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É mais do que hora de flexibilizar o FGTS

Começou no governo uma discussão sobre a necessidade de flexibilizar as regras do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço. O FGTS rende, por ano, a variação da TR (taxa referencial) mais 3%. O debate ainda é embrionário. Cogita-se, porém, iniciar um processo gradual de liberação para que o trabalhador possa investir em aplicações mais rentáveis e de prazos mais longos. Uma possibilidade contemplada pelos técnicos do governo seria liberar inicialmente de 3% a 5% do saldo do fundo de cada empregado para que ele possa destinar esses recursos a investimentos em debêntures ligadas a projetos de infraestrutura.

Ao mesmo tempo em que tramitam no Congresso Nacional propostas para melhorar a sofrível remuneração da conta do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) inicia-se, no governo, uma discussão sobre a necessidade de flexibilizar as regras dessa poupança compulsória do trabalhador. O FGTS rende, por ano, a variação da TR (taxa referencial) mais 3% ao ano. Rentabilidade que perde para qualquer aplicação voluntária e sequer cobre a corrosão inflacionária dos recursos dos cotistas.

A correção do FGTS em 12 meses até maio deste ano é de 4,03%. A remuneração da caderneta de poupança é de 7,23% nesse mesmo período e a variação do IPCA, de 6,5%, considerando a mediana de 0,81% em abril e de 0,43% em maio.

O fundo foi criado em setembro de 1966, quando o governo militar trocou o direito à estabilidade no emprego, que os trabalhadores adquiriam após dez anos numa mesma empresa, pelo FGTS. Formado pelo recolhimento de 8% do valor do salário, ele corresponde a uma indenização por tempo de serviço. A intenção, na época, era forçar uma poupança para atender o trabalhador no caso de perda do emprego. A economia mudou, o mundo mudou, mas o FGTS permanece o mesmo.

No governo, o debate ainda é embrionário. Cogita-se, porém, iniciar um processo gradual de liberação para que o trabalhador possa investir em aplicações mais rentáveis e de prazos mais longos. Quando da criação do Fundo de Infraestrutura (FI-FGTS), chegou-se a aprovar a utilização, pelo cotista, de uma parcela do fundo de garantia para investimentos em obras. Essa, porém, nunca foi regulamentada.

Agora, uma possibilidade contemplada pelos técnicos oficiais seria a de liberar inicialmente uns 3% a 5% do saldo do fundo de cada empregado para que ele possa destinar esses recursos para investimentos em debêntures ligadas a projetos de infraestrutura. Ao longo dos anos esse percentual aumentaria.

A Medida Provisória 517, editada no apagar das luzes de 2010, desonera do Imposto de Renda as aplicações em debêntures lançadas por empreendimentos considerados estratégicos pelo governo, desde que os prazos de resgate sejam entre quatro a cinco anos. O IR terá alíquota zero para os investidores pessoa física e de 15% para pessoa jurídica. Esse incentivo fiscal deve vigorar até dezembro de 2015.

Os fundos de investimentos vão poder adquirir esses papéis desde que 85% do patrimônio líquido seja dirigido para os investimentos estratégicos.

Os técnicos do governo avaliam a possibilidade de autorizar que uma pequena parcela do FGTS possa ser alocada para esse ou algum outro tipo de aplicação financeira.

Seriam duas as vantagens: criar uma poupança financeira de mais longo prazo, que o país não tem, para financiar investimentos também de longa maturação, e dar ao trabalhador a chance de receber uma remuneração mais vantajosa, tal como ocorreu com as aplicações em ações da Vale e da Petrobras.

O primeiro problema a enfrentar será a disputa com os setores que se beneficiam dos recursos do fundo de garantia, como habitação, saneamento e infraestrutura urbana, entre outros.

No Congresso tramitam alguns projetos para melhorar a rentabilidade e as regras de saque do fundo. O Projeto de Lei 193, de 2008, sugere a substituição da TR pelo IPCA como indexador. Outra proposta é a que permite que o trabalhador possa sacar até 40% do seu fundo para quitar dívidas, desde que elas correspondam a 30% da sua renda bruta mensal e ele já esteja inadimplente.

Hoje o trabalhador só pode sacar o FGTS em casos de demissão sem justa causa, aposentadoria, quando o titular da conta ou algum dependente seja portador de uma doença grave (aids ou câncer), para aquisição de casa própria ou para abater parcelas do financiamento imobiliário.

O orçamento do FGTS para este ano, aprovado pelo Conselho Curador do fundo, indica disponibilidade de R$ 46,9 bilhões. Desses, R$ 30,6 bilhões serão aplicados em habitação, R$ 4,8 bilhões em saneamento básico, e R$ 11,5 bilhões para projetos de infraestrutura (R$ 4 bilhões para transporte urbano e R$ 7,5 bilhões para o fundo de investimento que investe em energia, rodovia, ferrovia, hidrovia e portos, entre outros).

O fundo tinha, em 2010, R$ 260 bilhões em ativos, sendo que R$ 112 bilhões estão aplicados em títulos públicos. São 33,49% em títulos atrelados à taxa Selic, 29,04% em papéis indexados a índices de preços e 37,47% em pré-fixados. Outros R$ 120 bilhões estão investidos em habitação, saneamento e infraestrutura urbana, operações que têm rendimento estimado este ano de R$ 15 bilhões. O restante está em debêntures e no FI-FGTS.

Se havia alguma finalidade na criação do fundo de garantia há 45 anos atrás, está já está mais do que superada. No governo, o debate só começou agora e de forma acanhada.

O economista Pérsio Arida, ex-presidente do Banco Central, vem chamando a atenção sobre a necessidade de se desmontar os mecanismos compulsórios de poupança há quase uma década.

Em entrevista ao Valor, em 2004, ele questionava: “Com que direito o Estado se arvora juiz das necessidades do trabalhador? Quem é o Estado para dizer que é melhor para o trabalhador deixar seu dinheiro no FGTS do que comprar um remédio para o filho, alimento para sua família ou investir em um negócio próprio? O sinal enviado pela poupança compulsória é de descrença no padrão monetário porque o dinheiro administrado pelo governo nos fundos compulsórios rende menos do que o CDI.”

São perguntas que permanecem no ar.

Claudia Safatle é diretora de redação adjunta e escreve às sextas-feiras

Fonte: Valor Econômico