O trabalho nas ruas tem previsão normativa de insalubridade em grau máximo.
A Sexta Turma do Tribunal Superior do Trabalho condenou a SS Empreendimentos e Serviços, de Natal (RN), a pagar a diferença entre o adicional de insalubridade em grau médio e máximo a um agente de limpeza ambiental. O entendimento do TST é de que o serviço de varrição e recolhimento de lixo nas vias públicas, realizado pelos garis, se enquadra como atividade insalubre em grau máximo.
Legislação em vigor
Na ação, o empregado contou que fora contratado pela SS em outubro de 2016, para trabalhar em Natal, e dispensado em junho de 2017. Ele afirmou que, durante todo o contrato de trabalho, havia recebido o adicional de insalubridade em grau médio (20%). Como realizava atividades de varrição e coleta de lixo em vias públicas, cemitérios e terrenos baldios, em contato com fezes de animais, restos de alimentos e animais mortos, requereu o recebimento da parcela em grau máximo (40%), nos termos do Anexo 14 da Norma Regulamentadora (NR) 15 do Ministério do Trabalho e Previdência.
Divergência entre laudos técnicos
O Tribunal Regional do Trabalho da 21ª Região (RN) reformou a decisão do juiz da 12ª Vara do Trabalho da capital para afastar a condenação da empresa ao pagamento das diferenças entre os graus máximo e médio. O TRT analisou três laudos periciais distintos, elaborados para outras ações semelhantes e aproveitados no processo.
Na avaliação do TRT, os dois laudos que concluíram que o gari não teria direito ao adicional em grau máximo eram mais condizentes com a realidade do caso examinado. Pelo que ficou constatado, esses trabalhadores desempenhavam suas atribuições a céu aberto em vias públicas, praças e cemitérios, e o tipo de lixo recolhido era, de modo geral, plantas, mato, folhas secas, galhos secos e, raramente, animais mortos.
Lixo urbano
A relatora do recurso de revista do gari, ministra Kátia Arruda, explicou que a jurisprudência do TST se firmou no sentido de que a varrição e o recolhimento de lixo nas vias públicas se enquadra como atividade insalubre em grau máximo e tem previsão normativa (Anexo 14 da NR-15). Ainda de acordo com os julgados destacados pela ministra, não cabe distinção entre o lixo urbano recolhido pelos garis na atividade de varredor de ruas e o coletado pelos empregados que trabalham no caminhão de lixo.
Autarquia emitiu nota para informar que possui planos de contingência para assegurar serviços essenciais à população, como o serviço de pagamento instantâneo
MP
Michelle Portela
O Banco Central (BC) emitiu nota, nesta terça-feira (29/3), para informar que possui planos de contingência para assegurar serviços essenciais à população, como o Pix. Ao mesmo tempo, servidores em greve do BC lembraram que o meio de pagamento eletrônico instantâneo e outros serviços não constam na legislação sobre serviços essenciais.
“(A autarquia) Tem planos de contingência para manter o funcionamento dos sistemas críticos para a população, os mercados e as operações das instituições reguladas, tais como STR, Pix, Selic, entre outros”, diz o Banco Central.
No entanto, o Sindicato Nacional dos Funcionários do Banco Central (Sinal) enviou nota à imprensa contrariando essa informação.
“Na greve, a lei de serviços essenciais será respeitada. Mas o Pix e diversas outras atividades do BC não estão nessa lei. Portanto, muitos atrasos ou interrupções poderão ocorrer. Não podemos ainda antecipar quais”, diz o texto.
Além do Pix, outros serviços poderão ser afetados, como o Sistema de Valores a Receber (SVR).
Servidores
O Sinal também diz que a entrega de comissões começou ainda na segunda-feira (28). “Trezentos comissionados já entregaram suas comissões e esperamos chegar, amanhã (30), a 500 entregas”, explicou. O BC totaliza mil comissões, sendo 50% gerenciais e 50% de assessoramento.
A greve foi aprovada na última segunda-feira com aprovação de 90% da assembleia virtual, que contou com a participação de mais de 1,3 mil servidores.
Tesouro
Os servidores do Tesouro Nacional decidiram, em assembleia realizada hoje, paralisar as atividades na próxima sexta (1º) e na terça-feira da semana que vem, no dia 5 de abril, quando os servidores farão nova assembleia para discutir os passos seguintes da mobilização.
A previsão é de que a mobilização impacte a entrega do Relatório do Tesouro Nacional, que apresenta o deficit primário e o perfil dos gastos e receitas públicas.
Dados são do Caged e foram divulgados nesta terça (29). Ao todo, país registrou 2,01 milhões de contratações e 1,68 milhão de demissões no mês passado.
Por Alexandro Martello, g1 – Brasília
O Ministério do Trabalho informou nesta terça-feira (29) que o Brasil gerou 328,5 mil empregos com carteira assinada em fevereiro deste ano.
Os dados são do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) e representam queda na comparação com fevereiro de 2021, quando foram criados 397,5 mil empregos formais.
De acordo com o secretário-executivo do Ministério do Trabalho e Previdência, Bruno Dalcolmo, é natural que se espere alguma desaceleração na abertura no saldo de empregos frente ao ano passado.
“As empresas não continuarão contratando naquele ritmo para sempre, mas é um número expressivo que merece comemoração [o resultado de fevereiro]”, declarou.
Ao todo, no mês passado, o país registrou:
2.013.143 contratações;
1.684.636 demissões.
O resultado representa a maior geração mensal de empregos formais desde agosto de 2021, quando as contratações superaram as demissões em 383 mil vagas.
Em janeiro deste ano, a abertura de vagas formais já havia registrado desaceleração.
A comparação dos números com anos anteriores a 2020, segundo analistas, não é mais adequada porque o governo mudou a metodologia no início do ano passado.
O Ministério do Trabalho e Previdência estimou que serão criadas até 2 milhões de vagas com carteira assinada em todo ano de 2022.
Primeiro bimestre
Ainda de acordo com o Ministério do Trabalho, foram criadas 478,9 mil de vagas no acumulado do primeiro bimestre deste ano.
No mesmo período ano passado, havia sido abertos 651,8 mil empregos com carteira assinada. Com isso, a geração de empregos na economia desacelerou nos dois primeiros meses de 2022.
Ao final de fevereiro de 2022, o Brasil tinha saldo de 41,2 milhões de empregos com carteira assinada.
Isso representa aumento na comparação com janeiro deste ano (40,9 milhões de empregos) e, também, com fevereiro de 2021, quando o saldo estava em 38,6 milhões.
Setores
Os números do Caged de fevereiro de 2022 mostram que foram criados empregos formais nos cinco setores da economia.
Regiões do país
Os dados também revelam que foram abertas vagas em todas as regiões do país no mês passado
Salário médio de admissão
O governo também informou que o salário médio de admissão foi de R$ 1.878,66 em fevereiro deste ano, o que representa queda real, com os valores sendo corrigidos pelo INPC, de R$ 61,14 em relação a janeiro (R$ 1.939,80).
Na comparação com fevereiro do ano passado, também recuou, pois o salário de admissão estava em R$ 1.926,36 naquele mês.
Caged x Pnad
Os dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados consideram os trabalhadores com carteira assinada, isto é, não inclui os informais.
Com isso, os resultados não são comparáveis com os números do desemprego, divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), coletados por meio da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Continua (Pnad).
Os números do Caged são coletados das empresas e abarcam o setor privado com carteira assinada, enquanto que os dados da Pnad são obtidos por meio de pesquisa domiciliar e abrangem também o setor informal da economia.
Segundo o IBGE, a taxa de desemprego no Brasil ficou em 11,2% no trimestre encerrado em janeiro, com a falta de trabalho ainda atinge 12 milhões de brasileiros. O número de ocupados no país atingiu 95,4 milhões de pessoas, uma alta de 1,6% (1,5 milhão de pessoas) ante o trimestre anterior. Foi a primeira vez que a gente consegue ultrapassar o total de ocupados do período pré-pandemia.
Frente à disparada dos preços e à explosão do desemprego, é preciso oferecer novos horizontes políticos. Inspiração pode vir do movimento contra a carestia que, em plena ditadura, mobilizou ruas e entidades. Mas Lula ainda opta por “jogar parado”
As páginas de economia dos jornalões e as telinhas dos grandes meios de comunicação não conseguem mais deixar de mencionar a escalada de preços que vem ocorrendo em nossa sociedade ao longo dos últimos meses. Ao que tudo indica, até mesmo o quarto ano consecutivo da presença do todo-poderoso super-ministro Paulo Guedes no comando da economia vai se revelar um desastre completo. Aquele que era saudado por grande parte das elites tupiniquins e dos operadores do mundo do financismo como o redentor de todos os nossos pecados, na verdade vai entrar para a história como o destruidor do Estado e o desmontador das políticas públicas. Mas também vai ficar reconhecido por sua mais completa incompetência para solucionar problemas macroeconômicos básicos em conjuntura adversa. A se confirmarem a expectativas do próprio sistema financeiro para o ano em curso, o quadriênio 2019/22 deverá registrar um crescimento nulo das atividades econômicas medidas pelo PIB.
A persistência da equipe do aprendiz de banqueiro em menosprezar o fenômeno da retomada da inflação como um assunto sério e com graves consequências em termos sociais e políticos começa a incomodar aquele que é candidato à sua própria reeleição ao Palácio do Planalto. Os responsáveis pelo Ministério da Economia e pelo Banco Central insistem em considerar o aumento do IPCA como mera consequência de um aumento desproporcional da demanda sobre a oferta. Assim, a única solução que conseguem enxergar em sua miopia econômica é o esfarrapado recurso ao aumento da taxa oficial de juros. E foi exatamente o que fizeram. Ao longo dos últimos 12 meses, a SELIC saiu do patamar de 2% ao ano para chegar aos atuais 11,75%. Mas ao contrário do prometido pelo povo do financismo, a inflação não arrefeceu. Muito pelo contrário, os preços continuaram a subir.
Essa insistência da realidade em negar os modelitos de planilha dos neoliberais de carteirinha terminou por provocar – ora, vejam só! – uma reação inusitada do Presidente do Banco Central. Para Roberto Campos Neto, a grande dúvida permanece sendo a busca de uma explicação razoável para a ausência de crescimento de nosso PIB, mesmo depois de eles terem implementado a agenda das reformas. É provável que daqui a pouco ele também venha a público para colocar a dúvida sobre as razões para tal persistência da inflação, apesar da explosão da taxa de juros. É a tal da teimosia do fenômeno real, que insiste em incomodar as certezas das simplórias explicações de gabinete da tecnocracia.
Inflação prejudica os mais pobres
Ocorre que a conjuntura dos últimos anos tem promovido a cruel combinação de um aumento generalizado nos preços com a permanência de desemprego em níveis bastante elevados. Acrescente-se a esse quadro a redução significativa na renda das famílias, em especial aquelas situadas na base de nossa pirâmide da desigualdade. Essa radicalização da crise social encontra sua expressão mais trágica no aumento da violência urbana e da marginalidade, com a ampliação do número de famílias em condições de fome e de miséria. De acordo com cálculos do DIEESE, o salário mínimo reajustado para 2022 não consegue comprar nem mesmo 2 cestas básicas em grande parte das capitais do país.
As gerações mais novas talvez não estejam muito habituadas ao termo “carestia”. De acordo com o dicionário Houaiss, as alternativas de definição seriam:
(…) “carestia: 1. escassez de víveres ou de determinado produto; 2 p.ext. encarecimento do custo de vida” (…)
Infelizmente, essa combinação de escassez de acesso aos produtos, o aumento de seus preços e a redução da renda disponível das famílias é fenômeno social recorrente em nossa sociedade. Há quase 50 anos atrás, durante a ditadura militar, o Brasil conheceu o fortalecimento de um amplo movimento para denunciar e enfrentar esse aprofundamento do quadro de crise social. Durante a década de 1970 foi organizado o “Movimento Contra a Carestia” (MCC), que aglutinou diferentes setores e entidades por todo o território. Com forte presença nos movimentos populares nas periferias das grandes metrópoles, o MCC também era conhecido por Movimento do Custo de Vida (MCV) e contribuiu para formação de importantes lideranças e chegou a encaminhar ao governo do general Geisel e ao Congresso Nacional um abaixo-assinado com mais de 1 milhão de assinaturas, um recorde à época. A proposta era de congelamento dos preços de alimentos e itens de maior necessidade, além da reivindicação de mais creches e escolas.
Em vez jogar parado, Lula deve ampliar a mobilização popular
Ora, a aproximação da data das eleições faz com que as dificuldades enfrentadas por Bolsonaro nas esferas política, econômica e social se reflitam também na liderança de Lula na preferência da população quando indagada a respeito de suas intenções de voto. A dificuldade do governo em retomar o ritmo de crescimento da economia, a existência de um nível preocupante de desempregados, a memória recente das mais de 600 mil mortes pela covid-19, os sucessivos escândalos públicos de corrupção na antessala do presidente e o nível estratosférico dos preços de alimentos e derivados de petróleo são fatos mais do que evidentes. No então, o que mais surpreende os analistas é que eles não estejam encontrando a contrapartida adequada em termos das denúncias da oposição e do quartel-general da campanha de Lula.
A estratégia de priorizar os contatos e articulações “por cima” para assegurar a vitória na disputa de outubro acaba por deixar relegada a um segundo plano a tarefa política fundamental e emergencial de organizar os setores mais afetados pelo aprofundamento da crise econômica e social. A opção do ex-presidente por “jogar parado” implica uma aposta arriscada e equivocada de que a eleição já estaria definida “a priori” e de que tudo deve ser feito para evitar qualquer tipo de acirramento da conjuntura. Ocorre que a distância de pouco mais de seis meses que nos separa do primeiro turno se assemelha a uma eternidade na atual dinâmica política em que estamos mergulhados. A oposição não pode menosprezar a capacidade de Bolsonaro promover mudanças no estado de ânimo da população, como já ocorreu quando promoveu a ampliação do auxílio emergencial à época mais aguda da crise sanitária.
O anúncio de que pretende demitir o presidente da Petrobrás indicado por ele há pouco mais de um ano, general Luna e Silva, se encaixa bem na estratégia de Bolsonaro de buscar retirar a sua própria responsabilidade na elevação dos preços dos derivados. Tudo seria culpa dos governadores pelo ICMS e desse “pessoal” da empresa de economia mista, como se ele não fosse o Chefe do Executivo, que detém a maioria dos votos na assembleia de acionistas da companhia. Na verdade, ele manteve e aprofundou a criminosa política de preços da Petrobrás (PPI), uma criação “genial” de Pedro Parente e Henrique Meirelles, logo depois do golpe que depôs Dilma Rousseff e instalou Michel Temer no Palácio do Planalto. Desde aquele momento, em 2016, os preços internos de gasolina, diesel e gás de cozinha passaram a ser reajustados de acordo com a variação dos preços do barril de petróleo no mercado internacional. Uma loucura!
O exemplo do Movimento Contra a Carestia
Mais de cinco anos depois da vigência de tal excrescência e sentindo o peso da impopularidade na reta final, Bolsonaro resolve agir. A ver como vai tentar solucionar a crise e qual a narrativa que vai adotar para convencer a população de que está indo contra os poderosos, que mais uma vez tentam impedi-lo de governar.
De qualquer maneira, ainda está em tempo para ampliar a mobilização popular por todo o Brasil, criando comitês de campanha nos municípios, nos bairros e nos locais de trabalho. É fundamental oferecer concretude a esse sentimento geral e difuso do anti-bolsonarismo. Não basta oferecer apenas a promessa de uma redenção por meio da pré-candidatura de Lula e pedir para o povo esperar até outubro e depois até janeiro para a posse, em caso de vitória. É necessário aproveitar o desejo de mudança e apresentar as propostas para solucionar questões essenciais para o dia a dia da maioria da população.
Caso contrário, esse receio injustificável de colocar o povo em movimento, pode oferecer o caminho para Bolsonaro seguir mantendo de forma proativa a inciativa política e apresentar propostas de solução (ainda que parcial) da questão da inflação como se fossem ideias exclusivamente suas. Se ele demitir o general da Petrobrás e mudar a política de preços dos derivados, por exemplo, como fará a oposição para denunciar tão tardiamente a manobra há muito anunciada e oferecer suas ideias para questão?
A história e o sucesso do Movimento Contra a Carestia deveriam servir de exemplo e de inspiração para as lideranças da oposição. Já é passada a hora de contribuir para dar vez e voz à mobilização popular contra a situação dramática das condições de vida da maioria de nosso povo. Essa é a verdadeira forma de promover a necessária combinação entre a ampliação da luta política, o debate de alternativas ao modelo atual e o oferecimento da alternativa eleitoral.
Blog Outras Palavras https://outraspalavras.net/crise-brasileira/inflacao-pobreza-e-eleicoes/
Avanço do presidente nas pesquisas é limitado, mas real e perigoso. Para enfrentá-lo, não basta formar frentes políticas. É preciso apresentar um programa de mudanças concretas e factíveis – que evidencie, por contraste, a destruição provocada pelo bolsonarismo
Desta vez, Guilherme Boulos foi cirúrgico. Na sexta-feira (18/2), ele advertiu, numa sequência de postagens no twtter, para o perigo de considerar as eleições de outubro liquidadas e de desprezar as chances de recuperação de Bolsonaro. Dois elementos, argumentou, levam a esta atitude perigosa. O primeiro é desconsiderar o efeito eleitoral das políticas de emergência do Palácio do Planalto – entre elas, o “auxílio Brasil” de até R$ 400, pago até o fim do ano a 18 milhões de famílias. O segundo é acreditar que uma grande frente de partidos bastará para afastar o fantasma da ultradireita. O líder do MTST parece incomodado, em especial, com o risco de a esquerda a mergulhar na discussão aveludada sobre “coligações, federações e palanques” e se esquecer das maiorias, cuja vida é cada vez mais árida.
Boulos captou os movimentos detectados pelas sondagens eleitorais de fevereiro. Numa delas, do PoderData, divulgada em 16/2, a diferença entre Lula e Bolsonaro caiu, em 30 dias, de 14 para 9 pontos percentuais. Como a distância anterior entre os dois candidatos era folgada, o movimento atual ainda tem impactos limitados. Segundo a mesma sondagem, no segundo turno Lula continua com folga de 15 pontos tanto sobre Bolsonaro quanto sobre Sérgio Moro. Mas há um mês, a frente era de 22 pontos.
Para conter o movimento atual é preciso conhecer suas razões. A grande dianteira alcançada por Lula, no segundo semestre de 2021, foi obtida graças principalmente ao eleitorado mais empobrecido – os eleitores do Nordeste e das periferias, por exemplo. Deve-se à percepção de que os grandes dramas do país – as mortes desnecessárias por covid, o desemprego, o empobrecimento, a inflação – estão relacionados à ausência de políticas e ao descaso do governo. No período mais recente, por exemplo, um dos fatos que mais abalou a popularidade de Bolsonaro foi o desprezo diante das tragédias provocadas pelas inundações na Bahia.
Mas este eleitorado é, além de muito numeroso, heterogêneo e, por isso mesmo, volátil. Parte dele sofre a influência das religiões conservadoras. E está sujeito a condições de vida tão precárias que qualquer pequena melhora é sentida. Bolsonaro sabe que tem, neste ponto, uma brecha. Está ciente, também, de que pode contrariar, neste momento, o grande poder econômico, que constitui a base essencial de sua sustentação. Caso vença, a recomposição se fará em seguida. Teve fôlego para contrariar Paulo Guedes em relação ao valor do “auxílio Brasil”. Poderá ter, também, para outras medidas parciais e temporárias, porém de repercussão imedidata (pense, por exemplo, em redução dos preços de combustíveis, do gás de cozinha ou de outros itens da cesta básica).
Para afastar esta ameaça, o caminho mais certeiro é fugir da armadilha da mediocridade. Exige recompor um horizonte político de transformações reais. É perfeitamente possível demonstrar, às maiorias, que a reconstrução do país, em novas bases, não poderá ser feita por meio de medidas precárias e limitadas, como o auxílio-Brasil e um vale-gás. Para isso, é preciso colocar na agenda nacional temas que acendam a esperança numa vida de fato melhor e que exponham, por contraste, a miséria do projeto que o bolsonarismo expressa. Entre muitos outros, a garantia, pelo Estado, de empregos dignos para quem deseje trabalhar. O fortalecimento e expansão do SUS e da escola pública. O alívio ao endividamento das famílias. O investimento pesado em Educação, Cultura e Ciência, para dar alento a uma legião de profissionais bem formados e subaproveitados. A redução das contas de eletricidade, com conversão ecológica da matriz energética. Um programa de habitação e urbanização que vá muito além do “Minha Casa, Minha Vida”. A redução imediata dos preços dos alimentos, por meio de medidas emergenciais (como a retirada dos impostos sobre a cesta básica), seguidas de uma reforma agrária com viés agroecológico. O amparo e a recuperação das pequenas e médias empresas. Etc etc etc.
Um programa assim não estava no horizonte dos primeiros governos de esquerda. Pesava sobre eles a necessidade de cumprir a “disciplina fiscal” imposta pelo Consenso de Washington. O cenário transformou-se totalmente, após a pandemia. O próprio bolsonarismo adaptou-se à mudança. Muito parcialmente (porque não pode contrariar sua base principal), mas a ponto de ousar as medidas por meio das quais tenta, agora, recuperar seu eleitorado.
A reconstrução do Brasil em novas bases é uma possibilidade real, que precisa ser enunciada. Ela exige, como frisa Boulos, mudar o foco da campanha – tirando-a das tratativas de acordos alimentadas pelo “já ganhou” e devolvendo-a à “batalha pelos becos e vielas”. Vale notar que esta flexão não requer romper com o esforço de articular, contra a ultradireita, uma frente muito ampla. Num novo projeto de país há espaço para um leque vasto de sujeitos sociais – das periferias aos empresários não conformados com a submissão ao capitalismo financeiro. É assunto para um comentário futuro.
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