A forma mais fácil de se constatar uma relação de emprego de fato, em que há a utilização fraudulenta de negócios jurídicos dotados de natureza civilista e baseados em silogismos por parte do empresariado, se dá pela investigação das responsabilidades, das obrigações e dos compromissos da classe trabalhadora com base na verdade fática do serviço prestado aos tomadores.
Não há relação jurídico-civilista que se confirme, quando as nomenclaturas não correspondem aos fatos e impingem algo que as relações sociolaborais (ou até mesmo a legislação) coíbem face aos impedimentos comportamentais que jamais podem ser invocados para dar guarida à fraude e à sonegação de direitos trabalhistas, beneficiando única e exclusivamente o infrator.
As empregadoras de um modo geral sabem muito bem que a intermediação de mão de obra para com empresas interpostas lhe é vedada, entretanto, para economizar com verbas trabalhistas e securitárias, aquelas preferem se arriscar na seara da pejotização e criam subterfúgios para que seus empregados montem CNPJs e tornem seus lucros ainda maiores.
É isso que fez com que muitas empresa, com o advento da reforma trabalhista (Lei nº 13.467/2017), se aventurassem na celebração de contratos de prestação de serviços para com empresas criadas por pessoas que deveriam ser empregados (Consolidação das Leis do Trabalho) e que servem como intermediadoras de mão de obra de atividade-fim.
Em todo o caso, certos de que “não há bem que dure para sempre, nem mal que nunca se acabe”, tem-se que a procura pela aplicação de todas as garantias inerentes ao Direito do Trabalho, a começar pelos princípios da proteção, da primazia da realidade sobre a forma e do não retrocesso social, nos dias de hoje, seja uma luta premente e, por assim dizer, a única forma de eliminar de uma vez por todas as práticas ilegais de contratação de empregados por meio do conceito anacrônico e indulgente da pejotização.
O conceito de relação de emprego, entretanto, é guardado pela própria Constituição, no artigo 7º, I, e sobre ele se sustenta todo o sistema de garantias sociais de natureza trabalhista, inclusive os elencados nos demais incisos daquele dispositivo. A legislação infraconstitucional não pode extinguir direito previsto no art. 7º da Constituição, o que, pela mesma lógica, se torna vedado manipular o âmbito semântico da locução “relação de emprego”, insculpida no texto constitucional, de modo a inviabilizar ou restringir a aplicação daquelas garantias.
A partir do momento em que esse conceito (“relação de emprego”) é incorporado ao texto da Constituição, já não se pode ter o seu sentido alterado pela legislação infraconstitucional, porque isso tem repercussão no sistema de garantias trabalhistas constitucionais sobre ele erigido. Há, portanto, um conceito constitucional de relação de emprego, indisponível à redefinição pelo legislador infraconstitucional face à aplicação do princípio do não retrocesso social.
Mais afrontas a princípios
E não é só isso. Os julgamentos do Recurso Extraordinário nº 958.252/MG, em que foi aprovada tese de Repercussão Geral para o Tema nº 725, assim como da ADPF nº 324, por parte do Supremo Tribunal Federal, apesar de terem sido permeados por considerações axiológicas, de ordem socioeconômica, tanto da parte dos ministros que formaram maioria como da parte dos que ficaram vencidos, acabaram por ferir, também, o princípio da vedação de retrocesso social e ambos os precedentes jurisdicionais devem ser tidos como inconstitucionais.
Isso porque o Direito do Trabalho não reside na periferia do sistema, à mercê das sobras dos sucessos econômicos do país, ao contrário, ocupa posição central na conciliação do conflito entre as classes, fomentada pelo artigo 1º, IV, da Constituição. Posição esta que assume o papel de marco civilizatório, impondo as condições mínimas a que o trabalhador pode ficar sujeito, em torno das quais seu trabalho pode ser empregado na exploração de uma atividade econômica por outrem.
Com efeito, quando do julgamento do Tema nº 1.389 por parte do Supremo Tribunal Federal, é fundamental se ter em mente que a relação de emprego constitui-se na presença das suas características intrínsecas independentemente de ajuste prévio, e, nessas condições, supera mesmo a formalização de ajustes de outra natureza. A celebração de um contrato de prestação de serviços (seja ele, de trabalhador autônomo, de “terceirização”, de franquia, entre outros) não inibe o exame das características que dão lugar ao reconhecimento do trabalho subordinado a merecer a proteção oferecida pela legislação trabalhista.
No que concerne às características que permitem reconhecer a relação de emprego tácito, há consenso, tanto na doutrina como na jurisprudência, em torno dos parâmetros da pessoalidade, da não eventualidade, da remuneração e da subordinação, predicados estes inferidos dos artigos 2º e 3º da CLT, que definem as posições do empregado e do empregador nessa espécie de relação de trabalho.
Constatadas, enfim, essas características em determinada relação de trabalho, em especial a subordinação, por qualquer de suas dimensões – inclusive pela integração da atividade do trabalhador na atividade-fim da empresa, portanto –, pouco importa que não haja ajuste escrito entre as partes, porque o contrato de emprego admite a forma tácita, como explicita o artigo 442, da CLT.
Além disso, deve-se ter em mente que essa forma se impõe mesmo em detrimento da confecção de instrumento escrito pelo qual se pretenda atribuir-lhe outra natureza, já que do seu reconhecimento depende a aplicação de todas as garantias inerentes ao Direito do Trabalho, a começar pelo princípio do não retrocesso social e, por fim, pelo princípio da primazia da realidade sobre a forma.
Logo, a tese de Repercussão Geral para o Tema nº 1.389 não pode desprezar o conceito de relação de emprego, que foi incorporado ao texto da constituição federal por meio de seu artigo 7º, eis que vedado manipular o seu âmbito semântico, de forma a inviabilizar ou restringir a aplicação das garantias presentes na norma magna, sob pena de ser tida tal decisão como inconstitucional face à aplicação do princípio do não retrocesso social.
Isso porque a Constituição de 1988 consagrou a vedação de retrocesso social com um princípio constitucional de finalidade negativa, cujo objetivo de tal princípio é, por assim dizer, o de assegurar o nível – até então obtido – de concretização dos direitos fundamentais sociais e tornar permanente a sua respectiva materialização, impedindo que os poderes constituídos pratiquem qualquer ato que aniquilem, diminuam ou flexibilizem direitos fundamentais sociais (como é o caso do conceito de relação de emprego).
O Direito do Trabalho surgiu para proteger o hipossuficiente na relação entre capital e trabalho, e mesmo com toda a evolução social, econômica e tecnológica vivida desde então, não há como se entender que atualmente haja um equilíbrio natural entre as partes que torne desnecessária tal proteção jurídica. O desenvolvimento econômico não tem o condão de trazer esse equilíbrio, tampouco de garanti-lo, e as novas relações de trabalho não afastam os direitos trabalhistas consolidados pela Constituição, assentados no conceito da relação de emprego ali pressuposto, e que, por isso mesmo, é indisponível à manipulação tanto pelo legislador infraconstitucional quanto pelo Poder Judiciário.
Logo, se a Tese de Repercussão Geral para o Tema nº 1.389 visem impedir o reconhecimento de relação de emprego, mesmo que haja a presença dos requisitos da subordinação, da pessoalidade, da onerosidade e da não eventualidade, esta estará dotada de inconstitucionalidade face à aplicação ao caso do princípio do não retrocesso social, posto que as disposições dos artigos 2º e 3º, da Consolidação das Leis do Trabalho, alcançaram um patamar de conceituação constitucional da relação de emprego, de tal forma que os mesmos são compreendidos como uma complementação, indissociável, da norma constitucional disposta no inciso I, do artigo 7º, da Constituição.
1) Ordinários (requisitos CLT): etapa 1:
a) Pessoalidade
b) Onerosidade
c) Não Eventualidade
d) Subordinação
Caso haja a constatação dos quatro requisitos presentes na etapa 1 concomitantemente, deve haver o reconhecimento do vínculo empregatício. Se for duvidosa tal constatação, devem ser afastados todos os requisitos dispostos nas etapas 2 a 4 para reconhecimento da validade da “pejotização”, a saber:
2) Ordinários (requisitos CLT): etapa 2:
a) Controle de jornada
b) Pagamento de direitos trabalhistas (férias, 13º salário, vales refeição, alimentação, entre outros)
c) Custos administrativos (contador, material para operação, computadores, etc.) arcados pelo tomador
d) Obrigação de prestar serviços apenas na sede do contratante
e) Existência de quadro hierárquico com delimitação de cargos e funções
3) Extraordinários (reforma trabalhista): etapa 03:
a) CNPJ do prestador com objeto social com permissão à prestação de serviços na atividade-fim do contratante
b) CNPJ do tomador com atividade-fim do contratante constante de seu objeto social
c) Não impedimento legal ao contratante para receber os serviços do objeto social constante do CNPJ do prestador
d) Existência de opção de contratação pelos sistemas CLT e PJ (com a escolha sujeita à vontade do contratado)
e) Possibilidade de prestação de serviços a outros contratantes
f) Emissão de notas fiscais não sequenciais
g) Possibilidade de contratação de empregado ou equipe de trabalho (múltiplos empregados) pelo prestador
4) Extraordinários (reforma trabalhista): etapa 4:
a) Formação acadêmica (ensino superior ou acima)
b) Remuneração média mensal do prestador ser superior a dez salários mínimos nacionais
c) Remuneração média anual do prestador (PJ) não ser inferior à mesma média do empregado (CLT) (ou seja, deve haver a apuração de todas as vantagens contidas na CLT e em convenção e acordo coletivos, e esta deve ser inferior ao quanto recebido como PJ)