Natalia de Andrade Dias Pereira
O INSS pode pagar auxílio-acidente mesmo quando o acidente acontece fora do trabalho. Descubra como funciona esse benefício ainda pouco conhecido.
“O acidente não foi no trabalho, então o INSS não paga, né?”
Essa é uma frase que escuto com frequência – e que revela um dos maiores mitos sobre o auxílio-acidente, um dos benefícios mais negligenciados e mal compreendidos da previdência social.
Muita gente acha que só tem direito ao benefício se sofrer um acidente no trabalho. Mas não é bem assim. Basta ter uma sequela permanente que atrapalhe seu trabalho – e estar com a carteira assinada no momento do acidente.
O que é o auxílio-acidente?
O auxílio-acidente é um benefício indenizatório pago pelo INSS, com o objetivo de compensar o trabalhador que sofreu uma lesão com sequela definitiva e que passou a ter dificuldade de exercer sua função como antes.
Não se trata de aposentadoria. Também não exige afastamento permanente. O trabalhador pode continuar exercendo sua atividade profissional – e ainda assim receber o benefício.
A confusão surge porque muita gente acredita que só há direito ao auxílio-acidente quando há uma ligação direta com o ambiente de trabalho. Mas isso não é verdade.
O acidente foi fora do trabalho. Ainda assim, tenho direito?
Sim. Acidentes domésticos, de trânsito, esportivos ou ocorridos em momentos de lazer podem gerar o direito ao auxílio-acidente, desde que cumpridos os requisitos legais:
Qualidade de segurado – ou seja, estar contribuindo para o INSS, estar dentro do período de graça ou estar trabalhando com carteira assinada;
Ocorrência de acidente ou doença com sequela permanente;
Redução da capacidade laboral habitual, ainda que parcial.
Ou seja, se um pedreiro sofre uma queda de bicicleta no fim de semana, fratura o braço e, mesmo depois de se recuperar, passa a ter limitações de movimento – ele pode ter direito ao benefício, mesmo que o acidente não tenha nada a ver com a empresa onde trabalha.
O que diz a Justiça sobre isso?
A boa notícia é que os tribunais já reconhecem essa possibilidade com clareza. Diversas decisões recentes têm confirmado que o auxílio-acidente não exige nexo com o trabalho, bastando que o trabalhador esteja coberto pelo INSS no momento do acidente e comprove a sequela funcional.
O Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por exemplo, já decidiu que:
“É possível a concessão do auxílio-acidente mesmo que o evento danoso não tenha sido decorrente de acidente de trabalho, desde que comprovada a sequela permanente e a redução da capacidade laboral.”
(TRF4 – Apelação Cível 5012765-87.2022.4.04.7100)
Esse entendimento reforça a ideia de que o foco está na proteção do trabalhador segurado, não no local onde o acidente ocorreu.
Por que tantos pedidos são negados?
A redução da capacidade nem sempre é fácil de comprovar. As perícias, muitas vezes apressadas, focam apenas em aspectos clínicos ou “visíveis”. Dores crônicas, perda de força, limitação de movimento ou necessidade de readaptação são desconsideradas com frequência.
Mas é importante destacar: o auxílio-acidente não exige incapacidade total, nem afastamento definitivo.
Basta que o trabalhador não consiga mais desempenhar sua função como antes.
O que fazer?
Quem passou por um acidente e ficou com alguma sequela que dificulta o trabalho deve buscar orientação especializada. Laudos médicos, exames e relatos funcionais são importantes para demonstrar como a limitação impacta o desempenho profissional.
É possível recorrer administrativamente e, se necessário, entrar com ação judicial. O caminho pode não ser simples, mas o direito existe – e precisa ser respeitado.
Em um país em que o trabalho físico ainda é realidade para milhões de pessoas, garantir o auxílio-acidente é mais do que aplicar a lei: é reconhecer a dignidade de quem continua a trabalhar, mesmo com limitações permanentes.
Natalia de Andrade Dias Pereira
Natália é presidente do Grupo D.Andrade, referência em precatórios e indenizações do INSS. Com 17 anos de experiência, atua com foco em soluções jurídicas rápidas, seguras e justas.
MIGALHAS
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