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Apenas uma em cada cinco crianças brasileiras de 0 a 3 anos frequentam a creche. Além do baixo acesso, o país apresenta uma divisão social na utilização do serviço: a proporção de crianças assistidas aumenta quanto maior é a renda ou o nível de escolaridade da família. Nos lares extremamente pobres, uma em cada dez crianças vão à creche (11%). Entre as famílias de alta renda, a frequência sobe para 38% – o dobro da média brasileira, que é de 19%. O dado faz parte do estudo “Primeira Infância em Números”, produzido pela Secretaria de Ações Estratégicas da Presidência da República (SAE) com base em dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad).

Em outro comparativo, 14% das crianças cuidadas por adultos com menos de 4 anos de escolaridade vão à creche. Entre os adultos de referência (pai, mãe ou responsável) com mais de 11 anos de estudo, a porcentagem de matrículas sobe para 33%. O cálculo leva em conta instituições públicas e particulares.

Estímulo

O resultado nacional é considerado baixo por especialistas em educação infantil. Os profissionais entendem que a função da creche vai além da guarda da criança durante o período de trabalho dos pais. A presença dos pequenos em um espaço de socialização é fundamental para desenvolver habilidades que, mais tarde, serão fundamentais ao aprendizado.

“Devemos ter em mente que a família já não consegue mais prover suficientemente os primeiros conteúdos”, ressalta a psicopedagoga Evelise Por­tilho, professora da Pon­tifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR). “A creche não é um espaço para a criança brincar por brincar. As atividades são voltadas ao estímulo cognitivo, como exercícios voltados para a fala e a pré-alfabetização”, cita.

Para a psicóloga e mestre em Educação Mariita Bertassoni da Silva, a quantidade de crianças na creche não é compatível com a maneira como as famílias estão atualmente estruturadas. “Considerando o fato de que, hoje, pai e mãe precisam trabalhar fora para dar um padrão de vida adequado à família, os 19% de frequência são um índice muito baixo. Precisaria ser exponencialmente maior”, avalia.

Ela explica que o ambiente coletivo é propício para o desenvolvimento mútuo das crianças. “Em uma turma com diferentes capacidades de aprendizagem, a tendência é que um puxe o outro para cima. É o que chamamos de zona de desenvolvimento proximal”, cita. “Mas o ideal é que até os três anos fosse possível haver uma alternância de cuidados entre a casa e a escola”, diz.

MP-PR diverge de prefeitura sobre carência de vagas

De acordo com um levantamento feito pelo Ministério Público do Paraná, Curitiba tem hoje um déficit de 23 mil vagas em creches públicas. Esse número não é reconhecido pela prefeitura, que calcula haver necessidade de serem criadas somente mais 9.295 vagas – cuja abertura é prevista para ocorrer até o fim de 2012.

A prefeitura informa terem si­­do inauguradas cinco novas creches em 2011 – com capacidade somada para 900 crianças –, e haver outras 19 em construção, além de cinco ampliações. Quando terminadas, estas obras abrirão 8,8 mil vagas na rede pública. Atual­­men­­te, a rede atende a 41.755 crianças, distribuídas em 179 Cen­­tros Municipais de Educação Infantil (CMEIs).

O governo federal também criou um plano de financiamento à construção de creches pelos municípios. Os recursos constam do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) 2, e devem beneficiar 1.466 cidades. Pelo convênio, o governo repassa o dinheiro e o projeto arquitetônico para a construção da creche, além de subsidiar o funcionamento por até 18 meses – tempo máximo necessário para que a nova instituição entre no censo escolar e passe a receber recursos do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb). 

Soluções

Pais elegem “babás” em família

Devido a falta de vagas nas creches públicas, é comum que arranjos familiares tomem parentes próximos como babás para que os pais possam trabalhar. Avós, tios ou mesmo vizinhos tornam-se corresponsáveis pela educação da criança. Um modelo que, segundo especialistas, distorce as funções do núcleo familiar e afeta a percepção das crianças sobre o papel de cada adulto em seu convívio. “Vivendo entre adultos, a tendência é que a criança repita as atitudes que vê, o que resulta no fenômeno de comportarem-se como “adultos em miniatura”. Se está sozinha em um ambiente, a criança passa a ver o mundo a partir de si mesma, não aprende a compartilhar e a trabalhar em grupo”, explica a psicóloga e mestre em Educação Mariita Bertassoni da Silva.

A transferência de responsabilidades também pode gerar conflito entre os adultos. “A avó é uma mãe de açúcar. Sua função é brincar e agradar a criança, e não tem tanta facilidade para ser rígida e educar”, ilustra Mariita. “Isso pode gerar discussões com os pais sobre a forma certa de lidar com as situações”.

Experiência

Brincadeira também tem proposta pedagógica

A diretora do Centro Municipal de Educação Infantil (CMEI) Arnaldo Carnasciali, Vanessa de Sousa Martinez, entende que a principal preocupação dos pais que procuram a instituição é ter um lugar onde deixar o filho durante o horário de trabalho. Após conhecer a metodologia da instituição, afirma, passam a se interessar e a se envolver nas estratégias pedagógicas. “As mães contam que perceberam diferença nos filhos: reversão de características de timidez, interesse maior”, cita ela, que administra um espaço para 150 crianças. Entre as atividades adotadas estão: contação de histórias, roda de conversa e desenhos. “O foco é a brincadeira, mas sempre com uma proposta pedagógica”, afirma Vanessa.

A assistente financeira Adriana Maciel Branco, de 28 anos, matriculou, em 2009, os dois filhos gêmeos, de 4 anos, em uma creche municipal. “No começo foi difícil conciliar a guarda dos filhos com o trabalho. Eu tive que fazer um acordo e sair da empresa para poder ficar com eles”, relembra Adriana. “Depois, voltei a trabalhar e os matriculei em uma escolinha particular, mas a mensalidade era mais alta que o meu salário”.

Ela destaca os ganhos no desenvolvimento dos filhos a partir da experiência com a creche: “Eles aprenderam a se comportar à mesa e a não brigar um com o outro. Também estão descobrindo o interesse por livros”, cita.