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Seis das oito colisões envolvendo ônibus nos últimos dois anos aconteceram na região central. Sem mudanças, incidentes vão se repetir, avisam especialistas

O acidente ocorrido no sábado entre um ônibus biarticulado da linha Santa Cândida/Capão Raso e um ligeirinho de Fazenda Rio Grande, na Travessa da Lapa, no centro de Curitiba, re­­vela a necessidade urgente de rever as medidas de segurança no trânsito no anel central da capital. A colisão do fim de se­­mana deixou 40 pessoas feridas, 28 delas encaminhadas para hospitais de Curitiba e região metropolitana com ferimentos leves (leia mais na página ao lado). Em pouco mais de dois anos, foram oito acidentes graves envolvendo ônibus. Destes, seis ocorreram na região central. Ao todo, foram três mortos e mais de 100 feridos.

Para especialistas em trânsito, a recorrência de acidentes nos mesmos locais são conhecidos como “pontos negros”, e servem como indicativos de que a região deve ser alvo de uma análise constante pelas autoridades de trânsito. Para o advogado e especialista em trânsito Mar­­celo Araújo o mesmo tipo de acidente – no caso, envolvendo ônibus no mesmo local – é sinal de que, se algo não for feito, mais fatalidades ocorrerão. “Ou todo mundo está agindo de forma errada ou deve ter alterações de trânsito no local”, afirma. Ele não descarta uma investigação precisa para que o comportamento do motorista sofra mudanças.

Araújo vai além. Quando se fala em um ônibus biarticulado, modelo envolvido na grande maioria dos acidentes vistos nestes dois últimos anos (veja quadro na página ao lado), está se falando de um veículo com ca­­racterísticas especiais, por sua grande extensão e peso. São 25 metros e 40 toneladas. “A segregação dele em uma canaleta já diz tudo”, diz Araújo. Chamado por muitos como metrô de su­­perfície, desde sua implantação na década de 1980, o veículo tem uma natureza contrária ao trânsito co­­mum, segundo o especialista, e que merece uma sinalização condizente à sua proporção. Sendo assim, Araújo acredita que a redução da velocidade dos ônibus que trafegam na Tra­­vessa da Lapa, via onde ocorreram três dos oito acidentes, deveria ser no máximo 40 km/h.

Velocidade menor

A opinião é a mesma do perito criminal do Instituto de Cri­­minalística do Paraná e especialista em reconstituições de acidentes de trânsito Altamir Cou­­tinho. “Se um veículo de grande porte, como o biarticulado, precisar parar andando a 60 km/h, pode causar um transtorno enorme e ferir muita gente. Se­­ria interessante colocar o máximo de 40 [km/h] em trechos complicados e manter 60 [km/h] em vias melhores”, sugere.

Especificamente nos cruzamentos da Travessa da Lapa com a Rua André de Barros (onde os ônibus colidiram) e com a Avenida Visconde de Guara­­puava, Coutinho explica que, por causa das edificações frontais na região, o motorista que trafega na canaleta não consegue ter uma visão periférica, já que se forma uma espécie de corredor na região. “Esses cruzamentos são enclausurados, e o motorista só consegue visualizar no momento do acidente. O que não permite reduzir a velocidade para estancar o veículo”.

Para Coutinho, conhecer muito bem o caminho pode acostumar o motorista, o que o leva a assumir riscos que não deveria. “Ele consegue passar uma, duas vezes no amarelo, e nada acontece. Está tão habituado que memoriza todos os pontos, o que leva a um acidente. O correto é não cair nesta rotina e conseguir antever riscos”, alerta.

Soluções

O instrutor de cursos técnicos so­­bre trânsito Aldo Budel acredita que falta sinalização sobre a circulação dos biarticulados em Cu­­­ritiba. “É interessante colocar pa­­ra o motorista mais claramente que naquela via circula ônibus, pa­­­­­­ra que se tenha mais cuidado”. Al­­tamir Cou­­tinho ressalta que, nos cruzamentos da Travessa da La­­pa, o motorista deveria ser avisado de que a visibilidade no local é restrita. “Não tem como tirar os pré­­dios do local. Então, colocar mais placas de sinalização, para reforçar o motorista a um alerta, é fundamental. Se nada for feito, a ten­­dência é de que ou­­tros acidentes de grandes proporções aconteçam”.

Confusão a bordo

“Foi uma fatalidade”

A atendente de loja Márcia Cardinal não imaginou que a tarde de sábado acabaria como paciente em um hospital. Ela e a irmã Rita Maria, 57 anos, estavam indo justamente visitar um familiar no Hospital do Trabalhador. Para Márcia, foi uma fatalidade. Havia oito meses que ela não andava de ônibus. Trabalha e mora no bairro Boa Vista e faz o percurso a pé. A irmã Rita Maria está em Curitiba desde o dia 3, em função da sobrinha internada no hospital. Ela mora em Caraguatatuba, litoral de São Paulo.

“Senti que ia morrer quando ouvi a colisão”. Sentada na quarta fileira, atrás do motorista do biarticulado da linha Santa Cândida/Capão Raso, que ia sentido Capão Raso, só percebeu a gravidade do acidente ao ver a “chuva” de vidros. “A sorte que me protegi com a bolsa”. Ainda assim, o saldo foi seis pontos na testa e o extravio dos óculos.

A confusão foi enorme. Muito grito, choro. Tinha gente ensanguentada no chão, lembra ela. Ao lado, tinha uma senhora com um bebê no colo. À frente, uma menininha de três anos. “Quem avançou o sinal verde foi o ligeirinho”, garante. O auxiliar de produção Alcides de Oliveira, 24 anos, estava exatamente na calçada da Travessa da Lapa com a Rua André de Barros quando houve o acidente. Ele ouviu o ônibus ligeirinho vir buzinando, mas em velocidade normal. Com medo de ser abalroado ao perceber que haveria a colisão, atirou-se para trás. “Não sabia se corria, se me jogava no chão. Parecia um filme”, fala. Ele conta que o pânico era geral e não dava para saber a dimensão do acidente. Ele viu quando o ligeirinho bateu no biarticulado e foi levado pelo impacto em direção à Travessa da Lapa. Ele ligou para o socorro e resolveu ajudar as pessoas que não conseguiam sair pelas portas emperradas.

Fonte: Gazeta do Povo