Aumento de domicílios nos estratos médios faz especialistas proporem novo modelo, baseado em consumo e posses
O crescimento da classe média e o aumento do consumo por esta parcela da população fez dois professores criarem um novo modelo para a definição socioeconômica do brasileiro. Alimentação fora de casa, cosméticos, automóveis e viagens aéreas são hoje mais demandados do que antes, o que mostra que uma parcela maior da sociedade merece a atenção das empresas que oferecem estes produtos. Estas empresas, por sua vez, devem voltar seu olhar para esta ”nova classe média”, a fim de suprir melhor as suas necessidades.
O modelo proposto pelos professores Wagner Kamakura, da Fuqua School os Business, da Universidade de Duke (EUA), e José Afonso Mazzon, da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (Feausp) possibilita captar, com mais precisão, as mudanças nas condições socioeconômicas e os hábitos de consumo adotados pelas famílias brasileiras. Trabalha com 14 a 36 variáveis para realizar a classificação socioeconômica como o número de aparelhos de TV em cores, computadores pessoais e automóveis, nível de educação, acesso a esgoto, água tratada.
Os dados utilizados são dos mais de 104 mil domicílios levantados pelas Pesquisas de Orçamentos Familiares, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), realizadas em 2003 e 2009.
Foi justamente neste período que 20,5 milhões de brasileiros conseguiram ultrapassar a linha de pobreza e ascenderam à classes socioeconômicas mais elevadas. Desta forma, os domicílios de classe média, que representavam 46% do total em 2003, passaram a representar 56% dos domicílios brasileiros.
Com mais critérios, o modelo dos professores Mazzon e Kamakura chegou a uma distribuição mais simétrica da população brasileira, com boa parte dela nas classes médias. O modelo opõe-se ao desenvolvido hoje e largamente utilizado pela Associação Brasileiras das Empresas de Pesquisa (Abep), chamado de Critério Brasil, que se baseia na posse de apenas oito tipos de bens duráveis, empregada doméstica e educação do chefe do domicílio. O modelo proposto, assim como o Critério Brasil, pode ser utilizado para estudos de segmentação e análise de consumo por veículos e comunicação, agências de propaganda, anunciantes e institutos de pesquisa.
Para Mazzon, o Critério Brasil presta-se bem para mensurar as classes mais altas e hábitos de consumo de produtos como joias e viagens de lazer, mas coloca as classes mais baixas em uma ”vala comum”. Nota-se, inclusive, que no Critério Brasil a distribuição da população fica mais concentrada nas classes mais baixas. Assim, empresas que utilizam este modelo conseguem ter um bom retrato dos hábitos de consumo das classes mais altas, mas podem acabar negligenciando importantes segmentos emergentes de mercado. ”No critério Brasil, se quero fazer um produto para a classe média, tem muito menos pessoas (na classe média) que no nosso modelo. A nossa representa 100 milhões de pessoas”, comenta o especialista.
O professor resume que o novo modelo proposto mostra que houve mudanças importantes na sociedade brasileira de 2003 a 2009. ”Houve uma mudança gigantesca no consumo. Aumentou a renda real e muita gente passou a consumir mais categorias de produtos. O consumo é desconcentrado.”
O software para cálculo do novo modelo foi deixado na Abep para pesquisas sem custo nenhum, conta Mazzon. ”Como é um critério robusto, extremamente sólido do ponto de vista metodológico, acho que vai ter uma possibilidade grande de ser adotado inclusive por outros países.”

