CONJUNTURA
Confirmada ontem, estagnação do 3.º trimestre faz governo admitir que a economia crescerá menos que sua previsão de 3,8%. Bancos e consultorias também reduzem estimativas
O Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro estacionou no terceiro trimestre, com
crescimento zero em relação ao segundo. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), houve desaceleração generalizada de atividades e setores. Como esperado, a indústria caiu, e a surpresa ficou por conta do recuo dos serviços e da desaceleração do consumo das famílias. Para diversos analistas, ficou difícil o PIB crescer 3% em 2011. Alguns já acham difícil chegar a 3% também em 2012, embora o governo mantenha sua projeção de expansão entre 4% e 5% no ano que vem.
“Dificilmente o PIB cresce 3% este ano. Deve ficar mais perto de 2,8%”, projeta Bráulio Borges, economista-chefe da consultoria LCA. Outras instituições que preveem ou consideram que ficou mais provável um PIB abaixo de 3% em 2011 são o Itaú-BBA, a consultoria MB Associados e as gestoras de recursos Opus e JGP. Para o Banco Votorantim, a economia só deve engatar uma recuperação mais consistente no segundo trimestre de 2012, impulsionada pelo aumento de quase 15% do salário mínimo e pelos efeitos defasados das recentes quedas da taxa básica de juros (Selic).
Comércio exterior evitou dado negativo
O setor externo ajudou a evitar um desempenho negativo do PIB no terceiro trimestre. Na comparação com o trimestre anterior, houve avanço das exportações de bens e serviços (1,8%) e queda nas importações (-0,4%). “O comportamento do setor externo, com a taxa positiva das exportações acima da negativa das importações, contribuiu para que o PIB não fosse negativo”, disse Rebeca Palis, gerente de contas nacionais do IBGE.
A perspectiva de desaceleração do consumo fez com que as importações diminuíssem. Enquanto isso, a diversidade da pauta de exportações brasileira ajudou a manter um bom resultado na balança comercial, mesmo com a demanda internacional em queda.
Em relação ao mesmo trimestre do ano anterior, no entanto, as importações voltaram a crescer a taxas maiores do que as exportações. As exportações subiram 4,1%, contra 5,8% de alta das importações, influenciadas pela desvalorização do dólar nessa comparação.
Resultado foi o pior entre os Brics
O Brasil teve o pior resultado entre os Brics (grupo que também inclui Rússia, Índia, China e África do Sul) para a expansão do PIB no terceiro trimestre em relação ao mesmo período de 2010. Enquanto a economia brasileira registrou expansão de 2,1% no período, a da China cresceu 9,1%, a Índia teve aumento de 6,9%, a Rússia, de 4,8%, e a África do Sul, de 3,1%.
Na comparação com o trimestre anterior, o comportamento do PIB do Brasil – estável – ficou atrás de Japão (1,5%), Noruega (1,4%), México (1,3%), Coreia do Sul (0,7%), Chile (0,6%), Alemanha (0,5%), Estados Unidos (0,5%), Reino Unido (0,5%), França (0,4%) e União Europeia (0,2%).
Também tiveram expansão nula a Espanha e a Bélgica, enquanto a economia da Holanda apresentou retração de 0,3% no período. Nem todos os países divulgam a variação do PIB neste tipo de comparação, em relação ao trimestre imediatamente anterior, o que explica a ausência de outros Brics na lista.
“Temos o controle da situação. (…) No momento, não há medidas que o governo pense em tomar, mas vamos seguir na flexibilização do crédito. (…) Aquilo que nós apertamos nós vamos flexibilizar mais.”
Guido Mantega, ministro da Fazenda, para quem parte da desaceleração econômica foi provocada por medidas do próprio governo
Juro sobe, juro desce
A taxa básica de juros (Selic) começou 2011 em 10,75% ao ano, e foi sendo elevada pelo Banco Central até atingir 12,5%, em julho. A intenção era esfriar a economia e conter a inflação. A crise fez o BC cortar a taxa a partir de agosto – hoje ela está em 11% ao ano. Na avaliação da consultoria LCA, se a desaceleração econômica perdurar até o início de 2012, o governo poderá levar a Selic para menos de 9%.
Em relação a igual período de 2010, o PIB do terceiro trimestre cresceu 2,1%, o pior resultado nesse tipo de comparação desde a queda de 1,5% no terceiro trimestre de 2009, em plena crise global.
O mau desempenho do PIB no terceiro trimestre atingiu quase todos os setores e subsetores. A desaceleração foi puxada pela indústria, e já atingiu o consumo das famílias, que tem sido um suporte da economia brasileira nos últimos anos. Os investimentos também caíram.
Segundo os analistas, a alta da Selic e as medidas de contenção de crédito adotadas desde o fim de 2010 aliaram-se ao impacto da crise internacional para provocar a parada brusca da economia.
Para a gerente de contas nacionais do IBGE, Rebeca Palis, o terceiro trimestre revelou uma mudança estrutural no comportamento da economia. O crescimento do PIB, até então puxado pelos serviços, desta vez foi mais impulsionado pela agropecuária.
Na comparação com o período de abril a junho, a indústria recuou 0,9% e os serviços, 0,3%. A agropecuária, porém, cresceu substanciais 3,4%, impulsionada pelo bom desempenho de mandioca, feijão e laranja. O pior desempenho de todos subsetores do PIB foi o da indústria da transformação, que caiu 1,4% ante o segundo trimestre. Serviços ligados à indústria também foram afetados, com o comércio recuando 1% e transportes e armazenagem crescendo só 0,2%.
Projeção revista
O ministro da Fazenda, Guido Mantega (Fazenda), disse que a desaceleração é “passageira” e que o PIB voltará a crescer no quarto trimestre. “Temos o controle da situação. Diferente de outros países cujo crescimento cai fundamentalmente pela falta de mercado e por causa da crise, nós aqui temos a possibilidade da aceleração do crescimento”, afirmou.
Mantega admitiu que o PIB não crescerá neste ano os 3,8% que o governo previa. Segundo o ministro, a alta ficará em patamar próximo aos 3,2% (no acumulado do ano) registrados até setembro. “Esse número [3,8%] é inalcançável”, disse.
Ao citar os efeitos das medidas oficiais para conter crescimento e inflação, Mantega disse que o governo não “pisou demais no freio”. “O que foi inesperado foi o agravamento da crise internacional, esse é um fator que nós não tínhamos”, disse. O ministro acrescentou que o governo poderá continuar revertendo as medidas de contenção da economia.
Investimento cai após nove trimestres de alta
Os investimentos na economia brasileira recuaram pela primeira vez desde o início de 2009. De acordo com o IBGE, a Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF) – componente do PIB que indica o gasto com máquinas e equipamentos industriais e obras de infraestrutura – recuou 0,2% na passagem do segundo para o terceiro trimestre, na série com ajustes sazonais. A contração interrompeu uma trajetória de crescimento que já durava nove trimestres.
Um dos motivos para a redução da FBCF é o ritmo fraco das obras de estatais e do governo federal, que estão investindo menos neste ano. Mas a principal razão está na queda na confiança dos empresários – que reflete, entre outras coisas, o agravamento da crise internacional e o aumento do custo dos financiamentos, elementos que prejudicam tanto as empresas quanto os consumidores.
Pegar empréstimo ficou mais difícil por causa das medidas de restrição ao crédito adotadas a partir do fim de 2010, entre elas a elevação da taxa básica de juros (Selic). Nos últimos meses o Banco Central retirou algumas barreiras e reduziu o juro básico, mas esses estímulos só devem surtir efeito no ano que vem.
Insuficiente
Os investimentos feitos no terceiro trimestre corresponderam a 20% do PIB, abaixo do índice de igual período de 2010 (20,5%). Esses números cresceram recentemente, por causa da revisão do PIB promovida pelo IBGE. Mesmo assim, seguem muito abaixo dos patamares que permitiriam ao país crescer de forma mais robusta e sustentável.
Estima-se que, para a economia avançar 5% ao ano sem gerar pressões inflacionárias, os investimentos somar algo próximo de 25% do PIB. Mas, no acumulado de janeiro a setembro, a taxa ficou em 19,5% – abaixo dos 19,7% registrados no mesmo período do ano passado.