por NCSTPR | 27/10/25 | Ultimas Notícias
Em setembro, repercutiu na mídia uma decisão da 8ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST), em Recurso de Revista[1], em que se discutia a validade de convenção coletiva firmada entre entidades representativas de empregadores e empregadas domésticas.[2] Partindo dessa decisão, esse texto se propõe a refletir sobre o direito à negociação coletiva de trabalhadoras domésticas, bem como sobre as funções do direito do trabalho.
O direito do trabalho brasileiro se dedicou nas suas origens especialmente à regulação de trabalhadores urbanos, na indústria e serviços. A Constituição Federal de 1988 avançou no alargamento formal desse escopo, equiparando trabalhadores urbanos e rurais e listando mais de 30 direitos individuais e coletivos a eles. No entanto, em relação às trabalhadoras domésticas, a evolução foi mais tímida, garantindo-se tão somente nove direitos.
Anteriormente, a Lei 5.859 de 1972 havia reconhecido direitos à categoria, de maneira rasa e insuficiente. As demandas por ampliação de direitos ganharam novos contornos quando trabalhadoras domésticas brasileiras se envolveram diretamente na adoção da Convenção 189 – Convenção sobre Trabalhadores e Trabalhadoras Domésticas junto à Organização Internacional do Trabalho (OIT) (2011).
No plano interno, a Emenda Constitucional 72 de 2013 foi adotada expandindo de 9 para 25 os direitos reconhecidos para essas trabalhadoras. Esse aumento substancial contemplou não somente direitos individuais, mas coletivos: o art. 7º, XXVI, prevê o reconhecimento das convenções e acordos coletivos de trabalho.
Além do texto constitucional, a Convenção 189 da OIT, ratificada pelo Brasil em 2018, determina que se respeite “(a) a liberdade de associação e a liberdade sindical e o reconhecimento efetivo do direito à negociação coletiva […]” (art. 3º).
Nesse sentido, o direito à negociação coletiva da categoria foi reconhecido pela Constituição Federal e também pela Convenção 189 da OIT. Esse direito, todavia, não foi regulamentado pela Lei Complementar 150 de 2015, como foram os demais, tornando a sua efetivação uma questão ainda mais complexa.
Para ilustrar, tomamos por base a decisão proferida pelo TST, mencionada no início deste texto. O caso invoca o reconhecimento da categoria econômica dos empregadores domésticos como contraponto à categoria profissional.
Esses conceitos foram estabelecidos na CLT, no art. 511. Categoria econômica refere-se à solidariedade de interesses econômicos, como empresários que realizam atividades em um mesmo setor. Por sua vez, a categoria profissional diz respeito aos trabalhadores empregados em atividades econômicas iguais, similares ou conexas.
Essas definições datam dos anos 1940, o que não é um argumento para sua invalidade, mas um convite para refletir quem eram trabalhadores e empregadores na época. Um olhar atento percebe que trabalhadoras domésticas não eram sequer reconhecidas como profissionais e, portanto, excluídas da CLT.
Na sessão da 8ª Turma do TST, o desembargador Camargo Rodrigues de Souza reconheceu a dificuldade do conceito de categoria econômica acomodar empregadores domésticos, pela finalidade não lucrativa. Não obstante, para conferir-lhe eficácia, afirmou ser preciso “superar isso” e assegurar a possibilidade de negociação.
Em contrapartida, os ministros Pinto Martins e Dezena da Silva apresentaram divergência, não vislumbrando a possibilidade de negociação coletiva. Nas palavras do ministro Pinto Martins, “não existe categoria econômica, [uma vez que] não existe interesse de lucro”. Consequentemente, a decisão negou o direito à negociação coletiva, contrariando a Constituição e a Convenção da OIT.
É fato que trabalho doméstico é um ‘trabalho como nenhum outro’ já que que realizado no âmbito doméstico, permeado por intimidade e proximidade próprias de um trabalho de cuidado. No entanto, o trabalho doméstico é igualmente um ‘trabalho como qualquer outro’ pelas similaridades com outros trabalhadores.[3] Há caminhos para pensar um tratamento igualitário que o reconheça como um ‘trabalho como nenhum outro, trabalho como qualquer outro’? Para nós, a resposta é sim.
Primeiro, frisamos que o reconhecimento das negociações coletivas é um direito assegurado na Constituição e na Convenção nº 189 da OIT. São normas de hierarquia superior à própria CLT, com status constitucional e supralegal, respectivamente.[4] Assim, há amparo constitucional e convencional para se reconhecer a negociação coletiva da categoria.
Segundo, considerando que a dinâmica da organização e representação sindical de trabalhadoras domésticas e empregadores domésticos mimetiza a dinâmica das demais categorias – inclusive com registro das entidades sindicais no Ministério do Trabalho e Emprego –, seria juridicamente possível se valer do art. 8º da CLT para fundamentar o reconhecimento da entidade sindical de empregadores domésticos e, consequentemente, a negociação coletiva.
O art. 8º da CLT dispõe que, na falta de disposições legais ou contratuais, a Justiça do trabalho decidirá o caso “[…] pela jurisprudência, por analogia, por equidade e outros princípios e normas gerais de direito, principalmente do direito do trabalho, e, ainda, de acordo com os usos e costumes, o direito comparado […]”.
Assim, seria viável recorrer ao mecanismo da analogia para estender a formalidade procedimental de formação de uma categoria por empregadores domésticos, à luz do art. 511 da CLT. Valer-se desse mecanismo não seria novidade para o tribunal, que se fundou na analogia para estender aos digitadores a pausa garantida no art. 72 da CLT a trabalhadores em serviços de mecanografia (Súmula 346 do TST). A equidade também poderia servir de fundamento, pois permite a “suavização do rigor da norma abstrata, tendo em vista as circunstâncias específicas do caso concreto posto a exame judicial”.[5]
Por fim, também poderia ser útil o direito comparado, já que trabalhadoras e empregadores domésticos negociam coletivamente em outras jurisdições, como França[6] e Itália[7]. Há, portanto, fundamentos jurídicos que sustentam a possibilidade da negociação coletiva da categoria.
A Justiça do Trabalho sempre teve uma vocação de promoção da justiça social. Reconhecer a negociação coletiva das trabalhadoras domésticas é uma oportunidade de reforçar esse compromisso, além de contribuir para saldar uma dívida histórica que o direito do trabalho brasileiro tem com a categoria.
[1] Processo nº 11495-35.2021.5.15.0140.
[2] Ao longo do texto, as autoras optaram por adotar o feminino universal já que se trata de um trabalho desempenhado majoritariamente por mulheres.
[3] BLACKETT, A. Everyday transgressions: domestic worker‘s transnational challenge to international labour law. Ithaca: ILR Press, 2019.
[4] Entendimento do STF no RE 466.343, em que se definiu que tratados sobre direitos humanos não aprovados conforme o rito do artigo 5º, §3º da CF possuem hierarquia supralegal (e infraconstitucional).
[5] DELGADO, M. G. Curso de direito do trabalho. 18 ed. São Paulo: LTr, 2019, p. 207.
[6] MAILLARD, S; ENCINAS DE MUÑAGORRI, R. Le travail domestique en droit social: unité ou fragmentation ? Droit Social, v. 9, p. 668-673, 2022.
[7] SEIFFARTH, M. Collective bargaining in domestic work and its contribution to regulation and formalization in Italy. International Labour Review, v. 162, n. 3, p. 505-528, 2023.
Olívia de Quintana Pasqualeto é professora da Escola de Direito de São Paulo da FGV com pós-doutorado, doutorado e mestrado em Direito do Trabalho e da Seguridade Social pela Faculdade de Direito da USP
Catharina Lopes Scodro é doutoranda em Direito do Trabalho pela Universidade de Estrasburgo e pelo Centro Nacional Francês de Pesquisa Científica (CNRS). Mestra pela Faculdade de Direito de Ribeirão Preto da USP
DM TEM DEBATE
https://www.dmtemdebate.com.br/desigualdade-de-direitos-e-a-negociacao-coletiva-das-trabalhadoras-domesticas/
por NCSTPR | 27/10/25 | Ultimas Notícias
Audiência pública reuniu trabalhadores e parlamentares para discutir o PL 733/25, que atualiza a Lei dos Portos de 2013 e redefine regras de regulação, contratação e licenciamento ambiental
A comissão especial da Câmara dos Deputados que analisa o novo marco regulatório do setor portuário brasileiro (PL 733/25) realizou, na última quarta-feira (22), audiência pública com representantes dos trabalhadores para debater os impactos do novo marco portuário.
O objetivo foi discutir as condições de trabalho e os efeitos das mudanças previstas no projeto de lei sobre a rotina das operações portuárias.
O debate, solicitado por diversos parlamentares, faz parte do ciclo de discussões que antecede a votação do texto ainda neste ano. As informações são da Agência Câmara.
A comissão especial já realizou, desde a instalação do colegiado, 8 audiências públicas, com esta, além de seminário estadual, em Salvador, Porto-Cidade, no último sábado (25).
O que muda com o PL
O PL 733/25 propõe a substituição da Lei dos Portos — Lei 12.815 —, em vigor desde 2013. Com 151 artigos, o projeto revisa regras de regulação do setor, precificação dos serviços, contratação de mão de obra e licenciamento ambiental, além de propor novos mecanismos de gestão e governança portuária.
De autoria do deputado Leur Lomanto Júnior (União-BA), a proposta tem como base anteprojeto elaborado por comissão de juristas criada pela própria Câmara dos Deputados.
A ideia é alinhar a legislação às transformações logísticas, ambientais e tecnológicas que impactam o comércio marítimo e a infraestrutura portuária.
Comissão e tramitação
Instalada em 9 de julho, a Comissão Especial do Marco Portuário é presidida pelo deputado Murilo Galdino (Republicanos-PB), que espera votar a proposta até o fim do ano.
O relator, deputado Arthur Maia (União-BA), tem conduzido as negociações com representantes de trabalhadores, governo e empresários para buscar equilíbrio entre modernização e proteção social.
Segundo Maia, o desafio é “garantir eficiência e competitividade sem fragilizar os direitos trabalhistas”, e tenta conciliar interesses públicos e privados num setor estratégico para a economia brasileira.
10 anos após a Lei dos Portos
A atualização da legislação ocorre 10 anos depois da Lei 12.815/13, sancionada durante o governo Dilma Rousseff (PT).
À época, a medida buscava abrir o setor à iniciativa privada e simplificar a gestão dos terminais, mas enfrentou forte oposição sindical, que via risco de precarização da mão de obra e enfraquecimento dos portos públicos.
Com o novo projeto, o Congresso volta a debater quem deve controlar e operar os portos brasileiros — o Estado, as empresas privadas ou um modelo misto.
O tema divide opiniões e coloca novamente em pauta a sustentabilidade trabalhista e ambiental das atividades portuárias.
Peso econômico dos portos
O sistema portuário brasileiro movimenta cerca de 95% do comércio exterior do País, segundo dados da Antaq (Agência Nacional de Transportes Aquaviários). Em 2024, os portos públicos e privados somaram mais de 1,3 bilhão de toneladas de cargas, movimentando cerca de R$ 500 bilhões em mercadorias.
Além do impacto direto na balança comercial, o setor gera centenas de milhares de empregos diretos e indiretos, sendo essencial para cadeias produtivas como mineração, agronegócio, combustíveis e indústria de transformação.
Por essa relevância, o debate sobre o novo
DIAP
https://diap.org.br/index.php/noticias/noticias/92499-camara-debate-novo-marco-portuario-e-reacende-disputa-entre-modernizacao-e-direitos-trabalhistas
por NCSTPR | 27/10/25 | Ultimas Notícias
O sindicalismo é contemporâneo da modernidade — e continua sendo o escudo que impede o trabalhador de voltar ao tempo dos senhores e servos.
Marcos Verlaine*
Os sindicatos não são resquício do passado — são uma das maiores invenções humanas e conquistas da modernidade. O sindicato é avanço civilizatório.
Como lembra Antônio Augusto de Queiroz, em sua cartilha “Para que serve e o que faz o movimento sindical” (Diap, 2017)1, o sindicalismo nasceu da necessidade de equilíbrio entre capital e trabalho, num mundo que transformou o ser humano em força produtiva descartável.
Sem o sindicato, o trabalhador enfrenta sozinho o poder econômico, jurídico e político do capital.
O movimento sindical é, portanto, a forma organizada da resistência, o instrumento que impõe limites ao lucro e faz do trabalho espaço de dignidade — e não de submissão e exploração desmedida.
Voz que protege o trabalhador
O papel do sindicato vai muito além das negociações salariais. Esse instrumento do trabalhador representa, defende e educa.
Representa, às mesas de negociação; defende os direitos conquistados; e educa para a consciência de classe e a cidadania ativa.
Foi a luta sindical que garantiu: jornada de 8 horas, 13º salário, férias e descanso remunerado, licença-maternidade e paternidade, Previdência e Seguridade Social.
Sem essa força coletiva, a história seria outra: o lucro seguiria sem limites, e o trabalhador teria de “pagar pelo ar que respira”, como provoca o autor deste — metáfora precisa para o que seria a vida sem contrapoder social.
Sindicalismo é modernidade
O sindicalismo é filho da Revolução Industrial (1760-1840) e irmão da democracia moderna2.
Nasce no mesmo impulso civilizatório que reconhece direitos, organiza o Estado e limita o poder econômico.
Por isso, atacar os sindicatos é negar a própria modernidade.
Nas novas formas de trabalho — aplicativos, plataformas, contratos precários —, o sindicato é o único elo capaz de transformar o trabalhador isolado em sujeito político.
Não é o passado que o sindicalismo representa, mas o futuro possível do trabalho humano.
Sem organização, não há liberdade
A história comprova: onde o movimento sindical é forte, há menos desigualdade, maior redistribuição de renda e mais democracia.
Onde é enfraquecido, prosperam o medo, o individualismo e o retrocesso.
O sindicato é a instituição que dá voz àqueles que vivem do próprio esforço — a tradução concreta da palavra “solidariedade”.
Não há liberdade no trabalho sem organização coletiva. Não há cidadania sem sindicalismo. Não há democracia sem sindicalismo.
O que o capital teme
O que o capital teme no sindicato não é a greve, mas a consciência.
Trabalhador que entende seu papel na engrenagem social é menos manipulável, mais exigente e mais livre.
É isso que o sindicalismo promove: a emancipação pelo coletivo.
É por isso que, em todos os momentos históricos, os sindicatos foram atacados pelos mesmos interesses que exploram o trabalho e concentram a renda.
Mas também é por isso que seguem vivos — porque representam a essência do direito à dignidade.
Respirar é um ato político
O sindicalismo é o que resta de moderno numa sociedade que insiste em retroceder.
Enquanto houver exploração, haverá sindicato — e será esse o primeiro a lutar para que ninguém precise pedir licença para viver, trabalhar ou respirar.
Porque, sem sindicatos, até o ar teria dono.
(*) Jornalista, analista político e assessor parlamentar do Diap
___________________
1 Antônio Augusto de Queiroz — “Para que serve e o que faz o movimento sindical”, publicado pelo Diap (Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar), 2017, 3ª edição atualizada e ampliada.
2 A concepção de democracia moderna surgiu após as revoluções Americana (1776) e Francesa (1789), que romperam com o Antigo Regime absolutista.
DM TEM DEBATE
https://diap.org.br/index.php/noticias/artigos/92497-sem-sindicatos-ate-o-ar-teria-dono
por NCSTPR | 27/10/25 | Ultimas Notícias
O plano visa ampliar a inclusão e combater a discriminação contra pessoas LGBTQIA+ no ambiente de trabalho.
O governo federal instituiu o Plano Nacional de Trabalho Digno LGBTQIA+, por meio da Portaria Conjunta nº 4/2025, elaborada em parceria entre o Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania e o Ministério do Trabalho e Emprego. A iniciativa busca promover a inclusão social e profissional de pessoas LGBTQIA+, fortalecendo sua autonomia econômica e cidadania.
O plano define trabalho digno como o direito de exercer uma atividade produtiva em condições de liberdade, equidade e dignidade, com remuneração justa, ambiente seguro, proteção social e oportunidades de desenvolvimento pessoal e de integração social.
Entre os principais objetivos estão reduzir as barreiras de acesso e permanência de pessoas LGBTQIA+ no mercado de trabalho formal e combater a discriminação e o assédio laboral, assegurando que a orientação sexual e a identidade de gênero não sejam motivos de exclusão, desigualdade salarial ou violência institucional.
Diretrizes e eixos de atuação
O plano estabelece diretrizes como a garantia de direitos trabalhistas em ambientes inclusivos e livres de discriminação, o enfrentamento à LGBTQIA+fobia no mundo do trabalho, a valorização da diversidade de identidades e experiências, o uso de dados e evidências na formulação de políticas públicas e o fortalecimento da governança participativa.
As ações estão organizadas em quatro eixos principais:
- Acesso e permanência no trabalho digno;
- Igualdade de oportunidades;
- Empreendedorismo e economia solidária; e
- Governança e diálogo social.
Responsabilidades e execução
Caberá à Secretaria Nacional dos Direitos das Pessoas LGBTQIA+, do MDHC, promover ações de formação e sensibilização de agentes públicos e privados, articular com órgãos e entidades públicas e privadas, empresas, sindicatos e organizações da sociedade civil, e apoiar políticas descentralizadas de promoção ao trabalho digno. Também está prevista a produção e sistematização de indicadores e evidências sobre desigualdades e violências no ambiente laboral.
Já o Ministério do Trabalho e Emprego, por meio da Secretaria de Qualificação, Emprego e Renda, será responsável por desenvolver e implementar políticas públicas de qualificação profissional, incentivar o primeiro emprego e capacitar servidores das Superintendências Regionais de Trabalho e Emprego para lidar de forma adequada com questões relacionadas à população LGBTQIA+. O órgão também deverá fomentar estudos e análises sobre a situação dessa população no ambiente de trabalho e produzir informações que subsidiem novas políticas públicas.
Cooperação e articulação
A execução do plano poderá envolver parcerias entre governos, organismos internacionais e entidades privadas, garantindo ampla articulação federativa e social.
Leia a íntegra da portaria.
CONGRESSO EM FOCO
https://www.congressoemfoco.com.br/noticia/113184/entenda-o-plano-nacional-de-trabalho-digno-lgbtqia
por NCSTPR | 27/10/25 | Ultimas Notícias
“Apaguei tudo.” A frase, que normalmente sugeriria um erro de clique, ganhou outro sentido nas redes sociais. Ex-funcionários têm relatado episódios em que apagaram arquivos importantes das empresas após serem demitidos.
“Fui lá e apaguei todas as planilhas que eu montei desde que entrei (…) perderam histórico de consumo de mais de 15 meses”, escreveu uma usuária no X (antigo Twitter), referindo-se à programação de produção que ela mesma havia criado.
Outro post viralizou com tom de confissão: “Apaguei as senhas de tudo e era a única que tinha anotado. Me mandaram uma notificação extrajudicial e, quando o advogado ligou, falei que não podia fazer nada porque já estava perdido”.
Os relatos se multiplicam e, em muitos deles, a reação do público mistura empatia e riso, como se o ato de apagar arquivos fosse uma forma de se vingar de demissões mal conduzidas.
🚨 Mas o que parece brincadeira esconde um problema maior. Mesmo quando a intenção é só “descontar a raiva”, o gesto pode gerar sérias consequências.
Advogados alertam que deletar arquivos corporativos pode ser considerado crime digital, quebra de contrato e até motivo para processos por danos à empresa. Já especialistas em recursos humanos afirmam que esses casos também revelam falhas na forma como as empresas lidam com desligamentos e com a proteção de dados internos.
Do lado dos profissionais, o impulso costuma nascer da frustração. Segundo Tiago Santos, da Sesame HR, muitos trabalhadores ainda encaram a demissão como algo pessoal.
“As redes funcionam como uma válvula de escape, um espaço para buscar apoio e validação”, explica. O problema é que esse tipo de exposição pode prejudicar a reputação e afastar oportunidades no mercado.
Para as empresas, as perdas também são concretas. Apagar arquivos pode causar paralisação de processos, perda de informações estratégicas e até ações judiciais. Para evitar isso, especialistas recomendam medidas básicas: contratos mais claros, backups automáticos e protocolos de desligamento bem definidos.
➡️ Entenda nesta reportagem os impactos desse comportamento, o que ele revela sobre a cultura das empresas e como evitar que um simples clique apague mais do que arquivos. Abaixo, confira:
Vingança pode afetar a reputação profissional?
Apesar de os relatos serem feitos em tom de humor por usuários do X, essas vinganças mostram que muitos profissionais ainda vivem a demissão como uma ferida pessoal, explica Tiago Santos, vice-presidente de Comunidade e Crescimento da Sesame HR.
“A ‘vingança’ costuma ser uma reação impulsiva, nascida da frustração, do sentimento de injustiça e da perda de controle”, afirma. Para ele, quando a demissão é percebida como algo que fere o valor pessoal do trabalhador, a emoção tende a se sobrepor à razão.
As redes sociais amplificam esse impulso. O que antes seria um desabafo restrito a conversas entre amigos, hoje se transforma em um post público, em busca de empatia, curtidas e apoio, segundo Tiago.
O problema é que essa validação imediata pode gerar consequências duradouras. A exposição de comportamentos impulsivos pode prejudicar a reputação e criar barreiras no mercado de trabalho.
“Essas atitudes costumam ser vistas como falta de maturidade e geram desconfiança em recrutadores e gestores”, alerta o especialista. Isso pode dificultar futuras contratações e enfraquecer a marca pessoal do profissional.
Wolnei Ferreira, diretor jurídico da ABRH Brasil, acrescenta que a situação pode ser ainda mais grave quando envolve informações sigilosas.
Ele lembra que, se dados confidenciais forem levados ou utilizados em outra empresa, a nova contratante também pode ser responsabilizada judicialmente por concorrência desleal. Por isso, recomenda que o profissional, ao sair de um emprego, busque apoio emocional e orientação de carreira, evite reações impulsivas e cuide da comunicação pública.
“Manter o respeito e o equilíbrio é essencial para preservar a reputação e deixar portas abertas”, reforça.
Quais são os riscos jurídicos?
Segundo o advogado trabalhista Luís Gustavo Nicoli, apagar arquivos corporativos pode configurar dano ao patrimônio, violação da boa-fé contratual e, em alguns casos, crime digital.
“Se os arquivos pertencem à empresa, o ato pode gerar responsabilidade civil e até criminal, caso se comprove a intenção de causar prejuízo”, explica.
A depender da situação, a conduta pode ser enquadrada em diferentes dispositivos legais. O artigo 163 do Código Penal trata do crime de dano, enquanto o artigo 154-A prevê punição para quem invade, adultera ou destrói dados de sistemas informáticos — conduta reforçada pela Lei nº 12.737/2012, conhecida como Lei Carolina Dieckmann.
Mesmo quando o funcionário foi o autor do material, isso não lhe dá o direito de exclusão ou uso.
“Se o conteúdo foi produzido no exercício do trabalho, com recursos da empresa e dentro do horário contratual, os direitos patrimoniais pertencem à companhia”, explica Nicoli.
O empregado pode manter apenas o crédito moral pela autoria, mas não o controle sobre os arquivos.
A advogada trabalhista Elisa Alonso reforça que a exclusão intencional de arquivos pode gerar ação de indenização por prejuízos materiais e morais.
“O dever de lealdade e boa-fé permanece mesmo após a dispensa. O ex-empregado deve preservar o patrimônio e as informações da empresa”, afirma. Para ela, o dano é caracterizado quando há perda de dados, paralisação de sistemas ou impacto financeiro comprovado.
Nesses casos, a empresa pode acionar a Justiça para pedir reparação, desde que demonstre dolo ou culpa. A justa causa retroativa, segundo os especialistas, é rara e só ocorre se o ato danoso foi praticado antes do desligamento formal. Fora isso, a medida adequada é o pedido de indenização judicial.
🤔 E se o trabalhador for acusado injustamente? Elisa Alonso recomenda cautela: não assinar confissões sem orientação jurídica, reunir provas, como e-mails, mensagens e registros de acesso. E, se necessário, solicitar perícia técnica para comprovar quem realmente excluiu os dados.
“A acusação falsa pode, inclusive, gerar direito a indenização por dano moral”, ressalta.
Como as empresas podem se proteger?
Para as empresas, o aumento de casos de exclusão deliberada de arquivos e bloqueio de acessos após demissões é um sinal de alerta.
De acordo com o diretor jurídico da ABRH Brasil, Wolnei Ferreira, situações desse tipo têm se tornado cada vez mais comuns e podem causar grandes transtornos.
“Muitas vezes o empregado que deixa a organização apaga informações, retém senhas ou cria barreiras de acesso. Isso causa embaraços e prejuízos sérios às operações”, afirma.
Segundo Ferreira, a melhor resposta é agir de forma preventiva. Ele recomenda que as empresas deixem claro, desde o contrato de trabalho, que todos os arquivos e dados produzidos em equipamentos corporativos pertencem à companhia e podem ser monitorados.
“Essas cláusulas dão respaldo jurídico para que a empresa adote medidas cabíveis, inclusive em casos de justa causa ou ações judiciais”, explica.
Além da previsão contratual, Ferreira destaca a importância de manter backups diários e sistemas de monitoramento, capazes de recuperar arquivos apagados. Outra medida essencial é o bloqueio imediato de acessos após o desligamento e a adoção de termos de confidencialidade assinados pelos colaboradores.
Essas práticas também se relacionam diretamente à Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), que reforça o dever das empresas de proteger informações sensíveis e garantir o sigilo.
“Essas regras ajudam a evitar incidentes e protegem tanto a empresa quanto o trabalhador”, diz Ferreira.
Para além dos mecanismos legais, Ferreira defende que o RH exerça papel ativo na construção de uma cultura de desligamento ética e transparente.
por NCSTPR | 27/10/25 | Ultimas Notícias
A Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho manteve a condenação da Corpvs – Corpo de Vigilantes Particulares Ltda., de Olinda (PE), ao pagamento de indenização de R$ 5 mil a um vigilante que fazia a segurança de prédios abandonados. A decisão leva em conta que não havia condições dignas de higiene, segurança e saúde.
Prédio não tinham luz nem água
Na ação trabalhista, o vigilante relatou que seus postos de trabalho eram sempre prédios abandonados de responsabilidade da Caixa Seguradora, tomadora de serviços. Segundo ele, os locais não tinham banheiros, água encanada, local adequado para refeições nem instalações elétricas. Além de ter de fazer necessidades fisiológicas a céu aberto, era obrigado a trabalhar no escuro, quando seu turno era à noite.
Em sua defesa, a Corpvs alegou que era “uma empresa séria”, com 47 anos de atuação no ramo de segurança. Disse que os prédios eram residenciais e tinham condições adequadas de trabalho. Além disso, os vigilantes tinham à sua disposição um dos apartamentos, onde podiam guardar uniformes, comer, descansar e atender às demais necessidades.
Condições de trabalho eram degradantes
Provas obtidas em outra ação contra a empresa demonstraram a “situação absurda e deplorável” em que estavam os prédios. Segundo outro vigilante que trabalhou no mesmo posto de trabalho, não havia banheiro nos apartamentos nem ponto de apoio: ele fazia as necessidades fisiológicas no mato e nos quartos dos apartamentos abandonados.
O juízo de primeiro grau deferiu a indenização, reconhecendo que as condições de trabalho eram degradantes e violavam a sua dignidade. O Tribunal Regional do Trabalho da 6ª Região manteve a sentença.
Empresa foi multada por recurso protelatório
O caso chegou ao TST por meio de agravo de instrumento da empresa de vigilância. O objetivo era rediscutir a condenação, uma vez que o TRT havia trancado seu recurso de revista.
Porém, segundo o relator, ministro Alberto Balazeiro, a Corpvs se limitou a repetir os argumentos de mérito, sem questionar especificamente a decisão que impediu a subida do recurso. Para o ministro, a apresentação de sucessivos agravos, com argumentos dissociados dos motivos das decisões anteriores, revela o intuito meramente protelatório e abusivo da medida. Por isso, aplicou multa de 1% sobre o valor da causa, prevista no Código de Processo Civil (CPC) para agravos manifestamente inadmissíveis.
A decisão foi unânime.
(Dirceu Arcoverde/CF. Foto: Agência Brasil)
O TST tem oito Turmas, que julgam principalmente recursos de revista, agravos de instrumento e agravos contra decisões individuais de relatores. Das decisões das Turmas, pode caber recurso à Subseção I Especializada em Dissídios Individuais (SDI-1). Acompanhe o andamento do processo neste link:
Processo: Ag-AIRR-0000752-98.2022.5.06.0101
TST JUS
https://www.tst.jus.br/en/-/vigilante-de-predios-abandonados-recebera-indenizacao-por-condicoes-precarias-de-trabalho