, trocar emprego formal por suposta “liberdade contratual” é “ilusão”:
“Empresa não adoece, não tira férias, não engravida. A cidadania e os direitos humanos são atributos da pessoa, não de CNPJ”.
Justiça do Trabalho segue essencial
Vieira de Mello também contestou o argumento de que a flexibilização de vínculos gera mais postos de trabalho. Para ele, quem cria emprego é o crescimento econômico, não mudanças legais.
O ministro defendeu que a Justiça do Trabalho permaneça competente para julgar conflitos nas novas formas de contratação, sob risco de ampliar ainda mais a precarização.
Proteção trabalhista é a base do desenvolvimento
Na audiência, o presidente do TRT da 2ª Região (SP), desembargador Valdir Florindo, afirmou que a proteção ao trabalhador é condição do Estado Democrático de Direito e deve alcançar todos os vínculos, independentemente do modelo contratual.
Ele destacou que os direitos constitucionais do artigo 7º — férias, 13º salário, FGTS, adicional de horas extras — não podem ser relativizados por contratos ou pela adoção de novas tecnologias.
“A essência das relações de trabalho não muda pela vontade do legislador. A realidade acaba se impondo”, disse.
Diálogo sobre o futuro do trabalho
A audiência, realizada no plenário 12 da Câmara, aproximou Legislativo, Judiciário, Ministério Público, advocacia e centrais sindicais. Entre as propostas discutidas estão:
- criação de Fórum Permanente em Defesa da Justiça do Trabalho; e
- instalação de Frente Parlamentar pela Valorização da Justiça do Trabalho.
O encontro reforçou a preocupação institucional com o avanço da pejotização e seus impactos sociais, econômicos e democráticos.
