por NCSTPR | 22/09/25 | Ultimas Notícias
Antônio Augusto Queiroz
A democracia brasileira se aproxima de um de seus momentos mais decisivos desde a redemocratização. As eleições de 2026, ainda que possam parecer distantes no horizonte político, já projetam suas longas sombras sobre o presente, definindo manobras, alianças e estratégias que moldarão o destino da nação. Este pleito será muito mais do que uma simples alternância de poder; será um referendo sobre o projeto de país que desejamos construir e uma batalha épica pela alma das instituições democráticas. No centro deste embate estarão dois cargos de importância capital: a Presidência da República e dois terços das cadeiras do Senado Federal. O resultado desta conjunção de forças terá o poder de acelerar o projeto de inclusão social e desenvolvimento soberano em curso ou de desmantelá-lo em favor de um projeto de poder autoritário, ultraliberal e alinhado submissamente a interesses geopolíticos externos.
A importância estratégica da eleição presidencial é evidente por si só. O Presidente da República é o condutor da nação, o chefe do Poder Executivo e o principal proponente de políticas públicas. No entanto, a partir de 2027, o cargo carregará um peso adicional e histórico: a prerrogativa de indicar, potencialmente, pelo menos três dos onze ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). A atual composição da Corte conta com ministros cuja aposentadoria compulsória se aproxima (Cármen Lúcia, Luiz Fux e Gilmar Mendes). As nomeações para estas vagas definirão o caráter jurídico e a orientação constitucional do mais alto tribunal do país para as próximas décadas.
Um presidente eleito pelo campo progressista, comprometido com o Estado Democrático de Direito, indicaria ministros com perfil técnico, idôneos e alinhados com a defesa intransigente da Constituição de 1988, garantindo a continuidade de uma jurisprudência que valoriza os direitos sociais, a proteção ambiental e as liberdades individuais. Por outro lado, a eleição de um candidato alinhado ao bolsonarismo, como já foi explicitamente prometido em diversos fóruns, teria um objetivo claro: instrumentalizar o STF. As indicações seriam feitas com um único propósito: criar uma maioria favorável a anistiar o ex-presidente Jair Bolsonaro e seus aliados mais próximos, além de promover uma guinada conservadora e revanchista na interpretação das leis, submetendo o Judiciário aos caprichos do Executivo.
Contudo, a presidência não age sozinha neste tabuleiro. O processo de nomeação e posse de um ministro do STF requer a aprovação da maioria absoluta do Senado Federal. É aqui que a eleição para a Casa legislativa adquire uma importância que, muitas vezes, passa despercebida pelo eleitorado médio, mas que é absolutamente vital. Em 2026, serão renovados dois terços dos 81 assentos do Senado. Esta eleição não definirá apenas uma maioria qualificada de 54 senadores, mas tem o potencial de forjar uma maioria de extrema direita capaz de alterar a própria estrutura de freios e contrapesos da República.
Caso a extrema direita, aglutinada em torno do bolsonarismo, consiga conquistar esta maioria qualificada, o cenário se tornaria profundamente sombrio. Um Senado com esta composição não seria apenas um coadjuvante complacente, mas um ator protagonista em um projeto de ruptura institucional. Além de chancelar ou bloquear as indicações presidenciais para o STF, esta maioria teria o poder de admitir a instauração, por 41 votos (maioria absoluta), de processo de impeachment contra ministros da Corte Suprema, com o consequente afastamento imediato por 180 dias, e o poder de condenar à perda do cargo por crime de responsabilidade aqueles considerados “indesejados”, por maioria qualificada de 54 votos (dois terços da Casa). Ameaças que hoje soam como bravatas de grupos radicais se transformariam em uma agenda legislativa concreta e assustadoramente viável. O Congresso Nacional, que deveria ser o guardião do processo democrático, se tornaria o seu algoz, promovendo um acerto de contas com o Judiciário e esvaziando a autonomia do STF.
Este não é um exercício de ficção política, mas uma possibilidade real que já está sendo organizada em gabinetes e em convenções partidárias. A polarização que marca o Brasil atual não se resume a Lula e Bolsonaro; é uma disputa entre dois projetos antagônicos de sociedade. De um lado, um presidente da República legitimamente eleito, empenhado em promover o desenvolvimento com distribuição de renda, a reindustrialização, a soberania nacional e a reinserção internacional do país como potência ambiental e pacificadora. Sua administração tem trabalhado para reconstruir as políticas públicas de inclusão social desmontadas no quadriênio anterior, recompor o orçamento para saúde e educação, e enfrentar a crise da fome que assolou milhões de brasileiros.
Do outro lado, governadores, parlamentares e uma vasta rede de influenciadores remam vigorosa e constantemente contra a maré do interesse nacional. Seu objetivo primordial não é legislar ou apresentar um projeto alternativo de governo; é defender e proteger um ex-presidente da República que deixou um legado de ódio, negacionismo da ciência, desprezo pela crise climática e ataques sistemáticos às instituições democráticas. Este mesmo ex-presidente foi condenado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e pelo Supremo Tribunal Federal (STF) por crimes eleitorais e inúmeros outros crimes, como organização criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, Golpe de Estado, dano qualificado pela violência e grave ameaça, e deterioração do patrimônio público tombado. A eleição de 2026 é, para este campo, uma questão de sobrevivência política e de impunidade. É uma tentativa de chegar ao poder não para governar para todos, mas para garantir que seus líderes nunca precisem responder perante a Justiça.
A harmonia entre os Poderes, um princípio basilar para o funcionamento de qualquer democracia madura, estará diretamente na cédula de votação. O atual governo, apesar de suas divergências naturais e saudáveis com o Legislativo e o Judiciário, opera dentro dos limites institucionais, respeitando a autonomia de cada poder. Já um governo bolsonarista, reeditado ou não em uma nova figura (Bolsonarismo em Bolsonaro), apostaria no conflito permanente como estratégia de governo. A escalada retórica, as ameaças veladas e o desrespeito às decisões judiciais seriam a tônica, criando um ambiente de instabilidade permanente que afugenta investimentos, paralisa o país e aprofunda as fraturas sociais.
Além do front institucional, as políticas públicas de caráter social estarão sob ameaça existencial. Programas como Bolsa Família, o Minha Casa Minha Vida, o fortalecimento do SUS, as políticas de cotas e de valorização do salário-mínimo são conquistas que ainda geram resistência em setores conservadores da sociedade. Um triunfo da extrema direita em 2026 significaria não uma mera revisão, mas um desmonte acelerado e deliberado desta rede de proteção social, em nome de um fundamentalismo de mercado que prega o Estado mínimo para os pobres e máximo para os ricos. O projeto é claro: a privatização de ativos estratégicos, a precarização das relações de trabalho e o fim de políticas de afirmação.
A submissão aos interesses estrangeiros, outro pilar do projeto bolsonarista, também voltaria com força total. Basta observar o apoio explícito e vergonhoso de seus líderes às medidas tarifárias impostas pelo governo estadunidense contra a indústria brasileira. Enquanto o governo atual trabalha para diversificar parcerias e fortalecer o Mercosul e os BRICS, o campo da extrema direita enxerga o Brasil como um mero apêndice subalterno do ocidente, disposto a abrir mão de sua soberania econômica e ambiental em troca de um lugar à mesa de potências que não veem nosso país como um igual, mas como uma colônia a ser explorada.
Portanto, não se enganem com a aparente calmaria ou com a distância temporal. A batalha de 2026 já começou. Cada discurso, cada votação no Congresso, cada manifestação nas redes sociais é um movimento neste grande jogo pelo futuro do Brasil. A pergunta que se coloca para cada cidadão é profunda: queremos um país soberano, democrático, inclusivo e com instituições fortes, ou optaremos por um projeto de poder que glorifica o conflito, a exclusão, a submissão e a impunidade?
A resposta não deverá ser dada apenas nas eleições de 2026. Ela precisa ser construída agora, na conscientização política do eleitorado, no fortalecimento da mídia independente, no engajamento da sociedade civil e na clara compreensão de que a democracia não é um dado adquirido, mas uma conquista diária que precisa ser defendida com unhas e dentes. O destino do Brasil não está escrito. Ele será, literalmente, votado. E cada voto contará não apenas para escolher um governante, mas para definir o que seremos como nação.
Jornalista, analista e consultor político. Mestre em Políticas Públicas e Governo (FGV)*
DIAP
https://diap.org.br/index.php/noticias/artigos/92414-a-batalha-das-eleicoes-de-2026-o-futuro-do-brasil-em-jogo
por NCSTPR | 17/09/25 | Ultimas Notícias
Ganhar centavos para realizar tarefas repetitivas, e muitas vezes incompreensíveis, é a realidade de milhares de trabalhadores brasileiros ligados ao chamado microtrabalho. Plataformas digitais bilionárias contratam pessoas para classificar imagens, transcrever áudios curtos ou moderar conteúdos. A denúncia é do psicólogo e professor da Universidade Estadual de Maringá, Matheus Viana Braz, em entrevista ao BdF Entrevista, da Rádio Brasil de Fato.
“Em 2020, nós mapeamos mais de 54 plataformas em operação no Brasil. Hoje, os estudos que temos feito mostram que o país se tornou um grande conservatório dessa força de trabalho precária, voltada sobretudo à produção de inteligência artificial”, afirma. Segundo ele, cerca de 80% do tempo de um projeto de machine learning (aprendizado de máquina) é destinado a essas tarefas invisíveis, realizadas longe dos holofotes e sem direitos trabalhistas.
O professor relata casos emblemáticos, como o de uma trabalhadora brasileira contratada para fotografar fezes de cachorro em casa, material usado para treinar robôs aspiradores a identificar sujeiras. Ela tirou 250 fotos em dois dias e recebeu menos de R$ 0,15 por imagem. Outro projeto pedia vídeos de crianças dormindo ou brincando, sem que os trabalhadores soubessem qual empresa utilizaria esse material.
“Essas tarefas são chamadas de ‘estranhas’ ou ‘confusas’ pelos próprios trabalhadores. Eles não sabem para quem estão trabalhando, nem qual é a finalidade do que fazem”, revela Braz. “O que vemos hoje é um novo estágio do capitalismo, onde empresas multibilionárias lucram a partir de uma exploração selvagem, invisível e sem garantias mínimas de direitos”, critica.
Impactos na saúde mental
Além da baixa remuneração, que em média não passa de R$ 600 por mês no Brasil, o isolamento e a repetição das tarefas provocam sofrimento, relata o psicólogo. “Há queixas de ansiedade, crises relacionadas à instabilidade financeira e perda de sentido no trabalho. A situação é ainda mais grave entre quem atua na moderação de conteúdos violentos e pornográficos, atividade extremamente nociva à saúde psíquica”, explica.
Pesquisas internacionais já identificaram casos de transtorno de estresse pós-traumático (TEPT) e burnout entre moderadores de conteúdo. No Brasil, segundo Braz, estudos estão em andamento para mapear esses impactos.
Falta de proteção e exploração global
Para o pesquisador, a precarização é acentuada porque muitas plataformas não têm sequer representação legal no país, dificultando a responsabilização judicial. Além disso, há uma lógica global de desigualdade. “Para uma mesma tarefa, um trabalhador brasileiro ganha US$ 3,50 por hora, um holandês US$ 12,50 e um filipino US$ 0,80”, compara.
Essa assimetria, observa, revela como o sul global subsidia com mão de obra barata o desenvolvimento tecnológico bilionário do norte do mundo. “Não existe inteligência artificial no mundo que prescinda de trabalho humano precário”, alerta.
Braz defende que a regulação não pode ser apenas nacional. “É preciso criar regras de compliance globais, para que as big techs sejam responsabilizadas por toda a sua cadeia produtiva, assim como já ocorre em setores, como o têxtil”, declara. Ele indica que a Organização Internacional do Trabalho (OIT) e o Parlamento Europeu já avançam em propostas nessa direção.
DM TEM DEBATE
https://www.dmtemdebate.com.br/capitalismo-de-plataforma-trabalhadores-recebem-centavos-para-treinar-inteligencia-artificial/
por NCSTPR | 17/09/25 | Ultimas Notícias
Daniele Moreira, advogada no escritório Martorelli Advogados, pontua que o acordo entre ambas as partes era considerado informal, mas que, com a reforma trabalhista, essa forma de demissão passou a trazer mais segurança para todos.
Da Redação
Neste ano, a norma que estabeleceu a reforma trabalhista completou oito anos de existência. A lei 13.467/17 trouxe mudanças significativas e importantes, garantindo maior segurança e vantagens para as empresas e os trabalhadores.
Uma das alterações introduzidas foi o direito à demissão por acordo, uma forma de término do contrato de trabalho em que empregado e empregador, de forma voluntária, decidem encerrá-lo. Nesse caso, parte das verbas rescisórias é assegurada, conforme previsto no artigo 484-A da CLT.
Antes da reforma trabalhista, a demissão por acordo não existia formalmente na CLT, sendo apenas um acordo informal entre empregador e empregado, sem respaldo legal perante a Justiça do Trabalho.
“O ato era declarado nulo por tentar fraudar a legislação. Contudo, com a mudança, esse tipo de demissão, além de se tornar legal, tornou-se vantajoso para a empresa em termos financeiros, pois há a redução dos custos com o pagamento das verbas rescisórias no desligamento do empregado, em comparação com uma demissão sem justa causa, como a multa do FGTS e o aviso prévio indenizado, que passam a ser pagos pela metade”, explica Daniele Moreira, advogada especialista em Direito Trabalhista e atuante no escritório Martorelli Advogados.
“Por outro lado, outro aspecto positivo é o fato de ser uma decisão mútua, o que normalmente evita chances de conflitos judiciais, já que o empregado está ciente do que está recebendo”, completa Daniele.
Na demissão por acordo, o trabalhador mantém parte dos seus direitos, como: saldo de salário, férias vencidas mais um terço constitucional, férias proporcionais e 13º salário proporcional.
Já de forma reduzida, são pagos o aviso prévio indenizado pela metade e a multa do FGTS de 20%, em vez de 40%, além do direito ao saque de até 80% do FGTS, sendo retidos os 20% restantes. Contudo, nessa modalidade, o trabalhador perde o direito ao seguro-desemprego.
A especialista também orienta as empresas sobre como formalizar o acordo, a fim de evitar futuros conflitos trabalhistas.
“Existe um modelo ideal que deve ser seguido pela empresa, como uma carta escrita de próprio punho, intitulada ‘Rescisão por comum acordo do Contrato de Trabalho’, com base no artigo 484-A da CLT. Nela, devem constar os dados do empregador e do empregado, deixando claro que ambas as partes concordam com a rescisão do contrato. O empregado deve declarar estar ciente das verbas que irá receber”, afirma.
“Ao final, é necessária a assinatura da empresa, do empregado e de duas testemunhas. Além disso, é fundamental que a empresa mantenha os comprovantes de pagamento, extrato do FGTS e comprovante de entrega das guias”, esclarece.
Daniele ainda explica as diferenças entre o pedido de demissão e a demissão por acordo. “A principal diferença entre o pedido de demissão e a demissão por acordo consiste na iniciativa e nas consequências financeiras. No pedido de demissão, a iniciativa parte do empregado, que não terá direito à multa de 40% do FGTS, nem poderá sacar o valor depositado, além de precisar cumprir o aviso prévio ou indenizar o empregador, caso não o cumpra”.
“Na demissão por acordo, a decisão é mútua, sendo permitido que o trabalhador saque até 80% do saldo do FGTS e receba metade da multa rescisória, além do aviso prévio pago pela metade, se for indenizado. Em ambas as modalidades, não haverá direito ao seguro-desemprego”, conclui.
MIGALHAS
https://www.migalhas.com.br/quentes/440222/especialista-explica-vantagens-em-demissao-por-acordo
por NCSTPR | 17/09/25 | Ultimas Notícias
O Supremo Tribunal Federal (STF) deu início a um julgamento que pode definir o futuro de milhões de trabalhadores brasileiros na era da inteligência artificial e dos robôs. Trata-se da Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO) 73, que acusa o Congresso Nacional de falhar em sua obrigação de criar uma lei para regulamentar a proteção dos trabalhadores contra a automação, um direito previsto na Constituição Federal de 1988.
A sessão, ocorrida em agosto de 2024, foi interrompida após a apresentação do relatório pelo ministro relator, Luís Roberto Barroso, e uma sustentação oral da Central Única dos Trabalhadores (CUT). O julgamento foi suspenso e será retomado em data futura, estando previsto para 26 de setembro a possibilidade de continuação em plenário virtual.
O Cerne da Questão Constitucional
O embate judicial gira em torno do artigo 7º, inciso XXVII, da Constituição, que inclui entre os direitos dos trabalhadores urbanos e rurais “proteção em face da automação, na forma da lei”. A Procuradoria-Geral da República (PGR), autora da ação, argumenta que a Constituição estabeleceu o direito, mas condicionou sua aplicação prática à edição de uma lei específica pelo Congresso Nacional.
A PGR sustenta que a omissão legislativa persiste por mais de três décadas, tornando-se inconstitucional, pois impede o exercício de um direito social fundamental. A ação pede que o STF reconheça essa mora e estipule um prazo para que o Congresso elabore a norma regulamentadora.
Por Que Este Julgamento é Crucial?
A discussão ganha urgência diante do avanço acelerado de tecnologias como robótica e inteligência artificial no mercado de trabalho. Diferentes estudos e relatórios globais, como os do Fórum Econômico Mundial e da McKinsey Global Institute, alertam que a automação tende a substituir um número significativo de postos de trabalho em diversas áreas, da indústria aos serviços.
Sem uma legislação que estabeleça regras claras, os trabalhadores ficam vulneráveis a demissões em massa sem qualquer amparo ou compensação. A regulamentação buscada visa preservar o equilíbrio entre o capital e o trabalho, assegurando que a modernização produtiva não ocorra à custa de direitos básicos, como emprego decente, recolocação no mercado e formação profissional.
Os Próximos Passos
Com o julgamento interrompido, a Corte aguarda a nova data para retomada dos trabalhos. Na sessão, a CUT participou como amicus curiae (amigo da corte), instituição que é admitida no processo para oferecer subsídios técnicos. A entidade defendeu a tese de que a omissão do Legislativo é grave e que a Corte deve intervir para garantir a efetividade da norma constitucional.
Caso o STF acolha os argumentos da PGR, a decisão terá um caráter mandamental, ordenando que o Congresso Nacional cumpra seu dever constitucional dentro de um período determinado, sob pena de descumprir uma ordem judicial.
DIAP
https://diap.org.br/index.php/noticias/noticias/92408-stf-analisa-obrigacao-do-congresso-em-regular-impacto-da-automacao-no-emprego
por NCSTPR | 17/09/25 | Ultimas Notícias
Proposta do deputado Jonas Donizette visa eliminar exigência de comprovação de hipossuficiência financeira para entidades sindicais atuarem como substitutos processuais
Um projeto de lei em tramitação no Congresso Nacional pode facilitar o acesso à Justiça por parte de sindicatos em ações coletivas trabalhistas. O PL 4513/2025, de autoria do deputado Jonas Donizette (PSB-SP), propõe alterar a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) para garantir a concessão de justiça gratuita aos sindicatos que atuam como substitutos processuais, independentemente da comprovação de hipossuficiência financeira.
A proposta acrescenta um parágrafo ao art. 790 da CLT, estabelecendo que, nas ações coletivas movidas por sindicatos, a gratuidade de justiça será concedida sem a necessidade de demonstração de insuficiência de recursos. A única exceção seria nos casos de comprovada má-fé por parte da entidade sindical.
Fortalecimento da atuação coletiva
Na justificativa do projeto, o deputado argumenta que a exigência atual de comprovação de hipossuficiência econômica tem criado “entraves desnecessários ao acesso à Justiça”, reduzindo a efetividade das ações coletivas e enfraquecendo o papel do sindicato como representante legítimo da categoria.
Donizette defende que a medida busca alinhar a legislação trabalhista à realidade da atuação sindical, assegurando que “as demandas coletivas não sejam inviabilizadas por obstáculos formais incompatíveis com o princípio do amplo acesso à Justiça”.
Base em entendimento jurisprudencial
O projeto encontra respaldo em recente decisão do Tribunal Superior do Trabalho (TST). No julgamento do processo nº 0000992-21.2023.5.07.0038, a 2ª Turma do TST, sob relatoria da ministra Delaíde Miranda Arantes, entendeu que, em se tratando de substituição processual, aplicam-se as garantias previstas no art. 18 da Lei da Ação Civil Pública e no art. 87 do Código de Defesa do Consumidor.
Em sua decisão, a ministra destacou que “o objetivo do microsistema legal supracitado é incentivar a promoção da defesa dos direitos e interesses coletivos e individuais da categoria profissional, de modo a tornar eficaz a atuação sindical no conflito entre o capital e o trabalho”.
Harmonização com princípios constitucionais
A proposta busca harmonizar o processo coletivo trabalhista com a evolução jurisprudencial, conferindo maior segurança jurídica e reforçando os princípios constitucionais do acesso à justiça (art. 5º, XXXV), da ampla defesa (art. 5º, LV) e da valorização do trabalho humano (art. 170, caput).
O parlamentar conclama seus pares a apoiarem a aprovação do projeto, classificando-o como “medida legislativa que fortalece a atuação sindical, garante efetividade às ações coletivas trabalhistas e promove o pleno acesso à justiça social”.
O PL 4513/2025 aguarda designação de relator e início da tramitação nas comissões temáticas da Câmara dos Deputados.
DIAP
https://diap.org.br/index.php/noticias/noticias/92409-pl-4513-2025-propoe-gratuidade-de-justica-para-sindicatos-em-acoes-coletivas
por NCSTPR | 17/09/25 | Ultimas Notícias
O Direito do Trabalho atua como ferramenta civilizatória para equalizar a assimetria na relação entre capital e trabalho, impondo um patamar mínimo de dignidade fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, CF/88), nos valores sociais do trabalho (art. 1º, IV, CF/88) e na função social da propriedade e do contrato (arts. 5º, XXIII, e 170, III, CF/88).
Contudo, uma ardilosa engenharia jurídica tem utilizado inovações tecnológicas e terminológicas, como “parceria” e “economia compartilhada”, para elidir a incidência da legislação protetiva e perpetuar a precarização do trabalho. Nesse contexto, o modelo de negócio das plataformas digitais, especificamente o iFood, que utiliza Operadores Logísticos (OLs) para gerenciar entregadores, representa um caso emblemático que demanda rigorosa análise jurídica.
A discussão central não reside no modelo de contratação direta pela plataforma, conhecido como Nuvem, cuja natureza jurídica aguarda definição pelo Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário (RE) 1.446.336 (Tema 1291), mas na estrutura que envolve os Operadores Logísticos. Nesse arranjo, a plataforma firma um contrato de “intermediação” com uma empresa terceira (o OL), que aloca entregadores em locais e horários de alta demanda definidos pela plataforma.
A questão a ser respondida é se a plataforma, ao se beneficiar desse trabalho, possui responsabilidade sobre os créditos trabalhistas na hipótese de reconhecimento do vínculo empregatício entre o entregador e o Operador Logístico, especialmente diante de decisões judiciais que a isentam com base na premissa de uma relação jurídica de índole meramente comercial.
A defesa das plataformas assenta-se na premissa de duas relações jurídicas autônomas: uma, de natureza civil-comercial, entre a plataforma e o OL; outra, de emprego, entre o OL e o entregador. Tal construção, no entanto, não resiste à aplicação do princípio da primazia da realidade sobre a forma, norteador do Direito do Trabalho e positivado no art. 9º da CLT.
A análise fática revela que o Operador Logístico não é um parceiro comercial autônomo com carteira de clientes diversificada; ao contrário, funciona como uma entidade interposta, desprovida de autonomia econômica e gerencial, criada com o propósito principal de servir como mero escudo patrimonial para a plataforma, absorvendo o passivo trabalhista e isolando o núcleo do poder econômico. Trata-se, em verdade, de manifesta fraude à legislação trabalhista por interposta pessoa, destinada a frustrar a aplicação da legislação protetiva.
A análise do “Contrato de Intermediação” firmado entre a plataforma e o OL revela a falácia dessa autonomia. Cláusulas que obrigam o OL a executar as entregas nos “moldes” e a submeter os entregadores a “treinamentos” definidos pela plataforma demonstram um controle sobre o modo de execução do serviço, e não a mera aquisição de um resultado, caracterizando ingerência direta na forma de execução do serviço.
Por outro lado, a previsão de que a plataforma pode “penalizar” o OL por descumprimento dos níveis de serviço exigidos revela o exercício do poder diretivo e disciplinar, típico de uma relação hierarquizada, e não a resolução de um contrato civil entre pares.
De forma crucial, a cláusula que outorga à plataforma o poder de exigir documentos e reter pagamentos para garantir o cumprimento das obrigações trabalhistas pelo OL configura, em si, uma confissão contratual de sua posição como garante final das obrigações, ao se reservar um poder-dever fiscalizatório. Ao se reservar esse poder e, posteriormente, falhar em exercê-lo de modo eficaz, a plataforma materializa sua culpa in vigilando de forma documentalmente provada.
Para além da realidade fática, a tese de irresponsabilidade ignora o arcabouço normativo aplicável. A Lei 12.009/2009 (Lei do Motofrete) é taxativa ao se referir àquele que “firmar contrato de prestação continuada de serviço com condutor de moto-frete”. A relação estabelecida pela plataforma, que depende da disponibilidade ininterrupta de entregadores gerenciados pelo OL, enquadra-se a essa hipótese normativa. A referida lei estabelece, em seus artigos 6º e 7º, a responsabilidade da contratante dos serviços, sujeitando-a inclusive a sanções trabalhistas.
Adicionalmente, a jurisprudência pacificada do Tribunal Superior do Trabalho, consolidada na Súmula 331, oferece fundamento para a responsabilização subsidiária, tratando a plataforma como tomadora de serviços que se beneficiou do trabalho prestado por meio de uma empresa interposta, cuja inadimplência atrai o dever de reparação.
A abstração dessas teses jurídicas contrasta com a realidade vivida pelos trabalhadores. Situações corriqueiras, como a de entregadores acidentados, sem registro em carteira de trabalho e desprovidos de qualquer amparo previdenciário, ilustram o dano concreto e a vulnerabilidade extrema gerados por essa engenharia contratual.
A ficção jurídica que isola a plataforma da relação de trabalho não protege o trabalhador; ao contrário, o expõe ao desamparo absoluto diante do infortúnio, negando-lhe o acesso aos direitos sociais trabalhistas e previdenciários mais basilares, que conformam o mínimo existencial do trabalhador (arts. 6º e 7º, da CF/88).
Mesmo que se admitisse, a título de argumentação, a natureza puramente civil do contrato entre a plataforma e o OL, a responsabilidade da empresa digital permaneceria. Os princípios da função social do contrato e da boa-fé objetiva (arts. 421 e 422 do Código Civil) impõem deveres de proteção a terceiros afetados pela relação contratual.
Ao prever em contrato seu poder de fiscalização sobre as obrigações trabalhistas da contratada e se omitir, a plataforma viola esses deveres anexos, consubstanciando, ainda, o abuso de direito, na modalidade de ato ilícito equiparado (art. 187 do Código Civil).
Ademais, o paradigma global de devida diligência em direitos humanos, refletido nos Princípios de Ruggie da ONU e internalizado no ordenamento pátrio (Portaria Interministerial MTE/MDHC/MIR 18/2024), exige que as empresas previnam e remediem os impactos adversos de suas operações. Estruturar um modelo de negócio que fomenta a precarização e se apoia em intermediários insolventes constitui uma falha manifesta nesse dever, atraindo a responsabilidade civil de reparar integralmente os danos causados, nos termos dos arts. 186, 187 e 927 do Código Civil.
Embora a responsabilização subsidiária represente o patamar mínimo de proteção a ser garantido, uma análise mais aprofundada da estrutura do negócio revela que a solução jurídica mais adequada é a da responsabilidade solidária. A figura do Operador Logístico não representa uma terceirização lícita, mas um arranjo concebido com o propósito fraudulento de pulverizar a figura do empregador real e, assim, frustrar a aplicação da lei (art. 9º da CLT).
A plataforma digital não atua como mera tomadora, mas como a verdadeira gestora e beneficiária de toda a cadeia produtiva, controlando a tecnologia, a marca, os clientes e, em última análise, as condições de trabalho. Configura-se, assim, o grupo econômico por coordenação (art. 2º, §§ 2º e 3º, da CLT), no qual empresas com personalidades jurídicas distintas atuam sob um comando fático unificado. A própria Lei do Motofrete, aliás, já aponta para a solidariedade.
Portanto, reconhecer a responsabilidade solidária da plataforma é a única resposta jurídica que corresponde à realidade econômica, impondo o custo real à precarização calculada e promovendo um efetivo desestímulo à perpetuação de modelos de negócio que violam a ordem jurídica trabalhista.
Nara Araújo Gomes de Castro é analista judiciária no TRT-12. Pós-graduada em Direito do Trabalho pela PUC-Minas e graduada em Direito pela Universidade Federal de Viçosa
DM TEM DEBATE
https://www.dmtemdebate.com.br/responsabilidade-juridica-das-plataformas-na-intermediacao-do-trabalho-de-entregadores/