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Governo pode lançar medidas para cortar gastos após a eleição e deixar reforma do IR para 2025

Governo pode lançar medidas para cortar gastos após a eleição e deixar reforma do IR para 2025

A equipe econômica do governo Luiz Inácio Lula da Silva pode lançar, após as eleições, um pacote de medidas estruturais para cortar gastos públicos. A reforma da tributação da renda, já em elaboração, pode ficar para 2025.

As sinalizações, feitas pelo ministro Fernando Haddad nesta segunda-feira (14), levaram a uma queda no valor do dólar e geraram otimismo no mercado. Haddad seguiu na linha de mostrar que vai continuar perseguindo o cumprimento da meta fiscal.

Entre as medidas em estudo pelos ministérios da Fazenda e do Planejamento, o governo pode propor mudanças em regras de benefícios como abono salarial, BPC (Benefício de Prestação Continuada) e seguro-desemprego para corrigir falhas e distorções nestes programas.

Dados do governo indicam um aumento nos gastos com esses benefícios, em um momento no qual a economia está crescendo.

Além disso, Haddad, indicou que a reforma do Imposto de Renda pode ficar para o próximo ano. O texto, de viés mais populista, diminui a arrecadação de impostos e – se não for devidamente compensado – pode ampliar o buraco nas contas públicas.

Recentes falas do presidente Lula de que iria garantir a isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil, cumprindo uma promessa de campanha, levantaram dúvidas sobre como o governo iria bancar a medida.

Haddad diz que governo trabalha para colocar contas públicas em ordem; Bruno Carazza comenta

Galípolo também deu sinal positivo

Outro fator que pesou positivamente ontem foi a primeira fala do futuro presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, depois de ser aprovado pelo Senado.

Ele reforçou que o Banco Central sob sua gestão vai seguir perseguindo o cumprimento da meta de inflação, tomando todas as medidas necessárias para garantir esse objetivo.

G1

https://g1.globo.com/politica/blog/valdo-cruz/post/2024/10/15/governo-pode-lancar-medidas-para-cortar-gastos-apos-a-eleicao-e-deixar-reforma-do-ir-para-2025.ghtml

Governo pode lançar medidas para cortar gastos após a eleição e deixar reforma do IR para 2025

Lula precisa melhorar vida da classe média para fortalecer democracia, diz Acemoglu

Combater a desigualdade é importante, mas não é suficiente para o Brasil fortalecer sua democracia sob o novo governo, acredita o economista Daron Acemoglu, coautor do best-seller Por que as nações fracassam e do recém-lançado Poder e progresso.

“Ao menos que Lula encontre uma forma de atrair uma parcela significativa da população que se desencantou com a democracia brasileira, não será um caminho fácil”, disse Acemoglu, professor do MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts, na sigla em inglês), em entrevista exclusiva à BBC News Brasil, concedida em setembro de 2023.

Nesta segunda-feira (14/10), o economista ganhou o Prêmio Nobel de Economia 2024 ao lado de Simon Johnson e James A. Robinson por suas pesquisas que analisam as disparidades de prosperidade entre as nações.

Para Acemoglu, o presidente brasileiro precisa ir além dos programas sociais para vencer a polarização do país.

“É preciso criar melhores oportunidades de emprego para a classe média trabalhadora, para pessoas do setor agrícola”, sugere o economista turco-americano, de etnia armênia.

“O mesmo vale para os Estados Unidos – não acredito que você vá trazer de volta os eleitores de [Donald] Trump criando um programa de transferência de renda maior. Mas há uma chance maior de trazê-los de volta mostrando que um governo democrático cria empregos para eles, lhes dá melhores escolhas e lhes permite viver suas vidas da forma que eles quiserem.”

Em Por que as nações fracassam (de 2012, relançado no Brasil pela editora Intrínseca em 2022), Acemoglu e James A. Robinson analisaram os motivos que levam alguns países a enriquecer e outros a permanecer na pobreza.

Em O Corredor Estreito (de 2019 e publicado pela Intrínseca em 2022), os mesmos autores avaliam por que alguns países conseguem conquistar a liberdade e a democracia, enquanto outros vivem em tiranias ou autocracias.

Já em Poder e progresso (de 2023, lançado no Brasil pela Objetiva em abril deste ano), Acemoglu e o também economista e ,colega de Nobel Simon Johnson analisam como, ao longo da história, diferentes escolhas levaram o avanço tecnológico a servir ao interesse das elites ou a um crescimento inclusivo, garantindo também a melhora de vida dos trabalhadores.

Para os economistas, é possível um futuro onde a inteligência artificial (IA) e as novas tecnologias digitais sejam usadas para empoderar os trabalhadores, e não para a vigilância e automação crescentes. Mas, para isso, é preciso fazer escolhas que levem as novas tecnologias nessa direção.

À BBC News Brasil, Acemoglu falou sobre a recente expansão do Brics (bloco formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) e como ela representa, na visão dele, uma “oportunidade perdida” para os países emergentes assumirem uma voz independente nesse debate.

Para o economista, países como o Brasil têm um duplo desafio: o de regulamentar as novas tecnologias para que elas não prejudiquem suas populações, sem prejudicar o avanço delas – num contexto em que as nações emergentes ainda estão atrasadas na curva tecnológica.

Acemoglu diz ainda não acreditar na renda básica universal como uma solução para a ameaça que a inteligência artificial representa ao futuro do trabalho.

“Não acho que estamos condenados a substituir o trabalho humano”, afirma o economista.

“Há um caminho alternativo e esse caminho é usar a inteligência artificial de maneira mais em favor do ser humano, em favor do trabalhador. Ao colocar tanta ênfase na renda básica universal, assumimos uma postura derrotista”, defende.

Confira abaixo os principais trechos da entrevista.

BBC News Brasil – Em anos recentes, o senhor esteve pessimista em relação ao Brasil, tendo dito que estávamos sob risco de destruir nossa democracia. O senhor acredita que esse risco passou?

Daron Acemoglu – É claro que eu estou muito feliz que [Jair] Bolsonaro não foi reeleito. E estou cautelosamente otimista que agora há espaço para reconstruir a democracia brasileira.

Mas sigo preocupado com o fato de que o Brasil ainda é um país muito polarizado. E que essa polarização pode atrapalhar o fortalecimento da democracia.

Acho que eu nunca fui pessimista ao ponto de pensar que o Brasil estava “condenado” a destruir sua democracia. Mas talvez minhas falas refletissem o fato de que, dez anos atrás, eu acreditava que a democracia brasileira estava muito segura, apesar de todos os escândalos de corrupção e todos os problemas que estavam acontecendo.

[Eu acreditava] que o Brasil nunca voltaria a uma ditadura militar. Mas, sob o governo Bolsonaro, houve momentos em que passei a temer. Quando o presidente de vocês começou a pedir intervenção militar e a dizer que ele sentia saudade do tempo em que os militares mandavam no país. E ele se manteve muito popular, quase 50% dos brasileiros o apoiavam.

Então eu acredito que isso é a polarização.

Veja, Lula ter sido eleito é ótimo. Mas, ao menos que ele encontre uma forma de atrair uma parcela significativa da população que se desencantou com a democracia brasileira, não será um caminho fácil.

O mesmo acontece nos EUA. Eu gosto de muitas das políticas da gestão [Joe] Biden, mas não acredito que elas sejam suficientes para ganhar de volta as pessoas que votaram em Trump e que se tornaram muito desiludidas com o sistema americano.

BBC News Brasil – Então o que deve ser feito para assegurar que não voltemos àquele caminho de sentirmos que a democracia está sob ameaça? O senhor acredita que endereçar a questão da desigualdade no Brasil é uma das formas de garantir isso?

Acemoglu – [Combater a] desigualdade é uma forma de garantir isso. Mas não pode ser apenas através de programas sociais. Acredito que é preciso criar melhores oportunidades de emprego para a classe média trabalhadora, para pessoas do setor agrícola…

O mesmo vale para os EUA – não acredito que você vá trazer de volta os eleitores de Trump criando um programa de transferência de renda maior. Mas há uma chance maior de trazê-los de volta mostrando que um governo democrático cria empregos para eles, lhes dá melhores escolhas e lhes permite viver suas vidas da forma que eles quiserem.

Acredito que os EUA e o Brasil têm muito em comum: são muito heterogêneos, têm sociedades muito diversas. É preciso respeitar essa diversidade e tentar criar mais e mais oportunidades para que as pessoas tenham boas condições de vida, e bons resultados econômicos dentro dessa diversidade.

E eu acho que tanto a história do Brasil, como a dos EUA, mostra que, se você tenta eliminar essa diversidade de um jeito ou de outro, isso sai pela culatra.

BBC News Brasil – O senhor também disse recentemente que o Brasil provavelmente não vai conseguir um crescimento significativo baseado apenas na exportação de commodities para a China. E que o país precisará em algum momento encontrar um outro caminho. O que o senhor vê para o futuro do Brasil?

Acemoglu – O Brasil aspirou nos anos 1950 e 1960 a ser uma potência industrial. O país tem uma grande parcela de sua mão de obra educada. Tem uma quantidade de setores em que investiu muito no passado. Então acredito que o país precisa encontrar formas de estimular o setor privado.

E o governo não pode fazer isso. O governo pode dar incentivos e ser um facilitador. Mas, no fim das contas, o setor privado precisa liderar um crescimento que não seja baseado apenas na exportação de commodities. No momento, eu não vejo isso acontecendo o suficiente.

BBC News Brasil – O senhor acredita que o boom de industrialização que estamos vendo no México e na Índia pode ser exemplo para o Brasil?

Acemoglu – Exatamente, mas talvez através de outros setores. O México tem vantagens comparativas em algumas coisas, facilitadas pela proximidade com os EUA. A Índia está apostando em outro conjunto de setores. Então o Brasil precisa encontrar em quais setores tem capital humano, conhecimento especializado e que façam sentido diante da sua posição geopolítica.

BBC News Brasil – E o momento político para isso é agora?

Acemoglu – Certamente, porque essa é a forma de criar empregos melhores para as pessoas, considerando que algumas delas se tornaram muito desiludidas com o modelo de crescimento brasileiro. Acredito que isso é parte da razão pela qual elas apoiaram Bolsonaro.

BBC News Brasil – Recentemente o senhor escreveu um artigo afirmando que a expansão do Brics anunciada em agosto é “a expansão errada do Brics”. Por que o senhor pensa assim?

Acemoglu – Fiquei muito surpreso e entristecido pela forma como essa expansão aconteceu, porque acredito que os países que foram adicionados estão em grande medida sob influência de Rússia e China.

Então isso transforma o Brics em um eixo amplamente controlado pela China, quando eu penso que o que o mundo precisa é um agrupamento de economias emergentes que deveria ter um papel maior na diplomacia internacional, mas também ter voz em questões relacionadas ao comércio internacional, tecnologia, respostas globais na área de saúde.

Então países como Brasil, Índia, Indonésia, Malásia, Turquia vão ter uma perspectiva que é muito diferente daquela da China – ou deveriam ter uma perspectiva muito diferente da China.

Pense em todas as grandes questões que devem surgir nos próximos dez anos.

Por exemplo: democracia. A China é a maior ameaça à democracia em nível global. É nisso que os países do Brics deverão trabalhar junto à China?

Com relação à globalização, por exemplo, haverá grandes tensões entre EUA e China. E precisamos de uma voz do mundo emergente que seja neutra em relação a esses dois poderes hegemônicos.

Isso não vai acontecer enquanto o grupo estiver sob influência de China e Rússia.

Na tecnologia, serão necessárias grandes decisões sobre como a inteligência artificial deverá ser usada. E a China é a maior impulsionadora do uso da IA para vigilância, mas não é disso que o mundo em desenvolvimento precisa.

BBC News Brasil – No seu artigo, o senhor reforça que as economias emergentes deveriam buscar influenciar o futuro da inteligência artificial e de outras tecnologias digitais. Por que isso é importante e por que o senhor avalia que isso não será possível sob a nova formação do Brics?

Acemoglu – Porque a China tem interesses muito distintos em se tratando do uso da tecnologia.

Por exemplo, algumas das grandes decisões sobre o futuro da inteligência artificial serão o quanto dela irá na direção de ferramentas autoritárias, censura, monitoramento, vigilância, reconhecimento facial versus ferramentas que vão de fato ajudar as pessoas comuns a se comunicarem e talvez até se engajarem em atividades dissidentes, incluindo organizações da sociedade civil, mídia de oposição, mídia crítica ao governo. A China está em uma das pontas dessa escolha.

Outra grande escolha, que é muito relevante para Índia, Indonésia e Brasil, é como as tecnologias de IA serão usadas na produção. Elas serão mais pró-trabalhador ou mais contrárias ao trabalhador?

Aí também a China tem claros incentivos, nesse caso, muito alinhados com o setor americano de tecnologia, de usar mais e mais [a inteligência artificial] para automação.

Isso em parte porque a mão de obra chinesa está envelhecendo, mas também porque a China está muito preocupada com o descontentamento trabalhista. Então usar IA e outras tecnologias de automação é muito atrativo para as autoridades chinesas por esses motivos.

Mas isso não é do interesse do Brasil, que tem uma imensa força de trabalho, que deveria ser uma de suas vantagens competitivas. Mas não será se a inteligência artificial e as tecnologias digitais forem direcionadas para mais automação.

Acredito que o Brasil poderia ter tido um papel de liderança nisso. Penso que um grupo independente nas relações internacionais seria de grande valor e que foi uma oportunidade perdida.

BBC News Brasil – Ainda no tema da China, como senhor vê a atual crise econômica por lá e isso pode, do seu ponto de vista, se tornar uma crise política maior e mudar de alguma forma a trajetória autoritária daquele país?

Acemoglu – Acredito que estamos apenas no começo desse processo.

Não espero que isso se transforme numa crise política no futuro próximo. Precisamente pela forma como a censura [chinesa] usa ferramentas de IA e como outras tecnologias repressivas têm sido utilizadas ao longo da última década na China, acredito que o espaço para protestos é limitado.

Então, se você comparar a sociedade civil chinesa hoje com aquela que prevalecia nos anos 2010, há uma grande diferença. Há muito menos liberdade, muito menos organização.

[Naquele momento] havia pessoas defendendo os diretos dos trabalhadores rurais, de proprietários de terras, tratando de questões ambientais. Havia uma pequena quantidade de imprensa “semi livre”, havia [protestos pela democracia em] Hong Kong. E tudo isso foi suprimido.

Então eu não espero que a crise econômica leve imediatamente a uma crise política. Mas a China está enredada em um impossível paradoxo.

BBC News Brasil – O que o senhor quer dizer com isso?

Acemoglu – Eu explico. O impossível paradoxo é que eles querem crescimento econômico, mas estão muito preocupados que, à medida em que a economia cresce, a classe média fará mais demandas, enfraquecendo o controle do Partido Comunista da China.

Assim, junto com o crescimento, há mais e mais controle governamental. Mas isso, por sua vez, cria ineficiências tanto no curto, quanto no longo prazo. Reduz a independência das empresas, desencoraja o verdadeiro potencial de inovação, leva a mais e mais má alocação de capital.

Então a solução criada pelo governo é mais intervenção governamental na economia e ainda mais repressão, para que o descontentamento gerado por isso não resulte em oposição ao Partido Comunista. É, portanto, uma “bola de neve” e é essa a natureza do paradoxo.

Agora, eu não acredito que isso possa durar para sempre. Então creio que, em cerca de dez anos, haverá uma crise política. Mas, no momento atual, eu não acredito que a sociedade civil, a imprensa ou qualquer tipo de organização seja forte o suficiente para que isso aconteça.

BBC News Brasil – Mudando de assunto para seu novo livro, Poder e progresso. Nele, o senhor diz que o mundo está vivendo uma “ilusão da inteligência artificial”. O que significa isso?

Acemoglu – Deixe-me primeiro fazer uma introdução, dizendo que eu acredito que as tecnologias de IA, incluindo a recente IA generativa [inteligência artificial capaz de gerar textos, imagens ou outras mídias em resposta a solicitações em linguagem comum, como o ChatGPT da OpenAI e o Bard da Google] são promissoras. Então não estou questionando que haja valor social e econômico a serem obtidos a partir dessas tecnologias.

Mas a ilusão é acharmos que podemos substituir e escantear os seres humanos. Isso é sintetizado pela busca por uma inteligência artificial geral [AI que teria a capacidade de aprender e desempenhar qualquer tarefa realizada por um ser humano] ou superinteligência.

É sintetizado também pelo esforço incessante por automatizar o trabalho e resumir e capturar toda a sabedoria humana em tecnologias simples como o ChatGPT.

As razões por que isso é uma ilusão são duas.

A primeira é que eu acredito que, no fim das contas, mesmo com mais avanços, a criatividade humana será central e muito importante, tanto para a dignidade do trabalho humano e dos seres humano, como também para a eficiência produtiva.

Em segundo lugar, ainda mais no curto prazo, essas tecnologias têm muitas limitações, então escantear os humanos leva a um caminho de ineficiência. E não estaremos obtendo os benefícios que poderíamos a partir dessas tecnologias.

BBC News Brasil – O senhor também acredita que há um certo otimismo, certo? Quer dizer, haveria uma crença de que tudo isso será para o bem. E você diz que não necessariamente, que é preciso intervir para que essas tecnologias tragam resultados positivos. O senhor pode explicar isso melhor?

Acemoglu – Toda essa busca por uma inteligência artificial geral vem combinada com um profundo “tecno otimismo”. E esse tecno otimismo tem alguns desdobramentos.

Primeiro, ele acredita que as máquinas se tornarão muito melhores do que os seres humanos rapidamente. Segundo, que isso vai gerar valor econômico. E terceiro, que isso também vai criar soluções tecnológicas para muitos problemas.

Então essa combinação faz muitos líderes do Vale do Silício e outras figuras de liderança defenderem uma perspectiva de adesão total: “Não se preocupem com problemas, privacidade, coleta de dados, desemprego, porque é tudo para o bem. Vamos rapidamente chegar a bons lugares. Vamos criar mais produção, soluções para os problemas climáticos, para as pandemias globais, para o câncer” e assim por diante.

Mas, quando combinamos isso com minha afirmação anterior de que, na verdade, as capacidades da IA são exageradas no curto prazo e não vão se realizar nem no médio prazo – a não ser que elas sejam usadas para ampliar as capacidades e o poder de agência humano – então você percebe que isso não está caminhando para nenhum bom lugar.

Estamos desempoderando as pessoas mais e mais e não chegaremos às soluções ou obteremos o valor econômico prometido.

Então eu não sou um completo pessimista, mas digo que há formas melhores de usar essas tecnologias e é por isso que precisamos de uma intervenção.

Porque a indústria americana e, por motivos distintos, a indústria chinesa, com a liderança do Partido Comunista, caminham para uma direção que não é boa. Não é democrática, não vai trazer em nenhum momento próximo os benefícios econômicos prometidos e há caminhos muito melhores disponíveis.

BBC News Brasil – No livro, o senhor aponta que impor limites ao poder das grandes empresas de tecnologia e regulá-las são passos cruciais para um futuro melhor para as tecnologias digitais. Mas, no Brasil, tivemos uma experiência recente de o Congresso tentar passar uma lei contra a desinformação nas redes sociais e voltar atrás, sob pressão de empresas como Google e Facebook, com o Google chegando a postar anúncios contra a lei na página principal do seu buscador. É realmente possível os governos regularem as big techs no cenário atual?

Acemoglu – Google, Facebook, Amazon vão fazer o que podem para barrar regulações, mesmo quando dizem ser a favor de regulações razoáveis, como disseram recentemente aos congressistas americanos.

E sim, em lugares onde os limites quanto ao uso de propaganda são mais frouxos, como no Brasil, eles vão usá-la de forma mais abusiva.

Mas acredito elas serem tão resistentes é uma prova de que é possível regular essas empresas. Se de fato a regulação não tivesse nenhum efeito, elas não estariam gastando milhões de dólares para lutar contra isso.

E há um país que mostra como efetivamente as big techs podem ser reguladas: a China.

Veja, eu não sou a favor do caminho chinês, me oponho fortemente ao Partido Comunista Chinês e não gosto dos seus métodos ou seus objetivos. Mas a China provou nos últimos cinco anos que eles podem de forma muito bem-sucedida regular as big techs.

Então eu espero que não precisemos copiar os chineses – certamente não deveríamos copiar seus métodos antidemocráticos ou seus objetivos. Mas é uma prova de que regular é possível.

Mas deixe-me dizer algo sobre Brasil, Índia, Turquia e outros países como estes.

O problema aí é muito mais difícil porque, por um lado, você quer fazer o mesmo tipo de regulação e garantir que as mazelas dessas novas tecnologias não afetem a população. Mas, diferentemente dos EUA, por exemplo, esses países estão atrasados na curva tecnológica.

Então, ao mesmo tempo, é preciso garantir que empresas e indivíduos tenham incentivos para adotar e aprender essas tecnologias rapidamente. Mas, ao fazer isso, é preciso não repetir os erros cometidos nos EUA. Então é um problema bastante difícil.

BBC News Brasil – E por que o senhor acredita que a renda básica universal não é a solução para a ameaça que a inteligência artificial representa ao futuro do trabalho?

Acemoglu – Se eu estivesse convencido de que não há nada que possamos fazer e muitos empregos irão desaparecer; de que existe acordo político para uma renda básica universal; e de que, numa sociedade sem uma renda básica universal, pessoas que recebessem uma renda básica não seriam classificadas como cidadãos de segunda classe, eu seria mais favorável a uma renda básica universal.

Mas todas essas condições não se aplicam.

Primeiro, eu não acho que estamos condenados a substituir o trabalho humano. Há um caminho alternativo e esse caminho é usar a IA de maneira mais em favor do ser humano, em favor do trabalhador.

Ao colocar tanta ênfase na renda básica universal, assumimos uma postura derrotista, fechando as portas para esse caminho muito mais atraente.

Segundo, mesmo se decidíssimos pelo caminho da renda básica, não acredito que o equilíbrio político permitiria uma renda básica universal generosa. Elon Musk, Mark Zuckerberg e os executivos da Google, que são tão resistentes a um pouquinho de regulação, não vão dizer: “Tudo bem, peguem metade da minha riqueza e destinem para uma renda básica universal.”

E terceiro, mesmo que isso acontecesse, essa ainda seria uma sociedade de duas castas. Teríamos 10%, 15% ou 20% da população que seriam os grandes advogados, engenheiros, inovadores e designers, que ganhariam todo o dinheiro e então dariam uma fração dele para o cuidado com as outras pessoas. E as pessoas que receberiam não fariam nada, só ficariam com as migalhas dos super ricos. Essa seria uma sociedade muito desigual e acho que não queremos isso.

BBC News Brasil – Então o senhor acredita que a forma de lidar com o impacto da IA sobre o trabalho é mudar sua direção?

Acemoglu – Exatamente. Redirecionar a mudança tecnológica, regular a forma como usamos a inteligência artificial e garantir mais controle governamental sobre as direções em que estamos colocando nossos esforços.

Esta entrevista foi publicada em setembro de 2023 e atualizada em 14/10/2024 para refletir o Prêmio Nobel de Economia vencido por Acemoglu e dois outros economistas.

 BBC

https://www.bbc.com/portuguese/articles/crg0rqny831o

Governo pode lançar medidas para cortar gastos após a eleição e deixar reforma do IR para 2025

A quem interessa apequenar o Supremo?

Ofensiva de bolsonaristas ao STF afronta Constituição, critica Paulo José Cunha – Antônio Cruz / Agencia Brasil

Paulo José Cunha

Nem precisa ir muito longe. Basta abrir a Constituição e logo em seu artigo 2° agente lê: “São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário”. Ou seja, os poderes têm autonomia para atuar. Mas o Supremo, como diz o nome, é o poder com competência para interpretar a Constituição. Portanto é dele a última palavra sobre qualquer pendência jurídica. E mais: a divisão dos poderes – Executivo, Legislativo e Judiciário – é um critério de organização que não pode ser abolido, pois é cláusula pétrea da Carta Magna. Só pode ser alterado por uma Constituinte legal e formalmente convocada para tal fim.

Portanto, qualquer mudança na própria Constituição terá de ser respaldada pelo… Supremo! Inclusive as que pretenderem reduzir os poderes do… Supremo!

Justamente por isso a tentativa de alterar a Constituição com a finalidade de reduzir o grau de competência do STF, como preveem diversas propostas em análise no Congresso, tem jeito, gosto e fedor de golpe. De golpe e de retaliação ao Supremo e seus integrantes, notadamente ao ministro Alexandre de Moraes, que virou pedra no sapato dos bolsonaristas depois de mandar pro xilindró os golpista do 8 de janeiro e alguns dos autores de atos atentatórios ao estado de direito, como o deputado Daniel Silveira, que, entre outras imbecilidades, publicou vídeo nas redes sociais defendendo a volta do AI-5, o documento mais violento da ditadura de 64. Além do mais, foi Moraes quem presidiu a sessão do TSE que declarou a inelegibilidade de Bolsonaro por oito anos. Tudo dentro da lei e das competências dele e do Supremo Tribunal Federal.

Não por acaso, alguns projetos aprovados pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara (de maioria bolsonarista e presidida por uma bolsonarista declarada, a deputada Carolini de Toni), facilitam a abertura de pedidos de impeachment de ministros do Supremo. Adivinha para qual deles está apontada a mira? Um dos projetos, de autoria do deputado-pastor Sóstenes Cavalcante, (PL-RJ), estabelece o prazo de 15 dias para a Mesa Diretora do Senado – leia-se: o Presidente do Senado – decidir o que fará com pedido de impeachment protocolado na Casa.

Curioso, né? Só pra refrescar a memória: ainda em setembro passado, um pedido de impeachment contra, sabe quem? Ele mesmo: Alexandre de Moraes!, aguarda parecer da Mesa do Senado. Seu presidente, senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), vem sendo duramente criticado por se recusar a por em tramitação o pedido de impeachment de Moraes. E vem sendo acusado de omissão e de não dar “uma resposta ao país”.

Além disso, há propostas limitando as decisões monocráticas de ministros do STF, classificadas como autoritárias. O detalhe é que elas existem justamente para dar mais celeridade ao judiciário, evitando que a procrastinação beneficie o réu em detrimento da parte atingida. Se as decisões monocráticas forem mesmo autoritárias, nada mais monocrático do que o poder dos presidentes da Câmara e do Senado para por pra andar ou para brecar iniciativas de impeachment de ministros do Supremo. E aí, como ficamos no meio desse puxa-estica?

Os constituintes de 1988 demoraram um ano e meio para escrever a “Constituição cidadã”, como foi batizada no dia de sua promulgação pelo deputado e presidente da Câmara Ulysses Guimarães. A própria Constituição já previa uma revisão dela, que veio a ocorrer em 1993. Mas, à época, sequer se tocou no tema das decisões monocráticas, que só vieram à baila agora,36 anos depois, justamente quando decisões monocráticas de ministros do Supremo estão ferindo interesses dos grupos bolsonaristas, exatamente os que atingiram em cheio as prerrogativas do estado
democrático de direito.

Por tudo isso, o Presidente do Supremo, Ministro Luís Roberto Barroso, mandou um recado claro ao Congresso quando afirmou que “no mundo plural, não existem unanimidades. Porém, não se mexe em instituições que estão funcionando e cumprindo bem sua missão por injunção dos interesses políticos circunstanciais e dos ciclos eleitorais”.

E é precisamente o que está acontecendo, seja na tomada de decisões que defendem a democracia, contra a qual se insurgem bolsonaristas golpistas. Seja por sentirem seus interesses pessoais feridos, como foi o caso da paralisação dos repasses de emendas parlamentares. Paralisação determinada – em decisão monocrática posteriormente referendada pelo pleno do Supremo – pelo ministro Flávio Dino. Esses interesses ficaram muito claros no resultado das últimas eleições.

Na maioria dos municípios beneficiados com emendas parlamentares seus prefeitos foram reeleitos. E os deputados, autores dessas emendas, se aproveitarão delas para engordar os discursos nas campanhas em que estarão envolvidos daqui a dois anos. Emendas parlamentares, principalmente as tais de emendas pix, aquelas que o autor não precisa identificar o destino dos recursos, só servem para engordar o capital eleitoral dos autores. Simples assim.

De resto, o chamado “pacote anti-STF” não passa de um conjunto de propostas eivadas de ressentimentos, retaliações e orgulhos próprios feridos. Basta conferir a autoria, ou seja, de onde elas vêm e o perfil dos que as elaboram e apresentaram, para perceber o objetivo oportunista e fascista embutido em cada vírgula. Ainda bem que os plenários tanto da Câmara como do Senado não têm o mesmo perfil ideológico da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, onde a bancada bolsonarista permitiu que essas propostas passassem com muita facilidade. Nem por isso é hora de ensarilhar as armas.

É hora, isto sim, de as forças democráticas novamente ocuparem os palanques, as ruas e as redes sociais em pressão pela derrubada delas, a fim de que se preserve a “plantinha frágil e tenra”, como Otávio Mangabeira se referia à preciosa democracia. Sem esquecer que se o preço da liberdade é a eterna vigilância, como dizia Thomas Jefferson, o preço da democracia… também.

Autoria

Paulo José Cunha Escritor, jornalista e professor da UnB. Foi repórter da Rede Globo, do Jornal do Brasil, de O Globo e também trabalhou na Rádio Nacional e na TV Câmara. Entre outros livros, escreveu A Noite das Reformas, sobre a extinção do AI 5.

paulojosecunha@paulojusecunha.com.br

CONGRESSO EM FOCO

https://congressoemfoco.uol.com.br/area/congresso-nacional/a-quem-interessa-apequenar-o-supremo/

Governo pode lançar medidas para cortar gastos após a eleição e deixar reforma do IR para 2025

Caixa vai reduzir cota de financiamento para imóveis de até R$ 1,5 milhão e exigir entrada maior de compradores; entenda

Alterações valem a partir de 1º de novembro. Com isso, clientes precisarão dar pelo menos 30% do valor do imóvel de entrada pelo sistema de amortização SAC e 50% pelo sistema Price.

Por Isabela Bolzani, g1

Caixa Econômica Federal fará alterações nos financiamentos para imóveis de até R$ 1,5 milhão a partir de novembro e passará a exigir um valor de entrada maior dos compradores.

Segundo a Caixa, nos empréstimos feitos com recursos do Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE), o banco passará a financiar a compra ou a construção individual de imóveis que tenham valor de avaliação ou de compra e venda limitado a R$ 1,5 milhão.

O cliente também não poderá ter outro financiamento habitacional ativo com a Caixa.

Além disso, outra mudança acontecerá nas cotas de financiamento admitidas pelo banco. A partir de novembro, a Caixa só financiará até 70% do valor do imóvel pelo Sistema de Amortização Constante (SAC). No modelo atual, válido até o final deste mês, a cota admitida é de até 80% do valor do imóvel.

Já pelo sistema Price, o banco passará a financiar até 50% do valor do imóvel. Nesse caso, a cota era de 70%.

Pelo sistema SAC, o valor total das prestações pagas vai diminuindo ao longo do tempo, por conta da parcela decrescente de juros. Já no sistema Price, o valor total é constante durante o prazo contratado.

Na prática, isso significa que os compradores precisarão dar um valor maior de entrada no imóvel.

Veja os exemplos abaixo.

🏠 Modelo SAC

  • Modelo atual: se um imóvel vale R$ 800 mil, a Caixa financia até R$ 640 mil (80%). Nesse caso, o mutuário paga 20% do valor do imóvel como entrada, ou seja, R$ 160 mil.
  • Novo modelo: a partir de novembro, o mesmo imóvel de R$ 800 mil terá até R$ 560 mil (70%) financiados pela Caixa. Os outros 30%, por sua vez, ficam a cargo do tomador (R$ 240 mil).

🏠 Modelo Price

  • Modelo atual: se um imóvel vale R$ 800 mil, a Caixa financia até R$ 560 mil (70%). Nesse caso, o mutuário paga 30% do valor do imóvel como entrada, ou seja, R$ 240 mil.
  • Novo modelo: a partir de novembro, o mesmo imóvel de R$ 800 mil terá até R$ 400 mil (50%) financiados pela Caixa. Os outros 50%, por sua vez, ficam a cargo do tomador (R$ 400 mil).

Segundo a Caixa, a alteração nas cotas de financiamento e a limitação no valor do imóvel a R$ 1,5 milhão não se aplicam às unidades habitacionais vinculadas a empreendimentos financiados pelo banco. Nesse caso, mantêm-se as condições vigentes atualmente.

As propriedades já adquiridas também não terão as regras de financiamento alteradas. A Caixa informou que as novas medidas não terão prazo de validade, ou seja, as mudanças podem ser permanentes.

Falta de recursos

A redução das cotas de financiamento e a limitação no valor do imóvel vêm diante da crescente demanda por imóveis no mercado brasileiro e pelo maior volume de saques da caderneta de poupança — origem dos recursos utilizados pela Caixa para os empréstimos via SBPE.

Segundo dados recentes do Banco Central do Brasil (BC), a caderneta de poupança registrou o maior volume de saques líquidos do ano em setembro, totalizando R$ 7,1 bilhões. Esse também foi o terceiro mês seguido de retiradas.

Em nota, a Caixa informou que a carteira de crédito habitacional do banco deve superar o orçamento aprovado para o ano de 2024. Atualmente, a instituição é responsável por quase 70% do mercado.

O banco concedeu neste ano até setembro R$ 175 bilhões de crédito imobiliário, o que representa um aumento de 28,6% em relação ao mesmo período de 2023. Foram 627 mil financiamentos de imóveis.

Em relação às contratações com recursos da poupança (SBPE), a Caixa apresenta uma participação de mercado de 48,3%, correspondendo a R$ 63,5 bilhões das operações realizadas pelo banco até setembro.

“A Caixa estuda constantemente medidas que visam ampliar o atendimento da demanda excedente de financiamentos habitacionais, inclusive participando de discussões junto ao mercado e ao Governo, com o objetivo de buscar novas soluções que permitam expansão do crédito imobiliário no país, não somente pela Caixa, mas também pelos demais agentes do mercado”, afirmou o banco em nota oficial.

G1

https://g1.globo.com/economia/noticia/2024/10/15/caixa-financiamento-imoveis.ghtml

Governo pode lançar medidas para cortar gastos após a eleição e deixar reforma do IR para 2025

Seminário discute inconstitucionalidade de PEC da autonomia do Banco Central

Economia

Ândrea Malcher

Centrais sindicais discutiram em seminário nesta terça-feira (15), na Câmara dos Deputados, a proposta de emenda à Constituição (PEC) que busca dar autonomia financeira e orçamentária do Banco Central (65/2023). O debate apontou que a proposta pode incorrer em inconstitucionalidade. Especialistas dizem, ainda, que o texto precariza os servidores da autarquia.

Relatado no Senado por Plínio Valério (PSDB-AM), o texto propõe:

  • inserir na Constituição a autonomia técnica, operacional, administrativa e financeira do BC, que já é estabelecida pela Lei Complementar 179 de 2021;
  • instituir a autonomia orçamentária da instituição financeira.

Além disso, a PEC transforma a própria natureza do BC, que hoje é uma autarquia de natureza especial, sem vinculação com nenhum ministério nem subordinação hierárquica. Pelo projeto, ele passa a funcionar como empresa pública, fiscalizada pelo Congresso Nacional com o auxílio do Tribunal de Contas da União (TCU). Isso significa que os servidores do BC passariam a ser regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), perdendo os benefícios do Regime Jurídico Único (RJU) que regem o funcionalismo público.

Fabio Faiad, presidente do Sindicato Nacional dos Funcionários do Banco Central (Sinal), avaliou que a PEC 65/2023 não foi amplamente debatida. “Foi feito um texto dessa PEC 65 que diverge muito do que se considera autonomia do BC.”

O texto, na realidade, traz uma independência muito maior do que as discussões sobre autonomia trazem na literatura, no debate político. Além disso, ele transforma a autarquia pública de regime político público que é o Banco Central em uma empresa de direito privado. Esse texto afasta o Banco Central da proximidade com o Ministério da Fazenda, do Planejamento e do governo eleito. Então, o projeto tem muitos problemas como ele está escrito”, afirmou Faiad.

O presidente do Sinal criticou o atual presidente da instituição, Roberto Campos Neto, como “um dos piores” da história e desejou que com o recém aprovado pelo Senado, Gabriel Galípolo, possa fazer uma gestão de “maior diálogo”.

Faiad pontuou ainda que transformar o BC em uma empresa pública poderia “quebrar as proteções do Estado brasileiro”. Segundo ele, o texto “vai fragilizar a supervisão que os órgãos públicos têm, vai fragilizar as regras às quais os servidores públicos e a organização pública são submetidos. E essa flexibilização das regras pode ensejar mais patrimonialismo, ingresso de servidores sem o devido concurso público, contratação de empresas sem o devido processo licitatório, o que pode facilitar uma captura do Banco Central pela banca financeira”.

Autonomia e Tesouro

A professora Larissa Dornelas, do departamento de Economia da Universidade Federal do Paraná (UFPR), chamou atenção para a insegurança jurídica que seria gerada ao tornar o BC uma “instituição de natureza jurídica única no Brasil”. Pelo parecer de Plínio Valério, o BC passaria a ter uma “natureza jurídica única, uma corporação integrante do setor público financeiro que exerce atividade estatal”.

É grande o nome, a gente não sabe do que se trata. E isso deixando o argumento de insegurança jurídica que isso gera e também da oportunidade que outras autarquias do serviço público brasileiro possam querer o mesmo distinto tratamento que a PEC 65 dá ao Banco Central”, ponderou a pesquisadora.

A economista apontou também que tanto no texto original, de Vanderlan Cardoso (PSD-GO), quanto no atual relatório, que aguarda a análise da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, há a determinação de uma Lei Complementar para a definição de “tudo o que vai ser a institucionalidade e o modo de funcionamento desse novo Banco Central”.

Não existe urgência para aprovar essa PEC. Ninguém sabe o que é essa nova instituição a ser criada. Para se mudar a Constituição Federal, em termos de uma instituição única no Brasil, o mínimo que teríamos que ter é estudo sobre isso de como essa instituição funcionará”, observou Dornelas, que acrescentou ainda que a autonomia orçamentária e financeira não demanda a mudança do regime jurídico do BC.

A especialista explicou que o orçamento do BC é dividido em duas esferas: o orçamento administrativo, que passa pela Lei Orçamentária Anual (LOA) e é destinado a pagar despesas obrigatórias e discricionárias do BC, e o orçamento da autoridade monetária, que é aprovado pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), não passa pela LOA e é destinado às operações da instituição: política monetária, cambial e creditícia.

“Portanto, não temos ameaça às operações que o Banco Central desempenha por falta de orçamento. Esse orçamento nem passa pela Lei Orçamentária Anual. Além disso, existe uma lei – 13.820 de 2019 – que garante que caso o BC tenha prejuízo, o Tesouro Nacional é obrigado a cobrir esse prejuízo. (…) Dentro da PEC, se exige que essa lei continue valendo, ou seja, a gente quer o melhor dos mundos: uma nova instituição, baseado num regime jurídico único, e que se mantenha a prerrogativa de caso o BC tenha prejuízo, o Tesouro retira seus recursos e coloca dentro do BC”, pontuou ela.

Equívocos concentuais

O professor do Departamento de Economia da Universidade de Brasília (UnB) José Luís Oreiro, por sua vez, comentou que a justificativa da PEC é um “horror de erros conceituais”. Um exemplo é quando cita a senhoriagem: a proposta trata o conceito de forma equivocada para se justificar, explica o economista.

No seminário, Oreiro explicou o uso do termo na economia: “A senhoriagem nada mais é do que a diferença entre o valor de face das notas de papel — por exemplo, uma nota de R$ 100 — e o custo de produção da mesma pela Casa da Moeda, que será de uns míseros centavos. Essa diferença entre o valor de face e o custo de produção das cédulas é apropriada pelo Estado, pois o mesmo dispõe do monopólio legal de emissão da moeda. Portanto, a quem cabe o direito de se apropriar da receita de senhoriagem é o Estado brasileiro”.

A PEC da autonomia financeira do Banco Central, segundo Oreiro, usa o termo incorretamente para justificar a sua aprovação no Congresso. A proposta define senhoriagem como “custo de oportunidade do setor privado em deter moeda, comparativamente a outros ativos que rendem juros. A apuração é realizada aplicando-se uma medida de taxa de juros nominal da economia sobre o valor da base monetária”.

Ou seja, como se fosse algo que é próprio do setor privado, e não do Estado”, declarou Oreiro. “Essa definição não está em nenhum manual de economia do mundo”.

Autoria

Ândrea Malcher

andrea@congressoemfoco.com.br

CONGRESSO EM FOCO

https://congressoemfoco.uol.com.br/area/congresso-nacional/seminario-discute-inconstitucionalidade-de-pec-da-autonomia-do-banco-central/

Governo pode lançar medidas para cortar gastos após a eleição e deixar reforma do IR para 2025

Entenda por que home office é questionado por empresas em todo mundo

pandemia de Covid-19 abalou profundamente o mundo do trabalho e impôs o home office como novo padrão de funcionamento em muitas empresas. Trabalhar à distância se transformou, para muitas pessoas, em sinônimo de flexibilidade e de um melhor equilíbrio entre vida pessoal e profissional. Mas três anos após o fim das restrições ligadas à doença na maioria dos países ocidentais, empresas multinacionais estão dando marcha a ré e mandando os funcionários voltarem para seus escritórios.

A reportagem é publicada por RFI, 14-10-2024.

Nos Estados Unidos, o PDG da Amazon, Andy Jassy, anunciou em 16 de setembro uma volta total de seus 300.000 trabalhadores ao modelo presencial a partir de janeiro de 2025.

Outras figuras importantes da indústria, como Sam Altman, do ChatGPTBob Iger, da Disney, e Elon Musk, da Tesla e SpaceX, expressaram suas reservas ou mudaram claramente suas políticas com relação ao trabalho à distância.

O grupo Tesla obriga seus empregados a passarem no mínimo 40 horas semanais nos locais de trabalho e mantém o home office como uma opção viável apenas para empregados considerados “excepcionais”.

Outros chefes de empresas vão além proibindo totalmente o teletrabalho, como o do banco JPMorganJamie Dimon, por exemplo, que proibiu o home office para executivos sêniors, afirmando que retardava a tomada de decisões.

Outros executivos, entre eles Marc Benioff, da Salesforce, e Hanno Kirner, da Dyson, alegam que o teletrabalho atrapalha a produtividade, a inovação e o desenvolvimento de habilidades.

Volta atrás na França

Em 2021, o grupo automotivo Stellantis assinou um acordo revolucionário com sindicatos franceses permitindo que seus engenheiros trabalhassem até três semanas por mês de maneira remota. Até mesmo o CEO do grupo Carlos Tavares, não esconde que passa oito dias por mês em home office em sua casa em Portugal.

Mas, de acordo com a Bloomberg em junho deste ano, a empresa pediu a seus engenheiros que voltassem a trabalhar nas fábricas para enfrentar as novas exigências de redução de tempo de desenvolvimento de um veículo elétrico em menos de dois anos.

No entanto, segundo o representante sindical Benoît Vernier, o construtor seria atualmente incapaz de acabar com o trabalho remoto, já que o grupo estabeleceu um sistema de “flex office” (sem escritório fixo), reduzindo em 30% o espaço nos escritórios. A medida permitiu à empresa de fazer economias importantes.

Trabalhadores não querem voltar

As empresas também encontram dificuldades em fazer voltar seus empregados ao trabalho. Em uma escala de 1 a 5, a volta ao escritório em tempo integral decidida pela Amazon ficou com uma nota de 1,4 durante uma pesquisa realizada entre os empregados da empresa. Eles acreditam que a obrigatoriedade do presencial terá um impacto negativo em sua vida e em sua produtividade no trabalho, de acordo com um relatório da revista Fortune.

Na França, empregados da empresa de videogames Ubisoft lançaram um chamado à greve a partir de 15 de outubro, contra a obrigatoriedade de voltar ao escritório imposta pela direção.

Como lembra o sociólogo e pesquisador da Universidade Paris-Dauphine, Jean-Yves Boulin, em entrevista à FranceInter, o teletrabalho é para muitos jovens uma condição primordial no momento de aceitar um emprego.

Menos radical que o mercado de trabalho americano, na França, as empresas oferecem contrapartidas aos empregados que vão desde a oferta de atividades esportivas nas dependências da empresa ou até mesmo uma semana de 4 dias de trabalho. Aumentos de salário também são usados para atrair os empregados mais valiosos.

Benoît Serre, vice-presidente da Associação nacional francesa de Diretores de Recursos Humanos salienta que os Estados Unidos voltaram atrás no direito ao teletrabalho em tempo integral. Ele lembra, em entrevista à FranceInfo, que na França e na Europa de maneira geral, que têm um modelo tradicionalmente presencial, poucas empresas adotaram o teletrabalho a 100%, mas usam modelos de 2 a 3 dias por semana de home office.

Segundo ele, um estudo realizado nos Estados Unidos mostra que as pessoas recebem menos aumentos de salários ou promoções quando trabalham remotamente o tempo todo.

Por outro lado, na França foi observada uma diminuição das licenças por doença de curta duração. “Existem prós e contras. Mas é verdade que existe uma procura bastante forte, especialmente nas zonas urbanas, uma vez que o home office apresenta vantagens principalmente no que se refere aos transportes, dando uma real sensação de maior autonomia no trabalho”, afirma.

“Esta é a principal expectativa das pessoas. Se a empresa conseguir implementar modelos operacionais e de gestão menos hierárquicos e menos controlados, o teletrabalho perde alguma da sua atratividade para as pessoas”, diz.

IHU – UNISINOS

https://www.ihu.unisinos.br/644818-entenda-por-que-home-office-e-questionado-por-empresas-em-todo-mundo