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Ex-presidente do Banco Central e do BNDES diz que se a turbulência avançar para uma onda de aversão ao risco o País terá que baixar juros e segurar os gastos públicos

Se a crise da dívida dos países ricos piorar e avançar para um movimento de aversão generalizada ao risco, o Brasil precisará baixar juros em vez de aumentar o gasto público. A opinião é do economista Persio Arida, sócio do Banco BTG Pactual, e ex-presidente do Banco Central e do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).

Um dos economistas mais admirados do País, Arida diz que ainda é preciso avaliar melhor o cenário nebuloso em que se dá o repique da crise mundial, que envolve as dificuldades dos países europeus com suas dívidas e ganhou mais lenha na fogueira na sexta-feira, quando a agência de classificação de risco Standard & Poor”s rebaixou a nota da dívida dos Estados Unidos.

Caso essa onda se transforme num movimento global de aversão ao risco, e as chances existem, a atividade econômica tenderá a diminuir no mundo, afetando o Brasil. “Se isso de fato acontecer, na minha opinião tem que contra-arrestar o efeito negativo diminuindo a taxa de juros e não aumentando o gasto público”, diz Arida. Em 2008, o país fez as duas coisas: baixou os juros e jogou um caminhão de dinheiro na economia.

Quais as consequências do rebaixamento da nota da dívida dos Estados Unidos?

Primeiro há uma questão técnica sobre a nota, que é saber se houve um erro da Standard & Poor”s (S&P), como diz o governo americano, ou não. Do ponto de vista das expectativas dos mercados, a avaliação sobre esse possível erro faz uma grande diferença. Por outro lado, a longo prazo é de se esperar uma piora na qualidade da dívida soberana tanto dos Estados Unidos quanto dos países europeus. A consequência desse fenômeno deve se traduzir numa aversão generalizada ao risco, o que tende a implicar no desaquecimento da economia global.

Então, mesmo que o Brasil não esteja no centro da crise, ela deverá transbordar para cá…

Todo episódio de aversão ao risco afeta a propensão a investimento e, portanto, tem consequência de desaceleração. No Brasil, parte disso já está de alguma forma precificado no mercado futuro de juros. Mas, se de fato houver uma percepção de mercado muito negativa, é de imaginar que se passe a ter no Brasil um impacto negativo na atividade que poderia ser contra-arrestado ou por política fiscal ou por política monetária. O ideal para o País é que fosse contra-arrestado exclusivamente por política monetária.

O sr. está falando em baixar os juros?

Do nosso ponto de vista, o efeito da turbulência de curto prazo é sempre uma aversão generalizada ao risco e a atividade econômica tende a cair. Nesse sentido, entendo que a resposta ideal de política econômica é exclusivamente via política monetária e não via política fiscal, e muito menos de crédito. Tem que contra-arrestar o efeito negativo diminuindo a taxa de juros e não aumentando o gasto público.

É o oposto do que o governo vem fazendo…

O que estou dizendo é o seguinte: se de fato houver uma aversão generalizada ao risco, porque o que houve até agora foi queda de bolsa, muito forte, mas não necessariamente uma aversão generalizada ao risco, como é que o País deveria responder? Na minha opinião, via política monetária e não via política fiscal.

O sr. vê risco de rebaixamento de dívidas em cascata na Europa?

Ao longo do tempo é de se imaginar que toda dívida soberana desses países que resolveram o problema de excesso do endividamento privado transferindo parte da dívida para o setor público tenda a resultar em ratings (avaliações) piores. Portanto, não me surpreende como processo, como tendência de longo prazo.

E no curto prazo?

Ainda é cedo para dizer. Imagino que a resposta óbvia para essa crise europeia é um programa maciço de recompra de títulos soberanos pelo Banco Central Europeu. Não sei se vão fazer isso ou não, mas é o óbvio. É possível que a situação se reverta no curto prazo se tiver esse programa de recompra do BC europeu, mais os questionamentos pelos agentes de mercado quanto à avaliação da S&P. Se isso ocorrer, é possível que a situação seja menos dramática do que parece agora.

Como o sr. avalia a reação da China, que pediu supervisão internacional sobre a emissão de dólares e a adoção de uma nova moeda global?

Como principal credor soberano dos Estados Unidos, a China tem uma preocupação evidente com a sustentabilidade da trajetória da dívida americana. Mas não está muito claro o que eles têm em mente. Durante algum tempo a China argumentou pela transformação dos direitos especiais de saque do Fundo Monetário Internacional como moeda global. Não sei se é exatamente isso que eles têm em mente hoje. Agora, como traduzir isso numa nova arquitetura global é uma questão muito complexa, não acho que o mundo esteja preparado para respondê-la neste momento.

É bobagem pensar que os investidores vão fugir dos títulos americanos por causa de tudo que está acontecendo agora?

Processos de mudança de moeda reserva são historicamente lentos e entremeados de desdobramentos políticos. Não imaginaria transições muito abruptas nessa direção.