NOVA CENTRAL SINDICAL
DE TRABALHADORES
DO ESTADO DO PARANÁ

UNICIDADE
DESENVOLVIMENTO
JUSTIÇA SOCIAL

OPINIÃO

Por Fernando Bosi e Rodrigo Mattos Sérvulo dos Santos

Agora em novembro, a reforma trabalhista (Lei nº 13.467/2017) completará cinco anos. Promulgada em 2017, durante o governo do ex-presidente Michel Temer, ela foi proposta como uma maneira de modernizar e flexibilizar as relações de trabalho no Brasil, proporcionando um crescimento econômico do país, a partir de uma profunda reformulação da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).

 

As principais alterações foram propostas visando o acompanhamento das mudanças sociais, bem como abranger todas as relações de trabalhos até então não previstas pelo ordenamento jurídico. Assim, a reforma trouxe normas a respeito de regulamentação contratual, jornadas de trabalho, ampliação do negociado sobre o legislado, entre outras regras pertinentes ao mundo do trabalho e ao processo trabalhista.

 

Nesse sentido, uma de suas principais promessas foi a promoção da geração de empregos a curto prazo, em paralelo, com a formalização do mercado de trabalho. À época da aprovação da reforma trabalhista, quando o Brasil apresentava taxa de desemprego de 12,7% e uma média de 34,31 milhões de pessoas trabalhando por conta própria ou sem carteira registrada, acreditava-se que ela seria capaz de promover a criação de aproximadamente dois milhões de empregos em dois anos e seis milhões de empregos formais em 10 anos.

 

Na prática, contudo, o resultado não se aproximou das expectativas, isso porque a taxa de desemprego variou de maneira sutil ao longo dos últimos anos, ainda que se considere a instabilidade econômica que representou o período da pandemia da Covid-19. De acordo com os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2018, o Brasil fechou o ano com uma taxa de desemprego de 12,3%; em 2019, 11,9%; em 2020, 13,5%; em 2021, 11,1%. Nos dois primeiros trimestres de 2022, a taxa de desemprego atingiu o patamar de 11,1% e 9,3%, respectivamente.

 

Na mesma esteira, o IBGE registrou um recorde no número de trabalhadores informais no trimestre encerrado em maio de 2022: 39,12 milhões de pessoas. São 3,5 milhões a mais do que os trabalhadores com carteira assinada no período.

 

Após cinco anos, é possível observar, portanto, que a reforma trabalhista ainda não atingiu os números esperados quanto à geração de empregos, bem como que a qualidade do emprego não melhorou, uma vez que a maioria não possui carteira assinada, sendo estes trabalhos por conta própria (autônomos, “bicos”) que cresceram ainda mais.

 

Uma segunda promessa feita pela reforma trabalhista foi a diminuição da litigiosidade na Justiça do Trabalho, com uma consequente acentuação de sua eficiência.

 

Sob o viés de se coibir comportamentos oportunistas por parte dos trabalhadores na Justiça do Trabalho (má-fé) e promover maior segurança jurídica aos empregadores, a reforma alterou a CLT ao incluir os dispositivos 790-B e 791-A, § 4º, que previam serem devidos honorários periciais e sucumbenciais, sendo estes fixados entre 5% a 15%, mesmos pelos beneficiários da justiça gratuita.

 

Consequentemente, houve uma redução do número de processos trabalhistas ajuizados, conforme dados levantados pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST), o que pode indicar a adoção de um comportamento mais cauteloso por parte dos trabalhadores no momento do ajuizamento de ações:

 

Fonte: TST, estatísticas da Justiça do Trabalho (2022)Figura 1 – Comparação de casos novos, solucionados e pendentes de solução (1º grau)

No entanto, a inovação promovida pela Reforma Trabalhista acabou resultando na intervenção do Supremo Tribunal Federal (STF), o qual decidiu, com a maioria do plenário, no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 5766, pela inconstitucionalidade das regras previstas nos artigos 790-B e 791-A, § 4º, da CLT, não devendo ser imputado à parte comprovadamente beneficiária da justiça gratuita o pagamento de honorários periciais e sucumbenciais.

 

Assim, caindo por terra tal necessidade de pagamento de honorários pela parte vencida beneficiária da justiça gratuita, pode-se especular um cenário inverso ao presente, ou seja, o retorno do aumento de número de processos trabalhistas.

 

Um terceiro ponto ao qual se propôs a reforma trabalhista, foi a ampliação do negociado sobre o legislado (negociação dos sindicatos). Porém, incoerentemente, a partir da nova lei trabalhista, o pagamento das contribuições sindicais, principal fonte de renda dos sindicatos, antes descontado obrigatoriamente na folha de pagamento dos trabalhadores, passou a ser facultativa, dependendo de autorização prévia dos empregados.

 

Consequentemente, muitas entidades sindicais foram enfraquecidas, o que prejudicou a ideia de ampliação dos direitos dos empregados nas negociações coletivas.

 

Um sinal desse resultado é o fato de que, em 2021, foram realizadas um total de 34.871 convenções e acordos coletivos, segundo o Sistema Mediador do Ministério da Economia, em dados reunidos pelo Dieese, configurando-se como o menor número desde 2010. De 2011 a 2017, por exemplo, o total de convenções e acordos coletivos assinados oscilou de 46 mil a 49 mil.

 

Além do mais, nessa mesma temática do negociado sobre o legislado, com o advento da reforma trabalhista foi inserido o artigo 611-A ao texto celetista, estabelecendo, como falamos, que a convenção coletiva e o acordo coletivo de trabalho terão prevalência sobre a legislação infraconstitucional em determinados assuntos.

 

No entanto, na prática, muitos processos que envolviam direitos previstos em instrumentos de negociação coletiva foram paralisados, isso porque não eram raras as ocasiões em que determinadas cláusulas de convenções e acordos coletivos eram afastadas e/ou anuladas judicialmente, que, de certo modo, gerou um cenário de instabilidade na condução das negociações sindicais.

 

Esta insegurança só foi certificada por meio de julgamento da ARE 1.121.633, que consolidou o Tema 1.046, declarando constitucionais os “acordos e as convenções coletivos que, ao considerarem a adequação setorial negociada, pactuam limitações ou afastamentos de direitos trabalhistas, independentemente da explicitação especificada de vantagens compensatórias, desde que respeitados os direitos absolutamente indisponíveis”.

 

Já no sentido da flexibilização trabalhista, a reforma foi responsável por inserir no ordenamento jurídico brasileiro a possibilidade de trabalho intermitente, uma de suas principais apostas.

 

O contrato de trabalho intermitente trata da prestação de serviços, com subordinação, que não é contínua, não havendo jornada fixa, uma vez que o trabalhador é convocado a trabalhar de acordo com as necessidades do empregador.

 

Um dos principais motivos da instituição do trabalho intermitente foi a busca pelo aumento da formalização empregatícia e regulamentação dos chamados “bicos”, que geralmente se relacionam às atividades desempenhadas por de garçons, seguranças, empresas do ramo de eventos e comércios em determinadas épocas do ano.

 

Por se tratar de inovação na legislação trabalhista, o trabalho intermitente ainda traz dúvidas e insegurança jurídica às partes, o que pode acarretar precarização dos direitos dos trabalhadores. Tanto que, logo após o início de vigência da Lei nº 13.467/2017, foram ajuizadas no STF as ADIs 5.826, 5.829 e 6.154, que discutem a constitucionalidade do regime de trabalho intermitente.

 

Ademais, os dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) e do eSocial, quanto às formas de contratação anuais demonstram que, em 2018, apenas 0,5% das admissões foram na modalidade intermitente e, em 2019, aproximadamente 1%. Em 2020, o número de contratação de trabalhadores intermitentes foi de 1,2%, com destaque para o aumento após o mês de julho de 2020, o que possivelmente teria ocorrido em razão da pandemia e das incertezas sobre a atividade econômica. Por fim, o número de contratações anuais se manteve estável em 2021, com 1,3% das contratações formais sendo realizadas na modalidade intermitente.

 

Tais variações demonstram que, apesar de presente, a modalidade de contratação intermitente foi um fracasso, não atingindo a proporção que se imaginava, ao não ser utilizada pelas partes.

 

Ante ao exposto, é possível verificar que a reforma trabalhista, após seus cinco anos de vigência, não confirmou alguns de seus principais propósitos, como a formalização, a flexibilização e a geração de empregos.

 

As intenções por trás da reforma poderiam ser consideradas positivas, mas o que se tem visto na prática é a insegurança jurídica, conforme comprovada pelos julgamentos de inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal (STF), bem como a precarização do trabalho no Brasil.

 

Todavia, vale relembrar que os efeitos da pandemia de Covid-19 dificultaram o desenvolvimento da economia, o que prejudica a verificação dos possíveis efeitos positivos das novas regras trabalhistas no que concerne ao aumento dos postos de trabalho, por exemplo.

 

Nesse sentido, destaca-se o fato de que a flexibilização de regras trabalhistas por si só não é capaz de estimular a economia. Como bem se pode observar, é fundamental, além de reformas legislativas que visem a modernização e readequação de normas às atuais formas de relações sociais, uma retomada da economia pulsante.

 

 é mestre em Direito do Trabalho pela USP e sócio trabalhista do Almeida Advogados.

 é advogado trabalhista do Almeida Advogados.

Revista Consultor Jurídico

https://www.conjur.com.br/2022-out-31/bosie-servulo-cinco-anos-reforma-trabalhista