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O Brasil completa 20 dias de movimentos de inspiração golpista e antidemocrática em diversos pontos sem que tenha havido qualquer movimento mais firme das autoridades policiais e de defesa para debelá-los. Neste domingo (20), em Mato Grosso, a violência aponta para o risco de intensificação. O posto da concessionária da rodovia BR-163, entre as cidades de Nova Mutum e Lucas do Rio Verde, foi atacado por manifestantes. Cerca de dez homens encapuzados atiraram contra a base, atingindo o prédio e um veículo. Tocaram ainda fogo em uma ambulância e um caminhão guincho. Ninguém se feriu.

Boletim divulgado na tarde de domingo pela Polícia Rodoviária Federal (PRF) aponta que há 21 pontos de bloqueios em rodovias. As principais ocorrências são em Mato Grosso e Rondônia. Preocupado com a situação, o procurador-geral da República, Augusto Aras, convocou uma reunião do gabinete de crise do Ministério Público Federal para esta segunda-feira (21), às 10h, para discutir que providências podem ser tomadas. Além dos bloqueios nas estradas, há também diversos acampamentos de manifestantes em frente a quarteis onde pedem “intervenção federal” como reação ao resultado das eleições, que proclamaram a vitória de Luiz Inácio Lula da Silva, do PT, e a derrota de Jair Bolsonaro, do PL, que concorria à reeleição.

O que estimula a manutenção dos movimentos é a posição no mínimo ambígua e no máximo condescendente das autoridades que deveriam demovê-los. As manifestações têm um claro viés antidemocrático, uma vez que reagem ao resultado do pleito apenas porque seus participantes não gostam dele. Questionam sem provas o resultado das eleições e pedem uma intervenção militar que não seria justificada por nenhuma questão legal ou constitucional. Ou seja: pregam um golpe.

A despeito disso tudo, policiais fazem demonstrações de apoio aos manifestantes. Como mostrou o Congresso em Foco, o Ministério da Defesa enxerga os atos como “liberdade de manifestação”. O próprio QG do Exército em Brasília está cercado por um acampamento de bolsonaristas. No sábado (19), o general Walter Braga Netto, candidato a vice-presidente na chapa de Bolsonaro, em conversa no Palácio da Alvorada com uma manifestante bolsonarista, pareceu estimulá-la com uma frase enigmática: “Não percam a fé”.

No mesmo dia, o presidente do PL, Valdemar Costa Neto, reapareceu com novos questionamentos às eleições. Ele afirmou que apresentará ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) uma contestação quanto ao funcionamento de cerca de 250 mil urnas eletrônicas que, no seu entender, não poderiam ser auditadas por possuíram o mesmo número de patrimônio. O processo eleitoral brasileiro foi atestado por todas as instituições internacionais e brasileiras que acompanharam o processo.

Clima dificulta definições

É nesse ambiente que o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva reaparece em Brasília depois do périplo internacional pelo Egito, para a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, a COP27, e por Portugal para deslindar a mais delicada das questões da transição para o novo governo. Na semana passada, a transição coordenada pelo vice-presidente eleito Geraldo Alckmin concluiu as indicações para todos os setores previstos, com exceção de um: o da Defesa e da Inteligência.

A dificuldade está relacionada justamente com o clima descrito nos parágrafos acima. Nenhum outro setor do país foi tão contaminado pelo bolsonarismo que os setores militar e policial. Com Bolsonaro, militares passaram a ocupar diversas funções na administração. Há diversos casos de privilégios, como os supersalários pagos a Braga Netto e outros oficiais. A contaminação atingiu as polícias também, especialmente a Polícia Rodoviária Federal.

De acordo com uma fonte da transição, Lula sabe que será preciso intervir para descontaminar esses setores. Mas essa operação terá de ser feita com habilidade para não gerar reações que possam paralisar atividades ou crises de autoridade. Lula terá que encontrar um nome para a Defesa que ao mesmo tempo seja aceito pelas corporações e exerça autoridade sobre elas. Uma equação que não é simples, uma vez que a escalada bolsonarista dificulta diálogos.

Nomes cogitados

Alguns nomes têm sido cogitados para a Defesa, mas ainda não há consenso em torno deles. O nome que parece ter mais aceitação entre os militares é o do ex-ministro da Defesa Aldo Rebelo. Apesar da sua origem comunista, no PCdoB, Aldo é respeitado no meio e sua gestão na área é bem considerada. Aldo, porém, hoje está afastado de Lula e do atual governo. Aldo não está mais no PCdoB. Agora está filiado ao PDT, e apoiou a candidatura de Ciro Gomes no primeiro turno. O PDT apoiou Lula no segundo turno, mas Aldo não teve participação mais próxima.

Cogitou-se o nome do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski, que completa 75 anos em março e teria que se aposentar da Suprema Corte. Mas o nome não é bem visto pelos militares por seus posicionamentos no julgamento do mensalão e no impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, no qual articulou para que ela não perdesse seus direitos políticos.

Outro nome cogitado é o do ex-ministro das Relações Exteriores Celso Amorim, que também já comandou a Defesa. É, porém, outro nome sobre o qual os militares têm restrições.

Uma outra cogitação é Aloizio Mercadante, ex-ministro da Educação. Mercadante não tem muita atuação na área da Defesa. No caso, a ideia parte do fato de o ex-ministro ser filho de militar. Seu pai foi o general Oswaldo Muniz Oliva, que morreu em junho de 2020.

Finalmente, pensa-se na repetição de uma solução que já foi usada por Lula de 2004 a 2006. Quando saiu do Ministério da Defesa o diplomata José Viegas, Lula substituiu-o pelo vice-presidente José Alencar. O vice saiu-se bem na tarefa. Por isso, cogita-se repetir a ideia agora com Geraldo Alckmin. O que se comenta, porém, é que Alckmin não se anima muito com a ideia: prefere seguir trabalhando mais na articulação política, como tem feito agora como coordenador da transição.

Problemas nas polícias

Se a área da Defesa é delicada para o novo governo, fácil também não é sua interlocução com a segurança. O Congresso em Foco apurou que em grupos ligados ao setor, reclama-se da ausência de interlocução com representantes das polícias. A exceção seria Andrei Augusto Passos Rodrigues, delegado que atuou na segurança pessoal de Lula durante a campanha e estaria cotado para exercer agora a função de diretor-geral da Polícia Federal.

Segundo fonte da transição, o novo governo de fato ainda mapeia interlocutores em que possa confiar numa corporação que ficou muito contaminada. A avaliação é que há essa possibilidade na Polícia Federal, mas ela estaria muito restrita na Polícia Rodoviária Federal, onde a contaminação foi maior. No caso da PRF, cogita-se mesmo uma intervenção, com a nomeação de um diretor-geral que não seria oriundo da corporação.

AUTORIA

Rudolfo Lago

RUDOLFO LAGO Diretor do Congresso em Foco Análise. Formado pela UnB, passou pelas principais redações do país. Responsável por furos como o dos anões do orçamento e o que levou à cassação de Luiz Estevão. Ganhador do Prêmio Esso.

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