As centrais sindicais vivem um dilema no início do mandato da presidente Dilma Rousseff. Ao mesmo tempo em que reivindicam o aumento real do salário mínimo para atender suas bases, descartam afastar-se do governo federal e evitam o confronto direto com a presidente. O movimento sindical pretende influenciar os rumos da política econômica da gestão Dilma, mas não quer perder conquistas dos últimos anos, como o caixa das centrais reforçado pelo repasse do imposto sindical e a participação no governo.
O resultado é uma pressão moderada das centrais contra a gestão Dilma. “Não vamos romper. Somos parceiros e apoiamos Dilma”, diz o deputado Paulo Pereira da Silva, o Paulinho (PDT-SP), presidente da Força Sindical e um dos principais críticos do valor de R$ 545 proposto pelo Executivo para o mínimo. “Nossa ideia é disputar com [os rumos de] a política econômica. Queremos mostrar que o arrocho é a política dos derrotados, de quem estava no governo lá atrás, antes de [Luiz Inácio] Lula [da Silva] assumir”, afirma, referindo-se ao PSDB. “Dilma disse que o governo seria de continuidade”.
Semelhante ao discurso de Paulinho, Wagner Gomes, presidente da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), afirma que o esforço das centrais é evitar que o governo aposte em medidas de arrocho fiscal e aposte no crescimento com distribuição de renda. “O debate que está por trás do salário mínimo é qual o rumo que o governo vai tomar. Um lado defende uma política mais “financista”, de arrocho, e o outro quer investimento em infraestrutura para crescer”, declara.
As centrais preparam uma manifestação no Congresso para pressionar o governo a aumentar o valor do mínimo para R$ 580, na quarta-feira, véspera da data prevista para a votação do projeto de lei enviado pelo Executivo. “Mas não vamos colocar a faca no pescoço de ninguém”, diz Ricardo Patah, da União Geral dos Trabalhadores (UGT). “Não temos interesse de confrontos. Queremos só que o governo opte pelo aumento do salário mínimo e não pelos juros”, afirma.
Pela regra acertada com os sindicalistas em 2007, o mínimo deve ser reajustado por uma fórmula que leva em conta a taxa de inflação do ano anterior e a variação do PIB de dois anos antes. O aumento do piso de R$ 510 para R$ 545 não proporciona ganho real, porque o PIB não cresceu em 2009 (retrocedeu 0,2%).
Para o professor livre-docente da Unicamp Ricardo Antunes, a proposta de aumento dos sindicalistas só não é maior porque as centrais são “prisioneiras do governo”. Especializado em sociologia do trabalho, Antunes aponta para a perda de autonomia das centrais nos últimos anos, ao longo do governo do ex-presidente Lula. “As centrais dependem do governo e estão cooptadas. Contestam o reajuste sem confrontar o governo, porque querem participar dele, aumentar o espaço do “trabalho” [no Planalto]”, diz.
Líderes sindicais, no entanto, tentam marcar uma postura de independência frente ao governo federal, apesar da proximidade com a máquina pública. “O fato de termos ficado ao lado da presidente não significa que vamos apoiar tudo”, diz João Carlos Gonçalves, o Juruna, da direção da Força Sindical. “Os movimentos sociais têm que estar atentos ao governo, que é de coligação, não é de esquerda”, diz, ressaltando que há descolamento entre as centrais e o governo. O ministro do Trabalho, Carlos Lupi (PDT), é ligado à Força Sindical.
Em comum, os dirigentes reclamam da falta de diálogo com Dilma. Apesar da interlocução com Gilberto Carvalho, da Secretaria-Geral da Presidência, presidentes das maiores centrais dizem que não foram recebidos pela presidente. Para o consultor sindical João Guilherme Vargas Neto, o movimento sindical ainda está “aprendendo a reagir” no novo governo. Se com Lula a relação era de proximidade, com Dilma ainda está sendo construída. “As centrais estão passando por uma nova relação com um governo que tem um outro estilo “, comenta.
O atrito entre governo e centrais é semelhante ao que ocorreu no começo do governo Lula. Naquela época, o governo só se aproximou novamente do movimento sindical com a crise política do mensalão, em 2005.
Fonte: Valor Econômico