Nas últimas semanas, a grande imprensa destacou, com invulgar intensidade, as chamadas “pautas-bombas” em curso no Poder Legislativo. “Pauta-bomba é como é chamado no Brasil o projeto de lei que gera gastos públicos e que está na contramão do ajuste fiscal, dificultando que se atinja a meta fiscal. Ou seja, são medidas que causam impacto nos cofres públicos” (fonte: pt.wikipedia.org).
O maior destaque foi dado à Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 10/2023. Essa proposição, aprovada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado Federal, “… institui a parcela mensal de valorização por tempo de serviço dos magistrados e do Ministério Público, além de outras categorias que foram incluídas depois” (fonte: senado.leg.br).
“Popularmente conhecida como PEC do Quinquênio, a proposta aprovada na semana passada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado concede um aumento salarial de 5% a cada cinco anos de serviço para membros do Judiciário e do Ministério Público. Líder do governo na Casa, o senador Jaques Wagner (PT-BA) classificou a proposta como uma “bomba [fiscal] que pode estar por vir”. O senador disse haver um estudo que indica que o impacto dos benefícios previstos na proposta pode ser de cerca de R$ 42 bilhões por ano” (fonte: g1.globo.com).
Trata-se de uma cifra de expressão significativa que justifica um debate mais profundo acerca da pertinência, no sentido mais amplo possível, de realização dessas despesas. A análise cuidadosa também é necessária para concluir, com precisão, acerca do impacto financeiro da medida, confirmando ou afastando os números mencionados inicialmente. O debate, inclusive, precisaria chegar nos critérios de fixação proporcional das remunerações, em função das responsabilidades desempenhadas, em relação a todas as carreiras integrantes dos Poderes Públicos.
Curiosamente, em termos de finanças públicas, as “pautas-bombas” explícitas, que recebem uma enorme cobertura midiática, ajudam a manter “convenientemente” escondidas outras “pautas-bombas”. Outras “pautas-bombas”? “Pautas-bombas” ocultas? Em que consistem essas “pautas-bombas” ocultas? E a extensão financeira dessas “pautas-bombas” ocultas?
Durante décadas, as finanças públicas brasileiras convivem com despesas e renúncias bilionárias, e até trilionárias, institucionalizadas de tal forma que são vistas e tratadas como normais pelos interesses econômicos dominantes. Elas não rendem sequer uma linha na grande imprensa escrita. A mídia de voz e imagem não dispensa sequer um minuto para tratar delas.
Eis uma despretensiosa lista de despesas ou renúncias, no âmbito das finanças públicas nacionais, que variam de 100 bilhões a 1,5 trilhão de reais por ano: a) serviço da dívida pública (juros e encargos); b) desonerações tributárias; c) subsídios; d) operações compromissadas; e) swap cambial e f) formação das reservas internacionais.
Parte dos gastos e renúncias referidos caracterizam, como destaca o economista Ladislau Dowbor, o rentismo contemporâneo. Segundo Dowbor, por intermédio de um conjunto de mecanismos, uma elite cada vez menos numerosa captura a riqueza social sem investir, empregar ou produzir. E o renomado economista aponta as consequências devastadoras da quadra histórica em que vivemos. Entre elas: a) 26 bilionários concentrarem mais riqueza que metade da humanidade; b) segmentos cada vez maiores da população estão desempregadas, precarizadas ou desalentadas e c) corporações insensíveis devastam a natureza, apesar da crescente propaganda em torno de ações ambientalmente sustentáveis.
Existe, ainda, uma dimensão extremamente perversa das finanças públicas brasileiras também fora dos holofotes midiáticos e do debate político mais profundo. Trata-se da contínua fixação de limites para o financiamento dos diversos direitos sociais, notadamente aqueles inseridos nos campos da saúde e da educação. Essa é uma “pauta-bomba” absolutamente estratégica e sequer é tratada assim pela grande imprensa.
Esse processo inclui o atual governo, apelidado de Lula 3. É mais uma demonstração do que já afirmei alhures. Todos os governos brasileiros, incluindo Bolsonaro e Lula, são iguais na essência. São fundamentalmente administrados do status quo, assim entendidos os poderosos instrumentos de concentração de recursos trilionários em uma fração mínima da população (0,1%) em detrimento, de diversas formas, da imensa maioria (99,9%).
Desde a edição da Emenda Constitucional 95, de 2016, a pretensão de alteração dos pisos de despesas públicas com saúde e educação entrou na pauta da austeridade fiscal seletiva. Essas antigas vinculações constitucionais em favor dos mais relevantes direitos sociais são postas como os vilões da tão decantada “estabilidade macroeconômica”. Curiosamente, despesas e renúncias bem maiores, como as destacadas anteriormente, sequer são cogitadas como objetos de limitações de qualquer natureza.
O referido movimento de restrição dos gastos com saúde e educação perseguiram (e perseguem), na prática, a conversão dos pisos em verdadeiros tetos. O “Novo Arcabouço Fiscal”, patrocinado pelo Governo Lula 3, não promove a adequada salvaguarda dos direitos sociais nos campos da saúde e da educação e alimenta o processo voltado para a supressão das despesas mínimas com educação e saúde. O Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias para 2025, recentemente encaminhado ao Congresso Nacional, reafirma o processo de busca de redução do financiamento dos direitos aludidos.
“Assim, a lógica no Novo Arcabouço Fiscal – que ele [Fernando Haddad] elaborou após consultas ao presidente do Banco Central e a meia dúzia de banqueiros do oligopólio privado – supõe a retirada dos pisos constitucionais para saúde e educação, além da tão sonhada desindexação dos benefícios da previdência social em relação ao salário mínimo” (fonte: outraspalavras.net). Essa avaliação foi realizada pelo economista Paulo Kliass.
Não foi por outra razão que os deputados federais Sâmia Bomfim (Psol-SP), Fernanda Melchionna (Psol-RS), Glauber Braga (Psol-RJ), Chico Alencar (Psol-RJ), Túlio Gadêlha (Rede/PE) e Luiza Erundina (Psol-SP) apresentaram o Projeto de Lei Complementar 62/2024.
“O projeto de lei complementar apresentado propõe uma modificação urgente na Lei Complementar n. 200, de 2023, que instituiu o Regime Fiscal Sustentável (RFS), conhecido também como Novo Arcabouço Fiscal (NAF). Este ajuste é fundamental para resolver a discrepância entre o regime de teto de gastos estabelecido pelo NAF e os pisos constitucionais de despesa obrigatória em saúde e educação, conforme estipulados nos artigos 198 e 212 da Constituição Federal./A implementação do NAF limita o aumento das despesas primárias a no máximo 70% do crescimento das receitas do ano anterior. Por outro lado, os pisos para saúde e educação devem crescer proporcionalmente à totalidade das receitas. Essa incongruência cria um cenário em que os pisos podem superar substancialmente o crescimento permitido para o conjunto das despesas sob o NAF. A longo prazo, isso irá gerar um desequilíbrio orçamentário insustentável, que membros dos Ministérios da Fazenda e Planejamento sugerem resolver diminuindo o crescimento dos pisos constitucionais, sob a justificativa de que estas despesas absorveriam uma fatia cada vez maior do orçamento, prejudicando outras áreas essenciais” (fonte: camara.leg.br).
Infelizmente, temos uma conjugação preocupante de dois fatores extremamente relevantes. De um lado, uma grande imprensa defensora dos interesses socioeconômicos sustentados pelas despesas e renúncias mencionadas. De outra banda, baixos níveis de educação e conscientização políticas capazes de realizar uma contestação consequente dos mecanismos de transferência de montanhas de recursos financeiros da imensa maioria dos brasileiros para uma média dúzia de endinheirados.
No cenário desenhado pelos dois fatores destacados, existem pautas-bombas com enormes repercussões socioeconômicas que permanecem por anos e décadas ocultas do debate público. Dito de outra forma, os poderosos interesses alimentados pelos instrumentos conscientemente escondidos potencializam a divulgação e demonização de certas pautas (as “bombas” explícitas) e escondem outras tantas (as “bombas” ocultas).
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O presidente Lula enviou ao Congresso, nesta segunda-feira (6), um projeto de decreto legislativo para acelerar a reconstrução do Rio Grande do Sul, estado assolado por chuvas e enchentes desde terça-feira. Segundo boletim da Defesa Civil, ao menos 85 pessoas morreram e 310 ficaram feridas em decorrência das enchentes. Há 134 pessoas desaparecidas e mais de 3,5 mil solicitações de resgate.
“O decreto é o primeiro passo para as coisas começarem a andar. Eu disse no Rio Grande do Sul e vou repetir agora: nós vamos fazer tudo que estiver ao nosso alcance para que a gente continue com a recuperação do estado do Rio Grande do Sul, com a melhoria das vida das pessoas e facilitar naquilo que a gente puder facilitar, obviamente que dentro da lei”, disse Lula.
O envio da proposta foi anunciado por Lula após reunião com os presidentes do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). O texto precisa ser aprovado nas duas Casas.
A abertura de crédito extraordinário para o estado não entra no arcabouço fiscal, ou seja, não entra no limite orçamentário e nas metas fiscais que o governo deve cumprir em 2024. Além disso, a proposta também flexibiliza a contratação de serviços e compra de produtos pela União.
Nesta segunda-feira, o governo federal também anunciou a liberação de R$ 614 milhões em emendas destinadas à área da saúde no Rio Grande do Sul. O valor está dividido em R$ 534 milhões para emendas parlamentares individuais aos congressistas do estado e R$ 80 milhões para emendas da bancada de saúde.
As estimativas para a reconstrução do estado gaúcho ainda estão sendo estudadas pelo corpo técnico dos ministérios. Prefeito de Santa Maria, uma das primeiras cidades a serem atingidas pelas chuvas, Jorge Pozzobom (PSDB) disse, em entrevista ao Congresso em Foco, que apenas para os danos estruturais serão necessários cerca de R$ 300 milhões.
AUTORIA
PEDRO SALES Jornalista em formação pela Universidade de Brasília (UnB). Integrou a equipe de comunicação interna do Ministério dos Transportes.
Por ocasião da passagem do 1º de Maio — Dia Internacional do Trabalhador — o senador Paulo Paim (PT-RS) destacou, em pronunciamento realizado dia 30 de abril, a importância de a criação do Estatuto do Trabalho.
Por ocasião do 1º de Maio, o senador gaúcho fez pronunciamento em defesa dos direitos trabalhistas, soterrados com a contrarreforma de 2017 | Foto: Waldemir Barreto/Agência Senado
A instituição do estatuto, chamado de “Nova CLT”, é proposta em sugestão legislativa — SUG 12/18 —, que tramita na CDH (Comissão de Direitos Humanos), cujo relator é o senador Paim. Trata-se de proposição robusta em contraposição à Reforma Trabalhista, instituída pela Lei 13.467/17, que soterrou a CLT, desprotegeu os trabalhadores, e privilegia o mercado, o capital e os patrões.
No pronunciamento, o parlamentar afirmou que o novo estatuto é caminho em busca da dignidade humana, tendo como base a promoção dos direitos sociais e trabalhistas, visando à construção de sociedade mais justa, fraterna, solidária e democrática.
É também resposta à precarização do mundo do trabalho causada pela contrarreforma trabalhista de 2017, que retirou direitos, destacou o senador.
Estatuto protetivo
Paim ressaltou que o estatuto não vai tratar apenas da remuneração, mas também de temas como a proibição de terceirização nas atividades-fim, o cumprimento do projeto de igualdade salarial entre homens e mulheres, a rejeição do trabalho intermitente e a redução da jornada de trabalho.
Segundo o senador, o texto vai regulamentar o direito de greve, além de combater o trabalho escravo, a escravidão, o trabalho infantil e o assédio moral e sexual.
“Vai tratar ainda de como é que funcionam e como podem funcionar outras áreas: banco de horas, trabalho externo, teletrabalho, trabalho por aplicativo, período de descanso, área de alimentação, férias, políticas salariais, salário mínimo, isonomia salarial, os adicionais legais que, ao longo da história, foram construídos.”
“Claro que vai tratar da situação do emprego da mulher, por exemplo, licença-maternidade. Aviso prévio, verbas rescisórias para todos, homens e mulheres, a organização sindical, entre tantos outros temas. […] Estamos batalhando muito pela valorização também do salário dos aposentados e pensionistas”, enumerou.
O parlamentar encerrou o pronunciamento parabenizando os trabalhadores e trabalhadoras “do campo e da cidade” pelo Dia do Trabalhador, que comemorado na última quarta-feira (1º).
Empresas podem operar aos domingos e feriados com permissão legal. A CLT proíbe, salvo exceções, o trabalho nesses dias, requerendo autorização prévia. Atividades essenciais podem ser autorizadas permanentemente, outras temporariamente.
É evidente que muitas empresas mantém o seu funcionamento de maneira ininterrupta. Ademais, também existem aquelas empresas que funcionam essencialmente ou possuem mais movimentos aos domingos e feriados, a exemplo dos shoppings centers.
Contudo, a realização de atividades pelo trabalhador nos dias de domingo e feriado deve ser pautada nas regras dispostas em legislação vigente.
A CLT, estabelece a proibição do trabalho em feriados civis e religiosos, salvo nos casos de necessidade relevante.
Portanto, para a jornada de trabalho em dia de feriado ser permitida, deve haver permissão prévia da autoridade competente.
De acordo com o parágrafo único do art. 68 da CLT: “A permissão será concedida a título permanente nas atividades que, por sua natureza ou pela conveniência pública, devem ser exercidas aos domingos, cabendo ao ministro do Trabalho, Indústria e Comércio, expedir instruções em que sejam especificadas tais atividades. Nos demais casos, ela será dada sob forma transitória, com discriminação do período autorizado, o qual, de cada vez, não excederá de 60 dias.”
Como exemplo, áreas do comércio, saúde, transportes, comunicação, entre outras, podem funcionar de maneira direta, sem interrupções e, portanto, são autorizadas a possuir trabalhadores que exerçam atividades em feriados e domingos.
É importante destacar ainda que a empresa mantenha atividades que necessitam funcionar feriados e domingos, o empregado tem direito a fruição de um descanso semanal remunerado, que deve ser realizado preferencialmente aos domingos, mas não obrigatoriamente.
As empresas que funcionam aos domingos podem convocar trabalhadores para exercerem suas atividades no dia correspondente, desde que concedam ao trabalhador a folga em outro dia na semana.
Além disso, com a existência de mais de um funcionário, é importante formular um regime de escala, para que cada trabalhador consiga folgar ao menos em um domingo ao mês.
Essa determinação é prevista na lei trabalhista, confira:
“Art. 67 – Será assegurado a todo empregado um descanso semanal de 24 horas consecutivas, o qual, salvo motivo de conveniência pública ou necessidade imperiosa do serviço, deverá coincidir com o domingo, no todo ou em parte.
Parágrafo único – Nos serviços que exijam trabalho aos domingos, com exceção quanto aos elencos teatrais, será estabelecida escala de revezamento, mensalmente organizada e constando de quadro sujeito à fiscalização.”
Depreende-se que a legislação tem o objetivo de proteger o trabalhador e lhe proporcionar descanso em dias de domingo e feriados, contudo, não havendo a possibilidade, prevê regras que visam compensar o empregado.
O empregado que trabalha em domingo ou feriado tem direito à compensação do dia em folga ou remuneração adicional. A legislação prevê pagamento em dobro do salário normal, assegurando uma compensação financeira proporcional ao sacrifício do empregado.
Portanto, se o empregador não conceder mais uma folga de 24 horas ao empregado, além da normal que já deve ser concedida, deverá remunerar o dia de trabalho em dobro.
É importante destacar que existem limites quanto à frequência do trabalho em feriado, visando evitar práticas abusivas. É importante que o empregador realize escalas de trabalho para que haja um revezamento entre os funcionários quando se trata de trabalho em dias de feriado.
Não obstante, existe outra questão relevante no que diz respeito ao trabalho em feriados religiosos. Deve-se considerar a diversidade cultural e religiosa da sociedade ao regulamentar o trabalho em feriados, promovendo o respeito às crenças e práticas de todos os trabalhadores.
Por isso, em se tratando de um trabalhador que possui uma crença religiosa, é essencial que o empregador respeite essa crença e designe outro trabalhador para realizar o serviço no dia de feriado em questão.
O trabalho em domingos e feriados é uma realidade que demanda atenção para o equilíbrio entre os interesses empresariais e os direitos dos trabalhadores.
Ricardo Nakahashi
Advogado e Pós-graduado em Direito Processual Civil pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC/SP. Especialista em Direito do Trabalho.
Conforme consta nos autos, comentários negativos sobre os cabelos da trabalhadora foram direcionados por um dos proprietários do estabelecimento.
Da Redação
O assédio moral decorrente das relações de trabalho é uma das situações mais denunciadas pelos trabalhadores na Justiça do Trabalho mineira. Nos processos julgados em Minas Gerais, é possível observar a criatividade dos infratores na prática do assédio.
Em um dos casos, uma trabalhadora de uma academia de ginástica em Juiz de Fora foi vítima de injúria racial e a Justiça do Trabalho determinou o pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 15 mil.
Segundo consta nos autos, comentários negativos sobre os cabelos da trabalhadora foram direcionados por um dos proprietários do estabelecimento. A prova oral produzida no processo confirmou a versão da trabalhadora, com testemunhas relatando os comentários ofensivos feitos pelo chefe.
A primeira testemunha contou que um dos proprietários fez comentários sobre o cabelo da autora, dizendo: “cabelo de defunto”. A segunda testemunha confirmou o ocorrido, dizendo que o chefe falou “cabelo de defunto”. A depoente disse que “a autora da ação saiu com os olhos marejados”.
A terceira testemunha ouvida, por sua vez, informou que a autora era brincalhona e chamava o chefe de “bocão”. “Ele brinca com todo mundo e todo mundo brinca com ele; ele brincou que o cabelo vinha da China e era de defunto; a trabalhadora ficou com cara ruim; avisei a ele que achava que a profissional não tinha gostado da brincadeira e ele não continuou mais”.
O desembargador relator Sércio da Silva Peçanha concluiu que a profissional foi vítima de ofensa racial no ambiente de trabalho, destacando que a conduta do chefe não pode ser vista como mera brincadeira, mas sim como uma verdadeira ofensa extrapatrimonial.
“Pode ser que, na ótica do reclamado, há o entendimento (e é dele) de que não houve ofensa ou intenção de ofender, que tudo se tratou de uma mera brincadeira, todavia, não tenho dúvida de que, sob a ótica da reclamante e pelo conjunto da prova, a ofensa é patente, dela derivando a condenação. Aquele que sofre a dor da ofensa, é que sabe o quanto dói.”
Considerando a capacidade financeira tanto do responsável pelo dano quanto da vítima, bem como outras circunstâncias relevantes do caso, conforme evidenciado pelo conjunto probatório, e reconhecendo especialmente o aspecto pedagógico da decisão, o desembargador determinou um aumento no valor da indenização por danos morais. Inicialmente fixado em R$ 10 mil na sentença, o montante foi ajustado para R$ 15 mil.
“Valor este condizente com os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade e que não caracteriza enriquecimento sem causa”, concluiu.
A academia foi responsabilizada pelos créditos devidos à trabalhadora, com os sócios, incluindo o chefe, respondendo de forma subsidiária.
O número do processo não foi divulgado pelo tribunal.
O Supremo Tribunal Federal (STF) tem recebido nos últimos meses uma quantidade expressiva de reclamações constitucionais para cassar decisões da Justiça do Trabalho relativas a contratos fraudulentos de prestação de serviços. Um dos métodos usualmente empregados para dissimular a verdadeira natureza — empregatícia dessas relações de trabalho são os contratos de pessoas jurídicas.
O ministro Edson Fachin, do STF
Embora esses processos ainda não tenham sido decididos por órgão colegiado, alguns ministros, individualmente, têm concedido decisões liminares para desconstituir as decisões da Justiça do Trabalho e até mesmo para afastar a competência desta em matéria trabalhista.
Na contramão dessa corrente, no último dia 23 de abril, o ministro Edson Fachin rejeitou reclamação ajuizada pela TIM S.A. A empresa se valeu dos mesmos argumentos invocados por parte dos ministros para conceder as mencionadas decisões liminares, a fim de anular decisão do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) da 9ª Região. Segundo essa argumentação, ao reconhecer o vínculo empregatício de uma trabalhadora contratada como pessoa jurídica, o TRT teria afrontado a jurisprudência do STF contida na ADPF 324, na ADC 48, na ADI 5.625, e no Tema 725 da repercussão geral, a despeito de terem sido identificados todos os elementos caracterizadores de uma relação de emprego.
Fachin fundamentou sua decisão na ausência de aderência temática, tendo em vista que as decisões supostamente violadas (ADPF 324, ADC 48, ADI 5.625 e Tema 725) não tratam de fraude para disfarçar a relação de emprego por meio de contratos simulados entre pessoas jurídicas.
Além disso, o ministro reafirmou a competência da Justiça do Trabalho para analisar a causa, com base no artigo 114 da Constituição, que atribui à Justiça do Trabalho competência para julgar as ações oriundas da relação de trabalho.
A decisão do ministro Edson Fachin homenageia a realidade fática e jurídica da controvérsia apresentada e representa uma verdadeira correção de rumos do STF em matéria trabalhista. A matéria tratada na ADC 48 (declaração de constitucionalidade da terceirização da atividade-fim do transporte rodoviário de cargas) não guarda aderência com os contratos de trabalho por meio de pessoa jurídica da empresa reclamante.
A ADPF 324, por sua vez, declarou a licitude da terceirização de atividade meio ou fim. A tese firmada é claríssima no sentido de que se está a tratar da modalidade de terceirização. Reitera-se, por oportuno, que esse não é o caso de contratação de mão de obra por meio de contrato de prestação de serviço por pessoa jurídica (fenômeno conhecido como “pejotização”).
Relação entre empresa e empregado
O caso da reclamação constitucional proposta pela TIM não se refere à relação triangular da terceirização (prestador de serviço, empresa terceirizada e tomador de serviço), mas de uma relação direta entre a TIM e a trabalhadora.
É certo que, no julgamento do Tema 725 da Repercussão Geral — RE 958.252 (relator ministro Luiz Fux), o STF reconheceu a possibilidade de organização da divisão do trabalho não só pela terceirização, mas por outras formas desenvolvidas por agentes econômicos, desde que realizada entre pessoas jurídicas distintas.
Entretanto, a chancela de outras formas de organização de trabalho pressupõe a juridicidade dos contratos e a boa-fé objetiva dos contratantes. Naturalmente, as decisões do STF em controle concentrado não poderiam admitir acobertar em suas respectivas teses a superação de situações de simulação ou fraude contratual.
A decisão do TRT da 9ª Região neste caso tem a ver com fraude na relação de trabalho, uma vez que os elementos caracterizadores do vínculo de emprego estavam presentes na relação direta de pessoa natural (trabalhadora) com a empresa.
O fato de o STF considerar lícita a organização do trabalho na modalidade de terceirização e de outras relações entre pessoas jurídicas distintas não pode ser interpretado para afirmar aprioristicamente que qualquer contrato de prestação de serviço seja lícito. Afinal, a própria legislação estabelece sanções para as hipóteses de fraude, de simulação de negócio jurídico, de cláusulas abusivas e de outros vícios jurídicos.
Conforme bem destacado na decisão do ministro Fachin, compete à Justiça do Trabalho avaliar os elementos de prova de cada caso concreto e a higidez da relação jurídica entre trabalhadores e seus contratantes.