Marco Antônio Aparecido de Lima
Os limites necessários à consideração do impacto do trabalho subordinado na saúde mental do trabalhador e a necessária valorização de quem empreende.
O conceito de valor do trabalho humano tem passado por transformações significativas nos últimos anos. O trabalho tradicional, com vínculo empregatício e subordinação, antes visto como instituição que enobrece e dignifica o ser humano, vem sendo, por alguns, reinterpretado como fator de adoecimento e desvalorização.
Essa mudança de percepção é reforçada por interpretações equivocadas sobre a responsabilização do empregador quanto aos fatores de risco psicossociais que afetam os trabalhadores, muitas vezes exagerando sua abrangência e atribuindo ao trabalho subordinado a origem de todos os males de natureza “social” que afetam o empregado.
Paralelamente, com o avanço da internet e das novas formas de ocupação, observa-se entre parte da chamada “Geração Z” uma valorização crescente do trabalho autônomo e da independência profissional, em detrimento da contratação formal regida pela CLT – Consolidação das Leis do Trabalho. Para muitos, a dignidade está em “não ter patrão”, apostando em carreiras como influenciadores digitais ou empreendedores individuais.
A consequência imediata da conjugação dessas ideias é a tendência de as organizações repensarem a contratação massiva de mão de obra, optando por estratégias mais comedidas na criação de novos postos de trabalho. Nesse contexto, a automação surge como alternativa atrativa para as empresas, uma vez que elimina variáveis humanas como adoecimento e conflitos trabalhistas.
Como já alertava um experiente empresário, “chegará o tempo em que desejar o insucesso de um concorrente será o mesmo que desejar que ele tenha muitos empregados”. Tal previsão parece cada vez mais próxima da realidade.
É certo que a preocupação com os efeitos sociais do trabalho representa um avanço civilizatório. A consideração dos fatores psicossociais como elementos de responsabilidade patronal é um reflexo disso. No entanto, é preciso reconhecer que o empreendedor brasileiro já enfrenta pesados encargos fiscais e administrativos, além da concorrência internacional. Exigir que ele também assuma responsabilidades por problemas sociais alheios ao ambiente de trabalho – que deveriam ser enfrentados pelo Estado – é um fator que desestimula a geração de empregos formais.
O termo “trabalho” teria origem no latim tripalium, instrumento de tortura da Antiguidade. Com o tempo, o trabalho passou a ser visto como elemento de dignidade e progresso. No entanto, observa-se um retrocesso conceitual, com o trabalho subordinado sendo novamente associado a sofrimento e punição.
Embora práticas abusivas devam ser firmemente combatidas – como jornadas habitualmente exaustivas, discriminação e assédio moral ou sexual – não se pode exigir do empregador que assuma, sozinho, a responsabilidade por todos os fatores que afetam a saúde mental do trabalhador. Problemas sociais mais amplos devem ser tratados por políticas públicas eficazes, e não exclusivamente por meio de ações judiciais ou fiscalizações punitivas.
Não se pode permitir, tampouco, que se naturalize a tese da “nocividade do trabalho subordinado”, ignorando o valor e o respeito que merecem aqueles que, de forma resiliente e até heroica, ainda insistem em criar empregos, gerar renda e sustentar o Estado com tributos cada vez mais elevados.
É necessário, sim, promover diretrizes que incentivem uma gestão proativa e colaborativa, envolvendo empregadores, trabalhadores e seus representantes na identificação, avaliação e mitigação de riscos psicossociais. Mas isso deve ser feito com equilíbrio, sem fomentar um ambiente de insegurança jurídica, fiscalizações arbitrárias ou demandas judiciais oportunistas contra quem emprega.
Marco Antonio Aparecido de Lima
Advogado do escritório Lima & Londero Advogados.