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JUSTIÇA SOCIAL

Juiz autoriza levantamento do FGTS para pai pagar tratamento do filho

Juiz autoriza levantamento do FGTS para pai pagar tratamento do filho

Diagnosticado com autismo, a criança necessita de tratamento multidisciplinar especializado.

Pai consegue levantamento integral de valores vinculados ao FGTS para pagar tratamento ao filho autista. Assim decidiu o juiz de Direito Paulo Alberto Sarno, da 5ª vara Cível de SP, ao ressaltar que o rol de patologias previsto na legislação é meramente exemplificativo.

 

O homem ajuizou ação objetivando o levantamento de valores depositados na sua conta vinculada ao FGTS alegando que seu filho apresenta diagnóstico de transtorno do espectro do autismo, necessitando de tratamento multidisciplinar, razão pela qual o levantamento dos valores é essencial para arcar com o elevado custo.

O magistrado ressaltou que, de acordo com o disposto no artigo 20 da lei 8.036/90, a conta vinculada do FGTS pode ser movimentada pelo trabalhador nos casos de doenças graves que especifica ou em situação de estágio terminal decorrente da patologia.

Segundo o julgador, o rol de patologias previsto na legislação de regência é meramente exemplificativo, sendo possível a movimentação da conta fundiária ainda que a doença grave que acomete o trabalhador ou seu dependente não esteja expressamente prevista no comando normativo.

“Em outro plano, é muito importante ressaltar que não há controvérsia nos autos sobre o fato de que o filho do impetrante, dada a gravidade de seu quadro clínico, necessita de cuidado específico e duradouro a ser prestado por equipe multidisciplinar, o que encerra elevadíssimo custo, de modo que a liberação do saldo da conta fundiária é indispensável para a concretização do tratamento.”

Diante disso, julgou procedente o pedido e determinou o levantamento integral do saldo da conta vinculada do FGTS do genitor.

A 1ª turma do TRF da 3ª região negou provimento a recurso, considerando que o homem faz jus à concessão.

O escritório Monteiro Lucena Advogados atua no caso.

  • Processo: 5012619-84.2020.4.03.6100

Veja a sentença.

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Monteiro Lucena Advogados

 

Por: Redação do Migalhas

Juiz autoriza levantamento do FGTS para pai pagar tratamento do filho

Trabalhadora demitida no período de estabilidade acidentária será indenizada

EXPLOSÃO EM NAVIO

Por Rafa Santos

A legislação pátria cuidou de prever especial proteção ao empregado que sofre acidente de trabalho, criando a figura da “estabilidade acidentária” — período de, no mínimo, doze meses, no qual o empregado acidentado tem seu emprego garantido, não podendo ser dispensado sem justa causa.

Trabalhadora sofreu acidente e foi demitida durante período de estabilidade acidentária

Com base nesse entendimento, o juízo da 3ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 17ª Região deu provimento a recurso de uma trabalhadora de 30 anos que foi vítima de explosão ocorrida em fevereiro de 2015 no Navio Plataforma Cidade de São Mateus (ES), que resultou na morte de vários trabalhadores.

Segundo os autos, após o acidente a trabalhadora passou a sofrer de síndrome do transtorno pós-traumático e foi submetida a tratamento psiquiátrico e psicológico. Após ter alta do INSS em maio de 2016, ela foi dispensada e teve o custeio do tratamento médico interrompido.

Ao analisar o caso, os desembargadores apontaram que ficou comprovado que a dispensa da trabalhadora ocorreu no período de estabilidade acidentária, quando ela ainda estava passando por tratamento médico decorrente de acidente em seu local de trabalho.

“O direito potestativo de denúncia do contrato de trabalho não pode exceder os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes, sob pena de configurar abuso de direito, à luz do artigo 187 do Código Civil”, diz trecho da decisão.

Diante disso, os julgadores decidiram condenar as empresas BW e a Petrobras e aumentaram o valor da indenização por dano moral concedida pelo juízo de primeiro grau de R$ 20 mil para R$ 50 mil. A trabalhadora foi representada pelo escritório de advocacia João Tancredo.

0000803-82.2018.5.17.0121

 

Rafa Santos é repórter da revista Consultor Jurídico.

Revista Consultor Jurídico

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O assédio moral no ambiente de trabalho

OPINIÃO

Por 

 

O assédio moral se caracteriza pela exposição de trabalhadores a situações humilhantes e constrangedoras no ambiente de trabalho, no exercício de suas funções, de forma repetitiva e prolongada.

A conduta do assédio pode se dar de forma direta por meio de gestos, palavras, atos ou escritos, por exemplo: gritos, insultos e acusações, ou por meio de atos indiretos, tais como a propagação de boatos, a exclusão ou o isolamento da vítima no ambiente de trabalho etc.

O assediador tem a intenção de desestabilizar emocional e profissionalmente o indivíduo (assediado), podendo ser motivado por inveja, autoritarismo ou por simples intenção e gosto por prejudicar a pessoa no seu trabalho.

A vítima do assédio moral pode sofrer danos à sua dignidade e, até mesmo, à sua integridade física e psíquica, com a degradação do ambiente de trabalho e, muitas vezes, causando o pedido de desligamento do trabalhador de suas funções.

Quem é assediado, portanto, tem violados seus direitos constitucionais, como a honra, a imagem e a dignidade.

O assédio moral pode ocorrer de maneira individual entre pessoas (interpessoal) ou institucional. Nesse último caso, o assédio moral é atribuído ao empregador, pessoa jurídica, na medida em que ele incentiva ou tolera atos de assédio.

Dessa forma, é importante que o empregador tenha muita cautela ao lidar com essas situações, mostrando-se sempre atuante e intolerante com esse tipo de conduta, sob pena de ser caracterizado o assédio moral institucional, como se o empregador/empresa fosse autor do assédio, na medida de sua eventual omissão. Exemplo: quando a empresa promove ou incentiva estratégias abusivas para melhorar a produtividade de vendas.

O assédio moral ocorre entre pessoas de níveis hierárquicos diferentes dentro da empresa, “de cima para baixo” ou “de baixo para cima”. Explico.

O primeiro tipo mais comum é o chamado assédio moral vertical descendente, ou seja, aquele ocorrido entre diretor, gerente, coordenador, etc. contra seus subordinados.

Um exemplo que ilustra esse tipo de assédio foi a reportagem exibida no programa “Fantástico”, da Rede Globo, na qual o gerente reuniu seus subordinados para promover uma espécie de “paredão do Big Brother” com o intuito de desligar colaboradores sob a alegação de que as vendas de pacotes de férias estavam em queda, trazendo muitos prejuízos para a empresa.

Cada funcionário tinha de escolher um colega para ser demitido na frente de todos e ainda justificar sua escolha. O gerente ainda ressaltou que essa seria uma primeira reunião de outras que viriam com a aplicação do mesmo “método”, na verdade, um verdadeiro estímulo abusivo à competição entre membros de uma equipe de trabalho.

Uma das colaboradoras que já havia sofrido outros episódios de assédio teve concretizada sua demissão nesse “paredão”, o que acabou por levar a empresa a uma condenação pela prática de assédio moral institucional, devendo pagar um valor de, aproximadamente, R$ 14 mil, a título de dano moral.

No segundo tipo o assédio é praticado pelo subordinado contra seu superior, visando a causar-lhe constrangimento, motivado por interesses diversos. Exemplo: praticar atos de boicote para tirá-lo do cargo porque sua liderança não agradou à equipe, ou ainda fazer chantagem para ganhar uma promoção etc. Esse é o chamado assédio vertical ascendente, ou seja, “de baixo para cima”.

Por fim, o assédio moral também pode ser praticado entre pessoas que pertencem ao mesmo nível hierárquico (assédio moral horizontal). Normalmente, nesses casos, trata-se de um comportamento instigado pelo clima de competição exagerado entre colegas de trabalho. O assediador promove liderança negativa perante os que fazem intimidação ao colega/vítima; é uma conduta que se aproxima do bullying.

Mas, afinal, o que as empresas podem fazer para evitar a ocorrência do assédio moral no ambiente de trabalho?

Existem algumas medidas que são desafiadoras para as empresas, mas que se prestam a minimizar o risco de ocorrência dessa prática de forma satisfatória e efetiva, se bem implementadas.

Primeiro de tudo: deve existir um comprometimento e um suporte efetivo por parte da alta administração da empresa no sentido de demonstrar, de modo claro e inequívoco, que os líderes da empresa abraçam a cultura do respeito aos trabalhadores e da construção de um ambiente saudável de trabalho.

Assim, é imprescindível que tal apoio não seja simplesmente um discurso ou um mero enunciado de missão e valores que a empresa tem no seu site contra o assédio moral. É demonstrar ações na prática.

Todo plano de ação deve ser impulsionado e legitimado pela administração da empresa ao fomentar palestras e cursos sobre o assunto, treinamento e capacitação de gestores, além de um processo de monitoramento e comunicação sobre eventuais práticas abusivas.

Ou seja, são necessárias ações claras, que endossem uma mudança na cultura da empresa, e de seus gestores em relação às boas práticas de relacionamentos interpessoais para que essas ações sejam visualizadas e incorporadas pelos funcionários da empresa.

Nesse sentido, um regulamento interno é um documento importante a ser criado e divulgado pela empresa, na medida em que tem a função de citar regras internas sobre rotinas trabalhistas no geral, além de reservar cláusulas que tratem do tema conduta e ética nos relacionamentos interpessoais, tratando da questão do assédio moral e citando as sanções que serão aplicadas, nos termos da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), em caso de descumprimento. Entretanto, é preciso ressaltar que a mera elaboração e distribuição desse documento não gerará qualquer efeito.

É fundamental que esse documento não vá parar no fundo de uma gaveta, mas, sim, que seja objeto de palestras e cursos sobre o assunto, com a prestação de informações e esclarecimento de dúvidas, de forma a conscientizar os trabalhadores da importância do tema para a construção de um ambiente de trabalho saudável e produtivo para todos, desencorajando a prática do assédio moral.

Outro ponto a considerar é o treinamento e a capacitação de coordenadores, gerentes, supervisores etc. para administrar conflitos e dificuldades pessoais dos funcionários no exercício de suas funções.

Reuniões de feedback também podem ser bastante úteis para ambas as partes, possibilitando ao funcionário expor suas dificuldades e seus receios no trabalho, e, ao seu superior, a chance de expor sua opinião e expectativas.

Em última análise, é preciso fazer uma “gestão de pessoas”, e não de “recursos humanos”.

Departamento de recursos humanos remete a uma ideia de mera burocracia, sendo um fator técnico e mecânico de contratação de funcionário, de mão de obra.

A gestão de pessoas, por sua vez, busca tratar da valorização do trabalhador como um ser humano complexo e integral, com sentimento, expectativas e problemas, e não apenas um executor de tarefas e cumpridor de normas. Isso pode fazer muita diferença no seu comportamento e na produtividade dentro do ambiente de trabalho.

Dentro das rotinas de trabalho, a busca por uma dinâmica mais flexível e focada no ser humano pode inspirar as pessoas a darem o melhor de si profissional e pessoalmente.

 

 é advogada especializada na área consultiva, com foco em contratos, e consultora jurídica nas áreas empresarial e trabalhista.

Revista Consultor Jurídico

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Senador pede ao STF que Bolsonaro apresente provas de fraude eleitoral

TEM QUE PROVAR

Por Severino Goes

O senador Alessandro Vieira (Cidadania – SE) ingressou no Supremo Tribunal Federal com uma interpelação judicial para que o presidente Jair Bolsonaro apresente provas concretas de que houve fraude nas eleições de 2018, tal como vem alardeando em entrevistas e declarações contra os procedimentos adotados pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

O senador pede que as afirmações sejam comprovadas com provas documentais e apresentação nominal “dos supostos responsáveis pela conduta”.

Este é o segundo pedido apresentado ao STF com a mesma finalidade, desde que o presidente começou sua escalada de críticas às autoridades judiciárias, colocando em dúvida a lisura do processo eleitoral e ofendendo ministros das cortes superiores, principalmente Luís Roberto Barroso, presidente do TSE. Em junho, a Rede Sustentabilidade apresentou representação ao STF.

Para o senador, o presidente coloca em risco a estabilidade democrática do país. “Ajuíza-se a presente medida com a finalidade de instruir possível ação penal em decorrência das manifestações inverídicas e infundadas do sr. Presidente da República, que colocam em risco a estabilidade democrática do país e desqualificam a atuação das autoridades durante as eleições de 2018, inclusive desta colenda Corte Suprema, do Tribunal Superior Eleitoral e tantas outras instituições, de modo a fragilizar o Sistema Eleitoral Brasileiro”, diz na representação encaminhada ao presidente do STF, Luiz Fux.

De acordo com o parlamentar, as declarações de Bolsonaro “possuem temeroso potencial de lesão à lisura das eleições e da própria democracia” , e não podem ser continuadas de maneira a permitir que “levianamente, tal discurso se propague sem que se apure eventual crime de fraude ou se responsabilize aqueles que espalham graves desinformações com propósitos eleitoreiros, colocando em risco o Estado Democrático de Direito”.

Impropérios

O recesso do Judiciário está favorecendo a escalada de impropérios e ofensas que o presidente Jair Bolsonaro vem dirigindo aos tribunais superiores, como o STF e o TSE, além do ministro Luís Roberto Barroso, presidente da corte eleitoral.

Com o recesso, o presidente ficou desobrigado, por enquanto, de prestar contas aos dois tribunais por ter colocado em dúvida a lisura das eleições e responder a um pedido do Corregedor Geral Eleitoral, ministro Luiz Alfredo Salomão, e outro do ministro Gilmar Mendes, que é o relator da representação da Rede Sustentabilidade.

Clique aqui para ler a representação do senador

Severino Goes é correspondente da revista Consultor Jurídico em Brasília.

Revista Consultor Jurídico

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O poder ‘contramajoritário’ do controle de constitucionalidade

OPINIÃO

Por 

 

A democracia, como regime de governo baseada no soberania exercida pelo povo — elegem seus representantes através do voto —, tem como pilares a garantia e o respeito aos direitos fundamentais, como as liberdades de expressão, de religião, de ir e vir, além da participação no ambiente político. Nesse contexto, temos a formação da noção de que a democracia é o governo da maioria, através do princípio majoritário.

Assim, para o efetivo exercício da democracia, há a necessidade de se observar as chamadas condições democráticas, sendo essas explicadas por Ronald Dworkin:

“Democracia significa governo sujeito a condições, as quais poderíamos denominar condições <<democráticas>> de igualdade de posições para todos os cidadãos. Quando as instituições majoritárias fornecem e respeitam as condições democráticas, então, por essa razão, é legítimo que estas instituições sejam aceitas por todos. No entanto, quando não o fazem, ou quando não fornecem ou respeitam suficientemente, então não podem se opor, em nome da democracia, a outros procedimentos que protejam e respeitem melhor essas condições” (Dworkin, 2004, p. 117, traduzido por Souza, 2016, p.4).

Nessa mesma esteira de que a democracia é o governo da maioria, entende-se que ela contém a visão de que os direitos fundamentais são trunfos contra a maioria, na medida em que garante a efetivação e respeito dos direitos da minoria. Assim entende Luigi Ferrajoli:

“Ninguna mayoría política puede disponer de las libertades y de los demás derechos fundamentales: decidir que una persona sea condenada sin pruebas, privada de la libertad personal, de los derechos civiles o políticos o, incluso, dejada morir sin atención o en la indigência” (2009, p. 36) [1].

Daí que a Constituição, ao prever que qualquer ato emanado pelo Legislativo ou pelo Executivo possa sofrer o controle por parte do Judiciário, permitindo que a vontade da maioria — representada pelos representantes eleitos do Executivo e Legislativo — seja submetida ao crivo de um poder que não foi eleito por ela, referenda a ideia de que os direitos fundamentais tem caráter limitador da atuação do Estado, vejamos:

“Percebe-se então que os direitos fundamentais são concebidos como posições jurídicas tão especiais que não podem se encontrar sob o arbítrio da maioria, justamente porque possuem um papel contramajoritário que visa garantir interesses daqueles que, em determinado momento histórico, podem constituir uma minoria” (Marinho e Borges, p.4).

No mesmo sentido, Robert Alexy:

“Uma possível perspectiva ou ideia-guia seria um conceito geral e formal de direitos fundamentais, que pode ser expresso da seguinte forma: direitos fundamentais são posições que são tão importantes que a decisão sobre garanti-las ou não garanti-las não pode ser simplesmente deixada para a maioria parlamentar simples” (2011, p. 446).

Passada essa introdução, e frente à transição política para governos democráticos, aumentou-se a ação das instituições judiciais na gerência da democracia. No Brasil, não foi diferente, o Judiciário, desde os primórdios, tem demonstrado a capacidade de interferência no cenário político, através do controle de constitucionalidade. Assim, ele ganhou, no debate contemporâneo sobre controle judicial de constitucionalidade, a função de “contramajoritário”.

De início, há a necessidade de analisar a expressão sobre o aspecto funcional. Assim, a função contramajoritária “resultaria da ampliação das áreas de atuação dos tribunais pela via do poder de revisão judicial de ações legislativas e executivas, baseado na constitucionalização de direitos e dos mecanismos de checks and balances” (Maciel; Koerner, 2002, p. 114) elencados na Constituição como um meio balizador e autorregulador do próprio Estado. Segundo Barroso e Mendonça (2013, p.2-3), informando sobre a função judiciária, temos que:

“O primeiro papel é apelidado, na teoria constitucional, de contramajoritário: em nome da Constituição, da proteção das regras do jogo democrático e dos direitos fundamentais, cabe a ela a atribuição de declarar a inconstitucionalidade de leis (i.e., de decisões majoritárias tomadas pelo Congresso) e de atos do Poder Executivo (cujo chefe foi eleito pela maioria absoluta dos cidadãos). Vale dizer: agentes públicos não eleitos, como juízes e ministros do STF, podem sobrepor a sua razão à dos tradicionais representantes da política majoritária. Daí o termo contramajoritário.”

Assim temos que a Constituição, ao prescrever a possibilidade de controle pelo Judiciário dos atos emanados pelo Executivo e pelo Legislativo (que foram tomados de forma majoritária, estes eleitos pelo povo e decisões que foram tomadas representando a maioria que os elegeu), permite, numa visão contramajoritária, a limitação da maioria em favor da Constituição, vejamos:

“O controle judicial de constitucionalidade ainda que contramajoritário consiste em elemento essencial de um Estado Democrático de Direito visto que age contra a vontade da maioria ordinária, mas em favor de uma maioria mais forte representada pela Constituição” (Santos e Arteiro, p.14).

Temos que todo o poder emana do povo, sendo este soberano, ditando as diretrizes através da Constituição, sendo esta suprema e soberana. Assim, todos os poderes devem respeito e obediência aos princípios e valores por ela elencados, cabendo ao Judiciário atuar de forma contramajoritária para corrigir eventuais distorções e abusos praticados pelos outros poderes.

Nesse contexto infere-se que o controle de constitucionalidade é um instituto que garante a supremacia constitucional como excelência (Dantas, 2001, p. 9), assegurando os anseios das minorias diante da vontade ou omissão das maiorias.

“Assim, considerando-se tal característica instrumental e de garantia da constitucionalidade que o caracteriza, o controle de constitucionalidade opera como instituição assecuratória das minorias vencidas e da própria democracia, protegendo e corrigindo imperfeições do próprio sistema democrático representativo majoritário” (Sgarbossa et al., 2011, p.145).

A partir da experiência contemporânea do exercício do controle de constitucionalidade no Brasil, é adequado caracterizar o Poder Judiciário brasileiro como “contramajoritário”, na medida em que a própria Constituição atribui a ele a função de assegurar a eficácia dos direitos e garantias fundamentais do indivíduo historicamente consagrados, em um processo de limitação da vontade majoritária, levando-se em conta a vontade da Constituição, seja em casos de ação ou em casos de omissão.

Além de ser “contramajoritário”, o controle de constitucionalidade é democrático, garantindo a participação de todos no processo na medida de suas peculiaridades. Vejamos:

“Portanto pode-se inferir que o controle judicial de constitucionalidade das leis, sem embargo de ser contramajoritário — pois frequentemente realizará sua função obstaculizando a vontade majoritária — não é antidemocrático, senão instrumento garantidor da própria noção de democracia ou corretivo de seu caráter contramajoritário. Tal conclusão evidencia, inclusive, que o fato de ser feito por instituições que não representam a vontade da maioria, em lugar de ser grave defeito de legitimidade, como alguns parecem querer fazer crer, faz com que o instituto esteja mais apto ainda a desempenhar suas funções, ainda que contra a vontade majoritária ou fictamente reputada como tal, em função da representação” (Sgarbossa et al., 2011, p.147).

Assim, coerente também é a conclusão de que é devida a caracterização do Judiciário como “contramajoritário” na medida em que, no exercício do controle de constitucionalidade, os seus componentes gozam do benefício da vitaliciedade, reduzindo assim a possibilidade de pressão política (evitando distorções em um ambiente de comoção social), podendo efetivar a proteção das minorias.

“Ademais, partindo-se da premissa de que o controle de constitucionalidade das leis pode operar como um instrumento protetor das minorias políticas, como visto, seria uma vez mais absurdo deixar esta proteção sob a incumbência de órgãos eleitos por um processo deliberativo majoritário, os quais parecem melhor vocacionados à representação política das maiorias do que à proteção das minorias. Paralelamente, justamente em razão de serem eleitos, é natural que estes órgãos estejam muito mais sujeitos a pressões da opinião pública, e, assim, sejam mais suscetíveis a concretizar os clamores populares feitos em momentos de comoção pública, ainda que em clara contrariedade ao texto constitucional” (Sgarbossa et al., 2011, p.149).

Nisso, “esse contexto de uma presença mais efetiva do direito cria, como consequência lógica, um processo de Judicialização de demandas sociais, preocupadas com a concretização do amplo elenco de Direitos Fundamentais” (Vieira, 2009, P.45).

Barroso argumenta que a Carta Política de 1988 trouxe inúmeras matérias que antes eram tratadas pelo “processo político majoritário e para a legislação ordinária” (2012, p.24). Assim, matérias que antes ficavam restritas ao Legislativo e ao Executivo podem ser judicializadas e levadas ao conhecimento do Poder Judiciário, “na medida em que uma questão — seja um direito individual, uma prestação estatal ou um fim público — é disciplinada em uma norma constitucional, ela se transforma, potencialmente, em uma pretensão jurídica” (2012, p.24).

A opção do controle de constitucionalidade permite a judicialização da vida, que foi uma opção que lentamente foi sendo formada, pois “limitou-se ela a cumprir, de modo estrito, o seu papel constitucional, em conformidade com o desenho institucional vigente” (Barroso, 2012, p. 25), diante de ações ou omissões da vontade majoritária.

Referências bibliográficas
ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. São Paulo: Malheiros, 2011.

BARROSO, Luís Roberto. Judicialização, ativismo judicial e legitimidade democrática. (Syn) thesis, v. 5, n. 1, p. 23-32, 2012.

BARROSO, Luís Roberto; MENDONÇA, Eduardo. STF entre seus papéis contramajoritário e representativo. Revista Consultor Jurídico. 3 jan. 2013. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2013-jan-03/retrospectiva-2012-stf-entre-papeis-contramajoritario-representativo>. Acesso em 11 set. 2016.

DANTAS, Ivo. O valor da Constituição: do controle de constitucionalidade como garantia da supralegalidade constitucional. 2. ed., rev. e aumen. Rio de Janeiro: Renovar, 2001.

DWORKIN, Ronald. La construcción de La nación, el constitucionalismo y la democracia. In: KOH, Harol Hongju; Slye, Ronald C. Democracia deliberativa y derechos humanos. 1. ed. Barcelona: Gedisa, 2004.

FERRAJOLI, Luigi. Derechos Fundamentales. In: L. FERRAJOLI, Los fundamentos de los derechos fundamentales (pp. 19-56). Madri: Trotta, 2009.

MARINHO, Sérgio Augusto Lima; BORGES, Alexandre Walmott. O Papel contramajoritário dos Direitos Fundamentais e o dever do Poder Judiciário Brasileiro perante omissões legislativas. Disponível em: <http://www.publicadireito.com.br/artigos/?cod=8ee30f15c1c633d3>, Acesso em 11 set. 2016.

MACIEL, Débora Alves; KOERNER, A. Sentidos da Judicialização da Política: Duas análises. Lua Nova, n.º 57, 2002.

SANTOS, Bruna Izídio de Castro; ARTEIRO, Rodrigo Lemos. O princípio contramajoritário como mecanismo regulamentador da soberania. Disponível em: < http://eventos.uenp.edu.br/sid/publicacao/artigos/8.pdf>. Acesso em 11 set. 2016.

SGARBOSSA, Luís Fernando et al. Uma crítica à objeção contramajoritária ao controle judicial de constitucionalidade. X Simpósio Nacional de Direito Constitucional — ABDConst. Curitiba, 24-26 maio 2012. Disponível em: <http://abdconst.com.br/anais2/ObjecaoLuis.pdf>. Acesso em: 11 set. 2016.

SOUZA, Clarissa Abrantes. O papel contramajoritário do Supremo Tribunal Federal e a efetivação dos direitos fundamentais. Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 07 abr. 2016. Disponivel em: <http://www.conteudojuridico.com.br/?artigos&ver=2.55583&seo=1>. Acesso em: 11 set. 2016.

VIEIRA, José Ribas. Verso e Reverso: a judicialização da política e o ativismo judicial no Brasil. Revista Estação Científica. Juiz de Fora, V.01, no. 04, outubro/novembro de 2009. Disponível em: <http://portal.estacio.br/media/2654368/artigo%203%20revisado.pdf>. Acesso em: 15 set. 2016.


[1] “Nenhuma maioria política pode dispor das liberdades e dos demais direitos fundamentais: decidir que uma pessoa seja condenada sem provas, privada de sua liberdade pessoal, dos direitos civis ou políticos, nem deixar alguém morrer sem atenção ou em indigência” (tradução MARINHO e BORGES, p.4).

Fernando Lacerda Rocha é pós-graduado em Direito Tributário com ênfase em Magistério Superior pela Universidade Anhanguera Uniderp (MS), advogado associado ao escritório José Lindomar Coelho e Advogados Associados, membro da Comissão de Direitos Humanos da 27ª Subseção da OAB/MG e professor de Direito na Faculdade de Ciências e Tecnologia de Unaí (Factu).

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