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REFLEXÕES TRABALHISTAS

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O Seguro de Acidentes do Trabalho (SAT) foi constituído na América Latina no século 20 e, no Brasil, nos anos 20, por conta de fortes movimentos operários, com a imigração e a industrialização, reivindicando os trabalhadores proteção social e coletiva contra os riscos imediatos dos acidentes de trabalho que subtraiam a capacidade laboral ou a vida de trabalhadores, deixando-os desamparados. Esse seguro se espelhou em paradigma contributivo com viés indenizatório, mas sem qualquer preocupação com a prevenção dos acidentes e a melhoria dos ambientes de trabalho.

No Brasil, até 1967 o Seguro de Acidentes do Trabalho estava a cargo da iniciativa privada, a partir de quando, pelo Decreto-Lei nº 293/67, ficou estabelecido que o Estado, por meio do Instituto Nacional de Previdência Social (INPS), passaria a operar o seguro contra os riscos dos acidentes de trabalho em regime de concorrência com as sociedades seguradoras (§1º do artigo 3º). Logo em seguida, pela Lei nº 5.316/67 (artigo 1º), o seguro obrigatório de acidentes do trabalho passou a ser realizado exclusivamente na Previdência Social, o que ocorre até hoje, conforme estabelece a Lei nº 8.212/91 (artigo 22, inciso II), mediante contribuições pagas exclusivamente pelas empresas (1% para os riscos leves, 2% para os riscos médios e 3% para os riscos graves).

Há quem sustente a transferência desse seguro social inteiramente para a iniciativa privada, como tendência ocorrente em vários países da América Latina. Outros entendem que, pela sua finalidade de alto alcance social, deva continuar a cargo exclusivo da Previdência Social. Conforme preceitua a Constituição Federal (§10 do artigo 201), poderá o SAT ser atendido concorrentemente pelo regime geral de Previdência Social e pelo setor privado, o que ainda depende de regulamentação legal.

Com efeito, experiências demonstraram o desacerto da privatização do Seguro de Acidentes do Trabalho, pois o interesse maior das seguradoras é a obtenção de lucros e, com isso, criam estratagemas para afastar os segmentos mais problemáticos, como a agricultura, a construção civil e outras atividades de maiores riscos para se concentrarem nos setores que possuem balanços de contribuições bastante positivos, que possam garantir retorno financeiro certo.

No que diz respeito à competição entre setores público e privado, pode haver, como já demonstrou a experiência brasileira, comportamento seletivo dos operadores privados, buscando os segmentos de potencial contribuição e deixando para o setor público as categorias não rentáveis. Mutatis mutandis, é o que ocorre com os planos privados de saúde, que tudo fazem para afastar os idosos, pois estes mais usam o sistema e os casos de doenças requerem tratamentos complexos e mais caros.

Pensamos que o SAT deve continuar exclusivamente a cargo da Previdência Social, merecendo, contudo, modificações no sentido de resgatar o seu papel inicial de verdadeira proteção diferenciada para os segurados vítimas de acidentes de trabalho, porque as investidas legislativas nos últimos anos têm sido no sentido de diminuir as coberturas e tornar os benefícios decorrentes de acidentes de trabalho praticamente iguais àqueles de natureza comum, o que constitui erro injustificável sob o ponto de vista social, cuja motivação, como tudo indica, seria facilitar a transferência desse seguro para a iniciativa privada.

Por outro lado, seria oportuno que as companhias seguradoras direcionassem seguros específicos para cobertura civil dos infortúnios do trabalho, em complemento aos seguros de máquinas, equipamentos e veículos já existentes no mercado. Seria apenas uma questão de ampliar a cobertura das fábricas, oficinas, metalúrgicas etc., fazendo um seguro casado do equipamento e dos operários que o manipulam. Trata-se de medida garantidora de segurança para os empresários por conta de indenizações de natureza civil, que, às vezes, podem comprometer seu patrimônio, bem como para os empregados, que estarão garantidos na eventualidade de um sinistro. Para tornar compensador referido seguro, e incentivar sua adoção, seria o caso de se fixar uma pontuação para as empresas de maior ou menor risco, em que as de maior risco pagariam mais pelo prêmio securitário e as de menor risco pagariam menos. Essa pontuação e outras medidas pertinentes poderiam ser estipuladas por uma comissão paritária, composta por empregados, empregadores e governo, além das seguradoras.

Esse seguro privado, que fique bem claro, seria destinado apenas à cobertura das indenizações de natureza civil, a cargo exclusivo do empregador, permanecendo o seguro oficial para cobrir os benefícios acidentários-previdenciários de natureza salarial/alimentícia. Não se trata de privatização do Seguro de Acidentes do Trabalho, como querem alguns.

 

 é doutor em Direito das Relações Sociais pela PUC-SP, professor titular do Centro Universitário do Distrito Federal (UDF)/mestrado em Direito das Relações Sociais e Trabalhistas, membro da Academia Brasileira de Direito do Trabalho, consultor jurídico, advogado, procurador regional do Trabalho aposentado e autor de livros jurídicos.

Revista Consultor Jurídico

https://www.conjur.com.br/2021-nov-26/reflexoes-trabalhistas-algumas-observacoes-seguro-acidentes-trabalho