Na última quarta-feira (9), o Supremo Tribunal Federal (STF) retomou o julgamento do processo que trata da implementação do juiz de garantias, incluído em 2019 no Código de Processo Penal. O caso estava parado desde junho, quando o relator Luiz Fux votou pela inconstitucionalidade do novo mecanismo. Na próxima quarta-feira (16), está prevista a retomada do julgamento que pode mudar a dinâmica dos processos criminais no Brasil.
A criação do juiz de garantias foi uma das primeiras derrotas políticas do hoje senador Sergio Moro (União-PR). Durante seu exercício como ministro da Justiça, apresentou o projeto de lei que ficou conhecido como “pacote anticrime”, prevendo uma série de medidas de recrudescimento da lei penal e fortalecimento da autoridade de órgãos de segurança.
O projeto foi aprovado ainda em 2019, sofrendo profundas mudanças ao longo do processo. Entre elas, houve a inclusão de uma emenda proposta pelo ex-deputado Marcelo Freixo, um dos principais opositores de Bolsonaro, que incluía a criação do juiz de garantias. O ex-presidente vetou dezenas de artigos da lei aprovada, mas manteve a mudança.
De acordo com o advogado criminalista Christian Thomas Oncken, “o juiz de garantias é uma modalidade do Judiciário com um juiz atuante na etapa pré-processual”. Com isso, a fase de inquérito, em que são realizadas as investigações e pedidos relacionados, como pedidos de prisão preventiva ou de habeas corpus, é conduzida por um juiz, e a fase processual, onde ocorre o julgamento de mérito, é realizada por outro.
“Defensores dessa modalidade a enxergam como uma forma de garantir com que a etapa processual não seja contaminada pela visão de um juiz que acompanha o caso desde a investigação, porque é uma etapa em que existem dúvidas sobre a culpabilidade ou não daquele agente”, relatou. Essa tese foi defendida no plenário do STF pelos ministros Dias Toffoli e Cristiano Zanin. Adeptos do garantismo penal, eles defendem que a adoção do juizado de garantias se torne obrigatória a partir de um ano após a conclusão do julgamento.
Outra corrente de juristas já considera inconstitucional a criação do juiz de garantias. “Existe uma controvérsia: muitos magistrados defendem que a imparcialidade faz parte da natureza de seu serviço. Sendo assim, o juiz de garantias seria uma etapa desnecessária”. A existência de mecanismos legais para afastar juízes considerados parciais, na visão deles, seria uma evidência de que a imparcialidade deve ser presumida.
Também existe, entre os opositores ao juizado de garantias, a tese de que ele pode violar o princípio da eficiência. “Para aplicar a nova lei, vai ser necessário gastar muito dinheiro. Será necessário criar concursos ou outras formas de seleção focados nessa nova modalidade, o que implica em pagar mais gente. No fim, você onera o Estado para incluir uma nova etapa processual”, apontou.
Quem defende esse lado no julgamento foi a entidade que deu abertura ao processo, a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB). Fux entendeu da mesma forma, e em seu voto, propôs que o juiz de garantias seja considerado uma opção aos tribunais, e não uma modalidade processual obrigatória.
Christian Thomas acredita que o resultado tende a chegar em um meio termo. “Existem diversos caminhos possíveis. Podem haver ressalvas por parte de ministros sobre a parte orçamentária, está em aberto também a possibilidade de se utilizarem juízes substitutos para isso. Ainda é cedo para antecipar um possível desfecho”, avaliou
A retomada do julgamento na quarta-feira não necessariamente marca o fim do processo, havendo ainda ampla margem para que um dos ministros peça vistas.
AUTORIA

LUCAS NEIVA Repórter. Jornalista formado pelo UniCeub, foi repórter da edição impressa do Jornal de Brasília, onde atuou na editoria de Cidades.