Leticia Ribeiro Crissiuma de Figueiredo
O aumento de tarifas nos EUA pressiona exportações brasileiras, exigindo estratégias trabalhistas e negociações coletivas para preservar empregos.
O recente aumento de tarifas pelo Governo dos Estados Unidos representa um desafio não apenas no campo comercial, mas também no âmbito trabalhista para o Brasil. A elevação dos custos tende a gerar efeitos adversos significativos sobre o mercado de trabalho nacional, atingindo de forma mais direta os setores industriais fortemente integrados às cadeias produtivas norte-americanas. Nesse cenário, o aumento do custo de exportação repercute especialmente em áreas estratégicas, como a siderurgia, a produção de alumínio e o setor metalmecânico, que possuem grande dependência das relações comerciais com os Estados Unidos.
A redução das margens de lucro pode levar empresas exportadoras a rever seus planos de produção, investimentos e até mesmo de expansão no curto e médio prazo. Essa retração gera reflexos diretos sobre o quadro de pessoal, tornando necessária uma preparação cuidadosa por parte dos empregadores. Para lidar com esse cenário, é fundamental estruturar previamente planos de ação que contemplem instrumentos trabalhistas já previstos na legislação, como a redução proporcional de jornada e salário (art. 7º, VI, da Constituição e art. 611-A da CLT), sempre mediante negociação coletiva. Esse mecanismo, quando bem aplicado, oferece uma alternativa eficaz para o ajuste de custos, evitando que a primeira medida adotada seja o corte de postos de trabalho.
Como as medidas tarifárias afetam setores inteiros da economia, o papel desempenhado por sindicatos e acordos coletivos torna-se ainda mais relevante. A CLT oferece instrumentos que permitem ajustes tanto em nível setorial quanto empresarial, possibilitando a adoção de bancos de horas, a flexibilização de escalas e até compensações diferenciadas. Nesse contexto, é essencial que os empregadores busquem estabelecer um diálogo antecipado com as entidades sindicais, apresentando pautas claras de negociação. Esse movimento preventivo contribui para reduzir a ocorrência de litígios, além de garantir maior previsibilidade e segurança não apenas para as empresas, mas também para os trabalhadores envolvidos.
De qualquer forma, é bastante provável que reestruturações produtivas se tornem inevitáveis, o que pode resultar em processos de dispensa coletiva. No Brasil, esse tipo de medida demanda cautela jurídica redobrada. Embora o STF já tenha decidido que a autorização sindical não é obrigatória, a ausência de comunicação prévia e transparente com o sindicato da categoria aumenta consideravelmente o risco de judicialização. Por isso, ainda que não seja uma exigência legal, a prática de diálogo institucional é altamente recomendada como forma de prevenir conflitos e preservar a segurança jurídica das empresas.
Havendo uma redução significativa de postos de trabalho, é recomendável que as empresas busquem, de forma preventiva, a mediação com sindicatos ou comissões internas de empregados. Esse diálogo deve ser acompanhado da devida documentação das razões econômicas que justificam a reestruturação, como a queda no volume de pedidos, o aumento expressivo de custos ou a perda de competitividade no mercado internacional. Ainda que tais medidas não eliminem totalmente a possibilidade de futuras discussões judiciais, sua adoção contribui de maneira relevante para mitigar riscos, reduzindo a chance de condenações por dano moral coletivo ou mesmo de determinações de reintegração de empregados.
Empresas com forte dependência do mercado norte-americano podem se ver obrigadas a buscar novos nichos de atuação ou expandir para outros mercados. Esse movimento, no entanto, exige a capacitação da mão de obra para assumir diferentes linhas de produção ou desempenhar novas funções dentro da própria estrutura empresarial. Nessas situações, é recomendável que as empregadoras invistam em programas de treinamento interno e estabeleçam parcerias com o Sistema S (SENAI, SESI, entre outros) para promover a requalificação dos trabalhadores. Além de agregar valor ao negócio ao ampliar a versatilidade da equipe, iniciativas desse tipo fortalecem a imagem institucional da empresa como socialmente responsável e comprometida com o desenvolvimento humano.
Por fim, em cenários de maior pressão econômica, muitos empregadores acabam descuidando do cumprimento de obrigações acessórias, como o pagamento de adicionais, a manutenção de benefícios ou a correta disponibilização de EPIs – equipamentos de proteção individual. Essas falhas, ainda que pontuais, podem elevar significativamente o passivo trabalhista e comprometer a sustentabilidade do negócio no longo prazo. Por isso, sobretudo em períodos de retração, torna-se indispensável reforçar rotinas de auditoria interna trabalhista, garantindo que todas as exigências legais e contratuais sejam observadas de forma consistente. A experiência mostra que investir em prevenção sempre representa um custo muito menor do que enfrentar ações judiciais coletivas e lidar com seus potenciais consequências financeiras e reputacionais.
A redução da competitividade dos produtos exportados, somada à necessidade de ajustes na capacidade produtiva, impõe às empresas o desafio de adotar estratégias juridicamente seguras e bem estruturadas para readequar seu quadro de pessoal. Nesse processo, o respeito aos marcos normativos locais, aliado à prática da negociação coletiva preventiva e ao alinhamento entre gestão empresarial e compliance trabalhista, torna-se essencial. Esses elementos, quando trabalhados de forma integrada, representam fatores determinantes para mitigar riscos, fortalecer a segurança jurídica e preservar a sustentabilidade das operações diante do novo cenário econômico.
Leticia Ribeiro Crissiuma de Figueiredo
Sócia da área trabalhista de Trench Rossi Watanabe.
