A série de pesquisas da Quaest, divulgada nesta semana, reforça importantes sinais de alerta (que não são novos) ao governo Lula. As respostas dadas pelos entrevistados e a análise dos dados mostram um descompasso entre a situação positiva vivida pelo país, de um lado, e a piora na avaliação, de outro, bem como as razões para isso.
A explicação para esse cenário parece estar especialmente (mas não só) no campo da comunicação, com elementos que vão desde o uso político e enviesado de crises como a do INSS pela oposição bolsonarista nas redes sociais até as dificuldades de comunicação existentes tanto por parte do governo quanto do próprio presidente Lula.
Dentre os dados trazidos pelas pesquisas está a desaprovação de 57% ao governo (eram 56% na pesquisa de março) contra 40% de aprovação (eram 41% naquele mesmo mês).
Nesse universo, é importante salientar a análise feita por Felipe Nunes, cientista político e CEO da Quaest: “Apesar da estabilidade nos números, o contexto político mudou. O governo anunciou e começou a implementar medidas que contam com 79% de aprovação entre quem as conhece, mas cerca de 60% da população ainda desconhece essas ações. Esse desequilíbrio entre a ação e percepção tem dificultado os avanços na avaliação do governo”.
Para exemplificar, eis alguns dos temas que tiveram a melhor taxa de sucesso, extraída da relação entre o percentual dos que ouviram falar e dentre estes, os que aprovam determinadas medidas. Sobre os benefícios e isenções para motoristas de aplicativos, 32% ouviram falar e 28% aprovam, uma taxa de sucesso dentre as mais altas, de 0,88.

A linha de crédito para reformas do Minha Casa, Minha Vida, por sua vez, tem conhecimento de 40% e destes, aprovação de 35%, índice de sucesso igual ao anterior. Já o novo Vale Gás é conhecido por 59% e, nesse grupo, tem 49% de aprovação, taxa de sucesso de 0,8.
Esses casos, entre outros levantados pela pesquisa, indicam haver um imenso universo de desconhecimento das ações por parte de pessoas que, se souberem, certamente as aprovarão — mesmo considerando que nem todas serão diretamente beneficiadas pela totalidade das medidas.
Quanto à percepção sobre a economia, o índice melhorou bastante, mas também há terreno a ser conquistado, já que não faltam marcadores positivos, tais como o baixo desemprego e a evolução nos ganhos das famílias. Conforme o levantamento, a avaliação de piora nesse campo caiu de 56% para 48%.
Também melhorou a forma como as pessoas sentem a inflação em seu dia a dia. A percepção da alta nos preços dos alimentos caiu de 88% para 79%, assim como caiu de 70% para 54% o percentual dos que apontam o preço da gasolina como um problema.
Na avaliação de Nunes, “o principal fator que explica essa contradição entre melhora econômica parcial e alta desaprovação do governo Lula tem a ver com o ambiente informacional. A quantidade de notícias negativas sobre o governo foi mais do que o dobro das positivas no período. E entre os temas negativos mais lembrados está o escândalo do INSS”.
Quando questionados sobre se têm visto mais notícias positivas ou negativas a respeito do governo, apenas 19% apontam a primeira alternativa e 50%, a segunda. Outros 28% dizem não ter visto notícias.
Nesse ponto, fica patente que o governo, de fato, deve “se mostrar mais” para a população, como também precisa reverter o bombardeio da máquina da extrema direita, hábil em disseminar, de maneira rápida e ampla, todo tipo de mentiras e manipulações com feições verossímeis.
Em pergunta estimulada sobre se o entrevistado tomou conhecimento sobre as fraudes no INSS, 82% dizem que sim, enquanto 18% afirmaram que não. Para 31%, o principal responsável é o governo; 14% indicam o INSS e um considerável universo de 26% não soube ou não quis responder. Com base nesses números, observou Nunes, “a repercussão foi duas vezes maior que a das políticas públicas anunciadas”.
Arsenal bolsonarista
Se de um lado é verdade que questões como a inflação dos alimentos pesaram no dia a dia da população, por outro também é fato que tudo o que há de negativo é amplificado e o que é positivo é escondido ou deturpado nas redes oposicionistas — com apoio, claro, de parte da mídia. Nesse sentido, merece destaque conhecer o funcionamento da engrenagem bolsonarista — o Vermelho mostrou, aqui, estudo que evidencia como ela se estrutura.
Focando especificamente nas situações mais recentes que criaram maior desgaste ao governo, vale destacar o escândalo do INSS, a inflação dos alimentos e a “crise” do Pix — um típico caso de manipulação da verdade.
No final de abril, a consultoria Palver apurou que postagens relativas à fraude nas pensões e aposentadorias atingiram seu pico nos ambientes virtuais bolsonaristas no dia 24 daquele mês, dia seguinte à deflagração da Operação Sem Desconto, que descortinou o escândalo. Naquele momento, 367 a cada 100 mil publicações em canais do Whats App e Telegram mencionavam o assunto.
Conforme noticiou a coluna de Mônica Bergamo, na Folha de S.Paulo, sobre o levantamento “em ao menos 80% dos conteúdos circula a frase ‘sindicato do irmão de Lula’. A segunda expressão mais recorrente é ‘Lula ladrão’”.
Em fevereiro, medição feita pela mesma consultoria havia detectado uma mudança de foco em boa parte dos ataques da oposição nas redes. Os assuntos favoritos deixaram de permear a pauta de costumes e passaram a focar especialmente as questões de âmbito econômico, uma clara escolha para desgastar uma área que vai bem.
Segundo dados dessa pesquisa, divulgada por O Globo, “no WhatsApp, as ocorrências ligadas à pauta econômica (141) representam quase o triplo (52) das discussões e críticas do campo conservador (52). A maior diferença numérica, no entanto, aparece nas publicações do TikTok: foram 1.337 referências à economia contra 657 à agenda de costumes, a cada 100 mil posts”.
No universo econômico, os temas que mais engajavam naquele momento eram a inflação, cujo pico foi de 1.337 menções no TikTok, seguido pelo discurso falacioso em torno do Pix, com 1.150 na mesma rede.
Reportagem do The Intercept divulgada nesta quinta (4) mostrou que a extrema direita prepara-se para ir muito além desse ferramental. Conforme relato do jornalista Sérgio de Souza, que participou do 2º Seminário Nacional de Comunicação do PL de Bolsonaro, no dia 30, “as big techs estavam ali em peso, abençoando o evento e compartilhando com os participantes o ‘caminho das pedras’ para usar suas ferramentas mais novas e poderosas”.
Um dos focos era aprofundar o uso da inteligência artificial — que, sem regulação, é um prato cheio para manipulações perfeitas — e nada mais, nada menos do que nomes da Meta (dona do Facebook, Instagram e WhatsApp) e do Google foram chamados a palestrar. A situação é mais uma a mostrar de que lado essas empresas (e seus algoritmos) estão.
Reflexos e desafios
Com tudo isso — e mais as dificuldades de comunicação do próprio governo —, não se admira que a avaliação da atual gestão e do presidente tenha ficado aquém do esperado, se refletindo, também nos humores para 2026.
No caso da intenção de voto para as próximas eleições, ainda segundo a Quaest, apesar de Lula ter empate técnico com alguns dos principais postulantes da direita no segundo turno, ele ainda está percentualmente à frente de Michelle Bolsonaro (43% a 39%) e dos governadores Tarcísio de Freitas (41% a 40%), Ratinho Jr. (40% a 38%) e Eduardo Leite (44% a 35%).
Num cenário remoto com Bolsonaro — já que o ex-presidente está inelegível e prestes a ser punido pela tentativa de golpe —, o percentual seria de 41% a 41%.
Reverter os impactos da nefasta máquina bolsonarista — que joga com elementos antiéticos e conta com a ajuda dos algoritmos para disseminar seus conteúdos mais amplamente — não é fácil, mas o governo tem boas armas para lutar.
Além de avanços reais na economia e no âmbito social, tem o trunfo chamado Lula. Segundo noticiado nesta quinta-feira (5) pela Folha de S.Paulo, pesquisa encomendada pelo Palácio do Planalto mostra que a grande maioria dos entrevistados quer ouvir mais o presidente.
“Na interpretação de assessores, o resultado sugere que as mensagens do governo não têm chegado ao público e que haveria espaço para uma ofensiva concentrada na figura de Lula”, diz a publicação.
Afinal, trata-se de um capital político e tanto. Não é qualquer líder político que tem a força de Lula, que se elegeu três vezes e enfrentou a força do antipetismo, os desvios e abusos da Lava Jato, uma prisão arbitrária e o uso imoral da máquina pública pela extrema direita em 2022. Fortalecer Lula agora, aproximá-lo ainda mais do povo e mostrar as conquistas de seu governo é urgente para garantir sua quarta vitória em 2026.