A Câmara dos Deputados aprovou, nesta quarta-feira (15), em dois turnos, e concluiu a votação da PEC (Proposta de Emenda à Constituição) que determina limite anual para pagamento de precatórios. Assim, o texto vai à promulgação pelo Congresso Nacional.
Nos debates que redundaram na aprovação, em 1º turno, da proposta, na terça-feira (14), o líder da Oposição, deputado Alessandro Molon (PSB-RJ) colocou o “dedo na ferida”.
“Vejo com enorme preocupação o que se quer votar aqui nesta tarde [de terça-feira]. Primeiro, quer-se votar como se fosse uma PEC nova uma parte da PEC que foi votada pelo Senado e já promulgada”, criticou o líder.
“Não faz sentido tratar como uma PEC nova um pedaço de outra PEC que lá foi aprovada na sequência daquilo que aprovamos. Portanto, do ponto de vista constitucional e regimental, é uma excrescência a votação que se quer fazer nesta tarde”, acrescentou.
Precatórios, são dívidas da União reconhecidas pela Justiça em decisões transitadas em julgado, isto é, as quais não cabem mais recursos.
Coerência
“Nós fomos contra esta PEC dos Precatórios, porque sempre entendemos que não poderíamos dar esse calote. Não está aqui em jogo ricos fazendo doação para ninguém”, explicou a posição da bancada do PCdoB, a deputada Jandira Feghali (RJ).
“Aqui a discussão é a dívida para aposentados, pensionistas, professores e trabalhadores que ganharam ações transitadas em julgado, bem como para garantir o espaço fiscal, que nós sabemos que é muito maior do que o auxílio emergencial, do que o Auxílio Brasil. É um espaço fiscal que não tem nenhuma transparência no que vai ser usado”, disparou.
Na terça-feira (14), o texto foi aprovado em 1º turno, por 327 votos a 147 e 1 abstenção. Nesta quarta-feira (15), os deputados concluíram a análise dos destaques. E chancelaram a matéria em 2º turno, por 332 votos favoráveis, 141 contrários e 1 abstenção.
O texto aprovado acolhe a maioria das mudanças feitas pelo Senado no início de dezembro. Agora, vai à promulgação e, com isso, abre espaço fiscal de mais R$ 43,8 bilhões para a União gastar em 2022, segundo o Ministério da Economia.
Na semana passada, o Congresso já havia promulgado trechos da PEC aprovados nas duas Casas do Congresso — Câmara dos Deputados e Senado Federal.
Destaque do DEM foi aprovado em 1º turno, com objetivo de anular o cronograma feito pelos senadores para pagamento de precatórios do antigo Fundef — fundo educacional que foi substituído pelo Fundeb.
Correção pelo IPCA
O limite para o pagamento dos precatórios, segundo a PEC, vai corresponder ao valor das despesas com precatórios em 2016 corrigidos pela inflação medida pelo IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo).
Uma das alterações realizada pelo Senado reduz de 2036 para 2026 o prazo de vigência para esse limite de pagamento de precatórios.
Inicialmente, havia acordo entre líderes para que o dispositivo fosse suprimido na Câmara — o que faria com que a mudança não tivesse validade. Porém, os deputados mantiveram a vigência até 2026 para evitar judicialização ou que o texto retornasse aos senadores.
“Fatiamento”
Na semana passada, apenas os dispositivos comuns, aprovados por ambas as casas legislativas, foram promulgados.
A principal mudança promulgada na última semana já abre espaço de R$ 62,2 bilhões nos cofres do governo para 2022, de acordo com a Economia. O valor pode ser ainda maior, de R$ 64,9 bilhões, segundo a Conof (Consultoria de Orçamento da Câmara dos Deputados).
Por acordo entre os presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), essa reanálise da Câmara foi feita diretamente no plenário, sem passar por comissões na Casa. A celeridade na votação dos trechos remanescentes era demanda dos senadores para promulgar apenas uma parte da PEC.
Segundo cálculos do Ministério da Economia, a alteração no cálculo do teto de gastos (já promulgada) e o limite anual do pagamento de precatórios (aprovado nesta quarta-feira) garantirão ao governo espaço no Orçamento de R$ 106,1 bilhões. Para a Conof, o espaço aberto pode chegar a R$ 108,5 bilhões.
Parte deste espaço será destinado ao pagamento do Auxílio Brasil, programa que substituiu o Bolsa Família. O ofício enviado ao Congresso na semana passada afirma que a ampliação do Auxílio Brasil em 2022 vai exigir mais R$ 54,6 bilhões do Orçamento.
Em 2022, o governo promete elevar o benefício para, ao menos, R$ 400 e ampliar o público do programa de 14,5 milhões para 17 milhões de famílias. A nota técnica que fundamentou o ofício considera R$ 415 como valor do benefício médio do Auxílio Brasil.
Vinculação à agenda social
Ao analisar a matéria, o centro da preocupação dos senadores foi aprovar dispositivo que obriga a utilização dos recursos obtidos com programas de transferência de renda, como Saúde, Previdência e Assistência Social. Por isso, essa parte do texto voltou para análise dos deputados.
O objetivo é impedir que o espaço fiscal aberto fosse destinado para outros gastos em ano eleitoral, como emendas de relator — o chamado “orçamento secreto”.
Com a amarração criada pelo Senado, e mantida pelos deputados, mais de R$ 100 bilhões estariam “carimbados” para recursos sociais. Contudo, o entendimento de técnicos do Congresso é que isso não impedirá, por exemplo, remanejamento de outros recursos do Orçamento para encorpar as emendas de relator.
Auxílio permanente
A proposta altera a Constituição para especificar que “a redução da vulnerabilidade socioeconômica de famílias em situação de pobreza ou extrema pobreza” deve ser objetivo da assistência social prestada a quem dessa necessitar.
Além disso, passa a constar na Carta Magna que “todo brasileiro em situação de vulnerabilidade social terá direito a uma renda básica familiar, garantida pelo poder público em programa permanente de transferência de renda”.
Segundo os senadores, que incluíram esses dispositivos, a redação dará caráter permanente a programa social de transferência de renda, hoje o Auxílio Brasil. A Câmara manteve essas mudanças.
Prioridade de pagamento
Conforme o texto aprovado, os precatórios não pagos em razão do limite estabelecido pela PEC terão prioridade de pagamento nos exercícios seguintes, respeitada a ordem cronológica e as seguintes rubricas:
• obrigações definidas em lei como de pequeno valor;
• precatórios de natureza alimentícia cujos titulares, originários ou por sucessão hereditária, tenham a partir de 60 anos de idade, ou sejam portadores de doença grave ou pessoas com deficiência até o valor equivalente ao triplo do montante fixado em lei como obrigação de pequeno valor;
• demais precatórios de natureza alimentícia até o valor equivalente ao triplo do montante fixado em lei como obrigação de pequeno valor;
• demais precatórios de natureza alimentícia acima do triplo do montante fixado como obrigação de pequeno valor; e
• demais precatórios.
Fundef
Outro ponto que foi alterado no Senado e precisou voltar para análise da Câmara foi o que retirou o pagamento dos precatórios do antigo Fundef (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério) do limite estabelecido pelo teto de gastos. Este ponto foi mantido pelos deputados.
Na primeira votação na Câmara, a PEC estabeleceu parcelamento, em três vezes, dessas dívidas: uma parcela de 40%; e duas de 30%.
Os senadores, contudo, incluíram cronograma para esse pagamento: o primeiro montante seria pago até 30 de abril; o segundo, até 31 de agosto; e o restante, até 31 de dezembro. Esse dispositivo foi retirado pelos deputados por acordo.
O texto também acrescenta dispositivo na Constituição para prever que 60% dos precatórios devido ao Fundef sejam destinados aos profissionais do magistério, inclusive aposentados e pensionistas, na forma de abono. Os recursos não poderão ser incorporados na remuneração, aposentadoria ou pensão.
DIAP