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Pobreza infantil seria 12 vezes maior no Brasil sem Bolsa Família, calcula estudo

Pobreza infantil seria 12 vezes maior no Brasil sem Bolsa Família, calcula estudo

O Bolsa Família é fundamental na mitigação da pobreza infantil. Em vez de 670 mil (3,7%) das crianças de 0 a 6 anos, a extrema pobreza atingiria 8,1 milhões (44,75%) sem o programa

por Cezar Xavier

Cerca de 670 mil (3,7%) crianças brasileiras de 0 a 6 anos de idade vivem em situação de extrema pobreza, com renda mensal familiar per capita de até R$ 218. No entanto, o estudo realizado pelo Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS) em parceria com a Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal (FMCSV) revelou que esse número poderia ser ainda mais preocupante, atingindo 8,1 milhões de crianças (44,75%) ou doze vezes mais, se não fosse a intervenção de programas de transferência de renda, como o Bolsa Família.

Desta forma, o programa desempenha um papel crucial na mitigação da pobreza infantil, conforme destacado pela secretária de Avaliação, Gestão da Informação e Cadastro Único, Letícia Bartholo. De acordo com o Censo de 2022, o país abriga aproximadamente 18,1 milhões de crianças nessa faixa etária.

O levantamento, intitulado “Perfil Síntese da Primeira Infância e Famílias no Cadastro Único”, utiliza dados de outubro de 2023 do Cadastro Único (CadÚnico), sistema que reúne informações das famílias de baixa renda no país. Dos 10 milhões de crianças de 0 a 6 anos registradas no CadÚnico, 55,4% são classificadas como vivendo em situação de vulnerabilidade.

Além disso, o estudo revela que 43% dos responsáveis por famílias com crianças nessa faixa etária não possuem nenhuma fonte de renda fixa, sendo o Bolsa Família a principal fonte de renda para 83% dessas famílias. A maioria das famílias é chefiada por mães solo, em sua maioria pardas e com idade entre 25 e 34 anos.

Em relação ao perfil das crianças, o estudo destaca que 11,1% são indígenas, 6,7% são quilombolas e 0,2% estão em situação de rua. Eliane Aquino, secretária Nacional de Renda de Cidadania, ressalta o potencial do Bolsa Família em equacionar as desigualdades do país, enfatizando a importância da criação do Benefício Primeira Infância.

O estudo também aponta disparidades regionais significativas. Por exemplo, enquanto o Nordeste concentra 72% das crianças registradas no CadÚnico, o Sudeste conta com uma proporção menor, com apenas 45% das crianças registradas. Mariana Luz, diretora da Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal, destaca a importância de uma política nacional integrada para abordar as necessidades específicas das famílias mais vulneráveis.

Por fim, o estudo faz um recorte municipal, evidenciando a falta de infraestrutura básica em muitas regiões. Por exemplo, 71% dos municípios na região Norte não possuem saneamento adequado, contrastando com os 20% na região Sudeste e os 9% no Nordeste. Esses dados, parte da série “Caderno de Estudos” do MDS, fornecem dados valiosos para a formulação de políticas públicas direcionadas à primeira infância no Brasil.

Não basta o dinheiro

Uma das descobertas mais impactantes foi o potencial dos valores mais altos do benefício do Bolsa Família na redução da desnutrição de grávidas e crianças menores de 2 anos de idade. A pesquisa mostrou que aumentos nos valores do programa resultaram em melhorias nos indicadores nutricionais dessas crianças, incluindo aumento do peso ajustado por altura e redução da desnutrição crônica.

No entanto, o estudo também ressaltou que simplesmente aumentar os valores das transferências de renda não é suficiente para resolver o problema da pobreza infantil. É necessário priorizar cuidadosamente os beneficiários dos programas e considerar estratégias complementares para garantir o desenvolvimento integral das crianças.

Uma simulação de cenários demonstrou o impacto de diferentes desenhos de transferência de renda na redução da pobreza infantil. Além de analisar a redução da porcentagem de crianças em situação de pobreza, a pesquisa também avaliou o custo fiscal de implementação para cada estado, comparando-o com a receita estadual de arrecadação de impostos.

Em suma, o estudo enfatizou que políticas de transferência de renda são mais eficazes quando são concebidas com uma visão abrangente do desenvolvimento infantil e complementadas por outras medidas, como acesso à saúde, educação, assistência social e cultura. Políticas que incorporem condicionalidades e promovam a qualificação e ampliação dos serviços públicos de saúde, educação e assistência social são fundamentais para garantir resultados significativos.

Para compreender melhor o cenário, o estudo avaliou o impacto de transferências incrementais de renda para famílias já beneficiárias do Bolsa Família, sem a adição de novas condicionalidades. Ao explorar as regras descontínuas de recebimento do componente Bolsa Variável Jovem, os pesquisadores puderam mensurar o impacto de aumentar a renda dessas famílias. Os resultados mostraram uma redução estatisticamente significativa da desnutrição infantil em crianças menores de 2 anos. No entanto, análises adicionais ressaltaram que esse efeito não foi consistente em todos os anos da amostra, sugerindo que pequenos incrementos de renda sozinhos podem ter um impacto limitado na ausência de serviços de apoio.

Evolução dos programas de transferência de renda

Desde a aprovação da Lei Orgânica de Assistência Social (LOAS) em 1993, o Brasil vem trilhando um caminho marcado por avanços significativos na implementação de programas de transferência de renda, visando garantir a proteção social e a redução da pobreza. Uma linha do tempo desses programas revela não apenas marcos históricos, mas também uma trajetória de adaptação e expansão para atender às necessidades da população mais vulnerável.

  • 1995: Pioneirismo em Campinas (SP): O Programa de Garantia de Renda Familiar Mínima (PGRFM) surge como o primeiro programa de transferência de renda voltado para famílias de baixa renda em Campinas, São Paulo, pavimentando o caminho para iniciativas semelhantes em todo o país.

  • 1995: Bolsa Escola no Distrito Federal: O Programa Bolsa Escola é lançado no Distrito Federal, oferecendo suporte financeiro às famílias com filhos matriculados na rede pública de ensino, estimulando a frequência escolar e o acesso à educação.

  • 2001: Surge o Bolsa Escola Federal: A iniciativa do Distrito Federal se expande para nível federal, dando origem ao Bolsa Escola do Governo Federal. Agora, famílias de baixa renda em todo o país podem contar com auxílio financeiro para garantir a educação de seus filhos.

  • 2003: O Nascimento do Bolsa Família: Um marco na história das políticas sociais brasileiras, o Bolsa Família é criado pela unificação de diversos programas de transferência de renda, consolidando uma abordagem integrada e mais eficaz para combater a pobreza.

  • 2006: Introdução das Condicionalidades: O Bolsa Família passa a incluir condicionalidades, como a frequência escolar e o acompanhamento da saúde, visando não apenas a transferência de renda, mas também o acesso a serviços essenciais.

  • 2011: Plano Brasil sem Miséria e Brasil Carinhoso: Com o objetivo de erradicar a miséria no país, são lançados o Plano Brasil sem Miséria e o Programa Brasil Carinhoso, priorizando ações específicas para a primeira infância e famílias em extrema pobreza.

  • 2019: 13º do Bolsa Família: foi pago apenas no primeiro ano do Governo Bolsonaro, uma vez que o Decreto que o institui perdeu sua eficácia ao não ser votado pelo congresso no prazo limite. Ao longo de 2020, a pandemia de covid forçou o atendimento de 66 milhões de beneficiários pelo Auxílio Emergencial. Em 2021, o Bolsa Família passou a se chamar Auxílio Brasil e foi descaracterizado pela falta de condicionantes.

  • 2023: Novo Bolsa Família: O programa passa por uma reformulação, aumentando os valores dos benefícios e introduzindo o Benefício de Primeira Infância, destinado às crianças de 0 a 6 anos. Essa nova versão busca ampliar o alcance e o impacto do programa na redução da pobreza com retorno das condicionantes.

VERMELHO

https://vermelho.org.br/2024/04/23/pobreza-infantil-seria-12-vezes-maior-no-brasil-sem-bolsa-familia-calcula-estudo/

Pobreza infantil seria 12 vezes maior no Brasil sem Bolsa Família, calcula estudo

Demissões por justa causa crescem e revelam outra face da precarização

Professor da Unicamp diz que reformas reforçaram poder do empregador de gerir força de trabalho e juíza aponta que opção gera menor custo e pouco tem a ver com comportamento

por Priscila Lobregatte

Segundo a LCA Consultoria, em janeiro deste ano, houve mais de 39,5 mil demissões por justa causa no Brasil — o que corresponde a 2,09% do total de desligamentos do mês. O número é 11,5% maior do que em dezembro e 25,6% superior em relação ao primeiro mês de 2023. Para além de questões comportamentais dos indivíduos e do mercado que podem explicar parte desse crescimento, esses números parecem também refletir o maior poder que o patronato passou a ter a partir do recente processo de retirada de direitos da classe trabalhadora.

Junto à divulgação desses números, vieram as análises. Parte indicava a possível influência do maior dinamismo do mercado de trabalho sobre as demissões, inclusive naquelas por justa causa. Outras especulavam sobre fatores comportamentais ligados ao retorno ao trabalho após a pandemia, tais como o aumento da ansiedade e do estresse, que resultariam em um aumento dos conflitos e, consequentemente, nesse tipo de demissão.

No entanto, para além desses aspectos mais circunstanciais que podem pesar sobre as demissões, a análise da pesquisa abre caminho para a compreensão de questões de fundo estrutural que incidem cotidianamente na vida laboral.

Direitos destruídos

No sistema capitalista, sobretudo em sua fase atual, a precarização das relações de trabalho, a perda de direitos básicos e os avanços tecnológicos que dispensam cada vez mais a mão de obra humana, entre outros fatores, resultam num ambiente progressivamente hostil e desanimador aos trabalhadores.

Cada vez mais, eles se vêem obrigados a alocar um tempo maior para o trabalho, ganhando salários mais baixos, com menos garantias e sabendo que sempre haverá alguém disposto a ocupar a sua vaga. Soma-se a isso a concepção meritocrática em voga, que sempre culpa a pessoa pelo seu insucesso.

“Há, de fato, uma situação resultante das transformações no mundo do trabalho e as pessoas estão sendo provocadas por essas transformações. Elas estão expostas a uma concorrência sempre muito forte para ocupar as poucas oportunidades de trabalho de qualidade existentes na sociedade contemporânea”, explica, ao Portal Vermelho, José Dari Krein, professor da Unicamp e diretor do Centro de Estudos Sindicais e Economia do Trabalho (Cesit).

Ele argumenta que a grande maioria dos trabalhos é de pouca qualidade, baixa realização pessoal e pequeno rendimento — mesmo para muita gente que pôde se especializar fazendo uma faculdade, por exemplo —, o que gera uma série de frustrações.

“A explicação hegemônica que foi sendo apresentada e que convenceu boa parte da sociedade é a de que a responsabilidade é do indivíduo. Se ele não tem uma posição melhor no mercado de trabalho, é porque ele falhou, não estudou, não se esforçou, não tem empregabilidade, porque não é empreendedor e não é líder. E esse indivíduo ainda é exposto a um ambiente de concorrência com poucas oportunidades de trabalho”, diz Krein.

Por tudo isso, se no século 19 era comum o adoecimento por doenças ligadas à insalubridade do trabalho ou da moradia, como a tuberculose, no século 21, parte considerável das doenças laborais está ligada a fatores emocionais e psicológicos, como o estresse, a angústia e a depressão, além da autocobrança gerada por esse ambiente, o que amplifica ainda mais esses males.

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), em 2019, um bilhão de pessoas viviam com transtornos mentais e 15% dos adultos em idade laboral sofriam com algum problema dessa natureza.

Despotismo nas empresas

Mas, há outra questão que pesa bastante e que diz respeito a como esse ambiente de precarização pode mudar o comportamento por parte dos patrões. “Ao mesmo tempo em que temos esse cenário, do ponto de vista do trabalhador, temos também um poder despótico sendo adotado em parte das empresas”, aponta Krein. Segundo o professor, as reformas trabalhistas “reforçaram o poder do empregador gerir sua força de trabalho de acordo com aquilo que ele acha mais conveniente”.

Quando uma pessoa é desligada por justa causa, recebe apenas parte de seus direitos — ela perde, por exemplo, o acesso ao Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, a indenização dos 40% sobre o FGTS e o direito ao aviso prévio.  “Isso significa que é um custo menor para o empregador despedir por justa causa”, explica, ao Portal Vermelho, Valdete Souto Severo, doutora em Direito do Trabalho pela USP e juíza do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região.

A juíza salienta que “a maioria das alegações de justa causa não se dá por uma questão comportamental, mas sim por alegação de faltas injustificadas ou outras questões que não tem a ver diretamente com uma insubordinação, por exemplo, por parte do trabalhador”.

Com medo de acabar ficando “marcado” no mercado de trabalho e ter dificuldades para se recolocar, muitos trabalhadores acabam não recorrendo à Justiça no caso de uma demissão que acredita ter sido arbitrária.

Ainda assim, Valdete explica que há muitos pedidos de reversão de justa causa de trabalhadores “desesperados porque não têm nem acesso ao seguro-desemprego e porque saíram do emprego sem receber nada. E via de regra, esses processos terminam ou em conciliação ou em reversão da justa causa, exatamente porque não há um motivo grave que justifique esse tipo de desligamento”.

Para o professor Krein, “num ambiente como esse e em meio a uma sociedade mais polarizada, obviamente que as tensões vão se colocando e podem gerar algum tipo de conflito — ou, como a empresa diz, de ‘indisciplina’. Mas, é preciso dizer que  fundamentalmente quem faz a demissão por justa causa não é o empregado, é o empregador”.

VERMELHO

https://vermelho.org.br/2024/04/23/demissoes-por-justa-causa-crescem-e-revelam-outra-face-da-precarizacao/

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Mercado eleva, mais uma vez, projeção de crescimento do PIB brasileiro para 2024

O Boletim Focus, com as previsões de economistas e analistas de mercado consultados pelo BC, também aponta expectativas otimistas para os anos seguintes.

por Cezar Xavier

O mercado financeiro brasileiro elevou, pela décima vez consecutiva, a projeção do crescimento da economia do país para o ano de 2024. De acordo com o boletim Focus divulgado hoje (23) pelo Banco Central (BC), a estimativa para o Produto Interno Bruto (PIB) agora é de 2,02%, em comparação com a projeção anterior de 1,95% há uma semana.

O Focus, que reúne as previsões de economistas e analistas de mercado consultados pelo BC, também aponta expectativas otimistas para os anos seguintes. Para 2025, a projeção é de um crescimento de 2%, um número que se repete desde as últimas 19 semanas. O mesmo índice é esperado para os anos de 2026 e 2027.

O mercado financeiro tem frequentemente errado e revisado suas projeções sobre o PIB e a inflação devido à complexidade e volatilidade do cenário econômico brasileiro, bem como às incertezas políticas, fiscais e relacionadas à conjuntura internacional. Esses fatores levam os analistas a adotarem um viés pessimista em suas previsões para mitigar riscos e incertezas.

Este é um dos elementos que levam o boletim a indicar um aumento na previsão da inflação para o ano de 2024. Os analistas consultados agora estimam que o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) encerre o ano em 3,73%, ligeiramente acima da previsão anterior de 3,71%.

Apesar do aumento na inflação, a estimativa para 2024 permanece dentro do intervalo de meta estabelecido pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), que é de 3%, com um intervalo de tolerância de 1,5 ponto percentual para cima ou para baixo.

Em relação à taxa básica de juros da economia, conhecida como Selic, o mercado projetou uma desaceleração no ritmo de queda. Os analistas agora preveem que a taxa Selic feche o ano em 9,5%, comparado à previsão anterior de 9,13% há uma semana.

O mercado ignora medidas de governo que estimulam o agronegócio, a indústria e o investimento produtivo, além da gestão direcionada da Petrobras, por exemplo, fatores que geram efeitos em cadeia sobre a economia e impactam o crescimento e a deflação.

Essa projeção reflete uma mudança no ritmo de cortes na Selic, já que o Comitê de Política Monetária (Copom) do BC sinalizou a possibilidade de não repetir o mesmo ritmo de redução nas duas últimas reuniões. Quando o Copom aumenta a taxa básica de juros, a finalidade é conter a demanda aquecida, enquanto a redução tem como objetivo estimular a atividade econômica.

Além disso, o boletim Focus também prevê um aumento no valor do câmbio em dólar. A moeda norte-americana é estimada para fechar o ano de 2024 em R$ 5,00, em comparação com a previsão anterior de R$ 4,95 há quatro semanas.

Para os anos seguintes, as projeções indicam uma tendência de valorização do dólar, com estimativas de R$ 5,05 para 2025 e R$ 5,10 para 2026. Esses números refletem a volatilidade e as incertezas do mercado cambial.

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https://vermelho.org.br/2024/04/23/mercado-eleva-mais-uma-vez-projecao-de-crescimento-do-pib-brasileiro-para-2024/

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O tempo não é mais senhor da razão, e sim um obstáculo a ela

Nas discussões sobre liberdade de expressão, fake news, intromissão de Elon Musk nos assuntos restritos à justiça brasileira, controle de conteúdo das redes e submissão das plataformas à legislação nacional há um componente que tem ficado de fora, embora seja de importância crucial para um bom encaminhamento da questão. Esse componente é o tempo.

Desde o advento da internet e seus subprodutos, como as redes sociais, mecanismos de neutralização da informação inverídica ou maliciosa, tais como o direito de resposta previsto na legislação que regula o uso dos meios de comunicação no Brasil e em diversas outras partes do mundo, perderam praticamente todo o sentido e mesmo a reduzida eficácia que ainda teriam. O direito de resposta virou mesmo foi um trambolho jurássico, diante da vertiginosa velocidade com que a informação trafega no hiperespaço.

Nós, da área da Comunicação, que lidamos diariamente com o assunto, bem conhecemos as limitações que envolvem as tentativas de correção, com base nos mecanismos atuais, de uma informação errada ou de conteúdo malicioso. Estudos diversos realizados nos mais conceituados institutos de pesquisa do mundo são unânimes na constatação de que o impacto e a devastação causados por uma informação errada ou maliciosa difundida por meio das redes sociais da internet é exponencialmente maior do que seu desmentido. No mais das vezes, sem exagero, o desmentido passa batido. E a pós-verdade, com seu enorme poder de fixação no imaginário, termina se impondo e se convertendo em verdade absoluta.

Ainda outro dia ouvi de uma senhora, vizinha aqui de casa, uma afirmação que já devia estar morando nos escaninhos do ridículo: “Não se deve tomar essas vacinas contra dengue ou Covid. Elas fazem um mal terrível”. Mas onde a senhora leu ou ouviu isso? “Recebi pelo whatsapp de fonte segura”, garantiu. E ponto final. Porque, depois que senta praça, não há verdade que neutralize a pós-verdade.

Costumo provocar meus alunos perguntando: Qual foi a última vez que vocês receberam o desmentido a uma fake news? A resposta invariavelmente tem sido: Nunca. E a razão é simples. Uma informação de conteúdo impactante, como costumam ser as fake news, tem um poder avassalador de atrair a atenção e de convencer o destinatário. Já o desmentido é invariavelmente pouco interessante e convincente, e na maioria absoluta das vezes é simplesmente inócuo porque destituído de atrativos que incentivem o destinatário a incorporar seu conteúdo e muito menos a distribuí-lo à sua rede de contatos. Por isso os desmentidos não circulam. A par disso há um obstáculo até aqui intransponível para dar agilidade e um mínimo de eficácia à correção da informação infundada ou propositadamente mentirosa: o tempo. Se o desmentido já é fraco e por vezes ineficaz, quando chega com atraso, menos eficaz se torna.

Sim, é merecedora de elogios a iniciativa da justiça eleitoral, ministro Alexandre de Moraes à frente, de disciplinar o uso da informação pelas redes sociais, sobretudo em períodos eleitorais, para conter abusos. Mas todo o esforço que vem sendo feito no enfrentamento da questão esbarra no obstáculo chamado tempo. Porque o arcabouço jurídico, com seus rituais de funcionamento, seus pareceres, recursos, contraditas, arrazoados etc. funciona fundamentalmente de forma analógica. Até porque é movido por pessoas que avaliam processos, dão pareceres, elaboram votos etc. E as pessoas são analógicas, é bom deixar claro. E, por isso, são lentas. Já as redes sociais e as plataformas operam no terreno da informação cibernética, à velocidade da luz. Esse confronto gera necessariamente um fosso na operosidade e eficácia da justiça que, como diz o bordão, quando atrasa não é mais justiça e por vezes se torna injustiça.

Daí porque o grande desafio do momento é conseguir algum meio capaz de permitir que os ritos processuais sejam mais rápidos para tentar, já nem digo se emparelhar, mas pelo menos se aproximar do ritmo da informação que trafega nas redes. É um desafio prodigioso, porque os avanços no desenvolvimento das tecnologias cibernéticas têm ocorrido em velocidade assustadora. Até outro dia a expressão “inteligência artificial” nem chegava a fazer sentido para grande parcela da população. Hoje, ela se popularizou tanto a ponto de se tornar componente do cotidiano de muita gente. Gente que opera um aplicativo como um ChatGPT desses com a desenvoltura com que descasca uma mexerica. A disponibilização massiva das ferramentas para o uso da IA para os mais diversos usos praticamente banalizou seu emprego.

Os tempos atuais são de espanto e apreensão, justa apreensão. Até porque, até agora, não se viu, não se leu, nem se ouviu uma iniciativa sequer capaz de dar mais agilidade aos procedimentos processuais da justiça brasileira em relação ao tema. Sequer um rito sumário para apreciação de denúncias de fake news durante as eleições foi objeto de debate nas cortes eleitorais ou no Congresso Nacional. Este último, aliás, vem empurrando o assunto com a barriga, com mais retrocessos que avanços. E até aqui não entendeu a importância de enfrentar a questão de peito aberto e com disposição de buscar um bom encaminhamento, inclusive levando em conta as legislações sobre o tema já adotadas em outros países.

Em relação aos crimes cometidos pelas redes sociais, o tempo não é mais o senhor da razão. Tornou-se, isto sim, um enorme obstáculo à razão e à aplicação da justiça.


O texto acima expressa a visão de quem o assina, não necessariamente do Congresso em Foco. Se você quer publicar algo sobre o mesmo tema, mas com um diferente ponto de vista, envie sua sugestão de texto para redacao@congressoemfoco.com.br.

AUTORIA

Paulo José Cunha

PAULO JOSÉ CUNHA Escritor, jornalista e professor da UnB. Foi repórter da Rede Globo, do Jornal do Brasil, de O Globo e também trabalhou na Rádio Nacional. Entre outros livros, escreveu A Noite das Reformas, sobre a extinção do AI 5.

CONGRESSO EM FOCO
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Lira encaminha pedido do Novo para cassar Glauber Braga, que reage: “Não vão nos intimidar”

O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), encaminhou ao Conselho de Ética o pedido de cassação do deputado Glauber Braga (Psol-RJ), movido pelo partido Novo. O partido alega que Glauber feriu o decoro parlamentar ao expulsar da Câmara, a chutes e empurrões, um integrante do Movimento Brasil Livre (MBL) no último dia 16.  Em vídeo publicado no X, Glauber afirmou que não será intimidado pelo processo de cassação nem retrocederá.

Segundo ele, o partido mente na representação ao dizer que Gabriel Costenaro, o militante que o provocou na Câmara, “dialogou pacificamente” com ele. “Mentira! Mentirosos! Se mentir dá perda de mandato, quem tinha que perder o mandato, então, era quem redigiu essa representação por parte do Novo”.

O deputado também declarou que não sabia que o militante era ligado ao Novo. “Eu nem sabia que esse rapaz da milícia fascista era do partido Novo, sabia que era do MBL, fiquei sabendo essa semana porque o próprio Marcel van Hattem disse na tribuna da Câmara”. “Estão juntinhos: MBL, partido Novo, PL, tentando constranger os seus inimigos políticos, mas não vai colar. Nós não vamos retroceder nas nossas posições. Se tem alguém que tem que ser responsabilizado, é esse marginal”, disse.

Com mais de 500 mil seguidores no Instagram, Gabriel Costenaro é um influenciador digital. Em seus vídeos, ele provoca deputados, jornalistas em transmissões ao vivo, estudantes universitários e militantes de esquerda durante manifestações. No vídeo (assista mais abaixo), é possível ver que o influenciador importuna o parlamentar, que primeiro revida com questionamentos. “Você é burro”, “sua mamãe é corrupta” e “você é fraco, não tem capacidade para bater nos outros” são algumas das frases ditas por Costenaro.

“Violência doméstica da sua parte. Seus seguidores não sabiam?”, questionou Glauber em referência a um caso de Costenaro contra a ex-companheira. O militante do MBL, porém, alegou que venceu o referido processo por “difamação”. O parlamentar também disse que o influenciador ameaçou a mãe de um militante do Psol.

Aos gritos de “põe para fora, deputado” e “vergonha”, Glauber começa a empurrar Gabriel Costenaro para fora do anexo da Câmara dos Deputados e lhe desfere um chute nas pernas. Alguns pessoas presentes tentam dissuadir o parlamentar, já do lado de fora, mas sem sucesso.

No mesmo dia, nas redes sociais, Glauber afirmou: “Não me arrependo absolutamente de nada do que fiz!”. “Esse sujeito do MBL tem histórico de agressão a mulheres. É a quinta provocação dele! Na quarta vez ele ameaçou a mãe de um militante nosso com mais de 70 anos dizendo que sabia onde ela morava”, ressaltou. “Nós não podemos aceitar esse tipo de intimidação de militante fascista do MBL. Não vamos aceitar. Eles tentam nos intimidar, tentam através do medo, fazer com que a gente recue, nós não vamos recuar para militante fascista, nem do MBL, nem de organização nenhuma”, complementou o deputado.

Aos gritos de “põe para fora, deputado” e “vergonha”, Glauber começa a empurrar Gabriel Costenaro para fora do anexo da Câmara dos Deputados e lhe desfere um chute nas pernas. Alguns homens tentam dissuadir o parlamentar, já do lado de fora, afirmando que “é isso que ele quer” e dizendo “não deixa esse babaca (sic) aparecer em cima de você, não, Glauber”.

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CCJ retira de pauta PL da autorização para estados legislarem sobre armas

Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados retirou da pauta desta terça-feira (23) um projeto de lei de autoria de sua presidente, deputada Caroline de Toni (PL-SC), que atribui aos estados e ao Distrito Federal a competência de legislar sobre controle, porte e posse de armas de fogo. O item foi adiado em atendimento a um pedido de vista.

Os principais interessados no projeto são os deputados ligados à Bancada da Bala, da qual pertencem não apenas a autora do texto, mas também o relator, deputado Paulo Bilynskyj (PL-SP). A frente parlamentar espera conseguir, com a delegação de competências sobre a questão, contornar as restrições estabelecidas em 2023 pelo governo federal, em especial no que diz respeito às normas de regulação dos registros de Caçador, Atirador desportivo e Atirador.

O projeto já possui parecer favorável da Comissão de Segurança Pública, restando apenas a análise da CCJ para avançar ao plenário. Interlocutores consideram fácil a sua aprovação no colegiado, mas pouco provável a inclusão em sessão plenária por afrontar diretamente tanto com a agenda do governo quanto com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF).

AUTORIA

Lucas Neiva

LUCAS NEIVA Repórter. Jornalista formado pelo UniCeub, foi repórter da edição impressa do Jornal de Brasília, onde atuou na editoria de Cidades.

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