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JUSTIÇA SOCIAL

O que está em jogo não é apenas a eficácia de um instrumento institucional específico, mas a capacidade das organizações — sindicais, partidárias e institucionais — de construir vínculos significativos com a sociedade e de sustentar processos participativos reais e duradouros.

Davide Carbonai

Nos dias 8 e 9 de junho de 2025, os cidadãos italianos foram convocados a votar em cinco referendos abrogativos: quatro sobre leis trabalhistas e um sobre cidadania. A iniciativa partiu da CGIL, maior central sindical do país, que foi responsável pela coleta de cerca de 500 mil assinaturas em apoio à realização das consultas. Após o recolhimento, as assinaturas foram submetidas à verificação da Corte Constitucional, que validou o pedido e autorizou a realização do referendo.

Com a aprovação, teve início a organização do processo eleitoral, que envolveu a preparação de cédulas distintas para cada uma das cinco propostas submetidas à consulta popular, além da definição do quórum mínimo exigido para a validação do plebiscito. Cada eleitor recebeu cinco cédulas de cores diferentes, correspondentes a temas específicos sobre a possível revogação de leis em vigor. A CGIL também teve papel ativo na mobilização popular, promovendo a divulgação das propostas referendárias junto à sociedade civil.

Para que os referendos fossem válidos, era necessário que mais da metade dos eleitores aptos comparecessem às urnas — o chamado quórum. Entre as propostas estavam: o restabelecimento da obrigatoriedade de reintegração em casos de demissão ilegal; a eliminação do teto de indenizações em pequenas empresas; novas restrições para contratos temporários; a reafirmação da responsabilidade solidária por acidentes de trabalho em contratos de terceirização; e a redução do tempo de residência necessário para a obtenção da cidadania italiana.

Apesar do apoio de partidos de oposição e de importantes entidades sindicais, diversos setores da base governista incentivaram a abstenção, justamente como estratégia para impedir o alcance do quórum. No fim, a participação popular não foi suficiente: com uma taxa de comparecimento de apenas 30,6%, o quórum não foi atingido e, consequentemente, os referendos foram invalidados. As leis, portanto, permanecem em vigor.

fracasso dos referendos de junho de 2025 confirma uma tendência já observada em muitas democracias contemporâneas: o esvaziamento da participação popular nos instrumentos formais de consulta. Embora os temas submetidos à votação — sobretudo os ligados ao trabalho e à cidadania — fossem de evidente relevância social, a incapacidade de mobilizar o eleitorado revela uma desconexão entre os promotores da consulta e amplos setores da sociedade.

Esse episódio se torna ainda mais significativo à luz das reações políticas que provocou. A centro-direita celebrou a baixa adesão como uma derrota do campo progressista, enquanto sindicatos e partidos de esquerda oscilaram entre o reconhecimento do fracasso e a recusa em assumir responsabilidades mais profundas. O resultado expôs tanto o enfraquecimento das formas tradicionais de mobilização quanto as dificuldades de reinvenção da ação coletiva no atual cenário político.

Neste contexto, o referendo italiano de 2025 fornece uma chave analítica para refletir sobre os limites contemporâneos da democracia participativa, assim como sobre os desafios da articulação política em sociedades marcadas pelo desencanto, pela fragmentação social e pela desmobilização. O fracasso, no entanto, pode ser lido também em contraste com experiências anteriores de forte envolvimento popular em processos decisórios, especialmente no campo sindical.

A CGIL construiu, nas últimas décadas, uma prática sistemática de consultas à base como forma de legitimar acordos e decisões políticas. Um exemplo emblemático foi o protocolo sobre o welfare em 2007, ratificado por meio de assembleias nos locais de trabalho com ampla participação.

Naquela ocasião, os sindicatos organizaram dezenas de milhares de assembleias para debater os termos do acordo, em um esforço deliberativo e pedagógico que envolveu milhões de trabalhadores. Em 2009, mesmo isolada, a CGIL voltou a consultar suas bases sobre a reforma do sistema contratual, promovendo cerca de 60 mil assembleias em poucas semanas e envolvendo mais de 3,6 milhões de pessoas.

Essas experiências refletiram uma concepção de democracia sindical baseada na deliberação coletiva, na transparência e na legitimação pela base — uma alternativa ao controle vertical ou meramente representativo. Esse modelo de participação sindical emergiu, em grande medida, num contexto de escassez de recursos e de crescente desconfiança nas instituições, exigindo das organizações um esforço constante de fortalecimento dos mecanismos democráticos internos. Nesses casos, a legitimidade não se limitava à representação formal, mas se fundamentava na participação ativa e no engajamento direto dos filiados.

No referendo de 2025, a CGIL, uma das principais promotoras da iniciativa, organizou assembleias, campanhas de mídia e debates nos locais de trabalho para apoiar os quesitos referendários. No entanto, esse mecanismo de participação — que funcionou com eficácia em ocasiões anteriores, como nos referendos sobre a indexação salarial em 1985 e nas consultas de 2007 e 2009 — desta vez não surtiu o efeito esperado. A ausência de quórum nos dias 8 e 9 de junho de 2025 é um sinal preocupante para as organizações sindicais e para o campo progressista italiano (e não apenas italiano).

O que está em jogo não é apenas a eficácia de um instrumento institucional específico, mas a capacidade das organizações — sindicais, partidárias e institucionais — de construir vínculos significativos com a sociedade e de sustentar processos participativos reais e duradouros.

DM TEM DEBATE

https://www.dmtemdebate.com.br/crise-da-democracia-participativa-a-abstencao-nos-referendos-italianos-de-2025-como-sintoma-politico/