A professora, ativista e pensadora mexicana tira um momento para refletir sobre o panorama político, econômico e social que a próxima presidente do México terá que enfrentar, escolhida neste 2 de junho, em uma eleição onde serão renovados até 20.000 cargos políticos em todo o país.
A reportagem é de Susana Albarrán Méndez, publicada por El Salto, 01-06-2024.
Raquel Gutiérrez Aguilar é uma matemática mexicana e doutora em sociologia com uma longa carreira militante e ativista. Foi cofundadora e integrante do Exército Guerrilheiro Tupac Katari (EGTK), guerrilha majoritariamente aimará que operou no altiplano boliviano entre 1986 e 1992. Por sua participação, foi detida e ficou presa cinco anos, em La Paz. Ao sair, dedicou-se ao ensino universitário sem deixar a militância de base. Em 2001, voltou ao México e, como pesquisadora da Universidade Autônoma de Puebla e da UNAM, estudou e documentou os processos constituintes do Equador e da Bolívia. Entre seus livros, destacam-se: Horizontes comunitário-populares e ¡A desordenar! Por una historia abierta de la lucha social, além de colaborações em livros coletivos.
De sua militância, Raquel cultivou e desenvolveu um pensamento fino e aguçado para analisar a realidade latino-americana e do país onde nasceu, ao mesmo tempo que sabe explicar em uma linguagem coloquial, mas com palavras certeiras. Seu olhar longo e reflexivo e sua conversa calma mantêm toda a carga de uma vida vivida intensamente. De sua etapa como professora universitária, tirou um recesso e, nestes dias, voltou à Espanha. Desta vez, nos permitimos a licença de perguntar-lhe sobre a complexa situação que o México vive, às portas de novas eleições presidenciais.
Eis a entrevista.
Estamos diante de eleições históricas, porque duas mulheres estão competindo diretamente pela presidência do país. O que significa que haja, pela primeira vez, uma presidente no México?
Se considerarmos que o voto feminino no México foi conquistado em 1953, ou seja, há 71 anos, acho que é interessante em termos da ampliação do exercício dos direitos, do acesso e, depois, do exercício dos direitos políticos pelas mulheres. Por outro lado, me parece que o sistema de governo democrático, com toda essa carga procedimental que veio acompanhada pela imposição e expansão da neoliberalização na economia, limita muito o significado real do poder político. Transforma-o em um sistema de certa forma administrativo, do que existe.
No entanto, também não me parece que seja algo plenamente indicativo das grandes aspirações e dos grandes anseios e desejos que foram colocados no debate público pelas lutas de muitas mulheres e feministas e corpos dissidentes nos últimos anos. A questão é complicada porque parte dessa democracia procedimental consistiu em apresentar leis de cotas. Isso há muitos anos, quando começou a agenda da paridade e das cotas, e depois isso se estendeu a muitas outras identidades étnicas de diversidade sexual, etc., e como isso era uma política para incluir “no que existe” e não tanto para continuar a transformação do que poderia ter sido o horizonte de luta naqueles momentos.
Qual seria o seu maior temor?
O que mais me preocupa, como uma das coisas que deixa em aberto para a discussão pública e na própria estrutura do Estado, esse progressismo de López Obrador, que terminará em alguns meses, é um poder militar ampliado a partir de uma participação muito, muito grande de diferentes segmentos das forças armadas em múltiplas atividades econômicas. A próxima presidente terá este setor tão reforçado, cuja importância em sua participação no orçamento, sua participação nas atividades econômicas, sua incidência política, se viu muito, muito aumentada, acompanhado por um governo de várias mulheres. Isso me dá uma espécie de imagem contraditória do que está ocorrendo no país.
Nem o PRI deu tanto poder ao setor militar em seus 70 anos de governos sucessivos. Então, que país herda Claudia Scheinbaum, sucessora de Andrés Manuel López Obrador e a candidata com mais possibilidades de governar?
Um país muito quebrado, muito saturado de propaganda, muito polarizado partidariamente, sobretudo em algumas cidades, muito militarizado e muito violento. Envolvido em uma enorme quantidade de projetos extrativos, digamos, com a face lavada, porque se supõe que todo esse conjunto de atividades extrativas é a garantia dessa grande possibilidade de dar subsídios. Ou seja, essa relação de desenvolvimento sem progresso, mas desenvolvimento que finalmente sim traz divisas.
Para mim, parece que o México vive um momento difícil, estrutural, que não é claramente visível porque os indicadores macroeconômicos estão bastante bons.
Ela é uma ótima administradora, primeiro foi secretária da Fazenda, depois do Serviço de Administração Tributária (SAT), ou seja, há várias mulheres que fizeram bem, administraram bem essa máquina, mas ela também enfrenta… uma seca terrível, uma distribuição da água inverossímil, ou seja, a água absolutamente concentrada em um conjunto de projetos que são muito contraditórios com a reprodução da vida, escassez em muitas cidades, em meio à seca que temos por conta do aquecimento global, etc. Para mim, parece que o México vive um momento difícil, estrutural, que não é claramente visível porque os indicadores macroeconômicos estão bastante bons. O peso nunca esteve tão forte em décadas, não houve um aumento enlouquecido da dívida externa, nem mesmo com a Covid-19, como aconteceu em outros países, houve mais ou menos um manejo cuidadoso da situação.
Mas, sendo um momento em que o capital se expande tanto, há um conjunto de contradições que acontecem em diversos territórios por causa de todos os projetos extrativos e de reorganização de formas de exploração, que em muitos lugares estão sendo controlados por figuras paramilitares que atuam como uma espécie de interface entre a economia legal e ilegal, que por sua vez existem de maneira bastante clandestina, opaca, ligadas às forças policiais dos próprios estados, municipais, e federais, e ainda mais opaca, com o exército. Vive-se um grande fenômeno de paramilitarização, porque eu não saberia expressar de outra maneira.
A propósito, não estou usando o discurso das guerras de cartéis ou das guerras do narcotráfico porque acho que isso bloqueia a capacidade de compreensão. Estou tentando descrever certos termos de como se estabelece o controle territorial, como isso sempre fica ligado aos processos de ampliação do econômico e com a construção de regimes de obediência pelo terror. Assim temos muitos estados. Isso será administrado por Claudia Scheinbaum.
E em relação à sociedade civil?
As companheiras mães buscadoras, as mulheres que têm desaparecidos ou assassinados, filhos e filhas, chamaram para um grande bordatón e que é essa atividade de voltar a reivindicar que o Estado faça seu trabalho de buscar os desaparecidos, identificar os corpos encontrados, entregar os restos às famílias, coisas que são de ordem básica. Então, nessa crise das desaparições de pessoas, essas mães estão colocando, a meu ver, o problema real do México no espaço público. O Zócalo da Cidade do México esteve lotado, lotado, lotado nos últimos três dias. Foram elas e depois foram os professores da CNTE que chegaram para colocar suas próprias demandas, os professores do povo.
Então, vai ganhar e vai permanecer a administração de uma situação verdadeiramente muito dramática. A mim sim me preocupa bastante esse discurso da continuidade, porque, tomara que depois do dia 2 de junho, quando finalmente Claudia Scheinbaum tenha que revelar suas cartas e esclarecer as coisas que vai fazer, ela terá que estabelecer em que termos vai se desmarcar das impotências de López Obrador. Porque agora é uma espécie de sintonizar-se com o que foi, com aquilo que AMLO conseguiu, mas são tantas coisas que o homem não pôde resolver, como o caso dos 43 de Ayotzinapa. E aí estará e se cumprirão 10 anos quando Claudia já governar. Como vai encarar isso? Como vai se animar a abordar essas questões? Ali se mostrará, na própria prática, se existe alguma possibilidade de um manejo diferente das mulheres em posições de governo. Sou muito cética quanto a isso, porque vi Thatcher, Merkel, Bachelet, vimos tantas, não é?
Por isso comecei falando sobre isso, das maneiras como funciona o próprio aparelho estatal que condensa a capacidade administrativa e política, mas estruturada de uma certa maneira. Então, até que ponto um conjunto de pessoas pode fazer variações? Não sei. Vai ser muito interessante ver em outubro como opera, digamos, esse conjunto de mulheres que estarão no governo. Também espero que Clara Brugada se mantenha, porque claro, preferimos esses aos da direita.
Já que menciona as mães buscadoras e todas essas formas de micropolítica que existem diante da ausência do Estado, e que têm a ver com os tecidos comunitários dos quais você fala porque na base muitas coisas se movem, muitos movimentos e comunidades que tentam, na medida do possível, melhorar suas vidas, você poderia nos contar o que está acontecendo por aí?
Eu sinto que o México tem sido historicamente, e continua sendo, um país que tem uma grande capacidade comunitária e popular. E por popular entendemos que é o produto da hibridação do que é próprio, o mais comunitário, que tem que se adequar e se encaixar na economia monetarizada, nos trabalhos assalariados, nos deslocamentos e mobilizações, e há uma grande, grande, grande base popular que foi e é militante de muitos tipos de luta, muitas formas de lutas sociais.
Me parece que uma das questões que a 4T conseguiu é que deu centralidade ao processo do poder administrativo estatal, em termos do que se percebe, do que as pessoas percebem, e claro, ampliou-se o apoio dos subsídios a uma quantidade significativa de pessoas. No entanto, por outro lado, a demanda de que o Estado faça o que tem que fazer não foi satisfeita e isso levou a uma ampliação do que eu chamaria de micropolítica, em muitos sentidos. Por exemplo, um grande movimento, desde que começaram a ser retomados os corpos nas valas clandestinas, desde 2016, do norte do país, das mães que primeiro foram investigar, acompanhar, e pouco a pouco foram encontrando e aprendendo a fazer isso. Isso se ampliou por todo o país e deu origem a um conjunto de vínculos solidários, mas também de ações de denúncia, mas também de demanda, e de novos saberes.
Por exemplo, as associações de peritos independentes, como as do Equador, que vieram apoiar e ensinar as mães como fazer as perícias em uma vala. Esse processo, que considero que está no centro da questão política, não está sendo atendido pelo governo. Essas mães estão reabrindo, com sua força e seus movimentos, a questão de para que serve o Estado, ou para que se pode servir.
As redes de professores ou o movimento de cozinheiras tradicionais do sul do país que estão organizando muitas atividades, primeiro para ter uma melhor relação com a comida que se dá nas escolas e, em segundo lugar, para manter vivas as redes de colaboração nas cozinhas, que são redes de saberes, e as redes de comercialização de outros produtos e outras economias.
Então, o que acontece é que nos deparamos, assim, com um país que está cheio de capacidades populares, de capacidades comunitárias de diferentes tipos, e que me parece que agora estão em um ponto crítico, porque estão exigindo o reconhecimento do Estado por conta do crescimento do poder territorial das formas paramilitares. Assim estamos.
Você acredita que a sociedade pode ajudar a mudar as coisas?
Sempre acredito. Estou muito preocupada com o que pode acontecer em estados onde a relação paramilitar, militar, policial, empresarial, governamental é tão sombria, tão opaca. Por exemplo, em Guerrero, Morelos, no sul de Veracruz, em muitas partes de Puebla, em Michoacán, em Jalisco, por citar alguns lugares onde a situação é crítica e, ao mesmo tempo, existem movimentos e populações em luta. Como fazer para que sejam ouvidas e não exterminadas? Não sei como vamos resolver essa questão, ou melhor, como vamos enfrentá-la, como as comunidades e povos vão enfrentar essas situações para seguir adiante com suas demandas e exigências, além de colocar essas exigências nos espaços públicos.
México não é um país isolado, gostaria que ampliássemos o foco olhando para outros governos da região. Petro na Colômbia, mas com Milei na Argentina, o retorno de Lula, um Boric no Chile… Também não podemos ignorar a difícil situação dos países centro-americanos que estão expulsando sua população para o norte. Essa ampliação do capitalismo da qual você fala se repete também em outros países da América Latina, como isso afeta?
Não é só no México, isso é um fenômeno regional e ao México, a meu ver, acontece da forma menos pior possível, não sei como expressar, é que não quero dizer melhor. E por quê? Por nossa longuíssima tradição de nacionalismo revolucionário. Ou seja, se o nacionalismo revolucionário, a política de substituição de exportações, a questão do controle sobre certos recursos naturais que se viu durante uma época em muitos países, no México teve uma densidade e uma profundidade, porque veio acompanhado também da reforma agrária de Cárdenas. E isso foi produto da Revolução Mexicana, me parece. Acho que o México, para navegar nesses momentos progressistas, esteve melhor preparado.
Também devo reconhecer que me parece que uma parte da tarefa de separar o poder político do poder econômico, que foi uma das coisas que o progressismo ofereceu, no México foi feita um pouco melhor do que em outros lugares. Embora o preço que pagamos seja essa aliança com as forças armadas, ou seja, do poder político com as forças armadas como a estrutura de capacidade real para garantir essa separação e de estar lá para suportar. Isso é o perigoso. Ao povo foi pedido apoio em termos simplesmente de adesão ao líder e suporte às suas propostas, mas em termos operativos não houve um reconhecimento a essa multiplicidade de práticas e de formas organizativas e políticas que se jogam no popular mexicano. Que nem sempre são tão modernas, nem sempre são tão compreensíveis, mas que são altamente eficazes.
Isso é o que ficou de alguma maneira desconhecido para tentar converter simplesmente em suporte acrítico. Em momentos muito tensos vai, venha, chame, chamem, façam marchas… estamos falando de mobilizações muito grandes e com uma popularidade muito alta, porque as pessoas estão contentes. Até pessoas tão críticas como eu claramente estamos contentes dos esforços para separar esse poder com um grupo do poder político da maneira como vivemos em sexênios anteriores. Claro que sim, isso é importante, mas é insuficiente novamente, e a maneira como conseguiram foi altamente perigosa porque foi essa aliança que agora vai ficar.
E não acho que Claudia Scheinbaum seja a pupila de López Obrador, acho que é a sucessora e foi a companheira e é uma mulher muito inteligente. Mas o que sim acho é que, estruturalmente, a relação das mulheres com os militares é mais, muito mais problemática. Ou seja, há uma espécie de poder simbólico pela estruturação patriarcal do mundo que investe os homens com uma espécie de jogo de equilíbrios que uma mulher vai jogar de outra maneira. Veremos o que acontece.
Espero que não aconteça como com Bachelet, aquele outro caso onde uma mulher governa com ainda um regime militar um pouco à sombra, mas muito forte. Pois ficou cercada por todos os lados. Não por quem a nomeou, mas por com quem teve que operar. Essas coisas são as que vão se dirimindo ao longo dos próximos meses. E por isso a questão dos 10 anos de Ayotzinapa vai ser tão relevante porque aí vai se condensar.
Para ir terminando… “Tão longe de Deus e tão perto dos Estados Unidos” continua sendo para o México uma espécie de condena, e bem, porque vem Trump. Isso pode complicar mais nas fronteiras. Como você vê isso?
Vai ser muito complicado, embora veja, vem Trump depois de Biden que foi quase tão ruim quanto Trump, assim eu diria. Porque o outro grande ponto muito duro, que não tinha tocado até agora, é essa questão de como o México ficou constituído nesse terceiro país, na verdade. O país tampão do fluxo migratório, o país fronteira, o país onde se param as ondas migratórias, onde se contêm as coisas e de maneiras bastante brutais com frequência, como o caso das mortes dos migrantes em Tijuana. Um caso pavoroso, mas houve muitos outros muito duros.
Algo que está se vendo claramente agora que se está construindo o corredor interoceânico -a marinha de Salina Cruz a Coatzacoalcos (Veracruz) e um conjunto de zonas econômicas especiais-, com o fim de que seja um lugar extraordinariamente maquilador dentro do que chamam agora near shore. Uma produção mais de proximidade que não dê a volta ao mundo das mercadorias, mas sim ali, um pouco mais perto. E é que o México, acredito, tem a intenção de poder captar toda essa força de trabalho para que trabalhem aqui em condições bastante duras. Veremos como acontece. E se o governo dos Estados Unidos, ou seja, se Trump endurece sua política migratória, vai ficar muito difícil no México também.
Não acho que haja força política suficiente, ao menos nos primeiros anos do governo, para fazer variar isso. Esta é uma herança que ficou aí estabelecida como o custo político… um custo ético, de ter que funcionar como barreira da fronteira, embora depois, em ocasiões, e com famosos, ao México encante ser esse lugar de aceitação do exílio, de recepção do migrante, mas parece que há de primeira e de segunda, e toda a América Central é de segunda, e todos os caribenhos são de segunda. Isso é muito perigoso e não acho que vá variar e a pressão estadunidense vai ser muito forte em qualquer uma das duas capelas partidárias estadunidenses que ganhe.
Você vai votar?
A única vez na minha vida que votei foi quando votei por López Obrador contra Felipe Calderón em 2006, e foi fraude e ele não defendeu e encolheu, e eu disse, até aí minha trajetória votante.
O que você acha da campanha “Vote pelas pessoas desaparecidas”?
Me parece que para as pessoas que estão ali e querem tornar isso visível, eu não sei que extensão vai ter, mas justamente para se contrapor a isso que chamam de ‘plano C’ [votar por todo pelo partido Morena] para ter eventualmente a possibilidade de mudar leis, me parece interessante e valioso porque é o problema do duplo desaparecimento, ou seja, é o desaparecimento das pessoas e depois o desaparecimento político. Estivemos na marcha no dia 10 de maio passado com um esforço bastante grande por vários coletivos dos mais consolidados das buscadoras, sobretudo do norte e algumas de Veracruz, que são as mais antigas, um pouco também apoiado pelas corporações jesuítas como o Centro Prodh, em uma espécie de ato unificador e lá escutei sobre a campanha de votar por um desaparecido. Não sei que capacidade vai ter de reivindicar esse voto ou se vão contar e simplesmente vai ficar dentro dos votos anulados.
Você sabia que existe uma proposta na Câmara dos Deputados por parte do PRI de dar um salário para as mães buscadoras?
Estou ciente de toda essa dificuldade das mães buscadoras, que é duríssima e que certos apoios são dados às vítimas e isso já foi motivo de uma grande tensão com alguns coletivos porque a tal lei das vítimas não resolve as coisas, cria mais problemas, estabelece ou obriga o cumprimento de um conjunto de preceitos e requisitos que se tornam cada vez mais complicados. Por isso as mães buscadoras seguem independentes. O salário seria outra dessas coisas de, digamos, o know-how da política de neutralização, essa capacidade sutil de ensaiar maneiras de desmobilizar, que chamamos maiceo, como as galinhas, ou seja, te converter em objeto de jogar grãos de milho.
Dirigi uma pesquisa de uma estudante há uns dois anos, porque era o final da pandemia. O título da tese acabou sendo, “Não queremos fazer mais autópsias”, e era uma série de entrevistas com mulheres médicas legistas que narravam suas condições de trabalho e é uma verdadeira barbaridade: a quantidade de horas, como têm que entregar um tipo de relatórios, como são obrigadas a se apresentar ao tribunal, mas isso não as exonera de continuar fazendo autópsias, cumprir quotas nas autópsias pela quantidade de mortos, e não há mais gente. É um delírio, porque está tudo fabricado para que nada funcione. Está fabricado porque também é uma parte do regime de estabelecer obediência pela via da tristeza, da dor, do sofrimento, de te manter em suspense. São tudo menos tolos, então, é preciso buscar a lógica do que sim acontece e não tanto se basear no que não acontece. A carga sobre os legistas, sobre os ministérios públicos é uma loucura. Então coloquem mais, contratem mais e limpem nas altas esferas porque é um verdadeiro caos. Do Fiscal Geral, o senhor Hertz, para baixo é uma barbaridade.
IHU-UNISINOS