NOVA CENTRAL SINDICAL
DE TRABALHADORES
DO ESTADO DO PARANÁ

UNICIDADE
DESENVOLVIMENTO
JUSTIÇA SOCIAL

Paulo Vitor Faria da Encarnação

Férias: Direito social fundamental, assegurado pela CF e CLT, voltado ao descanso, saúde e dignidade do trabalhador, com sanções ao empregador em caso de descumprimento.

Introdução

O direito às férias ocupa posição central no ordenamento jurídico brasileiro, sendo assegurado constitucionalmente e disciplinado pela CLT. Mais do que um benefício pecuniário, esse instituto representa a concretização de direitos sociais fundamentais voltados à saúde, à dignidade e à valorização do trabalho. A efetividade desse direito exige o cumprimento de regras claras, que vinculam o empregador e asseguram ao empregado o gozo efetivo do descanso.

O presente estudo tem por objetivo analisar a concessão e fruição das férias a partir da legislação vigente, da jurisprudência consolidada e da prova documental produzida nos autos. Examina-se a evolução interpretativa ocorrida após a declaração de inconstitucionalidade da súmula 450, destacando-se a importância da proporcionalidade e da segurança jurídica. Pretende-se demonstrar que, diante da documentação apresentada e da ausência de provas consistentes da parte adversa, a improcedência da pretensão autoral é a solução juridicamente correta.

1. As férias no ordenamento jurídico brasileiro

1.1 Natureza jurídica das férias

As férias possuem natureza híbrida, pois se inserem simultaneamente no campo do direito trabalhista e da proteção constitucional à saúde do trabalhador. A Constituição da República, ao estabelecer em seu art. 7º, XVII, o direito ao gozo de férias anuais acrescidas de um terço, não apenas reforça a dimensão remuneratória da parcela, mas também evidencia seu caráter de medida voltada à tutela da dignidade da pessoa humana e da integridade psicofísica do empregado.

Ao longo do desenvolvimento histórico do direito laboral, consolidou-se a compreensão de que o descanso anual não é simples liberalidade do empregador, mas obrigação jurídica que busca conciliar produtividade com a preservação da força de trabalho. Nesse sentido, o art. 134 da CLT impõe a concessão das férias no período de doze meses subsequentes à aquisição, sob pena de pagamento em dobro, conforme art. 137. Tal previsão demonstra que a função das férias não se resume a permitir o afastamento temporário, mas a assegurar que esse afastamento se dê no momento adequado, para que o descanso cumpra sua finalidade social.

O caráter patrimonial se revela no pagamento devido pelo período de afastamento e no adicional constitucional de um terço. No entanto, esse aspecto não esgota a natureza da verba, uma vez que seu objetivo central transcende a remuneração e se volta à saúde do trabalhador. O próprio STF, ao julgar a ADPF 501, ao declarar a inconstitucionalidade da súmula 450 do TST, reconheceu que a sanção pelo atraso no pagamento não poderia ser ampliada sem previsão legal, preservando, contudo, a penalidade pelo descumprimento do prazo concessivo. Essa decisão reforça a compreensão de que o instituto deve ser analisado em sua totalidade, respeitando tanto a dimensão protetiva quanto a patrimonial.

Ademais, o entendimento jurisprudencial recente tem reiterado que a concessão das férias deve observar não apenas o aspecto temporal, mas também o efetivo afastamento das atividades, de modo que não se admite a manutenção do empregado em regime de trabalho, ainda que parcial, durante o período destinado ao descanso. A jurisprudência é firme ao afirmar que “a concessão das férias é obrigação que abrange não só o período de efetivo descanso, como também o pagamento da respectiva remuneração no prazo legalmente fixado, com estipulação de pagamento de indenização em dobro para o caso de descumprimento de qualquer uma das duas condições.1

Portanto, as férias não podem ser reduzidas a uma simples verba de natureza salarial, pois configuram instituto de natureza complexa: ao mesmo tempo direito social fundamental, garantia de saúde ocupacional e obrigação jurídica do empregador. Essa compreensão é essencial para que se reconheça que a fruição regular das férias é elemento indispensável à higidez das relações laborais, constituindo verdadeiro pilar do sistema de proteção ao trabalhador.

1.2 Fundamentos constitucionais e legais

O direito às férias encontra assento constitucional e legal que lhe confere dupla proteção: de um lado, a sua previsão expressa como direito social, e de outro, o detalhamento normativo na consolidação das leis do trabalho. O art. 7º, XVII, da CF/1988 consagra o direito às férias anuais remuneradas, acrescidas de um terço, estabelecendo garantia mínima de descanso ao trabalhador. Esse dispositivo assume caráter de cláusula pétrea, pois integra o rol dos direitos fundamentais de ordem social, voltados à preservação da saúde e da dignidade humana.

A CLT, por sua vez, disciplina minuciosamente a concessão e a fruição das férias. O art. 134 fixa o período concessivo de doze meses subsequentes ao período aquisitivo, impondo ao empregador a obrigação de conceder o descanso nesse prazo. O art. 137 prevê a sanção em caso de descumprimento, determinando o pagamento em dobro da remuneração correspondente, o que reforça o caráter cogente do instituto. Já o art. 145 estabelece que o pagamento deve ocorrer até dois dias antes do início da fruição, acompanhado do adicional de um terço constitucional.

A jurisprudência recente harmonizou a aplicação dessas normas, especialmente após o julgamento da ADPF 501, em que se declarou a inconstitucionalidade da súmula 450. A decisão afastou a interpretação que determinava o pagamento em dobro pelo simples atraso no pagamento, mantendo a penalidade apenas quando o descumprimento atinge o núcleo do direito, isto é, a ausência de concessão dentro do prazo legal.

Além disso, a reforma trabalhista (lei 13.467/17) alterou a redação do art. 134, §1º, permitindo o fracionamento das férias em até três períodos, desde que um deles tenha, no mínimo, quatorze dias corridos e os demais não inferiores a cinco dias. A exigência de concordância do trabalhador reforça a dimensão protetiva, ao impedir que a fragmentação do descanso seja imposta unilateralmente.

O conjunto normativo evidencia que o direito às férias não se limita à remuneração, mas está intrinsecamente ligado ao efetivo afastamento do trabalho. O legislador, ao prever o pagamento em dobro nos casos de descumprimento do prazo concessivo, sinaliza que o núcleo de proteção não é o valor econômico em si, mas o direito ao descanso, cuja ausência compromete a higidez física e mental do empregado. Nesse sentido, a jurisprudência tem afirmado que “o pagamento em dobro é medida de coerção ao empregador, para assegurar a fruição do descanso anual”.2

Portanto, os fundamentos constitucionais e legais convergem no sentido de resguardar o trabalhador por meio de regras rígidas de concessão, pagamento e fracionamento das férias, revelando que se trata de instituto essencial à ordem social e às condições dignas de trabalho.

1.3 Finalidade protetiva e dimensão social

As férias representam um dos mais relevantes instrumentos de tutela da saúde do trabalhador e de equilíbrio das relações laborais. A Constituição da República, ao garantir no art. 7º, XVII, o direito ao descanso anual acrescido de um terço, evidencia que não se trata de mera vantagem econômica, mas de medida protetiva, concebida para assegurar recuperação física, mental e social do empregado. A norma constitucional projeta-se como expressão do princípio da dignidade da pessoa humana e da valorização do trabalho, pilares que estruturam a ordem jurídica brasileira.

No plano legal, a CLT disciplina o instituto em harmonia com essa finalidade. O art. 134 fixa o período concessivo de doze meses, impondo ao empregador a obrigação de assegurar o descanso em prazo certo, justamente para evitar que o trabalhador, submetido à continuidade do labor, veja sua saúde e produtividade comprometidas. O art. 137 reforça esse caráter ao estabelecer o pagamento em dobro quando as férias não são concedidas no prazo legal, sanção que não se destina apenas a reparar financeiramente o empregado, mas a coagir o empregador a cumprir o dever de preservação da integridade física e psíquica do obreiro.

A jurisprudência recente reafirma esse caráter protetivo ao decidir que “o pagamento em dobro é medida de coerção ao empregador, para assegurar a fruição do descanso anual”3. Ao mesmo tempo, o STF, na ADPF 501, afastou a penalidade em dobro pelo simples atraso no pagamento, mas preservou a sanção para o caso de não concessão das férias dentro do período legal, reafirmando que a finalidade central do instituto é garantir o gozo efetivo do descanso.

Além disso, a reforma trabalhista permitiu o fracionamento das férias em até três períodos (art. 134, §1º, CLT), exigindo a concordância do trabalhador, o que reforça o aspecto social da norma, pois impede que o descanso seja fragmentado de forma prejudicial. A exigência de anuência do empregado confere proteção contra eventual imposição unilateral, garantindo que o descanso cumpra sua função de recomposição de energias.

Assim, a finalidade protetiva das férias é indissociável de sua dimensão social. Trata-se de instrumento destinado a assegurar a preservação da saúde, a convivência familiar e comunitária e o fortalecimento das relações laborais sob bases justas. O instituto ultrapassa o caráter meramente patrimonial, projetando-se como medida de justiça social e de efetivação dos direitos fundamentais dos trabalhadores.

Leia o artigo na íntegra: chrome-extension://efaidnbmnnnibpcajpcglclefindmkaj/https://www.migalhas.com.br/arquivos/2025/9/C31C5DB19BE327_Concessaoefruicaoregulardasfer.pdf

Paulo Vitor Faria da Encarnação
Mestre em Direito Processual. UFES.
paulo@santosfaria.com.br.
Advogado. OAB/ES 33.819.
Santos Faria Sociedade de Advogados.

MIGALHAS
https://www.migalhas.com.br/depeso/439931/concessao-e-fruicao-regular-das-ferias-na-clt