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TST cita falta de transparência e anula cláusula de banco de horas em acordo coletivo

TST cita falta de transparência e anula cláusula de banco de horas em acordo coletivo

A Seção Especializada em Dissídios Coletivos (SDC) do Tribunal Superior do Trabalho manteve a invalidade da cláusula de banco de horas prevista em acordo firmado em 2020 por empresas de transporte coletivo de Belo Horizonte.

Para o colegiado, o modelo viola a Constituição por não garantir transparência nem participação efetiva dos trabalhadores no controle da jornada.

Cláusula de banco de horas em acordo de empresas de transporte fere a Constituição

A ação foi proposta pelo Ministério Público do Trabalho, que pediu a anulação de cláusulas firmadas por diversas empresas do setor.

Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (MG) julgou inválido o dispositivo sobre banco de horas, levando as empresas a recorrer ao TST.

Segundo o TRT-3, a compensação de jornada só pode ser considerada válida se houver critérios claros de controle e fornecimento mensal dos saldos de horas. Na prática, a ausência de demonstrativos criava risco de dupla penalização: os trabalhadores já sofriam redução salarial pela flexibilização da jornada e ainda ficavam sem acesso às informações para conferir o banco de horas.

O TRT-3 também ressaltou que a prestação habitual de horas extras descaracteriza o sistema compensatório e afeta diretamente a saúde, o lazer e a convivência familiar dos trabalhadores.

Limite ultrapassado

Relator do recurso, o ministro Agra Belmonte confirmou os fundamentos do TRT-3, classificando o modelo como um banco de horas “às escuras”.

Embora a Constituição permita a compensação de jornada por negociação coletiva, ele considerou inadmissível um sistema que desobriga o empregador de apresentar demonstrativos mensais e abre espaço para extrapolar a limitação constitucional da jornada.

O ministro lembrou que acordos e convenções coletivas devem ser prestigiados, mas encontram limites quando direitos fundamentais estão em jogo. Para o colegiado, o banco de horas só é legítimo se garantir participação efetiva dos trabalhadores e acesso transparente às informações. A decisão foi unânime. Com informações da assessoria de imprensa do TST.

Processo 0011425-20.2020.5.03.0000

CONJUR
https://www.conjur.com.br/2025-out-15/tst-cita-falta-de-transparencia-e-anula-clausula-de-banco-de-horas-em-acordo-coletivo/

TST cita falta de transparência e anula cláusula de banco de horas em acordo coletivo

“Dois pesos, duas medidas”: Desafios da NR-1 e a saúde mental do trabalhador

Carlos Eduardo Carrusca Vieira

A atualização da NR-1 exige a proteção da saúde mental. Contudo, até que ponto as empresas estão dispostas a frear decisões rentáveis em nome do bem-estar do trabalhador?

O presidente e o diretor de finanças de uma organização convocam reunião com os gestores de cada um dos departamentos. Anunciam robustas mudanças organizacionais com o objetivo de melhorar a posição da empresa no mercado, a sua produtividade e o rendimento do seu capital. Os negócios vão bem, mas é necessário aperfeiçoar. Então, por que não?

Com base na análise dos dados contábeis e no escrutínio das planilhas, anunciam a necessidade de redução de pessoal. Mantras corporativos são evocados: “é preciso fazer mais com menos gente”, “é importante ter resiliência”. Além disso, é possível imaginar o seguinte diálogo:

– Vamos enfrentar a insatisfação dos colaboradores – alguns afirmam.

– Mas as pessoas se adaptam com o tempo – outros dizem.

– E, afinal, qual é o papel de vocês como líderes? – pergunta o diretor de finanças.

– Exatamente – responde o senhor presidente.

O diretor de finanças prossegue:

– Contribuir para que o plano de reestruturação seja levado a cabo, com o mínimo desgaste para a empresa – essa frase recebe apoio do Marketing e Branding e do Departamento Jurídico.

– Aliás, o pessoal do RH pode cuidar disso – ressalta o presidente, dirigindo-se ao gestor do RH. Você poderia fazer um planejamento de palestras voltadas para a saúde mental dos colaboradores. Observem: temos Janeiro Branco, Setembro Amarelo e a SIPAT para abordar a importância do autocuidado com a saúde mental. É bom estabelecer essa “nova cultura da prevenção”, mudar o mindset – acrescenta.

Reunião encerrada. Registre-se e cumpra-se.

Essa caricatura da reunião corporativa permitiria, obviamente, variações no enredo. No entanto, a preponderância do critério econômico sobre a saúde mental, a despolitização da luta pela saúde e a posição impotente do setor de recursos humanos em relação às finanças permaneceriam, em inúmeros casos, muito próximas, senão idênticas.

De longa data, na verdade, observa-se sistematicamente a conversão das disfunções, das patologias e dos vícios organizacionais, geradores de sofrimento e de adoecimento psíquico, em questões individuais. Problemas do mundo material e social são transformados, assim, em problemas individuais. “Crise do trabalho” torna-se “crise individual de saúde mental”, ocultando as raízes dessa temática.

As falácias, largamente disseminadas na sociedade e no mundo corporativo, despolitizam a luta pela saúde e reduzem o adoecimento a aspectos individuais, sobretudo, ao subtraírem do quadro da inteligibilidade do processo de saúde-doença a exigência de compreender as tensões entre capital-trabalho, as relações de poder e as contradições sociais experimentadas pelos trabalhadores. Sem essas discussões, a nova cultura organizacional conduz a medidas superficiais de abordagem da saúde mental relacionada ao trabalho.

Entre essas medidas, verifica-se a tentativa de rastrear sintomas psicológicos que indiquem fragilidades emocionais dos trabalhadores, os quais se tornam tanto mais descartáveis para uma organização quanto mais se observem suas incapacidades de suportar condições adoecedoras (metas inatingíveis, recursos escassos junto a exigências crescentes, jornadas extenuantes, assédios moral e sexual, excessivas e rigorosas vigilâncias, entre outros).

Para atacar os graves problemas de saúde relacionados ao trabalho, muitos programas corporativos de QVT – Qualidade de Vida no Trabalho limitam-se a oferecer mindfulness, palestras motivacionais, dias de embelezamento, atividades físicas, ambientes descontraídos e descolados. Evitam, contudo, discutir o essencial: os reais desafios, os paradoxos e as contradições da realidade laboral nas organizações. Intervenções paliativas, como as citadas, não costumam resultar em melhoria das condições laborais e da saúde dos trabalhadores. E não são inofensivas, pois ampliam a pressão sobre o trabalhador, transformado no único responsável pela própria saúde mental. As organizações reafirmam, desse modo, a ideia de que “muito já é feito pelos funcionários”.

Nesse cenário, a cultura da prevenção ao adoecimento e da promoção da saúde é reduzida a um discurso com ações pouco efetivas sobre a raiz dos problemas. Insiste-se, assim, em debater a crise da saúde mental, sem pautar a discussão sobre a crise social do trabalho, que tem resultado em diversas patologias laborais.

Em face disso, no âmbito corporativo, o RH segue, geralmente, a reboque das decisões gerenciais, tomadas em outras instâncias e com base em critérios econômico-financeiros que não são, necessariamente, compatíveis com a proteção da saúde dos trabalhadores. Quando se trata de discutir e de agir sobre as condições laborais causadoras de agravos à saúde mental, o RH opera, frequentemente, de maneira reativa. Sem real poder de transformar a realidade organizacional e o cotidiano laboral, por maior que possa ser a coragem individual de seus profissionais, o RH permanece constrangido por outras instâncias, ditas mais importantes e racionais, que cuidam dos negócios. A racionalidade gerencialista, porém, não incorpora em seu horizonte de atuação a proteção da saúde mental e os custos humanos que suas decisões acarretam para as pessoas. De outro lado, o RH acumula dados relativos ao sofrimento, que se refletem em licenças médicas, absenteísmos, rotatividades e que evidenciam o ônus financeiro da desumanização.

Em tal contexto, marcado pela notória incidência de transtornos mentais e comportamentais associados ao trabalho, a NR-1 – Norma Regulamentadora 1 é atualizada e impõe a necessidade de cuidar da saúde mental dos trabalhadores; do nosso ponto de vista, isso exige cuidar do trabalho. Em sua recente atualização, essa norma incorpora a obrigatoriedade de prevenir os riscos psicossociais relacionados ao trabalho que possam impactar a saúde mental dos trabalhadores. A NR-1 demanda que as organizações identifiquem, avaliem e controlem os fatores de risco, incluídos os riscos psicossociais, por meio do GRO – Gerenciamento de Riscos Ocupacionais. Estaria remediada a situação crítica da saúde mental relacionada ao trabalho? Certamente não.

A compreensão do que está em jogo nos contextos corporativos ressalta que a implementação dessa norma será um desafio. Mais ainda, evidencia que a proteção da saúde mental, exigida pela NR-1, encontra-se em uma encruzilhada marcada por contradições estruturais. Afinal, entre dois pesos e duas medidas, qual lugar restará para construir medidas efetivas de proteção da saúde mental – que permanece subordinada ao critério econômico, de maior peso para as organizações?

Profissionais das corporações e consultores têm repetido que, em razão da NR-1, as organizações terão de estabelecer uma nova cultura. Será preciso, conforme o jargão corporativo, mudar o mindset. Nesse sentido, indagam se as organizações estão preparadas para implementar a NR-1 e para produzir uma nova cultura. Ocorre que, em várias situações, essa nova cultura resume-se a reiterar antigas fórmulas e práticas, ou seja, a programas de qualidade de vida que abandonam os dramas do trabalho e que não integram a participação dos trabalhadores, reais conhecedores dos desafios e dos paradoxos da realidade.

Por tudo isso, é preciso lembrar: cuidar do trabalho, com o objetivo de cuidar da saúde mental, não equivale a preencher formulários e a elaborar diagnósticos de fragilidades individuais. Também não se reduz às palestras motivacionais, ao mindfulness ou às palestras do Janeiro Branco e do Setembro Amarelo. O cuidado dissimulado, conhecido como wellbeing washing, não logra transformar as condições laborais das quais decorrem os problemas de saúde mental relacionados ao trabalho, tais como quadros de ansiedade, de depressão, de estresse pós-traumático e de esgotamento profissional.

A saúde não se estabelece por decreto, nem por respostas protocolares. Na verdade, implica ações efetivas, com a participação incontornável dos coletivos profissionais, a fim de compreender os desafios e os problemas experimentados no trabalho real, bem como de construir soluções em face das contradições materializadas no âmbito laboral. Dessa maneira, para além das perguntas já feitas, outras parecem importantes para dar a real dimensão dos obstáculos impostos pela implementação da NR-1.

Desafios práticos irão se apresentar, sobretudo em relação aos pesos e às medidas de determinados critérios que presidem as tomadas de decisão. No binômio composto por produtividade-saúde, sabe-se que o ponto de vista econômico, em detrimento da saúde, pesa mais. Nesse sentido, a tarefa de proteger a saúde mental não pode ser simplesmente transferida ou realizada pelo RH. Por mais corajosos que sejam esses profissionais, eles continuam, com frequência, sem poder para decidir sobre aspectos (econômicos) que realmente impactam a saúde mental.

Para pensar em mudanças, seria indispensável que as organizações, por meio das suas políticas contábil e de gestão de RH, incorporassem a saúde mental não apenas como horizonte e cultura, de forma abstrata, mas como critério inegociável. Não temos nenhuma ingenuidade, ao contrário, temos clareza das restrições impostas a isso em uma economia que se orienta justamente pelo imperativo da valorização do valor. De qualquer modo, façamos um exercício de reflexão: se a saúde mental fosse assumida nas organizações como critério inegociável, o que tal escolha significaria na prática?

Ter a saúde como critério inegociável implicaria impor limites à obsessão pela maximização dos resultados econômicos, ou seja, à gestão do “custe o que custar”. Significaria ainda que uma decisão econômica potencialmente rentável poderia ser impedida se causasse impactos sobre a saúde. Então, a pergunta não seria simplesmente: as organizações estão prontas para implementar a NR-1? A pergunta é: as organizações estão preparadas para frear decisões mais rentáveis ou mais econômicas que possam impactar gravemente a saúde mental dos trabalhadores?

Nessa linha de raciocínio, exemplificamos um pouco mais: as empresas estão aptas a dar um passo atrás nas tentações de reduzir o quadro de pessoal, isto é, de produzir “mais, com menos” e, assim, a proteger a saúde dos trabalhadores? Estão dispostas a reduzir jornadas de trabalho extenuantes, sem depauperar a renda dos funcionários? Estão prontas para ampliar os recursos humanos, tecnológicos e materiais à disposição dos trabalhadores, porque isso pode resultar em prevenção ao adoecimento? Ou continuarão a reduzir a infraestrutura e os recursos humanos aos limites mínimos ou ainda menores, ignorando os impactos nocivos para a saúde? Seguirão o lema do “adapte-se quem quiser, ou peça para sair”, ou vão defender a adaptação do trabalho às características psicofisiológicas dos trabalhadores, como preconiza a NR-17? Vão parar de dizer por decreto o que é a saúde para os trabalhadores e de impor programas de QVT com pouca utilidade para transformar o trabalho? Irão escutar os funcionários, entender o que os adoece e mata, antes de propor ações? Estão dispostas a mudar efetivamente o papel do RH, tão relegado ao papel de ministrar cuidados paliativos?

Os impasses e as dificuldades são evidentes, pois no sistema econômico atual a economia e a saúde não caminham de mãos dadas. A saúde, o tempo e a energia vital dos trabalhadores são consumidos e sacrificados em nome da rentabilidade financeira de poucos. O desgaste, o sofrimento e o esgotamento profissional são distribuídos para muitos, como expressões sociais do antagonismo entre dois pesos e duas medidas.

No plano jurídico, de um lado, impõem-se balizas à ação predatória do capital, de outro, alimenta-se a insaciável serpente com a modernização das relações de trabalho, que já se fantasiou de reforma trabalhista e hoje se apresenta com diferentes roupagens (pejotização, empreendedorismo, colaboradores, parceiros), aprofundando a precarização laboral.

No fundo, vale destacar, sabemos que não está em jogo apenas a aplicação de normas, mas o projeto de sociedade que desejamos e que defendemos. Contudo, por ora, voltemos nossa atenção ao momento presente e à questão essencial para iniciar um real debate sobre a proteção da saúde mental: quais decisões de baixo custo e de alta rentabilidade, potencialmente nocivas, as organizações estão dispostas a frear em nome da saúde mental de seus trabalhadores?

Carlos Eduardo Carrusca Vieira
Pós-doutor em Psicologia pelo Programa de Pós-graduação em Psicologia da PUC Minas. Doutor e Mestre em Psicologia pela UFMG. Professor do Programa de Pós-graduação em Psicologia da PUC Minas.

MIGALHAS
https://www.migalhas.com.br/depeso/442251/dois-pesos-duas-medidas–nr-1-e-a-saude-mental-do-trabalhador

TST cita falta de transparência e anula cláusula de banco de horas em acordo coletivo

Escala 6×1 e o ciclo interminável da exaustão

Maioria nesta rotina são mulheres negras do setor de comércio. Escala é fator central de exaustão mental e física, distanciamento familiar e isolamento social. Sem tempo de cuidar da saúde, aumenta risco de hipermedicalização. Leia 2º texto de série sobre redução da jornada.

O artigo é de Flávia Manuella Uchoa de Oliveira, Clarice Rodrigues Pinheiro, Rafael Macharete, Gabriel Sant’Anna, Mary Zhang e Lucas de Oliveira, publicado pelo Instituto Humanitas Unisinos – IHU em parceria com o Centro de Estudos Sindicais e Economia do Trabalho (Cesit) da Unicamp.

Eis o artigo.

Introdução

O controle do tempo é elemento fundamental na contradição capital-trabalho. Na disputa política pelo tempo, a redução da jornada de trabalho tornou-se uma pauta histórica dos movimentos de trabalhadoras e trabalhadores (Dal Rosso, 2021). No Brasil, um fenômeno recente surge como imprescindível para a discussão dessa pauta. Em setembro de 2023, o movimento “Vida Além do Trabalho – Pelo fim da escala 6×1” (VAT) trouxe ao debate público a reivindicação pelo fim da escala 6×1, na qual trabalha-se seis dias e tem-se somente um dia de folga.

Ao longo de 2024, esse movimento tomou forma através de ações semanais de panfletagem; passeatas e do abaixo-assinado para o fim da escala, que contava com quase três milhões de assinaturas em maio de 2025. A pauta do movimento tornou-se também a espinha dorsal do texto de uma proposta de Emenda à Constituição (PEC) [1] – ainda em debate – que estabelece a duração do trabalho em até oito horas diárias e 36 horas semanais, com jornada de quatro dias por semana e três de descanso, sem redução salarial.

Em 2024, a Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do estado de São Paulo afirmou não poder comentar sobre o movimento e sua pauta “por falta de estudos sobre o tema” (Declercq, 2024). No último 1º de Maio, o pronunciamento do atual Presidente da República indicou a necessidade de aprofundar o debate sobre a redução da jornada de trabalho, com a menção de Lula diretamente à escala 6×1. Nota-se nesses pronunciamentos o argumento de que existem poucos estudos sobre essa jornada e seus impactos para a vida das trabalhadoras e trabalhadores, bem como para a economia do país.

Diante disso, a motivação deste artigo é fornecer dados, argumentos e referências que auxiliem e fortaleçam as mobilizações para a redução da jornada de trabalho e para o fim da escala 6×1. Para tanto, as seguintes perguntas foram formuladas: quem está submetida(o) à escala 6×1 no mercado de trabalho brasileiro? Que lugares essas pessoas ocupam nesse mercado? Em quais setores econômicos elas estão? Qual a realidade do trabalho nessa escala? Quais são os seus impactos na saúde e na vida de trabalhadoras e trabalhadores?

O texto está estruturado em três seções, além dessa introdução e das considerações finais. A primeira seção apresenta a metodologia, detalhando a elaboração do questionário, sua aplicação e formas de análise, bem como os cuidados éticos tomados nesse percurso. Em seguida, são apresentados e discutidos os resultados encontrados, pontuando os impactos da escala 6×1 na saúde e na vida pessoal, familiar e social do trabalhador.

Metodologia

A elaboração aqui desenvolvida é fruto de um esforço de construção junto ao “Movimento Vida Além do Trabalho – Pelo fim da escala 6×1” (VAT), inspirado no que Lacaz (1994), ao citar Chaia, nomeia como um processo de articulação e intermediação que produz junto e com as(os) trabalhadoras(es) o conhecimento para orientar as mobilizações.

Surgido na cidade do Rio de Janeiro, o VAT tem conseguido mobilizar e estabelecer uma determinada compreensão sobre o trabalho na escala 6×1 entre as(os) trabalhadoras(es). A força de mobilização do movimento torna palpável “a totalidade contraditória” do capitalismo (Bhattacharya, 2022). Isto é, a partir da escala 6×1 – temática que envolve concretamente multidões de trabalhadoras(es), diversas(os) entre si e colocadas(os) em distintas atividades, com acessos desiguais à proteção e à seguridade social –, foi possível unir experiências diferentes sem homogeneizá-las para pensar a produção de mais-valor pela espoliação do tempo de vida.

Em março de 2024 – a partir de uma ação de extensão na Universidade Federal Fluminense, em cooperação com a Universidade de Pernambuco –, foi realizada uma roda de conversa aberta à comunidade acadêmica, com Ricardo Azevedo, líder do VAT. Essa ação deu início ao processo de escrita de projetos de Iniciação Científica (IC) e de Mestrado com o objetivo de compreender quem são as(os) trabalhadoras(es) submetidas(os) à escala 6×1 e quais os impactos sentidos por elas(es), em decorrência dessa prática, na sua saúde física e mental, e na sua vida familiar. Essas primeiras atividades de extensão e pesquisa foram as bases do atual projeto “Impactos da escala 6×1 na vida das(os) trabalhadoras(es)”.

Em 19 de maio de 2025, a equipe de pesquisa esteve na Câmara dos Vereadores da cidade do Rio de Janeiro – a convite do VAT e do agora vereador eleito Ricardo Azevedo – junto a outras(os) trabalhadoras(es) para apresentação e discussão dos resultados alcançados pelo projeto. Esse encontro teve como objetivo o fortalecimento da Frente Parlamentar de Saúde Mental do Trabalhador Carioca (Resolução Mesa Diretora nº 12903 de 2025), aberta pelo mandato de Azevedo. Este artigo apresenta parte das discussões realizadas nessa oportunidade junto ao movimento e às(aos) trabalhadoras(es).

No projeto “Impactos da escala 6×1 na vida das(os) trabalhadoras(es)”, a estratégia metodológica é de natureza exploratória, com abordagem mista, combinando métodos quantitativos e qualitativos. A aplicação de questionário [2] no formato virtual foi o instrumento escolhido. O questionário possui três blocos de perguntas: o primeiro voltado à relação de trabalho, com o levantamento de informações como o tempo de trabalho na escala 6×1, tipo de contrato de trabalho, horas trabalhadas por dia, cargo (de acordo com a Classificação Brasileira de Ocupações – CBO) e setor econômico (de acordo com a Classificação Nacional de Atividades Econômicas – CNAE) em que as(os) trabalhadoras(es) atuam; o segundo bloco refere-se às informações socioeconômicas; e por fim, o terceiro bloco, composto por quatro questões.

Essas quatro questões utilizam o formato de resposta em escalas Likert [3]. A primeira questão pede que a (o) participante indique de que forma a escala 6×1 impacta negativamente sua vida pessoal e familiar como, por exemplo, se não impacta ou impacta extremamente. Duas outras questões pedem o nível de concordância do entrevistado com as seguintes afirmações: “a escala 6×1 afetou minha saúde física” e “a escala 6×1 afetou a minha saúde mental”. A quarta e última questão é aberta para que as(os) trabalhadoras(es) descrevam como a escala afeta suas vidas.

A aplicação do questionário teve a colaboração do VAT, por meio dos grupos de mensagem criados pelo movimento e que reúnem trabalhadoras(es) de todo Brasil. O instrumento ainda está em circulação para que se componha um pequeno painel ilustrativo do fenômeno, com objetivo de explorar possíveis impactos da escala na saúde e na vida de trabalhadoras e trabalhadores, sem pretensão de se fazer inferências ou extrapolar padrões observáveis e conclusões para toda a população em análise. Esse painel conta com 496 respostas válidas, tendo como critérios de inclusão a maioridade e a confirmação de que a(o) participante trabalha em escala 6×1. Nesse sentido, as(os) participantes foram selecionadas(os) por conveniência, pelo acesso que tivemos aos grupos de mensagem do VAT. Argumentamos que essa estratégia é adequada como etapa inicial ou preliminar do estudo, todavia, introduz um viés significativo nas respostas, não sendo possível, a partir delas, derivar generalizações.

Para a análise dos dados, foram utilizadas estatísticas descritivas, consideradas suficientes para o objetivo de caracterizar as(os) trabalhadoras(es). Para a pergunta aberta, seguiu-se a análise temática (Braun e Clarke, 2008), uma técnica para a identificação de padrões ou temas em dados qualitativos, pela qual determinamos categorias de análise à luz dos referenciais teóricos da Teoria do Desgaste e do Desgaste Mental relacionado ao Trabalho (Seligmann-Silva, 2011; Laurell e Noriega, 2021). Cabe indicar que o projeto foi aprovado em Comitê de Ética (nº CAAE: 84904324.2.0000.8160) e que segue a recomendação do uso do Termo de Consentimento Livre e Esclare-cido (TCLE), nos quais estão explicados os possíveis riscos e benefícios aos participantes da pesquisa.

Apresentação e discussões dos resultados

Os resultados deste projeto estão disponíveis ao público em um painel virtualiv, pelo qual se pode acompanhar a atualização dos resultados. Nesta apresentação, estruturada em duas subseções, são analisadas as características demográficas e socioeconômicas das(os) participantes e dos lugares que ocupam no mercado de trabalho; e, os impactos dessa escala percebidos na saúde e na vida pessoal, familiar e social das(os) mesmas(os).

Quem são e onde estão as(os) trabalhadoras(es) em escala 6×1 nesta pesquisa?

Os resultados parciais mostram uma maioria de respondentes do sexo feminino, pretas e pardas, jovens e adultas, sudestinas – moradoras dos estados do Rio de Janeiro e São Paulo – solteiras e sem filhos. Esse perfil demográfico predominante surge como viés estatístico, resultante provavelmente da maior representatividade de mulheres e de moradores do RJ e de SP, vinculados ao VAT. Com nível médio de escolaridade, elas possuem renda mensal de aproximadamente R$ 2.000,00 e estão ocupadas, principalmente, em cargos de atendimento ao público nos setores do comércio e serviços, há mais de cinco anos. Os contratos de trabalho a que estão submetidas são por tempo indeterminado e a carga horária é de 8 horas ou mais.

Descreve-se com mais detalhes, a seguir, a distribuição das informações demográficas e socioeconômicas das(os) participantes, com destaque para sexo, raça, idade, escolaridade e renda.

Dentre as 496 pessoas que responderam ao questionário, 60% são do sexo feminino e 40% do sexo masculino. Na autodeclaração de cor ou raça, 47% são brancas, 34% são pardas, 16% são pretas, 1% amarelas e 1% indígenas. A maioria tem entre 20 e 29 anos, 47% das participantes, 29% têm entre 30 e 39 anos, 17% têm mais de 40 anos e 3% têm até 19 anos. O nível de escolaridade das participantes mostra que 10% não chegaram a concluir o Ensino Médio, enquanto 51% possuem Ensino Médio Completo. Outros 33% estão cursando o Ensino Superior ou já concluíram. Os que estão cursando ou já concluíram cursos de Pós-Graduação correspondem a 6%. O rendimento mensal para 7% das trabalhadoras é de até R$ 1.000,00. Correspondem a 61% do total aquelas que possuem renda entre R$ 1.000,00 e 2.000,00, 29% ganham entre R$2.000,00 e 5.000,00 e 3% ganham acima de R$5.000,00.

Para compreender a relação de trabalho em que essas trabalhadoras estão inseridas, são analisados também o tempo de trabalho nessa escala, o tipo de contrato, a quantidade de horas trabalhadas, a ocupação que exercem e o setor em que estão colocadas. Como mostram os resultados, a escala 6×1 é a realidade de trabalho há mais de três anos para 57% das trabalhadoras. Outras 43% delas estão neste regime há menos de três anos. Aquelas que estão em contrato de trabalho por tempo indeterminado correspondem a 82%, sendo que outras 8% estão em contratos por tempo determinado, o que inclui aquelas em período de experiência. Correspondem a 2% as que estão colocadas em trabalho autônomo ou eventual, ao passo que, 5% declararam não possuir contrato de trabalho. A quantidade de horas de trabalho é 8 horas diárias ou mais para 70% das trabalhadoras, sendo que outras 30% têm menos que 8 horas diárias de trabalho.

As ocupações das participantes são diversas, com destaque para os cargos de operadora de caixa, vendedora de comércio varejista, atendente de lojas e mercados e atendente de lanchonete que correspondem a 30% das ocupações que as trabalhadoras exercem. Há também a presença de ocupações como recepcionista de hotel, assistente administrativo, repositora de mercadorias, fiscal de loja, farmacêutica, cozinheira geral, teleoperadora e operadora de telemarketing receptivo, cargos que correspondem a 19% das ocupações que as trabalhadoras exercem. A maioria das trabalhadoras está inserida no setor do comércio, que corresponde a 44% das respostas. Os setores de alimentação, hotéis e similares e telecomunicações também têm destaque por corresponderem a 27% das respostas.

Os impactos da escala 6×1 na saúde e na vida pessoal, familiar e social

A realidade de trabalho nessa escala 6×1 é descrita pelas(os) trabalhadoras(es) como determinante para a degradação de sua saúde, tanto física quanto mental, e de sua vida pessoal, com o isolamento familiar e social. Aquelas(es) que concordam e concordam completamente com a afirmação de que a escala 6×1 prejudica a saúde física correspondem a 97%; aquelas(es) que concordam e concordam completamente com a afirmação de que a escala 6×1 prejudica sua saúde mental correspondem a 94%. As(os) que consideram que a escala impacta muito ou extremamente a sua vida pessoal chega aos 94%.

Observam-se algumas diferenças nas respostas, segundo o sexo e o nível de escolaridade das(os) participantes que, embora pequenas, mostram como as mulheres e aqueles com menor nível de escolaridade percebem os impactos dessa escala com maior intensidade. Com relação ao sexo, o grau de concordância revela que as mulheres são mais incisivas sobre o impacto dessa escala em sua saúde física e mental: 70% delas concordam totalmente com a afirmação de que a escala 6×1 tem prejudicado a sua saúde física, enquanto 62% dos homens concordam totalmente com essa afirmação. A percepção dos prejuízos na saúde mental aparece mais próxima entre mulheres e homens, com 79% delas e 76% deles com total concordância com a afirmação de que a escala 6×1 tem prejudicado a sua saúde mental. A vida familiar e social também mostra uma pequena diferença entre os sexos, com 65% das mulheres e 58% dos homens indicando que a escala tem impactado extremamente sua vida pessoal e familiar.

Como hipóteses para essas diferenças entre os sexos, temos o peso da dupla jornada das mulheres. No Brasil, elas trabalham o dobro de horas que os homens nas atividades domésticas e de cuidados de pessoas (IBGE, 2023). A dupla jornada destaca como a organização própria do sistema capitalista desvaloriza, em termos materiais e simbólicos, as atividades de reprodução da vida, a maioria das quais são tarefas atribuídas às mulheres (Ferguson, 2020).

Os resultados dos impactos dessa escala quando recortados por escolaridade apontam para uma concordância geral, com trabalhadoras e trabalhadores de diferentes níveis de escolaridade afirmando os prejuízos em sua saúde e vida pessoal, familiar e social. Pequenas diferenças são apontadas no nível de concordância de que a escala tem prejudicado a saúde física. Quanto maior a escolaridade, observa-se um pequeno recuo na concordância com o prejuízo da escala 6×1 na saúde física: se considerados as(os) participantes que possuem até o Ensino Médio e que estão cursando o Ensino Superior, tem-se que mais de 70% concordam completamente com o prejuízo da escala em sua saúde física.

Se analisadas(os) apenas participantes com Ensino Superior ou Pós-Graduação, essa concordância completa se mantém em 59%. Hipóteses para essas diferenças devem ser elaboradas com cautela pela variedade de atividades exercidas pelas participantes. Isso demanda uma análise mais aprofundada sobre as ocupações das participantes e os seus impactos na saúde, algo que não pode ser feito no espaço deste artigo, mas que serão tratadas em publicações futuras.

Para a análise das respostas à pergunta aberta, os dados foram sistematizados em três categorias que caracterizam a rotina na escala: a exaustão física e mental, relatada no extremo cansaço e na irritabilidade; a sobrecarga física e mental, exposta nos relatos como a constante administração do pouco tempo fora do trabalho e da sobrecarga do corpo pelas horas de trabalho; e o isolamento, com o estreitamento afetivo e de horizonte, em relatos que indicam desânimo e impossibilidade de planejar o futuro. Essas categorias se entrelaçam no relato de uma trabalhadora do comércio, mulher preta, que afirma: “vivo apenas para trabalhar”. O Quadro 1 busca classificar os relatos das(os) trabalhadoras(es) nessas categorias:

Créditos: Outras Palavras

Dentre os prejuízos descritos, a impossibilidade de participar da vida familiar é um aspecto recorrente, assim como a inexistência de uma vida social em que seja possível o lazer e o desenvolvimento de relações de amizade e amorosas. Ressalta-se que as participantes mães apontam para a falta de redes de apoio e para a impossibilidade de acompanharem o desenvolvimento de seus filhos. A vida pessoal parece ser impactada pela falta de tempo para os estudos, para qualificação e para que alcancem algum nível de especialização, o que é visto pelas(os) participantes como a impossibilidade de crescimento profissional e de renda.

A falta de tempo para cuidar da saúde é apontada como parte dos impactos dessa escala. Por não conseguirem agendar consultas médicas nem contar com a liberação de algumas horas no trabalho, as(os) participantes apontam para a falta de prevenção e, por vezes, de tratamentos médicos. Os transtornos mentais também são recorrentes nas descrições dos impactos da escala 6×1. As(os) participantes relacionam transtornos de ansiedade e depressão com a rotina exaustiva e a falta de tempo para o descanso e para outras atividades.

A falta de tempo para o cuidado da saúde e os transtornos mentais relacionados ao trabalho parecem estar atrelados à medicamentalização. As(os) trabalhadoras(es) indicam o uso recorrente de medicamentos para suportar a rotina nessa escala. É comum o uso de analgésicos para dores no corpo, especialmente nos membros inferiores e nas costas; e de medicamentos ansiolíticos e antidepressivos como forma de suportar o dia a dia de exaustão mental e isolamento social.

Ressalta-se, ainda, que o deslocamento para o trabalho é compreendido como parte da rotina exaustiva nessa escala, que alonga as horas diárias dedicadas ao trabalho. O deslocamento pelas grandes cidades, com longos percursos de ida e vinda ao local de trabalho, com congestionamentos e superlotações dos transportes públicos são parte da descrição da rotina da maioria das(os) participantes. O dia de folga é visto como a possibilidade de recomposição das forças físicas e psíquicas, ao mesmo tempo em que é o único tempo disponível para a realização de trabalho doméstico e de organização da vida pessoal. Por isso, o lazer é preterido para que o repouso e a reorganização sejam possíveis nesse único dia.

Nesse cenário, a realidade de trabalho na escala 6×1 favorece o desgaste das trabalhadoras e trabalhadores, no sentido da perda das suas capacidades (potenciais e efetivas) de seu corpo e de seu psiquismo (Laurell e Noriega, 2021). Conforme Seligmann-Silva (2011, p. 135), essa perda implica uma “deformação”, isto é, uma “uma transformação negativa” pela qual as(os) trabalhadoras(es) perdem “um estado anterior mais satisfatório e valorizado” de suas capacidades físicas e psíquicas. A escala 6×1, como parte da organização do trabalho no capitalismo dependente e periférico (Marques, 2013), superexplora as trabalhadoras e os trabalhadores, sem a possibilidade de recomposição de suas forças.

Considerações finais

Este artigo apresenta os resultados parciais do projeto de pesquisa em desenvolvimento voltado a compreender quem são as trabalhadoras e trabalhadores em escala 6×1 e quais os impactos que percebem em sua saúde e vida pessoal, familiar e social. Até o momento, os resultados apontam para uma realidade de trabalho adoecedora, que desgasta física e mentalmente as(os) trabalhadoras(es), exaurindo suas forças e isolando-as(os) da convivência familiar e social.

A reivindicação da redução da jornada de trabalho volta à raiz da questão: abordar a totalidade da contradição capital-trabalho, identificada e informada na diversidade dos corpos das(os) trabalhadoras(es). O reconhecimento dessa relação contraditória indica as prioridades e urgências das pautas para as lutas. O fim da escala 6×1, a luta pela saúde como direito de todas(os), o acesso a transporte público de qualidade, de instituições de cuidados das crianças são exemplos de pautas táticas, urgentes no dia a dia das(os) trabalhadoras(es), mirando não apenas a reorganização das atividades de trabalho, mas a estratégia de reorganização das relações sociais como um todo. O VAT e a luta pela redução da jornada de trabalho nos lembram de que toda luta por justiça social no capitalismo será também uma luta pelo tempo.

Nesse sentido, o projeto busca fortalecer os argumentos a favor do fim da escala 6×1, ressaltando sua luta por Justiça Social. A limitação do instrumento utilizado e dos dados levantados para que se caracterize a diversidade de realidades de trabalho nessa escala são reconhecidos. Por isso, como próximos passos, deve-se refinar o instrumento, ampliar a base de dados e realizar análises mais detalhadas que considerem categorias e setores, bem como uma atualização da análise qualitativa.

Referências

ALLEN, I. E.; SEAMAN, C. A. Likert Scales and Data Analyses. Quality Progress, 2007. Disponível aqui.

DECLERCQ, M. “Vida Além do Trabalho”: movimento nascido no TikTok luta contra escala 6×1. 2024. Disponível aqui.

BHATTACHARYA, T. (Ed.). Teoria da reprodução social: remapear a classe, recentralizar a opressão. São Paulo: Elefante, 2022.

BRAUN, V.; CLARKE, V. Using thematic analysis in psychology. Qualitative Research in Psychology, v. 3, n. 2, pp. 77–101, 2008.

DAL ROSSO, S. Incontroláveis tempos de trabalho. In: ALVES, G. (Eds.). Trabalho e Valor: O novo (e precário) mundo do trabalho no século XXI. Marília: Projeto Editorial Praxis, 2021.

FERGUSON, S. J. Women and work: Feminism, labour, and social reproduction. London: Pluto Press, 2020.

IBGE. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua: Outras formas de trabalho 2022. 2023. Disponível aqui.

LACAZ, F. A. C. Reforma Sanitária e saúde do trabalhador. Saúde e Sociedade, v. 3, p. 41-59, 1994.

LAURELL, A. C.; NORIEGA, M. Processo de produção e saúde. São Paulo: Hucitec, 2021.

MARQUES, P. Dependência e superexploração do trabalho no capitalismo contemporâneo. São Paulo: IPEA, 2013.

SELIGMANN-SILVA, E. Trabalho e desgaste mental: O direito de ser dono de si mesmo. São Paulo: Cortez Editora, 2011.

Notas

[1] Texto da PEC disponível aqui.

[2] O questionário pode ser acessado aqui.

[3] As escalas Likert são um formato de resposta comum de avaliação em pesquisas. Elas classificam a qualidade de alta a baixa ou de melhor a pior usando cinco ou sete níveis de respostas (Seaman, 2007).

[4] Painei de pesquisa disponível aqui.

IHU – UNISINOS

https://www.ihu.unisinos.br/658522-escala-6-1-e-o-ciclo-interminavel-da-exaustao

TST cita falta de transparência e anula cláusula de banco de horas em acordo coletivo

Governo inicia pagamento de lote extra de RS 1,5 bi do abono salarial; veja se tem direito

Aproximadamente 1,6 milhão de trabalhadores que recebem até dois salários mínimos vão receber um dinheiro extra devido à inconsistência de dados enviados por seus empregadores. O pagamento do lote extra de R$ 1,5 bilhão do abono salarial do Programa de Integração Social (PIS) e do Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público (Pasep) começa nesta quarta-feira (15 /10) pelo governo federal.

Os pagamentos variam de R$ 126,50 a R$ 1.518,00, de acordo com o número de meses trabalhados em 2023, ano-base para o cálculo do benefício. A medida irá favorecer os trabalhadores que ficaram de fora do calendário regular por falhas ou atrasos no envio de informações pelos empregadores à Relação Anual de Informações Sociais (Rais) ou ao e-Social. O saque pode ser feito até 29 de dezembro de 2025. Para ter direito ao benefício, eles precisam ter trabalhado com carteira assinada, no mínimo, por 30 dias.

O Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) informou que o lote extraordinário foi autorizado pela Resolução Codefat nº 1.013/2025, que permitiu a correção dos dados pelas empresas até 20 de junho.

Para consultar se tem direito a receber, basta entrar no aplicativo Carteira de Trabalho Digital com o seu CPF e senha do gov.br, na aba de “Benefícios”, e selecionar “Abono Salarial”; ou ligar na Central Alô Trabalho — atendimento gratuito. Para trabalhadores da iniciativa privada, a consulta é feita por meio dos aplicativos Caixa Trabalhador e Caixa Tem.

Quem acredita ter direito a receber, mas não foi incluído no lote, pode registrar recurso diretamente no aplicativo Carteira de Trabalho Digital.

O pagamento, para aqueles que recebem PIS (trabalhadores de iniciativa privada), pode ser feito pelo crédito automático, para quem tem conta na Caixa Econômica Federal; pela poupança Social Digital acessada pelo Caixa Tem, pelo saque com Cartão Cidadão em terminais, lotéricas e correspondentes Caixa Aqui; ou via saque presencial nas agências da Caixa com documento de identificação.

Para quem recebe Pasep (servidores públicos e trabalhadores de estatais), o pagamento pode ser feito através do crédito em conta corrente no Banco do Brasil (BB), de transferência via TED ou Pix para outras instituições ou pelo saque presencial nas agências do BB.

Empregados domésticos, trabalhadores rurais e urbanos contratados por pessoa física e empregados de pessoa física equiparados à jurídica não têm direito ao abono.

CORREIO BRAZILIENSE
https://www.correiobraziliense.com.br/economia/2025/10/7270985-governo-inicia-pagamento-de-lote-extra-de-rs-15-bi-do-abono-salarial.html

TST cita falta de transparência e anula cláusula de banco de horas em acordo coletivo

STF busca saída para a uberização com mais garantias, mas longe da CLT

O Supremo Tribunal Federal (STF) tem tratado de dois temas latentes para a sociedade brasileira: uberização e pejotização. O primeiro está na pauta do presidente da Corte, ministro Edson Fachin, que busca uma saída negociada para permitir mais garantias aos trabalhadores, mas sem impor a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Já o segundo deverá ser levado ao plenário pelo ministro Gilmar Mendes, que paralisou os julgamentos sobre o tema na Justiça do Trabalho.

Os dois assuntos refletem uma situação em comum: a necessidade de maior proteção dos trabalhadores e de consenso jurídico sobre reconhecimento de vínculo empregatício. No fundo, o que se busca é um entendimento sobre como o país enxerga este mundo do trabalho que corre em paralelo à carteira assinada.

É nesse sentido que o STF irá pautar sua atuação por meio de decisões de repercussão geral, ou seja, os casos analisados servirão como base jurídica para futuros processos.

Neste aspecto, o foco está no direito do trabalho ao passo que os juízes da área têm considerado que sua atuação tem sido esvaziada.

Assim, além de observar uma decisão equilibrada entre os direitos dos trabalhadores e a atuação das empresas, os ministros terão que uniformizar o entendimento da legislação para diminuir a insegurança jurídica criada com decisões conflitantes em diferentes instâncias judiciais. Para completar, os ajustes feitos ainda devem ser realizados no sentido de fortalecer a Justiça do Trabalho, para que os casos sejam solucionados nos próprios tribunais.

Uberização

Ao tomar posse da presidência do Supremo em 1º de outubro, Fachin elegeu como uma de suas prioridades o tratamento da uberização do trabalho.

É consenso na sociedade que é preciso debater as condições oferecidas pelas plataformas de transporte e de entrega, uma vez que os trabalhadores relatam, cada vez mais, jornadas exaustivas e ganhos menores. Também pesa a falta de direitos trabalhistas, já que não têm acesso a benefícios garantidos pela legislação.

Fachin tem um histórico de votações em prol dos trabalhadores, diferente da grande maioria de seus colegas. Dessa forma, tomou uma postura corajosa em colocar para o debate público um assunto que envolve toda a sociedade, pois agrega o sustento de milhares de famílias, envolve a perspectiva dos milhões de usuários desses aplicativos, bem como a visão econômica das plataformas, entre elas Uber, Ifood, Rappi e 99.

O julgamento — que tem base na Reclamação (RCL) 64018, da plataforma Rappi, e no Recurso Extraordinário (RE 1446336), da Uber —, já contou com audições das partes e do advogado-geral da União, Jorge Messias. No entanto, o presidente do STF suspendeu a audiência e informou que a votação deve acontecer em 30 dias.

Apesar de contar com o apoio e a atenção popular, a pressão contrária à oferta de mais direitos é grande. Em outros julgamentos que chegaram ao STF, a primeira turma da Casa derrubou decisões do TST (Tribunal Superior do Trabalho) que reconheciam vínculos trabalhistas.

Nesse sentido, tem se perpetuado a falácia das plataformas de dizer que somente conectam os trabalhadores aos clientes, se imiscuindo da oferta de qualquer benefício.

Com o peso das decisões de seus colegas a favor das demandas das empresas, o entendimento de quem convive no dia a dia do Supremo é que Fachin buscará uma saída negociada.

Isso significa a busca por um meio-termo em que o vínculo formal dos trabalhadores pela CLT não necessite ser reconhecido, mas, em contrapartida, as empresas ofereçam aos entregadores e motoristas melhores condições de trabalho, de suporte técnico e uma definição criteriosa sobre a remuneração, com base em valores mínimos por deslocamento.

Pejotização

Outro assunto similar que está no STF é o da pejotização do trabalho. A denominação se refere ao tipo de contratação que as empresas fazem via pessoa jurídica (PJ) para driblar a legislação trabalhista e reduzir custos.

Este artifício tem encontrado respaldo do Judiciário sob a justificativa da terceirização do trabalho, aprovada como lei, até mesmo para atividades-fim, em 2017.

Em ocasiões passadas, o Supremo proferiu decisões contra o TST e os trabalhadores que buscaram o reconhecimento de vínculo, pois cumpriam as características de um emprego celetista (continuidade no serviço, carga horária definida, subordinação, garantia de salário, entre outros).

O grande contingente de contestações nessa área, que eventualmente chegavam ao STF, fez com que o ministro Gilmar Mendes suspendesse todos os julgamentos da pejotização do país em abril desse ano, o que desagradou os magistrados da área do Trabalho.

No último dia 7 de outubro, ocorreu uma audiência pública no STF que contou com mais de 40 expositores. O tema debatido tem como base o Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) 1532603, relatado por Mendes, que analisa a validade da contratação de trabalhador autônomo ou de pessoa jurídica para a prestação de serviços, burlando a CLT.

Na oportunidade, o assessor jurídico da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), Magnus Farkatt, fez duras críticas à terceirização e, consequentemente, à pejotização no Brasil, ao destacar que o país está na contramão do mundo ao diminuir o gasto com remuneração de pessoal em relação ao PIB (Produto Interno Bruto).

Ele também declarou que “todas as vezes em que um contrato de prestação de serviços for utilizado com o objetivo de mascarar a existência de um vínculo empregatício, ele deve ser declarado inconstitucional”. Farkatt relacionou o tema à uberização, ao explicar que a União Europeia recomenda que se reconheça como relação de emprego aquela estabelecida entre os trabalhadores de plataforma e as empresas que os contratam.

No final de setembro, o Senado também recebeu um debate sobre a precarização das relações de trabalho, oportunidade em que a pejotização foi amplamente criticada.

Segundo a coordenadora-Geral de Fiscalização e Promoção do Trabalho Decente do Ministério do Trabalho e Emprego, Dercylete Lisboa Loureiro, entre janeiro de 2022 e julho de 2025, 5,5 milhões de CPFs (Cadastro de Pessoa Física) tiveram os contratos de trabalho extintos e passaram a ser vinculados a um cadastro PJ, dado representado por 6 milhões de empresas vinculadas a essas pessoas – o número superior indica que muitos abriram até mesmo mais de uma empresa ou se tornaram sócios de outros negócios, para prestar diferentes serviços.

Desse total de 6 milhões de CNPJs (Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica) abertos, 4,7 milhões são de MEIs (microempreendedores individuais), 954 mil são optantes do Simples Nacional (microempresas ou empresas de pequeno porte) e 347 mil estão em outros tipos empresariais.

“Podemos afirmar que nesse período [janeiro de 2022 até julho de 2025] temos 8,3 milhões de MEIs criados. Desses mais de 8 milhões, 4,7 milhões são ex-empregados. Assim, nós temos 56,67% de MEIs que são ex-empregados. Ou seja, é um total desvirtuamento do MEI. Porque, se ele foi criado com o objetivo de trazer microempreendedores para ter uma proteção social, hoje, o MEI tornou-se um instrumento de informalidade”, criticou Loureiro.

Em vista desses apontamentos, as decisões do Supremo serão acompanhadas de perto, pois têm potencial até mesmo para redefinir o mercado de trabalho brasileiro nas próximas décadas. Portanto, a forma como os ministros consolidarem os entendimentos sobre a uberização e a pejotização representa um desafio de múltiplas camadas — mas também uma oportunidade de promover mais dignidade à vida dos trabalhadores.

VERMELHO

https://vermelho.org.br/2025/10/15/stf-busca-saida-para-a-uberizacao-com-mais-garantias-mas-longe-da-clt/

TST cita falta de transparência e anula cláusula de banco de horas em acordo coletivo

Mínimo sobe para R$ 1.631 em 2026, alta nominal de 7,44% sobre piso atual

O PLOA (Projeto de Lei Orçamentária Anual) para 2026 enviado ao Congresso Nacional prevê salário mínimo de R$ 1.631, o que representa alta nominal de 7,44% sobre o piso atual de R$ 1.518. O PLOA vai ser votado em dezembro.

O cálculo incorpora inflação projetada INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor) de 4,78% e ganho real de 2,5%, conforme regra fiscal vigente.

O teto da Previdência do RGPS (Regime Geral da Previdência Social), a cargo do INSS, também terá impacto. Então, esses percentuais incidirão sobre o valor atual, que é R$ 8.157,41, maior valor pago no Regime Geral.

Impacto nos benefícios previdenciários

O reajuste do salário mínimo não altera apenas os rendimentos dos trabalhadores de menor renda, que é o piso nacional — esse repercute diretamente no valor de diversos benefícios previdenciários e assistenciais.

  • Benefícios pagos no valor do mínimo — aposentadorias, pensões etc. — serão ajustados para esse novo patamar.
  • Para benefícios superiores ao piso, o reajuste é aplicado com base no INPC.
  • Nos regimes próprios de previdência — RPPS (Regime Próprio de Previdência Social —, dos servidores públicos, especialmente onde há alíquotas progressivas, o novo piso ajusta as faixas contributivas, e favorece servidores cujos vencimentos não foram adequadamente corrigidos.
  • Estimativas apontam que o impacto fiscal do reajuste — somando correções inflacionárias e aumentos reais em benefícios — pode ultrapassar R$ 84,1 bilhões para a Previdência.
  • Ao mesmo tempo, estudos indicam que cada R$ 1 de aumento do mínimo eleva as despesas previdenciárias em aproximadamente R$ 420 milhões.

Contexto orçamentário

  • A previsão de salário mínimo consta no PLN 15/25, submetido ao Congresso para análise na CMO (Comissão Mista de Orçamento).
  • O governo projeta crescimento do PIB (Produto Interno Bruto) de 2,44% para 2026 e trabalha com cenário de contenção fiscal que limita reajustes reais às regras aprovadas em 2023.
  • Apesar de já contemplado na peça orçamentária, o valor ainda pode mudar conforme negociações no Congresso — sobretudo em razão de projeções de inflação ou ajustes de política fiscal.

DIAP

https://diap.org.br/index.php/noticias/noticias/92469-minimo-sobe-para-r-1-631-em-2026-alta-nominal-de-7-44-sobre-piso-atual