Joseane de Menezes Condé
Este texto descreve a trajetória sui generis do direito trabalhista e suas diferentes vertentes vanguardistas.
Na antiguidade, a palavra trabalho era denominada de tripalium, derivada do latim, que significava um instrumento utilizado na lavoura pelos camponeses. Posteriormente, com o ápice da civilização greco-romana, este objeto de lavouras passou a ser utilizado para punir escravos e pessoas endividadas, contextualizando o caráter depreciativo da palavra trabalho dessa época. De acordo com o filósofo Platão, “É próprio de um homem bem nascido desprezar o trabalho”. Nesse sentido, é cediço que quem trabalhava nos tempos remotos não possuía certos requisitos da elite do pretérito como capacidade artística, intelectual e política.
Com a queda do Império Romano, houve a descentralização de poder e iniciou- se o sistema de controle feudal que promovia a proteção das famílias em troca do recolhimento da produção nos feudos. Destarte, o trabalho continuou a ter caráter de subordinação e penalização, pois as classes sociais eram praticamente intransponíveis, o regime laboral demonstrava-se como semi- escravagista e a hierarquia engessada entre as classes sociais.
No início do século XVIII, houve a mudança de paradigma do sistema laboral, com industrialização e divisão de trabalhos interpessoais. Segundo o doutrinador Mauricio Godinho Delgado, só havia algumas leis isoladas nessa época e a intervenção estatal era mínima, ou seja, mulheres e crianças trabalhavam exaustivamente em fábricas, com intuito meramente habitacional e alimentar. Segundo o jornal el paiz, as vilas industriais “doadas” pelos empregadores aos empregados continham ratos, falta de saneamento básico e aglomeração de famílias- fato que aumentou a transmissão de doenças como tifo.
Com a expansão da primeira guerra mundial, o desequilíbrio entre empregado e empregador era notório, fazendo com que a polarização de ideais fomentasse movimentos cartistas e manifestos comunistas em prol dos trabalhadores. Um exemplo disso é o Manifesto Comunista de 1848, que estipulava a livre associação sindical e o direito de greve. Entretanto diante de toda a ebulição axiológica, a igreja católica encontrou terreno fértil para ensejar o controle normativo e jurídico da população em geral. Nesse prisma, o Papa Leão XIII escreveu a “Encíclica Rerum Novarum”, em 1891, aberta a todos os bispos, cujo teor discursivo era sobre condições distributivas em prol das classes trabalhadoras.
Diante de tantas mudanças socioeconômicas e culturais, o período entre 1919 e o século XX, foi marcado por reivindicações sociais de direitos fundamentais proativos. Por conseguinte, observa-se que o paradigma de controle do trabalho e toda a movimentação insurrecionista, já não preenchia os requisitos fundamentais de segunda geração aos trabalhadores. Nesse ângulo, a Constituição Mexicana e a Alemã (Weimar) tornaram- se marcos laborais reivindicatórios, pautando-se na dignidade da pessoa humana, com sugestão tripartite de cooperação, envolvendo o Governo, a organização e os empregadores.
No fim do século XX, novas mudanças ocorreram em relação a forma de Governo de muitas nações que elegeram governos neoliberais, ampliando a autonomia das vontades, reduzindo o Estado interventor e fomentando as inovações tecnológicas. Um exemplo disso pode ser descrito nos Estados Unidos e na Inglaterra de 1980, que se adaptaram às tecnologias com a criação de novas profissões especializadas. Nessa linha de pensamento, para muitos historiadores, essa época foi marcada por uma dicotomia de valores, pois mesmo havendo inovações laborais, o desemprego chegou a um nível alarmante.
Outrossim, especificamente no Brasil, o Direito do trabalho se iniciou tardiamente com a abolição da escravatura em 1.888 e, posteriormente, com a imigração europeia de trabalhadores. Nesse período, leis lusitanas conduziam os governantes e havia lacunas no tocante aos direitos civis de uma maneira geral. Após 42 anos, surge a figura então presidente Getúlio Vargas, “o pai dos pobres”, que priorizou a criação normativa trabalhista por meio de leis e decretos. Ademais, com toda a popularidade em alta, o governo getulista criou a Consolidação das Leis do Trabalho em 1943 (CLT), com o intuito de unificar todas as leis criadas. Destarte, pode- se citar a criação da Carteira de Trabalho como um marco de inclusão laborativa de grande notoriedade atemporal.
Finalmente, em 1988, foi promulgada a Constituição cidadã com enfoque em direitos fundamentais individuais e coletivos – fato que foi um símbolo sui generis de dignidade da pessoa humana. Entretanto, diante da necessidade de flexibilização do Direito trabalhista e da aplicação da autonomia das relações, entrou em vigor a Reforma Trabalhista em 2017, revogando pelo menos cem dispositivos da CLT. Segundo o doutrinador Pedro Teixeira, a reforma foi um retrocesso de 150 anos para os trabalhadores, pois expandiu em demasia a autonomia relacional, mascarando a hipossuficiência laboral dos proletariados. Nessa linha, faz-se necessário descrever algumas inovações desta reforma como teletrabalho, trabalho intermitente, distrato, regime parcial de trabalho, entre outros. Diante do exposto, desde os primórdios da humanidade até os dias atuais, percebe-se que as mudanças sociais, culturais e econômicas de cada sociedade denotam um papel fundamental na proteção laboral de seu povo. Independente da diversidade das opiniões dos atuantes do Direito, as condições trabalhistas avançaram em prol da coletividade pactuando com o mínimo existencial constitucional.
Joseane de Menezes Condé
Discente de Direito Unimep Piracicaba, cursa aula de redação há 2 anos e é formada em Medicina Veterinária pela Universidade Federal de Minas Gerais. Escreve para o Jornal Gazeta Piracicaba .
Migalhas: https://www.migalhas.com.br/depeso/363203/as-diferentes-nuances-do-direito-intertemporal-do-trabalho