A comunicação se tornou central na nossa vida, então vamos discutir o pano de fundo para esse impasse entre o Estado brasileiro e uma plataforma internacional.
Nos últimos dias, repercutiu na mídia o chamado Twitter Files Brasil, que se baseia na declaração do dono do X, ex-Twitter, de que irá desbloquear contas que foram suspensas por determinação do Supremo Tribunal Federal no inquérito dos atentados de 8 de janeiro, e que a plataforma pode deixar o país.
A era digital mudou completamente como nos comunicamos, aprendemos e conduzimos negócios, democratizando o acesso à informação e abrindo portas para inovações. Ela é central na nossa vida. Mas, com grandes poderes, vêm grandes responsabilidades: a desinformação, violações de privacidade e o discurso de ódio são desafios prementes que precisam ser enfrentados.
A agenda política traz o debate da regulação como pauta global. Internacionalmente, a União Europeia sai na frente com leis como o Digital Services Act e o Digital Markets Act, buscando tornar o espaço digital mais seguro e promover um mercado justo e aberto. O DAS inspirou vários pontos do PL 2630, sobre o qual vamos falar a seguir.
Por aqui, o PL 2630, de 2020, conhecido como Lei da Transparência e, anteriormente, como PL das Fake News, e propostas como a do deputado João Maia, materializada no PL 2768, de 2022, que buscam endereçar problemas similares. Eles refletem o esforço global em buscar um equilíbrio entre liberdade e segurança no ambiente digital. O PL 2630 é apenas o carro chefe, mas existem inúmeros outros projetos que tratam desde a proteção da infância até a necessidade de autenticar todas as contas em redes sociais.
E a divergência entre governo e oposição e quais são os pontos mais polêmicos desse debate?
Nesse debate, governo e oposição encontram tantos pontos em comum, como a defesa da privacidade e liberdade de expressão, quanto divergências, especialmente sobre como a regulação deve ser implementada. Enquanto o governo pode enfatizar o papel regulatório do estado para proteger os usuários e garantir equidade, a oposição tende a valorizar a liberdade de mercado e a autorregularão, ressaltando os riscos de censura e limitação da inovação.
E por que regular a internet?
Os principais problemas na internet hoje incluem a disseminação de fake news, discurso de ódio, violações de privacidade e ataques cibernéticos. Esses desafios não apenas afetam a experiência online dos usuários, mas também têm implicações legais, ferindo leis brasileiras relacionadas à difamação, direitos autorais e proteção de dados pessoais.
O Marco Civil da Internet já nos dá uma base para essas discussões, especialmente em relação à responsabilidade dos provedores de conteúdo. O percurso do PL 2630 destaca o intenso debate em torno do tema. O art. 19, que trata da responsabilidade dos provedores de aplicações por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros,
O Projeto de Lei 2630 propõe medidas para regulamentar a atividade nas redes sociais, indo além da remoção de conteúdo por via judicial. Entre os pontos mais debatidos, estão a proibição de contas falsas que simulam a identidade de pessoas ou entidades, o uso restrito de bots para automação, a limitação do alcance de mensagens amplamente compartilhadas, e a exigência de manter registros de mensagens em massa por três meses. Também se busca maior transparência, exigindo a identificação de usuários que financiam anúncios, e proibindo contas oficiais governamentais de bloquear cidadãos. Além disso, propõe-se a criação de um Conselho de Transparência e Responsabilidade na Internet para fiscalização, a obrigatoriedade de sedes brasileiras para provedores de redes sociais, e a aplicação de sanções às empresas que não cumprirem as novas regras (3).
As críticas ao PL 2630, conhecido como Lei das Fake News, que vem sobretudo da oposição, giram em torno da preocupação com a potencial restrição à liberdade de expressão e o medo de uma intervenção estatal excessiva na internet, o que poderia centralizar o controle e limitar as liberdades digitais. Algo mais além disso?
Há também receios de que a legislação possa desestimular a inovação no setor digital, prejudicando startups e empresas tecnológicas. Questiona-se a eficácia das medidas propostas devido à complexidade da natureza global da internet. Preocupa-se, ainda, com o uso político da lei para suprimir vozes dissidentes.
Em meio às eleições municipais e eventos significativos, como os de 8 de janeiro, qual é a saída? Buscar uma regulação equilibrada feita pelo Estado ou pressionar por uma autorregularão mais rigorosa pelas empresas?
O desafio é encontrar o ponto de equilíbrio entre a liberdade que todos valorizamos e a responsabilidade que a era digital exige. A verdade é que o mundo digital não é mais um ambiente seguro, e tende a piorar.
À medida que nos aproximamos das eleições municipais, a importância de uma legislação bem balanceada se torna ainda mais clara, destacada pelo debate profundo da capacidade do TSE de intervir em conteúdo online e pela autoridade do STF em demandar informações das plataformas, uma necessidade evidenciada após os eventos marcantes de 8 de janeiro.
O princípio da liberdade de expressão é um pilar da Constituição Brasileira, mas cabe lembrar que se distingue da abordagem quase absolutista vista na legislação dos EUA, a Primeira Emenda.
No Brasil, a liberdade de expressão é cuidadosamente ponderada contra outros direitos essenciais, como honra, privacidade e segurança.
Esse equilíbrio mostra que não é tarefa fácil e que, independente da ideologia, a complexidade do tema exige que se dê uma atenção e tempo a este assunto como nunca se deu antes.
Nos últimos dias, veículos de várias partes do mundo repercutiram o embate entre Elon Musk, dono do X (o antigo Twitter), com a Justiça brasileira, em particular com o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF).
Alguns jornais e sites chegaram a questionar se as últimas publicações do bilionário podem incentivar e acelerar a regulamentação das mídias sociais no Brasil.
O Financial Times, do Reino Unido, por exemplo, repercutiu a manifestação do advogado-geral da União, Jorge Messias. Depois dos últimos posts de Musk, ele classificou como “urgente” a necessidade de regulamentar as plataformas digitais.
Sim, o advogado-geral da União disse: “Não podemos viver numa sociedade em que bilionários domiciliados no exterior têm o controle das redes sociais e se colocam em posição de violar o Estado de Direito, descumprindo ordens judiciais e ameaçando as nossas autoridades”, diz a BBC.
O texto acima expressa a visão de quem o assina, não necessariamente do Congresso em Foco. Se você quer publicar algo sobre o mesmo tema, mas com um diferente ponto de vista, envie sua sugestão de texto para redacao@congressoemfoco.com.br.
AUTORIA
BETH VELOSO Doutoranda pela Universidade do Minho, em Portugal, e mestre em Políticas de Comunicações pela University of Westminster, na Inglaterra. É jornalista e atua como consultora legislativa da Câmara, nas áreas de Comunicação, Informática, Telecomunicações e Ciências da Comunicação. Tem especial interesse nos temas de regulação da internet, capitalismo digital e capitalismo de vigilância.