Para a economista Carla Beni, professora da FGV (Fundação Getulio Vargas), a desigualdade estrutural do Brasil e manutenção de privilégios têm como motor as riquezas geradas pela herança. “No Brasil, o motor da ascensão social é a herança”, disse, em entrevista ao ICL Notícias 1ª edição desta terça-feira (8). Ela afirma que a estrutura tributária brasileira acentua desigualdades ao tributar pouco patrimônio, renda e lucros, e muito bens e serviços.
A professora explicou que nos Estados Unidos, por exemplo, o imposto por herança é uma escala: “começa com 18% e vai até 40%”, enquanto no Japão chega a 50%. “No Brasil, nosso limite máximo é 8%. São Paulo é 4%, Bahia é 6%. Nosso imposto sobre herança é menor do que o cenário internacional”, afirmou.
Segundo a economista, a carga tributária brasileira gira em torno de 33% do PIB (Produto Interno Bruto), mas o problema está na composição: “Podemos manter o tamanho da pizza, mas redistribuir melhor as fatias”, frisou.
“Essa é a origem da nossa desigualdade de oportunidades. O Estado brasileiro deixou de investir na alocação de bens e serviços públicos, e empurra investidores para o mercado financeiro com juros altos. O resultado é um sistema que perpetua privilégios e limita a mobilidade social.”
Sobre o tema da justiça tributária, o ICL (Instituto Conhecimento Liberta) lançou o manifesto Somos 99% contra privilégios de 1% da população que concentra 63% da riqueza do Brasil e de abusos de políticos fisiológicos, servidores que recebem supersalários. O movimento foi intitulado de “Somos 99 por cento”, e quem quiser aderir ao abaixo-assinado deve acessar o site 99porcento.com.br.
Ameaça de Trump ao Brics
A economista também comentou as recentes ameaças do presidente norte-americano Donald Trump de sobretaxar países do Brics. Para ela, a maneira como Trump conduz a política externa — por meio de postagens na sua própria rede social, a Truth Social — mistura interesses privados com decisões de Estado e enfraquece a credibilidade institucional dos EUA. “Estamos naturalizando um procedimento ruim para o país como um todo”, disse.
As ameaças de tarifas a países que representam 40% do PIB global e metade da população mundial ocorrem no contexto de fortalecimento do Brics frente à hegemonia norte-americana. Segundo Carla, essas medidas protecionistas já demonstraram baixa eficácia no primeiro mandato de Trump. “A sobretaxação do aço gerou o ‘efeito máquina de lavar’, com aumento dos preços dos eletrodomésticos e queda de popularidade. Ele mesmo teve que recuar”, afirmou.
Ela ressalta o descompasso temporal entre tarifas, que têm efeito imediato nos preços, e uma eventual reindustrialização, que levaria anos. “É uma estratégia de curto prazo para um problema de longo prazo.”
Desdolarização e ascensão do yuan
Outro tema que reacendeu tensões com Washington é a proposta de líderes do Brics de reduzir a dependência do dólar como moeda padrão. O presidente Lula tem defendido um sistema financeiro mais multipolar, com maior uso de moedas locais ou digitais nas trocas comerciais.
A professora da FGV destacou que o movimento já está em curso. Segundo dados do Banco Central, as reservas brasileiras em yuan (moeda chinesa) chegaram a 5%, mesmo patamar do euro — em 2018, eram zero.
“Se temos yuan como reserva, é porque empresas estão negociando nessa moeda. A grande mudança é essa”, explicou. Para ela, a substituição do dólar não significa seu desaparecimento, mas o surgimento de alternativas que podem reduzir custos operacionais e equilibrar o sistema monetário global.
Veja a entrevista completa da economista Carla Beni no vídeo abaixo:
ICL NOTÍCIAS
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