Fazia tempo, no Brasil, talvez desde 2010, que algum tema relevante e geral do mundo do trabalho fazia parte, positivamente, da pauta política nacional. Na última semana, finalmente, isso ocorreu. E pode iniciar discussão orgânica no Congresso, em particular, na Câmara dos Deputados.Eis que pauta cara e histórica da esquerda e do movimento sindical entrou na agenda do noticiário nacional e mobilizou as redes1, as ruas2 e o debate político nacional3 — a Escala 6×1 —, com a apresentação da PEC (proposta de emeda à Constituição), pela deputada Erika Hilton (PSol-SP), cujo objetivo é extinguir a jornada em que o trabalhador labuta 6 dias e descansa apenas 1.
A proposta (PEC) ultrapassou o número mínimo de assinaturas (171) para ser protocolada na Câmara dos Deputados e iniciar debates na Casa. Isso pode ocorrer nesta semana.
Conteúdo da PEC
No lugar da Escala 6×1, a deputada propõe, por meio da PEC, duração da jornada de trabalho de até 8 horas diárias e 36 semanais, com jornada de 4 dias por semana e 3 de descanso.
Movimento VAT
O movimento VAT (Vida Além do Trabalho) foi iniciado pelo influenciador digital, Rick Azevedo, 30 anos. Ele foi eleito vereador na cidade do Rio de Janeiro, pelo PSol. E é considerado fenômeno eleitoral no Rio.
Ele foi o vereador do PSol com menos investimentos e mais votos. O próprio partido se surpreendeu.
Do anonimato para a relevância
Para Rick, os 29,3 mil votos que recebeu vêm da força do VAT, que defende o fim da jornada de 6 dias de trabalho para 1 de folga (6×1), “dando voz a trabalhadores que muitas vezes não se veem representados por estruturas tradicionais”.
“O movimento sindical tem uma relevância histórica enorme, sendo responsável por muitas das conquistas que temos hoje”, diz Azevedo. “No entanto, acredito que ele precisa de uma atualização para se adaptar à realidade dos trabalhadores atuais, especialmente daqueles que estão em condições precarizadas ou em setores informais”, avalia.
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Não é “despolitização”. Eles desejam autonomia, mas também apoio ao trabalho hoje isolado e precário. Mobilizam-se de forma mais flexível e valorizam a diversidade. Assistência aos “plataformizados” e comunicação inovadora podem ser o começo para a renovação de bases.
O artigo é de Clemente Ganz Lúcio, Diretor técnico do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE), publicado por Outras Palavras, 11-11-2024.
Eis o artigo.
A sindicalização é uma ação contínua e essencial no trabalho de base dos dirigentes e ativistas sindicais. Os desafios para atrair e engajar trabalhadores de todas as idades são constantes, mas os jovens sempre representam uma barreira a ser enfrentada. Os debates indicam a necessidade de inovações nas estratégias que visam à filiação dos trabalhadores aos sindicatos, ampliando, assim, a representatividade, a proteção e o poder sindical. Estudos da OCDE indicam que a baixa taxa de adesão sindical entre os jovens é um fator importante na queda global da densidade sindical. De acordo com o levantamento, apenas 7% dos sindicalizados na área da OCDE são jovens e a adesão a sindicatos tende a seguir uma curva em “U” invertido, atingindo seu ponto mais alto em trabalhadores com cerca de 40 anos.
Para que um trabalhador decida se sindicalizar é fundamental que se sinta conectado ao sindicato e veja valor em sua atuação e, com o jovem, não é diferente. O que cabe considerar é quais são as características que marcam as atuais novas gerações que chegam para ingressar no mundo do trabalho remunerado. As transformações econômicas, sociais, políticas e culturais definem a visão de mundo e as novas gerações desenvolvem abordagens existenciais e de modo de vida que se diferem das gerações anteriores.
O desenvolvimento da relação com o sindicato passa pela presença constante e significativa dos dirigentes no ambiente de trabalho, pela apresentação dos benefícios que a filiação pode proporcionar e pela demonstração do impacto positivo que o sindicato pode ter nas condições de trabalho e de vida dos trabalhadores. Quando um sindicato é percebido como ativo e eficaz, capaz de melhorar salários, defender direitos e cuidar das condições de trabalho, ele se torna mais atrativo também para os jovens, que buscam suporte e segurança em suas trajetórias profissionais.
O sindicato também tem o desafio de se apresentar como um espaço de encontro, de acesso e de promoção de atividades culturais e recreativas, de lazer, de momentos lúdicos, com sessões de cinema, teatro, atividades de literatura e de música, com atividades esportivas, entre outras possibilidades. Nesses espaços e momentos as pessoas se conhecem, relacionam-se, criam identidades e confiança.
Quem é jovem?
Segundo a OIT – Organização Internacional do Trabalho, jovem é a população na faixa etária de 15 a 24 anos. As políticas públicas no Brasil consideram juventude a população na faixa etária de 15 a 29 anos. É longa a extensão da faixa etária da juventude, compreendendo a possibilidade de identificar-se vários recortes que estarão associados a outras características como a inserção educacional, a formação profissional acumulada, a experiência em curso ou vivida de transição escola – trabalho, a necessidade ou urgência de um emprego e de renda etc. E a sua situação econômica, suas carências e necessidades, suas expectativas com o presente e o futuro.
A juventude é uma diversidade complexa de vivências, é um período de arriscar-se, de colocar-se no e para o mundo, de conquistar autonomia, de estabelecer relacionamentos. Vencer o desafio de agregar-se, relacionar-se, posicionar-se, estabelecer metas, tomar iniciativa, ser recebido e incluído. A juventude irrompe suas demandas, seus anseios, seus sonhos e esperanças e é com elas que o sindicato deve saber trabalhar.
Chegar ao mundo do trabalho é vencer barreiras que estão associadas à educação formal recebida, à qualificação profissional, à origem de classe, de gênero, de raça. Chegar para a procura do primeiro emprego em um mercado de trabalho aquecido é uma coisa, outra é chegar com o desemprego bombando. Procurar o primeiro emprego, ser demitido ou pedir demissão pela primeira vez gera expectativas, ansiedade e causa insegurança, algumas das questões que afligem os jovens.
Desafios para a sindicalização dos jovens
A dificuldade em sindicalizar os jovens sempre esteve relacionada ao menor tempo de vida laboral, à experiência de ingresso no mundo do trabalho, à falta de experiência e de cultura da ação coletiva e do seu valor. Além disso, muitos dos direitos trabalhistas e sociais conquistados ao longo das décadas acabam sendo vistos como “naturais” pelas novas gerações, que não vivenciaram a luta histórica que os garantiu. Nesse contexto, a formação e a comunicação sindical têm o papel de revelar a origem desses direitos e reforçar a importância de preservá-los e expandi-los.
Além do contexto histórico e de acesso à informação, há outros fatores que desmotivam a sindicalização entre os jovens. A crescente flexibilização do trabalho, com o aumento de contratos temporários e empregos informais, a alta rotatividade e a precariedade das condições laborais, dificultam a sindicalização de todos os trabalhadores. Muitos jovens são empregados em setores menos organizados sindicalmente, como serviços, comércio e trabalho informal, onde a rotatividade é alta e os direitos são mais frágeis. O medo da demissão e a insegurança podem afastá-los, mas de outro lado, seu ímpeto para enfrentar desafios e querer mudanças, podem atraí-los.
O trabalho em plataformas digitais, que cresceu enormemente entre os jovens, apresenta um obstáculo significativo para o sindicalismo. Muitos desses trabalhadores, como motoristas e entregadores, atuam sem vínculo formal e enfrentam dificuldades para se organizarem, devido à dispersão geográfica e ao isolamento característico desse modelo de trabalho. A OCDE destaca que o aumento do trabalho não padronizado representa um desafio adicional, pois esses trabalhadores têm menor probabilidade de serem sindicalizados do que os trabalhadores assalariados clássicos.
A visão dos jovens sobre os sindicatos
A percepção dos jovens em relação aos sindicatos é mista, embora de acordo com a OCDE, em 23 de 32 países analisados, a confiança dos jovens em sindicatos é superior à dos trabalhadores mais velhos, porém muitos ainda veem as entidades sindicais como distantes ou antiquadas. Ou seja, reconhecem a importância dos sindicatos, mas não se sentem representados.
É comum que os jovens valorizem a liberdade individual e a flexibilidade, o que às vezes entra em conflito com a visão dominante do sindicalismo, que enfatiza o coletivo e as ações coordenadas. Mesmo assim, os jovens demonstram interesse em participar de ações coletivas, como manifestações e arrecadações para causas sociais, o que aponta para uma base potencial para engajamento. É fundamental compreender que são muitas as portas de entrada para a vida sindical e a maior parte delas está relacionada às múltiplas atividades e oportunidades oferecidas em termos culturais, esportivos, de lazer e de espaços de encontro.
A literatura sobre a participação da juventude no movimento sindical destaca uma série de desafios e tendências que refletem a complexidade do mercado de trabalho atual e as mudanças nas expectativas dos jovens.
Percepções de distanciamento dos sindicatos
Uma parte da juventude vê os sindicatos como instituições distantes ou desconectadas das realidades e desafios do mercado de trabalho moderno. A literatura aponta que, para muitos jovens, a linguagem e as estratégias sindicais tradicionais parecem pouco atrativas e inadequadas para lidar com os novos tipos de trabalho, como o digital e o por plataformas. Esse descompasso entre expectativas e abordagem sindical é um dos principais motivos da baixa adesão. Por isso, é importante atuar em espaços educacionais para esclarecer e fomentar a sindicalização, especialmente para os jovens que estão ingressando no mercado de trabalho e desconhecem as alternativas de organização coletiva. É preciso compreender que é necessário construir uma forma específica de informar e formar os jovens. Esta precisa ser dinâmica, participativa, divertida e interativa. Outra atuação importante é oferecer um bom serviço de intermediação para o emprego, inclusive com apoio em termos de orientação profissional.
Preferência por formas de mobilização alternativas
Pesquisas indicam que os jovens tendem a preferir formas de mobilização mais flexíveis e descentralizadas, como movimentos sociais e ativismo digital. Eles demonstram um alto grau de engajamento em causas sociais, ambientais e de direitos civis, o que sugere uma disposição para a ação coletiva, mas em formatos que diferem do sindicalismo clássico. Neste caso, a inserção dos sindicatos em movimentos diversos, culturais, sociais e políticos, abre a possibilidade de conexão entre a diversidade de processos sociais que se conectam também com a vida sindical.
Individualismo versus coletivismo
A literatura destaca que existe um certo paradoxo pois, enquanto os jovens valorizam a liberdade e autonomia no ambiente de trabalho, muitos também reconhecem a importância do apoio coletivo. Pesquisas mostram que os jovens atualmente têm uma percepção de individualismo maior do que os jovens de gerações anteriores, mas ao mesmo tempo são inclinados a apoiar movimentos de justiça social e igualdade, o que pode ser uma base potencial para a sindicalização, desde que os sindicatos ajustem suas abordagens. Nesse mundo que fortalece o individualismo, cabe ao sindicato oferecer possibilidades múltiplas de encontros e ações conjuntas e coletivas oportunizadas pelas atividades culturais, recreativas, esportivas, comunitárias e de solidariedade.
A atração por um sindicalismo mais representativo e inclusivo
Estudos sugerem que os jovens se sentem mais atraídos por sindicatos que promovem a inclusão e a diversidade e que adotam uma postura progressista em questões de justiça social. Os sindicatos que integram pautas econômicas e sociais e oferecem um espaço de acolhimento para minorias têm mais sucesso em atrair jovens, que desejam ver representadas suas preocupações com temas como igualdade de gênero, antirracismo e direitos LGBTQIAPN+.
Sindicalização de trabalhadores em plataformas
A expansão do trabalho em plataformas, como transporte e entrega, traz novos desafios para o sindicalismo, pois esses trabalhadores muitas vezes não possuem vínculo empregatício formal e estão dispersos geograficamente. A literatura enfatiza que é necessário inovar nos modelos de organização sindical para alcançar esses trabalhadores, considerando que muitos deles são jovens que enfrentam um ambiente de trabalho isolado e precário. A oferta de serviços como assessoria jurídica, oportunidades de qualificação, orientação profissional e assistência saúde pode atrair os jovens que enfrentam condições de trabalho precárias. Abrir os sindicatos para trabalhadores autônomos e temporários, oferecendo serviços que os ajudem a se organizar, realizar manutenções e negociações com empresas plataformizadas, é uma estratégia importante para também alcançar um público jovem.
A necessidade de comunicação digital e inovadora
Os sindicatos que utilizam comunicação digital, como redes sociais e plataformas online, têm mais sucesso em alcançar jovens. A digitalização das atividades sindicais, incluindo campanhas, assembleias virtuais e canais de suporte online, pode criar um ambiente mais atraente e acessível para os jovens, facilitando o engajamento e a compreensão do papel dos sindicatos e desenvolvendo uma comunicação direta e transparente sobre os benefícios da filiação sindical.
Confiança em sindicatos e potencial de engajamento
Embora muitos jovens ainda vejam os sindicatos como pouco atrativos, existe confiança nas organizações sindicais, o que representa um potencial para engajá-los no movimento sindical, desde que este adote estratégias que se alinhem com suas demandas e expectativas.
A literatura destaca que, embora a sindicalização entre jovens enfrente desafios significativos, há um potencial inexplorado. Orientar o sindicalismo para responder às preocupações específicas dos jovens, oferecer um ambiente inclusivo e diversificado, e investir em formas inovadoras de comunicação e organização podem ser estratégias eficazes para revitalizar o movimento sindical e envolver uma nova geração de trabalhadores.
A sindicalização dos jovens é um desafio para o movimento sindical global. No entanto, as demandas dos jovens por segurança, dignidade e condições de trabalho justas são similares às dos trabalhadores de gerações anteriores, mesmo que as formas de engajamento sejam diferentes. Um sindicalismo que se adapte às necessidades e às perspectivas da juventude poderá renovar suas bases e fortalecer sua representatividade.
Os sindicatos têm a responsabilidade de construir um futuro que ofereça oportunidades justas para os jovens e promova uma cultura de solidariedade e apoio mútuo. Diante das pressões por maior individualismo e flexibilização crescente das relações de trabalho, é crucial que o movimento sindical se aproxime dos jovens para demonstrar que a união e a ação coletiva são as melhores ferramentas para a defesa e conquista de direitos.
Nota
[1] OCDE (2019), “Negotiating Our Way Up: Collective Bargaining in a Changing World of Work”, OECD Publishing, Paris, disponível aqui.
A 3ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho fixou em R$ 300 mil a indenização a ser paga por banco a um gerente de São Leopoldo (RS) que desenvolveu doença psiquiátrica grave após assaltos a agências próximas a seu local de trabalho e sequestros de colegas. Além de não receber treinamento para essas situações, o bancário era orientado, segundo testemunhas, a não fazer boletim de ocorrência.
Admitido em 2010, o gerente relatou na reclamação trabalhista que seu quadro depressivo grave foi desencadeado por dois fatores: medo de assaltos e sequestros e cobrança de metas inatingíveis. Segundo ele, a relação entre a doença e o trabalho foi demonstrada por atestados e pareceres médicos.
Gerente era orientado a não fazer BO
O pedido de reparação por dano moral foi rejeitado pelo juízo de primeiro grau, mas o Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (RS) condenou o banco a pagar R$ 2,5 milhões de indenização. A fixação do valor se baseou na gravidade do caso, e no aspecto pedagógico e educativo da condenação.
De acordo com o TRT, o relatório da perícia confirmou a cobrança de metas excessivas, as ameaças de demissão e “uma onda de sequestros a familiares de funcionários graduados”. A psiquiatra do gerente e testemunhas confirmaram essas circunstâncias e disseram que, após o sequestro de empregados numa agência próxima, a orientação do banco era de não fazer boletim de ocorrência.
As testemunhas também afirmaram que os funcionários não eram treinados para situações de sequestro e assalto, e que outras duas colegas se afastaram por problemas psíquicos relacionados ao trabalho.
Ao recorrer ao TST, o banco sustentou que o valor da condenação era desproporcional à extensão do dano.
O relator do recurso de revista, ministro José Roberto Pimenta, considerou que o valor de R$ 2,5 milhões não atende aos princípios da razoabilidade ou da proporcionalidade e não é adequado à situação concreta tratada na ação. Considerando, entre outros fatores, os 20 anos de vínculo e as metas excessivas, o colegiado reduziu a indenização para R$ 300 mil. Com informações da assessoria de comunicação do TST.
Pensar o mundo do trabalho a partir das mudanças tecnológicas, da emergência ambiental e da justiça social. Esses são os pilares das demandas que as centrais sindicais brasileiras vão levar para a Cúpula Social do G20, prevista para o ocorrer entre os dias 14 e 16 de novembro, na região da Praça Mauá, no Rio de Janeiro.G20: sindicatos cobram trabalho justo e sustentável 1G20: sindicatos cobram trabalho justo e sustentável 2
Os dois primeiros dias de evento terão atividades autogestionadas, ou seja, organizadas pelas entidades da sociedade civil. A atividade promovida pelos sindicatos ocorre no dia 14, entre 13h30 e 16h. Ao fim do dia, será aprovado um texto chamado “Transições no mundo do trabalho: garantir empregos de qualidade e promover a redução das desigualdades”. Ele vai ser apresentado ao lado das propostas das outras entidades civis no dia 16, quando vai ser produzido um documento síntese da Cúpula Social.
O encontro das centrais sindicais tem como organizadoras: CSB (Central dos Sindicatos Brasileiros), CTB (Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil), Central Única dos Trabalhadores (CUT), Força Sindical, Intersindical, Nova Central Sindical de Trabalhadores (NCST), Pública, União Geral dos Trabalhadores (UGT) e Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese).
“Nos outros encontros do G20 que ocorreram pelo mundo, o debate ficou restrito aos chefes de Estado. Os movimentos sindical e social ficaram à margem, tentando fazer atividades paralelas para ser ouvidos. No G20 do Brasil, a sociedade está integrada, vai poder debater e apresentar suas propostas. Nós temos a expectativa de contribuir com um documento único e entregar ao presidente Lula, para que ele possa ler diante dos outros chefes de Estado. É uma oportunidade extraordinária de apresentar uma pauta ampla em relação a temas que são urgentes”, diz Sérgio Nobre, presidente nacional da CUT.
Futuro do trabalho no G20
O documento das centrais sindicais parte do entendimento de que os impactos climáticos globais intensificam o deslocamento de refugiados e aprofundam as disparidades sociais. Há preocupação com a perda de empregos devido ao estresse térmico, em setores como agricultura, construção civil, turismo e comércio de rua. Eles são considerados mais vulneráveis pela maior exposição ao calor ou frio excessivos, pela escassez hídrica, por enchentes, queimadas, e outras condições extremas.
Baseadas em informações da Organização Internacional do Trabalho (OIT), as centrais apoiam uma economia sustentável, com redução de emissões de gases de efeito estufa, que seja capaz de gerar inclusão social e criar até 60 milhões de empregos a mais do que a economia convencional.
Há também preocupação de que o crescimento da digitalização e do uso de inteligência artificial (IA) promovam mudanças no mercado de trabalho e acelerem a obsolescência profissional. A automação é um sinal de alarme principalmente em países com predomínio de empregos de baixa renda, porque pode aprofundar problemas de desemprego, precarização e desigualdades. As centrais destacam o aumento dos trabalhos com menos direitos, sem proteção social, com obstáculos à organização sindical, jornada de trabalho extensa e desregulamentada, instabilidade da renda e sobrecarga de tarefas.
“Nesse mundo mais sustentável que desejamos, é importante que a gente garanta que ninguém fique para trás. Nem os trabalhadores, nem comunidades tradicionais, nem as mulheres negras, juventude. Por isso, ele deve ter como eixo estrutural a redução das desigualdades. E, nesse sentido, a classe trabalhadora reivindica postos de trabalho ambientalmente sustentáveis, com condições de trabalho dignas, orientadas pelo conceito de trabalho decente da OIT”, diz Adriana Marcolino, socióloga e diretora técnica do Dieese.
Demandas ao G20
Para as centrais sindicais, o G20 é a oportunidade única de ampliar vozes e demandas dos trabalhadores. A expectativa é que o encontro dos chefes de estado aborde mais do que questões macroeconômicas, e inclua também temas sociais. Um dos caminhos defendidos é o de que seja possível reduzir as desigualdades que se manifestam mesmo entre os países do bloco, como diferentes legislações e condições trabalhistas.
“É importante que o debate leve em conta os interesses de todos. E busque parâmetros internacionais. A OIT tem um papel fundamental nessa discussão, para que possamos ter um modelo unitário de legislação trabalhista e espaço de produção. Hoje, temos regras diferentes de um lugar para o outro. Há alguns com ambientes insalubres de produção, sem jornadas de trabalho regulamentadas. Muitas vezes, uma multinacional sai de um país e vai para o outro, buscando aquilo que ela pode subverter na lei de outro país. A concorrência baseada nessa precarização prejudica os trabalhadores e o meio ambiente”, analisa João Carlos Gonçalves (Juruna), secretário-geral da Força Sindical.
Dessa forma, o documento que será apresentado na Cúpula Social do G20 pelas centrais sindicais brasileiras terá, ao menos, 20 demandas:
1 – Implementação de políticas de desenvolvimento econômico socialmente justo e ambientalmente sustentável, com redução das diferentes dimensões das desigualdades.
2 – Garantia de acesso público, universal e de qualidade à saúde, educação, aos serviços de cuidado e seguridade para as populações ao longo de toda a vida.
3 – Garantia de direitos trabalhistas, previdenciários e sindicais, revertendo processos de precarização do trabalho difundidos ao redor do mundo, revendo o estabelecimento de contratos de trabalho precários.
4 – Fortalecimento da liberdade de organização sindical e a negociação coletiva nos setores público e privado, combate de práticas antissindicais e garantia de autonomia dos trabalhadores na definição do sistema de financiamento sindical.
5 – Implementação da política de valorização salarial.
6 – Ampliação da adesão às Convenções da OIT, como a convenção 156, sobre a adoção de medidas para impedir que demandas familiares dificultem o acesso ao emprego e o crescimento profissional; criação de convenções que tratem das novas formas de trabalho mediadas pela digitalização e pelo uso da Inteligência Artificial.
7 – Ampliação das oportunidades orientadas pelos princípios do trabalho decente para mulheres, população negra, juventude, LGBTQIA+ e pessoas com deficiência, além de combater o trabalho escravo e erradicar o trabalho infantil.
8 – Atualização das regulações da jornada laboral de modo a limitar a fragmentação do tempo de trabalho por meio das novas tecnologias.
9 – Garantia de formação profissional permanente e de qualificação profissional para novos postos de trabalho em casos de empresas afetadas pela automação.
10 – Eliminação de processos produtivos prejudiciais à saúde dos trabalhadores garantindo saúde e segurança no trabalho.
11 – Garantia de proteção aos desempregados através de políticas como seguro-desemprego, formação profissional, intermediação de mão de obra e programas de transferência de renda.
12 – Instituição da renda básica universal como direito social, complementar aos direitos do trabalho.
13 – Implementação de tributação progressiva sobre renda e patrimônio e o aumento da tributação sobre grandes heranças e fortunas, lucros e dividendos para a criação de um fundo mundial para transição energética e o combate à pobreza e às desigualdades.
14 – Implementação de políticas de transição, recuperação e preservação ambiental que incluam a geração de trabalho decente e amparo para todas as comunidades afetadas.
15 – Garantia da valorização da agricultura familiar, da agroecologia, da economia circular e redução da poluição nas cidades e no campo.
16 – Implementação de investimentos em energia limpa, renovável e acessível, garantindo que a população tenha acesso a padrões de vida dignos e mobilidade.
17 – Ampliação dos investimentos em infraestrutura para uma produtividade ancorada em ciência e tecnologia e criação de empregos formais de qualidade e sustentáveis.
18 – Estabelecer infraestrutura econômica, social e ambiental para uma industrialização sustentável, revertendo o processo de reprimarização em países da periferia.
19 – Regulamentação do uso de tecnologias que impactam negativamente os postos e as condições de trabalho, de forma que as inovações sejam elementos de promoção e melhoria da vida em sociedade.
20 – Compartilhamento dos ganhos de produtividade advindos de avanços tecnológicos com os trabalhadores (por meio da redução da jornada de trabalho e da valorização dos salários) e com o Estado (arrecadação de tributos).
Quase 90% das trabalhadoras domésticas do município de São Paulo afirmam que já passaram por alguma situação envolvendo assédio no local de trabalho, seja ela moral, física ou sexual.
É o que aponta pesquisa produzida pelo sindicato da categoria (STDMSP) em parceria com o doutor em ciência política e pesquisador Jean François Mayer, da Concordia University, do Canadá.
De acordo com os dados do estudo, 87,6% das trabalhadoras contam terem sido vítimas de violência em algum momento de suas carreiras. A maioria (58,9%), no entanto, diz resolver sozinha – geralmente no confronto verbal – os casos de assédios envolvendo seus patrões ou patroas.
A pesquisa na categoria é inédita e por enquanto só está disponível a primeira etapa do estudo, onde foram entrevistadas 241 trabalhadoras.
A etapa seguinte terá uma abrangência maior, com 1.100 domésticas do município paulista, que está em fase de elaboração e trará um aprofundamento sobre os dados de agora.
Outro diferencial do estudo é que a equipe de pesquisadoras foi formada por trabalhadoras domésticas, que passaram por um processo de formação e empoderamento para conduzir as entrevistas entre seus pares.
“Foi um trabalho colaborativo desde a concepção até a tabulação da pesquisa. E ajudei o Sindicato nesse processo, acompanhando e dando treinamento às trabalhadoras que quiseram participar, pois sempre entendemos que ninguém melhor do que elas para falar sobre a situação do trabalho doméstico na cidade de São Paulo”, explica Jean, que utiliza um método de pesquisa etnográfica e de ação participativa.
A expectativa era criar um mapeamento que apontasse sobre a situação de vida, mundo do trabalho e os desafios enfrentados pela categoria no dia a dia.
Com os dados, o Sindicato espera construir um plano de lutas mais próximo dos anseios dessas trabalhadoras, além de qualificar as cláusulas da convenção coletiva (CCT) durante as negociações junto ao sindicato patronal.
“Essa pesquisa confirma, em dados, aquilo que ouvimos todos os dias durante os atendimentos realizados aqui no Sindicato. Além da precarização no trabalho, elas ainda enfrentam riscos, passam por humilhações e vivem diferentes tipos de violências. Agora temos um papel importante de buscar cláusulas de proteção na CCT e cobrar por maior fiscalização nas residências”, aponta Marli Silva, presidenta do Sindicato dos Trabalhadores Domésticos do Munícipio de São Paulo (STMDSP).
A pesquisa também fez perguntas para identificar as perspectivas e o que planejam as trabalhadoras sobre os seus futuros. Para elas, o sonho de conquistar uma moradia própria está entre as prioridades (14,3%) ao lado de poder “ver a família bem” (14,3%). Em seguida, para 12,5%, existe o desejo de mudança de trabalho.
Em relação aos direitos, a maioria, 50,4%, diz possuir vínculo de trabalho com carteira assinada. Mas somente 31,2% são filiadas ao sindicato.
“Essa pesquisa mostra a grande precariedade econômica e social que afeta a vida das trabalhadoras domésticas. Mas também mostra que elas não permanecem passivas diante de abusos e opressão, utilizando-se de estratégias para resistir à violência no local de trabalho. Então é uma categoria que demonstra bastante força”, ressalta o pesquisador, que colabora com o Sindicato desde 2017.
Jean destaca que acompanhou o período de covid-19 no país, que afetou muitas trabalhadoras domésticas – inclusive a primeira morte no Brasil foi de uma trabalhadora que contraiu o vírus de seus patrões após eles voltarem de viagem.
Nesse período do coronavírus, conta Jean, as trabalhadoras perderam muitos direitos e, desde então, pouco conseguiram recuperar.
Para a presidenta do STMDSP, a luta por melhores condições na categoria nunca foi fácil.
“A lei que ampliou nossos direitos (PEC das Domésticas) tem somente 10 anos de aprovação e a conquista por uma convenção coletiva também é recente. Mas estamos em luta diariamente organizadas em sindicatos e na nossa federação, a Fenatrad, para termos garantido direitos, respeito e dignidade no trabalho”, finaliza Marli.
Com os avanços tecnológicos, o mercado de trabalho e o setor jurídico enfrentam a necessidade de adaptação e inovação para lidar com desafios e novas oportunidades.
A tecnologia tem deixado suas marcas em todos os setores, mudando a produtividade, as relações laborais e até mesmo redefinindo alguns cargos.
Automatização de processos, inteligência artificial e o uso de big data estão alterando a maneira como as empresas operam, permitindo análises mais rápidas e precisas, otimização de tarefas e um aumento notável na eficiência.
Além disso, a digitalização tem transformado o ambiente de trabalho, promovendo o home office e criando novas funções, como gestores de inovação, cientistas de dados e especialistas em cibersegurança, que antes não existiam.
Com isso, as atividades e habilidades exigidas dos profissionais estão em evolução, demandando uma adaptação contínua aos avanços.
Polarização no mercado de trabalho
De acordo com o blog do IBRE da FGV – Fundação Getúlio Vargas há uma tendência crescente de polarização no mercado de trabalho que reflete a reconfiguração tecnológica impulsionada pela automação e inteligência artificial. Funcionários de alta qualificação, especialmente aqueles que desempenham papéis não-rotineiros e criativos, estão experimentando um aumento de oportunidades e salários.
Por outro lado, aqueles de capacitação intermediária, que executam tarefas repetitivas ou que podem ser sistematizadas, estão vendo seus empregos desaparecerem ou seus rendimentos diminuírem. Essa alteração estrutural no ambiente profissional favorece os extremos da pirâmide de qualificação: os trabalhadores altamente capacitados e aqueles que realizam funções básicas e que ainda são difíceis de automatizar.
Nils Nilsson, um dos pioneiros da IA, já apontava que o objetivo desse sistema a longo prazo seria desenvolver máquinas que não apenas executem múltiplas atividades, mas que o façam de maneira mais eficaz do que as pessoas.
Embora essa visão ainda pareça distante em alguns setores, ela já está se tornando realidade em várias indústrias, como a manufatura, transporte, serviços financeiros e, cada vez mais, a área legal. Os dispositivos e algoritmos estão rapidamente se tornando capazes de analisar grandes volumes de dados, interpretar padrões complexos e até mesmo tomar decisões com base em critérios objetivos.
A diretora-gerente do FMI – Fundo Monetário Internacional, Kristalina Georgieva, previu que entre 40% e 60% dos empregos globais poderão ser afetados pelo sistema inteligente nas próximas décadas. Isso significa que um número substancial de ocupações, mesmo aquelas que tradicionalmente dependem de aptidões cognitivas, como o Direito, poderá ser impactado.
Ferramentas de automação jurídica, como sistemas de gestão de processos, redação de contratos e análise preditiva de litígios, já estão começando a alterar como advogados e juízes atuam. A perspectiva é que muitas das responsabilidades de rotina que envolvem pesquisa e análise de documentos poderão ser completamente mecanizadas.
Impactos da tecnologia no trabalho
Apesar das previsões alarmantes, um estudo recente do Laboratório de Ciências da Computação e Inteligência Artificial do MIT sugere que a alteração total de funções humanas por sistemas pode não acontecer tão rapidamente quanto se imagina.
O estudo analisou, por exemplo, a substituição de tarefas que envolvem visão computacional e concluiu que apenas 23% dos salários pagos por essas atividades poderiam ser sistematizadas de forma economicamente viável. Isso significa que, apesar da capacidade tecnológica, há barreiras financeiras e logísticas que retardam a adoção em larga escala desses mecanismos.
As modificações trazidas por esses avanços não são somente técnicas, mas também sociais e culturais, redefinindo como vivemos, trabalhamos e interagimos. As soluções digitais alteram a estrutura de mercados, influenciam o comportamento humano e têm o poder de transformar a dinâmica coletiva, criando novos caminhos, desafiando normas tradicionais e exacerbando desigualdades se não forem bem geridas.
Nesse sentido, com a tecnologia em evidência, o debate sobre suas consequências nas relações laborais tem se intensificado. Isso porque, a sua implementação no ambiente profissional deve vir acompanhada de uma adaptação nas políticas públicas e na legislação trabalhista. Assim, regulamentar os efeitos dessas mudanças, especialmente no que tange à proteção dos direitos dos colaboradores e à redistribuição equitativa dos benefícios, é um dos principais obstáculos do porvir.
A formulação de possíveis cenários é importante para a compreensão das implicações dessas modernizações, como a criação de uma estrutura legislativa sólida para assegurar que a automação e a IA não resultem em desproteção ou precarização do trabalho.
Além disso, as normas laborais precisam evoluir para assegurar que as vantagens trazidas sejam distribuídas de forma justa e que os funcionários afetados por reformas estruturais tenham o apoio necessário para se requalificar.
No entanto, a aceitação e o sucesso dessas normas dependem da participação ativa da comunidade em sua elaboração. O diálogo entre tecnólogos, formuladores de políticas, cientistas sociais e a população colaboram para que as soluções digitais atendam aos interesses coletivos e não beneficiem apenas uma parcela da sociedade.
Um processo colaborativo e transparente pode ajudar a construir um futuro mais justo e equitativo, onde as inovações sirvam ao bem comum e promovam um desenvolvimento inclusivo e sustentável, priorizando o bem-estar coletivo ao lado do avanço econômico.
Tecnologia como estratégia na advocacia
No campo legal, onde a demanda por eficiência e precisão é constante, o uso da inteligência artificial muitas vezes gera preocupações sobre a substituição de cargos humanos.
No entanto, a automação pode, na verdade, ser uma aliada dos profissionais do direito, possibilitando que se concentrem em funções que demandam mais estratégias. Ao sistematizar tarefas repetitivas, como o controle de prazos, a gestão de documentos e a comunicação com clientes, é possível aumentar a produtividade e ainda melhorar a organização do escritório de advocacia.
Por meio de ferramentas como o Taskscore, que monitora o desempenho da equipe e prioriza atividades, a plataforma garante que as operações diárias sejam realizadas de forma eficiente e sem erros. Essa automação ajuda a liberar os juristas de encargos burocráticos para que eles foquem em questões mais elaboradas, como a análise de casos e a criação de abordagens.
Além disso, o uso do software tem um impacto direto na qualidade de vida dos advogados. Ao proporcionar uma gestão mais organizada do fluxo de trabalho, ele contribui para evitar sobrecargas, reduzindo a necessidade de horas extras e minimizando o estresse. A plataforma oferece uma visão clara das funções pendentes, ajudando os colaboradores a manterem um equilíbrio entre suas vidas pessoais e profissionais.
A IA não precisa ser vista como uma ameaça, mas sim como uma facilitadora da atuação advocatícia. Ao delegar responsabilidades para ferramentas, os defensores podem aprimorar suas aptidões em áreas insubstituíveis, como a argumentação jurídica e a interação com clientes, onde o fator humano é essencial.
Humanizando o trabalho na era digital
O futuro moldado pela inteligência artificial e automação não é simplesmente sobre a substituição de funcionários, mas sim um conjunto de novas possibilidades e desafios. Em vez de ver a tecnologia como um risco, podemos encará-la como uma ferramenta para transformar o trabalho e a sociedade.
A questão não é apenas quem perderá empregos, mas como podemos usar essa revolução para criar um cenário mais inclusivo e voltado para o progresso. O caminho à frente exige mais do que adaptação técnica – requer uma redefinição dos valores que orientam nossas políticas e práticas laborais.
Se usados com responsabilidade, os avanços têm o potencial de redistribuir responsabilidades, possibilitando que as pessoas se concentrem em atividades mais criativas e intelectualmente gratificantes, enquanto as máquinas assumem tarefas rotineiras. Assim, as soluções digitais deixam de ser somente um meio para mais eficiência e passam a ser um instrumento de valorização do indivíduo.
Portanto, em vez de temer as mudanças, a questão que se coloca é mais profunda: como podemos garantir que a revolução digital sirva para humanizar o trabalho, elevar as habilidades e oferecer a todos um futuro mais justo e promissor? A resposta depende de como decidimos prosseguir- com inclusão, colaboração e atenção ao impacto social.
Eduardo Koetz
Eduardo Koetz é advogado, sócio-fundador da Koetz Advocacia e CEO do software jurídico ADVBOX . Especialista em tecnologia e gestão, ele também se destaca como palestrante em eventos jurídicos.