As propostas do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, de tentar promover justiça tributária e social, ao buscar fazer o andar de cima da pirâmide social pagar mais tributos, têm enfrentado forte resistência no Congresso Nacional. Em entrevista à BBC News Brasil, o economista Bráulio Borges, da LCA Consultores e pesquisador-associado do FGV Ibre (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas), disse que essa barreira reflete não apenas o lobby de setores privilegiados, mas também o cálculo político de lideranças parlamentares de olho nas eleições de 2026.
“Boa parte do Congresso quer elevar o preço do apoio ao governo, aproveitando-se de um momento de fragilidade do Executivo”, afirmou Borges.
Um dos principais instrumentos dessa negociação são as emendas parlamentares, que devem atingir R$ 50 bilhões em 2025 — volume considerado excessivo pelo economista.
Entre as principais propostas do Ministério da Fazenda estão o aumento do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) e a taxação de 5% sobre Letras de Crédito Imobiliário (LCI) e do Agronegócio (LCA), hoje isentas do pagamento de imposto de renda.
Ao encaminhar as medidas ao Congresso, Haddad pretende fazer caixa para reequilibrar as contas públicas, uma cobrança dos próprios parlamentares e do mercado financeiro.
Apesar disso, a Câmara dos Deputados aprovou com urgência um projeto que pretende barrar o aumento do IOF. Lideranças como o deputado Hugo Motta, presidente da Casa, afirmam que a sociedade não aceita mais impostos e cobram corte de gastos e uma reforma administrativa.
Para Borges, a crítica é contraditória: “O Congresso posa de adulto na sala, mas tem sido parte do problema fiscal”. Ele lembra que, ao mesmo tempo em que freia aumentos de impostos, o Legislativo aprovou a prorrogação de benefícios como a desoneração da folha de pagamentos de 17 setores econômicos e o Perse (programa de apoio ao setor de eventos), responsáveis por perdas de até R$ 50 bilhões em 2023.
Propostas de Haddad focam nos ricos
Na avaliação do economista, as propostas do governo Haddad atingem majoritariamente os mais ricos. “A tributação de LCI e LCA, por exemplo, não afeta a base da pirâmide. E ainda ajuda o Banco Central a conter o superaquecimento econômico”, explicou.
Esses instrumentos financeiros, ao crescerem sem tributação, reduzem a eficácia da política monetária e estimulam setores como o imobiliário e o agro a expandirem a atividade — o que vai na contramão do objetivo do BC de conter a inflação.
Emendas parlamentares
Para Borges, as emendas parlamentares estão entre os grandes entraves para o ajuste fiscal. A explosão desses repasses desde 2020, segundo ele, transformou o orçamento federal numa “excrescência”.
“O ideal seria voltar à média de R$ 10 bilhões por ano, como entre 2015 e 2019. Isso geraria uma economia de até R$ 40 bilhões”, defendeu.
Já a reforma administrativa, tida como solução mágica por parte do mercado, renderia no máximo R$ 3 bilhões ao ano, segundo cálculos do próprio economista.
Congresso e a CPMF
Borges afirmou que o Congresso tem histórico de prejudicar a sustentabilidade fiscal. Ele lembrou a extinção da CPMF (Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira) em 2007, sem medidas compensatórias, como um marco negativo. “A Lei de Responsabilidade Fiscal responsabiliza quase só o Executivo. Precisamos rever isso”, defendeu.
A falta de compromisso também é evidente, segundo ele, nas tentativas de sabotar propostas de aumento de arrecadação — mesmo que essas medidas corrijam distorções e mantenham benefícios seletivos em níveis mais razoáveis.
Risco de colapso em 2025
Caso o governo não consiga aprovar as novas fontes de receita propostas pela equipe de Haddad, terá que buscar saídas emergenciais, como receitas atípicas via leilões de petróleo ou concessões de usinas. Essas alternativas, no entanto, são incertas e não recorrentes.
Sem essas fontes, o Executivo pode ter que contingenciar investimentos do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) e cortar verbas de programas como Farmácia Popular e emissão de passaportes. Embora áreas como saúde e educação tenham pisos constitucionais protegidos, outras políticas discricionárias podem ser afetadas.
Em meio a essa queda de braços entre Executivo e Congresso, Borges criticou a ausência mais firme do presidente Lula (PT) nas negociações com o Congresso. “Não digo que ele abandonou o Haddad, mas o apoio tem sido menor do que o necessário. O ministro da Fazenda não consegue, sozinho, costurar os acordos políticos necessários”, pontuou.
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