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EUA: Suprema Corte legitima ataque aos trabalhadores da Starbucks

EUA: Suprema Corte legitima ataque aos trabalhadores da Starbucks

Por uma votação de 8-1, a Suprema Corte dos EUA restringiu a ferramenta mais forte do Conselho Nacional de Relações Trabalhistas (NLRB, na sigla em inglês) contra violadores das leis trabalhistas: conseguir injunções chamadas de 10(j) quando punições tradicionais não são suficientes para compensar os trabalhadores prejudicados.

A decisão, escrita pelo líder da ala direita nomeada pelos republicanos na corte, Clarence Thomas, deu uma vitória à Starbucks e à classe corporativa contra os trabalhadores e o conselho. A gigante do café processou o NLRB por sua injunção 10(j) contra a empresa por demitir os “Memphis 7”, sete baristas que foram demitidos por fazer campanha para sindicalizar sua loja.

“Os trabalhadores têm tão poucas ferramentas para se proteger e se defender quando seus empregadores quebram a lei. Isso torna a decisão de hoje particularmente atroz,” respondeu Lynne Fox, presidente do Starbucks Workers United, em uma declaração postada no Twitter/X. “Isso destaca como a economia é manipulada contra os trabalhadores, até o mais alto nível da Suprema Corte.” O SWU auxilia a campanha de base dos trabalhadores.

“A Starbucks deveria ter desistido deste caso no dia em que se comprometeu a traçar um novo caminho com seus trabalhadores” — negociando com eles — “em vez de alinhar-se com outras grandes corporações com a intenção de sufocar a organização dos trabalhadores.”

“O momentum dos trabalhadores é imparável e eles não deixarão a Suprema Corte desacelerá-los.”

Trabalhadores em cerca de 450 lojas, que empregam mais de 10.000 pessoas no total, votaram para se sindicalizar. Trabalhadores dessas lojas, com a ajuda profissional do Starbucks Workers United, estão agora negociando com os executivos da Starbucks — e seus advogados anti-sindicais — por um primeiro contrato.

E trabalhadores de mais 20 lojas querem se sindicalizar, para beneficiar a si mesmos e a empresa, escreveram recentemente em uma carta conjunta ao CEO da Starbucks, Laxman Narasimhan, que o SWU postou em junho.

“Como a cara da Starbucks, somos dedicados a fornecer um serviço excepcional aos nossos clientes, mas também merecemos uma compensação justa, segurança no emprego e uma voz nas decisões que nos afetam. Acreditamos que formar um sindicato é necessário para abordar essas preocupações e melhorar as condições de trabalho de todos os funcionários da Starbucks,” diz a carta.

“Acreditamos que um sindicato não só beneficiará a nós como trabalhadores, mas também fortalecerá a Starbucks como empresa, promovendo um ambiente de trabalho mais colaborativo e produtivo.”

Mesmo sob as antigas regras que a Alta Corte, para todos os efeitos, reinstaurou, o SWU ganhou seis injunções nacionais contra a empresa de café. Essas injunções destacam como os baristas da Starbucks fazem parte de um movimento maior de trabalhadores mal pagos, sobrecarregados, explorados — na maioria jovens, trabalhadores de cor, mulheres ou combinações dessas características — que estão fartos da ganância corporativa. Suas respostas são se sindicalizar, deixar o emprego por outros mais bem remunerados, ou ambos.

A decisão ignora o contexto

Nada desse contexto estava na decisão do juiz Thomas, falando pela corte.

“O conselho argumenta que o contexto estatutário requer que os tribunais distritais que avaliam petições do §10(j) apliquem os critérios tradicionais de forma menos rigorosa, consistente com um padrão de causa razoável,” estabelecido pelo tribunal federal de apelações que lidava com o caso de Memphis, escreveu Thomas, para todos os nove juízes.

“Mas o padrão de causa razoável vai muito além de simplesmente ajustar os critérios tradicionais ao contexto do §10(j). Ele substancialmente reduz o padrão para garantir uma liminar preliminar, ao exigir que os tribunais se submetam à visão preliminar do conselho sobre os fatos, a lei e as equidades,” acrescentou a decisão do tribunal.

“Há uma diferença óbvia entre fazer o conselho mostrar que é ‘provável’ que tenha sucesso no mérito e fazer com que mostre apenas que sua teoria do caso é ‘substancial e não frívola,’ sem ter que convencer o tribunal de que sua teoria é provavelmente meritória.”

“Na verdade, é difícil imaginar como o conselho poderia perder… se os tribunais perguntarem de maneira deferente apenas se o conselho ofereceu uma teoria legal minimamente plausível, enquanto ignoram a lei ou os fatos conflitantes,” escreveu Thomas.

O efeito prático da decisão do tribunal é dificultar o uso da injunção pelo conselho trabalhista, sua ferramenta mais forte contra violadores das leis trabalhistas. Tradicionalmente, o NLRB busca tais ordens judiciais apenas quando seus remédios usuais para a violação da lei não são suficientes para compensar os trabalhadores.

Esses remédios fracos ordenam o pagamento retroativo líquido aos trabalhadores prejudicados, ordenam que as empresas os reintegrem e apaguem as demissões e outras disciplinas dos registros, e ordenam que as empresas postem um aviso de “quebramos a lei e prometemos não fazer isso novamente” nos quadros de avisos ou que oficiais do NLRB leiam em voz alta, na presença silenciosa dos chefes, para os trabalhadores. Mas não há multas — e certamente sem termos de prisão para os violadores da lei.

Para os Memphis 7, esses remédios não foram suficientes, razão pela qual o NLRB foi ao tribunal buscar a injunção. Para interromper a campanha de organização de base dos trabalhadores lá, auxiliada pelo Starbucks Workers United, a Starbucks não só demitiu os sete baristas, mas também fechou o café, pelo menos por meses.

“De acordo com o padrão tradicional, por exemplo,” onde o NLRB deve atender a quatro critérios para buscar uma injunção, deve mostrar que “é provável que tenha sucesso no mérito” do caso, escreveu o juiz Thomas.

O padrão que a Conselheira Geral do NLRB, Jennifer Abruzzo, buscou diz que o conselho só precisa mostrar que tem “causa razoável para acreditar que práticas trabalhistas injustas ocorreram,” acrescentou o juiz. “O contexto estatutário do §10(j) não obriga essa abordagem enfraquecida da equidade.”

A juíza Ketanji Brown Jackson discordou parcialmente. Ela disse que seus colegas ignoraram a intenção do Congresso e o impacto prático. A Lei Nacional de Relações Trabalhistas não “retira dos tribunais sua discrição… para emitir uma injunção 10(j),” escreveu ela.

“Mas não posso me juntar à maioria em ignorar as escolhas feitas pelo Congresso sobre como os tribunais devem exercer sua discrição à luz da autoridade do Conselho Nacional de Relações Trabalhistas sobre disputas trabalhistas. Como a maioria escolhe a simplicidade da discrição judicial irrestrita sobre as nuances da direção do Congresso, discordo respeitosamente em parte.”

Fonte: Rádio Peão, com People’s World
Texto: Mark Gruenberg
Data original da publicação: 24/06/2024

DMT: https://www.dmtemdebate.com.br/eua-suprema-corte-legitima-ataque-aos-trabalhadores-da-starbucks/

EUA: Suprema Corte legitima ataque aos trabalhadores da Starbucks

TST: Empresa de energia tem de adaptar condições de trabalho a PcDs

Acessibilidade

Decisão determina que empresa promova adequações para atender às necessidades de pessoas com deficiência.

Da Redação

A 7ª turma do TST decidiu manter condenação de uma concessionária de distribuição de energia a realizar adaptações de acessibilidade em seus estabelecimentos para pessoas com deficiência. O colegiado destacou a importância das normas de acessibilidade e a responsabilidade das empresas em garantir um ambiente de trabalho inclusivo e acessível para todos.

A ação civil pública foi ajuizada pelo MPT, buscando garantir a acessibilidade nos prédios da empresa, conforme as normas estabelecidas pela lei brasileira de inclusão e outras regulamentações pertinentes.

A empresa contestou a decisão, alegando que a determinação judicial violava o princípio da separação de poderes e que a obrigação de realizar tais adaptações deveria estar sujeita à discricionariedade administrativa.

Em primeira instância, a Justiça do Trabalho reconheceu que a empresa não havia cumprido as normas de acessibilidade necessárias e determinou a realização das adaptações. A decisão foi mantida pelo TRT da 22ª região, que ordenou à empresa que comprovasse a realização das adaptações em um prazo de 18 meses, sob pena de multa diária de R$ 1 mil.

A empresa interpôs agravo contra a decisão do TRT-22, argumentando que a determinação judicial para realizar adaptações físicas nos prédios configurava uma criação de norma jurídica abstrata, o que seria de competência exclusiva do Poder Legislativo.

No entanto, o TST rejeitou os argumentos da empresa, destacando a importância das normas de acessibilidade e a responsabilidade das empresas em garantir um ambiente de trabalho inclusivo e acessível para todos.

O relator do caso, ministro Cláudio Mascarenhas Brandão, afirmou que a decisão judicial não implica a criação de nova norma jurídica, mas sim a efetivação de direitos já previstos na legislação brasileira e em convenções internacionais das quais o Brasil é signatário.

O ministro ressaltou que a acessibilidade é um direito fundamental das pessoas com deficiência e que a empresa, ao não cumprir as normas, estava em desacordo com a Constituição Federal e a LBI.

Com a decisão, a empresa deve realizar as adaptações necessárias para garantir a acessibilidade de seus estabelecimentos, conforme as determinações judiciais.

Processo: Ag-ED-AIRR-2947-28.2016.5.22.0002

Migalhas: https://www.migalhas.com.br/quentes/410283/tst-empresa-de-energia-tem-de-adaptar-condicoes-de-trabalho-a-pcds

EUA: Suprema Corte legitima ataque aos trabalhadores da Starbucks

Bancária que sofreu retaliação por propor ação trabalhista receberá R$ 50 mil

Gratificação suprimida

Banco suprimiu gratificação paga à gerente por 22 anos.

Da Redação

Bancária de João Pessoa/PB receberá uma indenização de R$ 50 mil devido ao Banco Santander  ter cortado uma gratificação que ela recebia há 22 anos como retaliação por ter ajuizado uma reclamação trabalhista contra a empresa. A 4ª turma do TST manteve a condenação, mas reduziu o valor fixado anteriormente para a reparação.

A bancária, que atuava como gerente de relacionamento desde 1999 e era dirigente sindical, havia solicitado o pagamento de horas extras em uma reclamação trabalhista. Após essa ação, ela foi informada por escrito que, devido ao ajuizamento da ação, sua gratificação de função seria cortada e sua jornada de trabalho reduzida.

Em uma nova ação, a bancária conseguiu a restauração da gratificação e também solicitou indenização por danos morais devido à conduta abusiva do banco. O Santander alegou que a supressão da gratificação ocorreu “por força de imperativo legal e convencional”.

A 6ª vara do Trabalho de João Pessoa/PB inicialmente julgou improcedente o pedido da trabalhadora. No entanto, o TRTda 13ª região concluiu que a bancária havia exercido seu direito constitucional de recorrer à Justiça.

O TRT entendeu que a retirada da gratificação, como forma de retaliação pelo ajuizamento da ação trabalhista, não poderia ser vista como um exercício regular do direito do empregador e deveria ser coibida pelo Judiciário. Dessa forma, condenou o banco a pagar R$ 100 mil de indenização.

O relator do recurso de revista, ministro Alexandre Ramos, propôs a redução do valor da indenização, observando que em casos semelhantes o TST tem arbitrado valores entre R$ 10 mil e R$ 40 mil.

Ele considerou que R$ 50 mil é uma quantia razoável, que não representa enriquecimento sem causa da trabalhadora nem um encargo financeiro desproporcional para o banco.

Processo: 699-41.2022.5.13.0031

Migalhas: https://www.migalhas.com.br/quentes/410353/tst-bancaria-que-sofreu-retaliacao-por-propor-acao-sera-indenizada

EUA: Suprema Corte legitima ataque aos trabalhadores da Starbucks

Servidora deficiente visual poderá voltar a trabalhar perto de casa

Acessibilidade

Após a relotação, a distância de deslocamento da autora mais que dobrou, apesar de sua recomendação médica e amparo legal para condições específicas de trabalho.

Da Redação

Uma servidora pública com deficiência visual, que havia sido transferida para um local de trabalho distante de sua residência, poderá retornar a trabalhar mais perto de casa. A decisão foi proferida pelo juiz de Direito Antonio Itamar de Sousa Gonzaga, do 1º Juizado Especial da Fazenda Pública Estadual e Municipal de Manaus/AM, ao considerar os benefícios à saúde e bem-estar da autora em local de trabalho perto de casa.

A servidora precisava se deslocar 5,6 quilômetros até seu local de trabalho, mas após a relotação para uma unidade em outro bairro, a distância aumentou para 13,5 quilômetros. Na ação, ela argumentou que sua condição de deficiência visual e a necessidade de acessibilidade não foram consideradas, o que prejudicou seu desempenho, saúde e comprometeu outro vínculo empregatício.

O município de Manaus defendeu a legalidade do ato e a discricionariedade da remoção, alegando que foi motivada pelo interesse público e pela necessidade de reorganização administrativa.

No caso, a servidora apresentou um laudo médico que confirmava sua deficiência e recomendava que ela permanecesse em um local de trabalho adaptado às suas necessidades específicas, com acesso facilitado e horários compatíveis com seu tratamento.

Ao avaliar o processo, o juiz considerou o caráter permanente e restritivo da condição física da servidora, considerando ser “plausível inferir que a autora se beneficiaria de um ambiente laboral que minimizasse as barreiras físicas e sensoriais, bem como de horários de trabalho flexíveis que permitam a realização de tratamentos ou ajustes necessários, visando assim preservar sua saúde e bem-estar no local de trabalho, especialmente diante de suas limitações e direitos como pessoa com deficiência.”

O magistrado fundamentou sua decisão na lei municipal 1.118/71 (Estatuto dos Servidores Públicos do Município de Manaus), que prevê, em seu art. 61, a possibilidade de readaptação do servidor em condição específica como a da autora, e também garante a concessão de horário especial a servidor com deficiência, quando comprovado por junta médica oficial, sem compensação (art. 83-A, incluído pela lei  2773/21).

“Este dispositivo legal reforça o direito da parte autora à realocação para um ambiente de trabalho que acomode adequadamente suas consultas médicas e tratamentos relacionados à sua deficiência, facilitando assim a sua adaptação e produtividade.”

Outra lei citada na decisão é o Estatuto da Pessoa com Deficiência (lei 13.146/15), que garante às pessoas com deficiência a igualdade de oportunidades e a não discriminação por sua condição.

O magistrado também observou que o princípio da eficiência não pode ser utilizado como justificativa para a violação de direitos garantidos por normas de hierarquia superior.

Além disso, se houvesse dificuldades técnicas ou a desnecessidade de manter a servidora na unidade anterior, a administração deveria demonstrar a inexistência de outra unidade mais próxima à residência da pessoa com deficiência apta a acomodar sua lotação. E também deveria provar que não havia outro servidor, sem deficiência, que pudesse ser transferido em seu lugar.

Processo: 0407483-88.2024.8.04.0001

Migalhas: https://www.migalhas.com.br/quentes/409833/servidora-deficiente-visual-podera-voltar-a-trabalhar-perto-de-casa

EUA: Suprema Corte legitima ataque aos trabalhadores da Starbucks

Para Alexandre de Moraes, extremistas atacam imprensa e Poder Judiciário para manipular debate

ESTRATEGIA DE ATAQUE

A ascensão global de grupos populistas extremistas envolve não apenas o uso de redes sociais para disseminar notícias falsas, mas também ataques à imprensa e ao Poder Judiciário para manipular o debate público e minar a democracia. Essa avaliação é do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, para quem essas duas instituições têm sido estrategicamente desacreditadas por fazerem frente a movimentos políticos tirânicos.

“A mídia tradicional, com todos os erros e acertos que todos temos, tem responsabilidade. As redes sociais hoje são irresponsáveis. Por isso que o primeiro ataque foi em relação à mídia tradicional. E o segundo ataque foi em relação a quem? A quem competia garantir a informação correta, a quem competia garantir os direitos fundamentais, contra o racismo, o nazismo e a misoginia. Então se passou a desacreditar o Poder Judiciário”, disse Alexandre.

A fala do ministro ocorreu durante o painel “O Mundo em Eleições e o Futuro da Democracia Representativa”, que integrou o terceiro e último dia da 12ª edição do Fórum Jurídico de Lisboa. O evento foi organizado pelo Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP), pelo Lisbon Public Law Research Centre (LPL), da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, e pelo Centro de Inovação, Administração e Pesquisa do Judiciário da Fundação Getulio Vargas (FGV Justiça).

Além dele, participaram da mesa o pesquisador Riccardo Marchi, do Centro de Estudos Internacionais no Instituto Universitário de Lisboa; e Vitalino Canas, presidente do Fórum de Integração Brasil-Europa (Fibe) e professor da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa (FDUL). A moderação foi feita pelo ministro Luis Felipe Salomão, do Superior Tribunal de Justiça, também corregedor nacional de Justiça e coordenador do Centro de Inovação, Administração e Pesquisa do Judiciário da FGV Justiça.

Clique aqui para ler a íntegra da fala do ministro Alexandre em Lisboa

Acompanhe o terceiro dia do fórum:

Conjur

https://www.conjur.com.br/2024-jun-28/para-alexandre-extremistas-atacam-imprensa-e-judiciario-para-manipular-debate/

EUA: Suprema Corte legitima ataque aos trabalhadores da Starbucks

Banco Central como ‘empresa pública’ é escolha imprudente

OPINIÃO

 

Tramita no Senado a PEC 65/2023, de autoria parlamentar, que altera o regime jurídico do Banco Central. A proposta busca conferir à instituição autonomia orçamentária e financeira. Segundo sua justificativa, o robustecimento da autonomia ao BC por meio da Lei Complementar nº 179, de 24 de fevereiro de 2021, não foi suficiente para assegurar as autonomias orçamentária e financeira. Para avançar nessa direção, seria necessário alterar o arcabouço constitucional e legal aplicável à autarquia, mudando sua própria natureza jurídica.

A proposta se desenvolve em três eixos: a transformação do BC de autarquia em empresa pública, conferindo-lhe personalidade jurídica de direito privado em suposta aderência ao padrão internacional seguido por outros bancos centrais; a supervisão do cumprimento da missão institucional da autoridade monetária exclusivamente pelo Congresso; e o uso das receitas de senhoriagem, elemento integrante do chamado Orçamento da Autoridade Monetária, para o custeio das despesas da entidade, incluindo gastos com pessoal.

Cada um desses aspectos da PEC 65/2023 merece análise específica, mas o momento é de problematizar os riscos implicados na mudança da natureza jurídica do BC de autarquia para empresa pública, alguns dos quais foram explorados durante audiência pública na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado em 18 de junho.

Embora se reconheça que o BC tem encontrado dificuldades em custear suas despesas operacionais para levar adiante projetos de relevo econômico e social, como o Pix, o Drex e o open banking, e em reter servidores qualificados, o caminho traçado na PEC 65/2023 não foi o da evolução incremental da entidade pública, mas o da mudança disruptiva de seus alicerces institucionais.

Conforme advertiu na audiência pública da CCJ o ex-diretor do BC e ex-vice-presidente do Bank for International Settlements (BIS), Luiz Awazu Pereira da Silva, o balanço de riscos da escolha feita não recomenda o caminho adotado, pois tamanha mudança põe em risco a trajetória evolutiva que tem levado ao aprimoramento da atuação do BC como gestor da política monetária e autoridade de regulação e supervisão do mercado financeiro.

Ao contrário do que afirmam os defensores da PEC 65/2023, a mudança da natureza jurídica não implica em alinhamento em relação ao padrão internacional aplicável aos bancos centrais.

Com efeito, uma análise da modelagem institucional dos bancos centrais revela uma preocupação em assegurar as diversas dimensões da autonomia. Contudo, não há  diretriz inequívoca acerca de uma natureza jurídica ideal. Entende-se, ao contrário, que a natureza jurídica dos bancos centrais deve observar a tradição e as balizas legais e constitucionais de cada país.

Por outro lado, pode-se afirmar que há uma tendência histórica em atribuir aos bancos centrais autônomos natureza jurídica de direito público. Mesmo onde os bancos centrais surgiram como entidades de direito privado, a evolução institucional deles se deu em direção a uma progressiva publicização marcada pela recepção de atribuições estatais em caráter monopolístico, como a emissão da moeda, a execução da política monetária e a supervisão de instituições financeiras. Esse é o caso, por exemplo, dos bancos centrais da Inglaterra, França, Itália, Portugal e México, todas instituições regidas pelo direito público.

Autarquia federal

No caso da nossa autoridade monetária, sua a evolução institucional é marcada pelo seu surgimento como autarquia federal, nos termos da Lei nº 4.595, de 31 de dezembro de 1964. Na ocasião, a nova instituição recebeu atribuições que, durante muitos anos foram realizadas por um banco público comercial, de direito privado, o Banco do Brasil S.A., antes de serem parcialmente transferidas para a Superintendência da Moeda e do Crédito, extinta para dar lugar ao BC. Sob esse aspecto, como bem ponderou o economista André Lara Resende durante a audiência pública na CCJ do Senado, transformar o Banco Central em empresa pública não seria um avanço institucional, mas um retrocesso de mais de 80 anos.

A atuação do BC “sobre” e “no” mercado envolve funções próprias de Estado, não se admitindo, a essa altura da evolução institucional da atuação voltada à defesa do valor da moeda e à busca da estabilidade e do regular funcionamento do mercado financeiro, que se possa atribui-las a entidade de direito privado. Senão vejamos.

Ao atuar como autoridade monetária, o Bacen realiza, em nome da União, a emissão monopolística da moeda de curso forçado, devendo buscar a preservação de seu valor e a realização, ainda que subsidiária, de outros objetivos no interesse da coletividade, nos termos da LC nº 179, de 2021. Para tanto, maneja, com autonomia operacional, os instrumentos de política monetária.

Isso implica na realização de relações negociais que não têm como objetivo a busca do lucro, mas a concretização dos objetivos das políticas monetária e cambial. Eventual mudança na natureza jurídica do executor dessas políticas, que são manifestação do poder estatal, comprometeria a segurança da teia de relações jurídicas celebradas para conferir estabilidade à moeda e a controlar as flutuações no mercado de câmbio. Em vez de contribuir para a estabilidade desses mercados, a insegurança jurídica gerada pela alteração disruptiva na natureza jurídica do BC tem o potencial de tornar ainda mais instáveis relações que são estruturalmente incertas.

Da mesma forma, a atuação do BC na qualidade de regulador e supervisor dos segmentos mais significativos e sistemicamente relevantes do mercado financeiro está ancorada na sua personificação como entidade de direito público. Aliás, a própria ideia de “autoridade monetária”, muitas vezes atribuída aos bancos centrais, já sugere uma entidade que exerce proeminência ou poder vertical de mando sobre terceiros. E isso caracteriza justamente o regime jurídico de direito público, em contraste com o direito privado, marcado pela lógica horizontal negocial da igualdade.

Agente regulador

Como guardião do acesso, da permanência e da saída organizada de instituições no sistema financeiro, o BC maneja ferramentas, normas e procedimentos de direito público, expressivos da supremacia do poder estatal. É o caso do regime de autorizações, que funciona como barreira de entrada no mercado financeiro, a supervisão direta e indireta de instituições financeiras e outras entidades reguladas, a edição de normas regulatórias de escopo prudencial e comportamental, instauração de processos administrativos punitivos e aplicação de sanções, e a decretação de regimes de resolução, que funcionam como sucedâneos dos regimes de recuperação e de falências de entes empresariais.

Todo esse arsenal de poderes de mando interfere na liberdade de empresa e restringe direitos econômicos no campo do sistema financeiro. Esses poderes revelam que o Banco Central não está — nem pode estar — em relação horizontal de igualdade frente aos entes supervisionados. Contudo, a PEC 65/2023 corrói as bases dessa proeminência jurídica do agente regulador, colocando em risco a legitimidade jurídica dessa atuação, em prejuízo à segurança jurídica dos agentes públicos e dos atores privados sujeitos ao poder regulatório do Bacen.

Por fim, no tocante ao Sistema de Pagamentos Brasileiro (SPB), o BC figura, ao mesmo tempo, como agente regulador e supervisor de arranjos e instituições de pagamento e como provedor de sistemas de pagamento e de compensação. Ambas as dimensões dessa “atuação de Jano” evoluíram, com eficiência internacionalmente reconhecida, segundo os pressupostos do direito público inerentes à sua condição autárquica.

Esses exemplos ajudam a compreender que a escolha disruptiva veiculada através da PEC 65/2023 não atende às exigências de cautela que devem orientar a regulação financeira. Não há demonstração inequívoca da necessidade da alteração da natureza jurídica do BC para avançar em direção à autonomia financeira em moldes empresariais. Ademais, a escolha por caminhar em direção a maior autonomia orçamentário-financeira deve vir acompanhada de acurada (re)avaliação das estruturas e procedimentos de governança.

A ampliação recente da autonomia pessoal, por meio da outorga de mandatos aos dirigentes do Banco Central, é experiência ainda recente e atravessada por polêmicas e incertezas, na medida em que não observamos ainda nem a primeira transição de presidentes da instituição. Trata-se de experiência ainda carente de maturação cultural e política, antes de se lançar a instituição em uma experiência ainda mais disruptiva.

Por essas razões, é possível qualificar a PEC 65/2023, defendida como solução para os reconhecidos problemas financeiros enfrentados pelo BC, como uma escolha imprudente. Uma escolha que, se tivesse sido tomada por uma das instituições autorizadas a operar pelo Bacen, sofreria censura por não haver ponderado adequadamente os riscos jurídicos e financeiros implicados e a exploração de soluções geradoras de menor insegurança jurídica, institucional e (por que não dizer) financeira.