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DESENVOLVIMENTO
JUSTIÇA SOCIAL

A validação trabalhista e tributária da “pejotização” pelo STF

A validação trabalhista e tributária da “pejotização” pelo STF

Renata Araujo, Sérgio Grama Lima, Marcela Baccan Bianchin e Caroline Palermo

O STF permite a pejotização, ou contratação de trabalhadores como PJ, se legítima e sem burlar leis trabalhistas. Recentemente, decidiu sobre contratos PJ da Rede Globo, refletindo impacto fiscal.

Atualmente, o STF vem reconhecendo o entendimento quanto à possibilidade de contratos e vínculos distintos da estrutura tradicional na organização do trabalho, reconhecendo formas alternativas à relação de emprego.

Ou seja, o STF admite a contratação de trabalhadores como pessoas jurídicas (“pejotização”) desde que essa prática seja feita de forma legítima e não para burlar a legislação trabalhista. Em outras palavras, a pejotização é permitida quando o trabalhador realmente atua como uma pessoa jurídica independente, com autonomia e sem vínculo de subordinação, habitualidade, pessoalidade e onerosidade típicos de uma relação de emprego.

Inclusive, é importante apontar o entendimento do ministro Luiz Fux no RE 958.252 (Tema 725 da repercussão geral – “Terceirização de serviços para a consecução da atividade-fim da empresa”), segundo o qual é “essencial para o progresso dos trabalhadores brasileiros a liberdade de organização produtiva dos cidadãos, entendida essa como balizamento do poder regulatório para evitar intervenções na dinâmica da economia incompatíveis com os postulados da proporcionalidade e da razoabilidade”.

No entanto, tal reconhecimento e ampliação das diversas estruturas de trabalho possuem efeito secundário em outras áreas, tais como a fiscal.

Nessa esteira, o STF proferiu recente decisão no processo do Fisco que mira contratos PJ da emissora Rede Globo de televisão, com artistas e até jornalistas.

Com suspeita de sonegação de tributos, a ação instaurada pela Receita Federal contesta os contratos no regime de PJ em vez de contratações pela CLT, considerando que o funcionário com carteira assinada e com uma renda superior a R$ 4.664,68 já passa a recolher 27,5% de Imposto de Renda, enquanto a PJ paga entre 4% e 15% de tributos por intermédio de micro e pequenas empresas (Simples Nacional) ou empresas enquadradas no Lucro Presumido.

Em plenário virtual, a 1ª turma do STF, com relatoria do ministro Cristiano Zanin e com respaldo de julgamentos anteriores, julgou inconstitucional a autuação da Receita Federal contra artistas da TV Globo, que foram acusados de suposto esquema de sonegação de impostos por meio de contratos “pejotizados” com a emissora.

A decisão vem para firmar o entendimento do STF e, em interpretação conjunta de precedentes da corte, como o RE 958.252 e a ADPF – Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 324, reconhece a validade de outras formas de relação de trabalho que não a relação de emprego regida pela CLT.

Em fevereiro/24, foi proferida decisão pelo STF, em que o ministro Alexandre de Moraes cassou seis acórdãos de uma das Delegacias de Julgamento da Receita Federal do Brasil em São Paulo (1ª instância de julgamento administrativa) e um acórdão do CARF – Conselho Administrativo de Recursos Fiscais, todos contrários à Rede Globo e aos artistas de seu elenco.

Recentemente, em 6/8, foi disponibilizado acórdão do CARF (Processo 16539.720001/2020-98/acórdão 1401-006.990), em que foi dado provimento ao recurso voluntário da Rede Globo sob o entendimento de que não foram vislumbrados os “elementos probatórios carreados pela autoridade autuante, relação empregatícia dissimulada ou maquiagem de contratos visando à pejotização que dissimule vínculo empregatício”, razão pela qual entendeu-se que a restrição da atividade fiscalizatória à análise documental foi insuficiente à demonstração do elemento subordinação.

Vale destacar que o referido processo foi oriundo de autuação fiscal lavrada para cobrança de multa isolada decorrente da ausência de retenção do Imposto de Renda Pessoa Física exigido com fundamento no inciso I do art. 7º da lei 7.713/88. A penalidade havia sido calculada considerando o montante efetivamente pago às pessoas jurídicas contratadas, reajustando-se a base de cálculo do IR para então se determinar a base de cálculo da multa (art. 725 do RIR/99).

Renata Araujo
Advogada no Leite, Tosto e Barros Advogados.

Leite, Tosto e Barros – Advogados Associados

Sérgio Grama Lima
Sócio no Leite, Tosto e Barros – Advogados Associados.

Leite, Tosto e Barros – Advogados Associados

Marcela Baccan Bianchin
Advogada no Leite, Tosto e Barros Advogados.

Leite, Tosto e Barros – Advogados Associados

Caroline Palermo
Advogada no Leite, Tosto e Barros Advogados.

Leite, Tosto e Barros – Advogados Associados

Migalhas: https://www.migalhas.com.br/depeso/414559/a-validacao-trabalhista-e-tributaria-da-pejotizacao-pelo-stf

A validação trabalhista e tributária da “pejotização” pelo STF

Justiça dispensa publicação de relatório de transparência salarial

Ana Karolina Lima Barros e Rebeka Sofia P. Mendonça

A lei 14.611/23 exige a publicação do relatório de transparência salarial. Liminares concedidas por TRFs dispensam essa obrigação e proíbem o governo de forçar planos de ação para combater desigualdades salariais, com efeito nacional.

A obrigação de publicar o relatório de transparência salarial, conforme determina a lei 14.611/23, trouxe vários questionamentos para as empresas sobre quais recairiam as reais consequências de um eventual descumprimento. Ações movidas pela Fiemg – Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais e pelo Sindimaq – Sindicato Nacional da Indústria de Máquinas e Equipamentos lograram êxito perante os TRFs da 3ª e da 6ª regiões que lhes concederam liminares que, não apenas dispensam a obrigatoriedade de publicar o mencionado relatório, mas, também, proíbem o Governo Federal de adotar qualquer tipo de estratégia com o intuito de obrigar aquelas entidades profissionais de classe a elaborarem planos de ação para combater potenciais desigualdades salariais.

Dessa forma, como essas liminares têm efeito “erga omnes”, ou seja, alcançam não só aquelas pessoas representadas pelas entidades litigantes, a decisão tem repercussão sobre todas os empregadores no território nacional.

Esta exigência legal no momento encontra-se suspensa para as empresas com 100 ou mais empregados, justamente por desrespeitar a LGPD e por colocar em risco informações sensíveis, sigilosas e internas das empresas.

A LGPD tem como objetivo proteger e garantir a liberdade e a privacidade dos dados pessoais, sejam eles armazenados em formato físico ou digital. A lei, ainda, persegue diferençar os dados sensíveis daqueles que podem ser divulgados, bem assim identifica os cuidados necessários para o tratamento quando de sua necessária utilização.

A decisão sobre esta liminar, que foi lastreada na LGPD, visa assegurar para todas as organizações dos diversos setores econômicos a total prevenção por danos irreversíveis relativos à privacidade e à proteção de dados, sejam estes pessoais ou empresariais, além de evitar a violação dos direitos à livre iniciativa e à leal concorrência.

É fundamental que exista ponderação entre exposição e transparência “versus” privacidade individual e a proteção dos dados. Via de consequência, as empresas devem zelar pelo estrito cumprimento de todas as premissas da lei, inclusive no que tange à igualdade salarial, ao tempo que se conectam aos princípios da LGPD.

Esses princípios, pois, impõem às empresas a responsabilidade pela segurança das informações e dados sensíveis dos empregados que, em última análise, estavam sendo afrontados pela lei que foi objeto de suspensão por força da liminar. Isso porque, as informações relativas aos salários dos empregados constituem-se, inafastavelmente, dados sensíveis a serem protegidos pelas empresas sob pena das sanções fixadas na lei.

Em suma, o deferimento desta liminar trouxe benefícios ao ambiente empresarial, visto que desobriga a disponibilização desses relatórios de transparência salarial, sem alguma cautela razoável de publicação, demonstrando que o dispositivo legal que assim obrigava ultrapassou os limites do poder estatal, atingindo não apenas os direitos das entidades privadas, mas também os dos trabalhadores, especialmente quanto às suas privacidade e intimidade, resguardando-os da indevida exposição de dados pessoais sensíveis.

Ana Karolina Lima Barros
Advogada da área de Direito do Trabalho de Martorelli Advogados.

Martorelli Advogados

Rebeka Sofia P. Mendonça
Advogada da área de Direito do Trabalho de Martorelli Advogados.

Martorelli Advogados

Migalhas: https://www.migalhas.com.br/depeso/414567/justica-dispensa-publicacao-de-relatorio-de-transparencia-salarial

A validação trabalhista e tributária da “pejotização” pelo STF

Mantida justa causa a homem que usou fotos de obra para divulgar concorrente

Uso de imagem

A relatora do caso destacou a improbidade do ato, que feriu a confiança na relação de trabalho e justificou a pena máxima imposta ao empregado.

Da Redação

A 10ª turma do TRT da 3ª região manteve justa causa aplicada a um empregado de uma construtora que utilizou fotografias de obras realizadas pela empregadora para divulgar os serviços de uma empresa concorrente do ramo de construção e reforma em uma rede social. O colegiado considerou a falta grave o suficiente para justificar a aplicação imediata da pena máxima trabalhista.

Conforme as provas apresentadas, o empregado em questão e as testemunhas por ele indicadas, que também prestavam serviços para a construtora, apareciam em fotografias tiradas nas obras da empregadora.

As imagens foram publicadas na página da empresa concorrente no Instagram, como se as obras pertencessem a ela. Além disso, foram apresentadas fotos que indicavam que o trabalhador fazia parte da equipe da concorrente.

Em sua defesa, o trabalhador alegou que não havia tirado ou publicado as fotos e que o simples fato de aparecer nelas não significava que ele as utilizou com o objetivo de captar clientes para a empresa concorrente. Ele solicitou o afastamento da justa causa e o pagamento das verbas rescisórias devidas.

No entanto, a juíza convocada Sandra Maria Generoso Thomaz Leidecker, relatora do caso, não acolheu os argumentos do trabalhador. A magistrada observou que o trabalhador seguia as redes sociais da empresa concorrente, o que demonstrava sua concordância com o uso de sua imagem na página.

A juíza ainda ponderou que o trabalhador tinha conhecimento de que as obras não pertenciam à empresa concorrente, mas sim à sua empregadora.

Com base nesse contexto, a relatora considerou válida a justa causa, fundamentando sua decisão nas alíneas “a” e “c” do art. 482 da CLT.

“A justa causa aplicada funda-se em ato de improbidade e em negociação habitual por conta própria ou alheia sem permissão do empregador, quando constituir ato de concorrência à empresa para a qual trabalha, o que tenho por verdadeiro, haja vista as provas produzidas no processo.”

A decisão também destacou que uma das testemunhas confessou ter deletado as fotos da rede social após ser notificada, evidenciando que possuía a senha de acesso à conta. Diante dos fatos, os julgadores, acompanhando o voto da relatora, entenderam que a empresa agiu de forma legítima ao exercer seu poder disciplinar para aplicar a dispensa por justa causa.

“Caracterizada, pois, a prática de falta grave, rompendo a confiança necessária entre as partes e impedindo a continuidade da relação de emprego, dando causa mais do que justa para a dispensa.”

O Tribunal omitiu o número do processo.

Informações: TRT da 3ª região.

Migalhas: https://www.migalhas.com.br/quentes/414563/mantida-justa-causa-por-uso-de-fotos-de-obra-para-divulgar-concorrente

A validação trabalhista e tributária da “pejotização” pelo STF

TST: Empresa não indenizará por dispensa de 44 empregados sem sindicato

Decisão

Colegiado levou em conta entendimento do STF sobre o tema.

Da Redação

A 3ª turma do TST afastou indenização de empresa a 44 trabalhadores dispensados coletivamente sem prévia participação do sindicato.

O colegiado atendeu aos embargos da empresa e revisou uma decisão anterior, em conformidade com o entendimento vinculante estabelecido pelo STF.

Apesar de afastar a condenação por indenização, foi mantida a exigência de que a empresa não realize futuras demissões coletivas sem a presença do sindicato anteriormente.

O caso foi iniciado pelo Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias da Construção, do Mobiliário e da Extração de Mármore, Calcário e Pedreiras de Pedro Leopoldo e outras cidades de Minas Gerais, que contestou a dispensa dos empregados em março de 2018.

O TRT da 3ª região havia determinado a reintegração dos funcionários, com o argumento de que o sindicato não havia sido informado previamente, o que impediu a busca de alternativas para minimizar os impactos das demissões em massa.

Em 2022, a 3ª turma do TST, ao analisar recurso da empresa, retirou a ordem de reintegração, mas condenou a empresa a indenizar os trabalhadores. No entanto, posteriormente, o STF firmou um entendimento sobre o tema (Tema 638, com repercussão geral), estabelecendo que a intervenção sindical é necessária em demissões em massa, mas apenas para aquelas ocorridas após a publicação da decisão do STF.

Com base nesse precedente, a empregadora entrou com embargos declaratórios, alegando que a decisão do Supremo afetava diretamente seu caso. O relator dos embargos, ministro Maurício Godinho Delgado, considerou que o fato superveniente – a decisão do STF – era relevante para o desfecho do processo.

Assim, a 3ª turma acatou o pedido da empresa, cumprindo o entendimento do STF e modificando a decisão anterior.

No entanto, a determinação de que a empresa não realize novas dispensas coletivas sem o envolvimento prévio do sindicato foi mantida, pois essa exigência se aplica a situações futuras e não é afetada pela modulação estabelecida pelo STF.

Processo: 10342-90.2018.5.03.0144

Com informações do TST.

Migalhas: https://www.migalhas.com.br/quentes/414635/empresa-nao-indenizara-por-dispensa-de-44-empregados-sem-sindicato

A validação trabalhista e tributária da “pejotização” pelo STF

Não faz sentido defender Banco Central isolado da política, mas sob influência do mercado, diz economista

BC EM DEBATE

O economista Paulo Nogueira Batista Jr. afirmou nesta quarta-feira (4/9) que é frágil o argumento de que é preciso isolar o Banco Central da “influência perniciosa” da política, ao mesmo tempo em que se mantém a influência do sistema financeiro sobre a autarquia.

A declaração ocorreu durante evento feito em Brasília pela TV ConJur, em parceria com o Brasil 247, para discutir a Proposta de Emenda Constitucional 65/2023, que busca transformar o BC em uma empresa pública. O economista participou da mesa de abertura do evento, junto com o deputado federal Lindbergh Farias (PT).

“O argumento é o de que seria formado um grupo técnico que seguiria uma suposta ‘boa teoria econômica’. O problema é: não há teoria que seja consenso entre os economistas sobre os temas do Banco Central. Segundo: não há propriamente técnicos, porque quem integra a diretoria são sobretudo executivos oriundos do sistema financeiro”, disse.

De acordo com ele, é preciso aumentar o período de quarentena para evitar que pessoas que saem do sistema financeiro para atuar como diretores do BC deixem a autarquia com informações privilegiadas. O maior rigor, diz, também evita que diretores tenham “que dançar conforme a música” para que consigam emprego depois de deixarem o Banco Central.

“Quem são os presidentes e diretores do BC? Executivos que vêm do sistema financeiro, passam pelo BC e, regra geral, voltam ao sistema financeiro. Quando ele está na diretoria do BC, ele pode ser independente dos interesses desse sistema? Pode, mas ao sair ele não consegue mais uma carreira neste sistema”, disse.

Mandatos coincidentes

O fato de os mandatos no BC não coincidirem com os do presidente da República também foi discutido no primeiro painel. A medida, diz Nogueira, faz com que o presidente eventualmente não consiga executar sua política econômica.

Ele deu como exemplo a atuação de Roberto Campos Neto na presidência do Banco Central, que foi indicado por Jair Bolsonaro (PL) e tem afinidade com os seguidores do capitão reformado. Neste caso, o atual presidente, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), precisou conviver com Campos Neto.

“O balanço dessa primeira experiência de autonomia do BC é altamente negativo: primeiro tem o déficit democrático. Tem um presidente da República eleito. Se você é eleito presidente com um programa econômico, você tem que ter condições de executar aquela política econômica”, disse.

Segundo ele, não faz sentido defender um modelo em que há autonomia em relação à política, mas não quanto ao mercado financeiro. “A relação do BC com o mercado financeiro, como há no Brasil, não existe em outro lugar no mundo”, afirmou.

Acompanhe o evento:

CONJUR

https://www.conjur.com.br/2024-set-04/nao-faz-sentido-defender-banco-central-isolado-mas-sob-influencia-do-mercado-diz-economista/

A validação trabalhista e tributária da “pejotização” pelo STF

Pessoa jurídica ou CLT: quando cada regime se aplica

Opinião

 

A discussão sobre a denominada “pejotização” tem ganhado destaque crescente nesta década, e ainda há ainda muita confusão quanto às diferenças fundamentais entre os regimes de pessoa jurídica (PJ) e o da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Cada forma de contratação tem características específicas, sobre as quais este artigo visa a jogar luz, dando clareza às suas definições e a quando cada uma delas é aplicável.

Não raro, o Ministério Público do Trabalho aciona o Poder Judiciário, por meio de ações civis públicas, visando a desconstituir a contratação de PJ, situação cada vez mais comum no mercado brasileiro. De outro lado, estão empresas de aplicativos, que utilizam suas plataformas para se inserir no mercado e, em consequência, abrem meios de rendimento para quem se encontra desempregado ou deseja auferir algum dinheiro extra.

Em suas ações, os promotores do MPT fundamentam que caberia reconhecimento do vínculo empregatício por estarem presentes os requisitos previstos no artigo 3º da CLT: habitualidade, pessoalidade, subordinação e onerosidade. Por sua vez, os réus alegam justamente a ausência do quesito subordinação – elemento essencial no contrato de trabalho celetista. É uma discussão que ainda deve gerar muita discussão nos tribunais.

Fundamentação via discussão jurídica

Em 2020, por exemplo, a empresa Loggi Tecnologia Ltda. chegou a ser condenada em primeira instância pelo Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (SP) a assinar as carteiras de trabalho de todos os motofretistas cadastrados em sua plataforma digital. No entanto, obteve, por liminar, efeito suspensivo da decisão até seu trânsito em julgado.

Melhor sorte teve a iFood, em ação civil pública cível que tramita na 37ª Vara do Trabalho de São Paulo, não se limitando a motofretistas, mas se estendendo a todas as modalidades de entregadores. Nesse caso, o juízo de primeiro grau entendeu por não reconhecer o vínculo empregatício entre os entregadores e a requerida.

Na ocasião desta última sentença, foi possível extrair elementos que tornam esse tipo de trabalhador senhor de suas responsabilidades, não havendo a subordinação.

“O cidadão ao desempenhar uma atividade remunerada sem ser empregado, diante do modelo legal vigente, tem duas opções claras: a) Inscrever-se como MEI, contribuindo com uma pequena parcela e recebendo o benefício estabelecido para aquela contribuição; b) Inscrever-se como trabalhador autônomo, recolhendo a alíquota incidente sobre os seus ganhos e recebendo o benefício de acordo com o valor sobre o qual contribuiu.”

Mais adiante:

“Outro aspecto importante da relação em análise é que o motofretista se diferencia por possuir a ferramenta de trabalho, ou seja, possui o meio de produção. Possuir o meio de produção afasta a figura do empregado que presta seus serviços utilizando-se dos meios de produção do empregador e o aproxima mais da figura de autônomo. Se possuir mais de um veículo, ou explorar veículo colocando outra pessoa para trabalhar, estará mais próximo da figura de empregador.”

(…)

“Portanto, o indivíduo, no caso o trabalhador, não está desprotegido. Há mecanismos de proteção que exigem, entretanto, que arque com sua parcela de contribuição social para fazer jus aos benefícios e serviços prestados pelo Estado.”

Não prosperaram os argumentos da Procuradoria, de que os trabalhadores seriam verdadeiras marionetes do aplicativo e que isso provocaria um dumping social.

Como dito acima, um dos objetivos da reforma trabalhista foi alçar o trabalhador à condição de responsável por suas decisões. Contribuir com a previdência social ou deixar de contribuir, por exemplo, é uma decisão que cabe única e exclusivamente a quem emprega sua força de trabalho nos moldes do caso em tela.

Esses trabalhadores, como se sabe, não ficam à disposição do aplicativo enquanto não recebem chamadas. Têm a possibilidade de desligar o celular e de trabalharem apenas quando quiserem, não ficando sob a fiscalização do titular da plataforma digital, o que descaracteriza a subordinação. Portanto, não há qualquer violação ao artigo 442-B da CLT capaz de transformar essa relação num contrato de trabalho na forma de seu artigo 3º.

Cabe ainda assinalar que a liberdade como garantia no exercício de atividades econômicas é o princípio norteador trazido pela Lei 13.874/2019. A atuação de profissionais por livre iniciativa, seja de forma individual ou na constituição de pessoas jurídicas como microempreendedor individual (MEI), em nenhum momento fere a dignidade da pessoa humana, colocando-a em inferioridade ante outros profissionais.

Em sequência a tal esclarecimento, vamos, então, ressaltar e reiterar algumas das principais características que distinguem serviços os quais podem ser prestados como pessoa jurídica daqueles que exigem a contratação pessoal do trabalhador via CLT:

Pessoa jurídica

Sob este regime, o indivíduo atua como prestador de serviços autônomo, celebrando um contrato de prestação de serviços entre sua empresa e a empresa contratante. Tal contrato deve especificar, de maneira detalhada, o escopo do trabalho, as ferramentas necessárias para a execução das tarefas, a responsabilidade de cada parte, os prazos e as condições de entrega dos serviços, o tipo de atendimento prestado e a forma de pagamento, dentre outros aspectos relevantes.

Algumas das principais características desse regime consistem em:

– Ausência de subordinação: como empresa, o prestador tem um contratante, na figura de outra empresa, mas não tem um chefe ou patrão.

– Flexibilidade quanto aos horários de trabalho: não há jornada padrão e, dependendo da natureza do serviço, nem mesmo um tempo mínimo a ser cumprido em sua prestação, mas apenas o prazo para a sua entrega.

– Pagamento efetuado mediante a emissão de nota fiscal pelo prestador de serviços, sem descontos de impostos retidos na fonte.

O profissional pode, ainda, atender a múltiplos clientes simultaneamente, desde que isto não comprometa sua produtividade e os termos acordados com cada contratante.

Consolidação das Leis do Trabalho

No regime de trabalho via CLT, trabalhadores e empregadores estão sujeitos a regulamentos que incluem:

– Dias e horários de trabalho estabelecidos pela empresa empregadora.

– Benefícios previstos em lei para o empregado, tais como assinatura da carteira de trabalho, férias remuneradas, 13º salário, seguro-desemprego, Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), licença-maternidade/paternidade e direito à aposentadoria.

– Eventuais benefícios extras (não obrigatórios), como auxílio-alimentação e, em alguns casos, seguro de vida e assistência médica e odontológica.

Este regime estabelece vínculo empregatício formal entre trabalhador e empresa, caracterizado por uma série de direitos e deveres previstos na CLT.

Conclusão: relação comercial x emprego

É essencial compreender que o modelo de pessoa jurídica compreende uma relação comercial entre duas empresas, sem vínculo empregatício. Por sua vez, a contratação regida pela CLT implica em uma relação de emprego, com direitos e obrigações claramente definidos para ambas as partes.

Cabe a essas partes ponderar sobre as características de cada regime, avaliando qual atende melhor às suas necessidades e à natureza dos serviços a serem prestados.

Não se pode, porém, mascarar, sob o prisma do modelo de pessoa jurídica, uma relação com evidências de trabalho subordinado, nos moldes da CLT. O contrato de trabalho é um contrato-realidade, sendo fácil comprovar quando sua natureza é deturpada.

Tal prática coloca a empresa no alvo do Ministério Público do Trabalho, das autoridades administrativas e do Poder Judiciário, aumentando seu passivo trabalhista e fiscal e acabando com sua reputação. Ela ainda gera desconfiança contra outras empresas, as quais utilizam a contratação via pessoa jurídica de forma lícita.

Por sua vez, o trabalhador submetido a uma pejotização inadequada acaba desprotegido, sem acesso aos direitos garantidos pela CLT, como FGTS, 13º salário e férias remuneradas. Assim, é fundamental que as partes interessadas compreendam e respeitem os limites legais e éticos ao estabelecerem suas relações de trabalho.