Paula Jaeger
As recentes pesquisas apontam que menos da metade dos trabalhadores de plataformas digitais fazem recolhimento para a Previdência Social.
Após o surgimento da economia compartilhada nos moldes atuais e a criação das plataformas digitais de intermediação de transportes e entregas, o seu modelo de sucesso tornou-se alvo de diversas discussões, dentre elas a possibilidade de haver ou não vínculo laboral entre a plataforma e o motorista ou entregador. Essa discussão ocorre em todo o mundo e tem resultados variados, sem consenso sobre o entendimento. No Brasil, não é diferente, e frequentemente são relatados julgamentos com decisões opostas.
Ocorre que no Brasil, salvo decisões judiciais em sentido contrário, os trabalhadores das plataformas digitais são considerados autônomos, sendo, portanto, segurados obrigatórios da Previdência Social.
Nessa condição, os trabalhadores devem verter as devidas contribuições para o INSS na modalidade de contribuinte individual autônomo, no percentual de 20% ou 11%, este último em caso de adoção do plano simplificado.
Para elucidar, vamos a um exemplo hipotético: um motorista de aplicativo que tenha uma renda mensal de R$ 3.000,00 (três mil reais). Essa renda auferida enquadra-se como rendimento do trabalho não assalariado, consoante prescreve o art. 45 do Decreto n° 3.000/99 e art. 3º, § 4º, lei 7.713, de 1988, sujeitando-se ao pagamento do imposto de renda mensal pela sistemática do carnê-leão. Ainda, o motorista deverá recolher a contribuição previdenciária sobre o regime de contribuinte individual, consoante prescreve o artigo 2, parágrafo 1º, da lei 8.212/91:
Tributo
Percentual
Valor em R$
IRRF
15%
360,00*
Contribuição Previdenciária
20%
600,00
Total
960,00
Como já referido, há a possibilidade de redução da alíquota do INSS para 11%, conforme prevê o artigo 21, parágrafo 2º, da lei n° 8.212/91, o que resultaria em um total de R$ 730,50 mensais de despesas tributárias para o trabalhador autônomo, o que continua representando um alto custo se considerado a renda mensal recebida (R$ 3.000,00).
No entanto, uma alternativa possível é a inscrição dos trabalhadores como Microempreendedor Individual, conhecido como MEI, que é um modelo empresarial simplificado.
O MEI está previsto no artigo 18-A da lei Complementar 123 e apresenta um regime de recolhimento de tributos mais barato e simples, o que facilita a formalização de milhares de trabalhadores.
Importante destacar que que para se enquadrar como MEI é necessário preencher alguns requisitos: (i) deverá faturar até R$ 81.000,00 (oitenta e um mil reais) por ano (ii) não ser sócio ou titular em outra empresa (iii) ter no máximo 01 (um) empregado contratado que receba o salário mínimo ou o piso da categoria.
Neste cenário, o trabalhador de aplicativo seria tributado em valores fixos, independentemente da sua receita, na seguinte proporção: (a) R$ 66,00 (sessenta e seis reais), a título da Contribuição para a Seguridade Social, relativa à pessoa do empresário, na qualidade de contribuinte individual; e (b) R$ 5,00 (cinco reais) relativos ao Imposto Sobre Serviços, por meio do Documento de Arrecadação do Simples Nacional – DAS.
O microempreendedor deverá entregar também a Declaração Anual de Faturamento do Simples Nacional (DASN-SIMEI), até o dia 31 de maio do ano seguinte, relativa ao exercício do ano anterior, sob pena de multa. Não há outros impostos ou taxas a serem recolhidos.
Comparando as duas situações hipotéticas (autônomo x MEI) em que o trabalhador receba a mesma renda, a tributação do contribuinte individual autônomo é mais de 10 vezes superior que o MEI.
Ocorre que apesar da possibilidade de recolhimento para a Previdência Social em uma alíquota de apenas 5%, no caso do MEI, a última pesquisa divulgada pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – IPEA1 aponta que apenas 23% dos trabalhadores de transportes por aplicativo contribuíram para o INSS.
Este índice é alarmante, pois a mesma pesquisa aponta que o Brasil conta com 1,7 milhões de profissionais na condição de motoristas e entregadores de plataformas digitais. Ou seja, uma parcela considerável da população está à margem da proteção Previdenciária, o que significa dizer que não terá qualquer amparo em caso de vir a sofrer algum acidente, ficar doente e também não terá contribuições para a futura aposentadoria.
Imprescindível observar a mudança que houve na sociedade em relação a forma de prestar serviço. Como já referido, o país conta com um vasto número de trabalhadores que não são considerados empregados, ao mesmo tempo, estes trabalhadores, na maioria dos casos, não contribuem para a Previdência Social, o que gera impacto negativo tanto no custeio da Previdência Social, quanto na sociedade como um todo, já que essas pessoas precisarão se aposentar daqui uns anos e não terão possibilidade, por falta de contribuição.
Afinal, é somente através dos recolhimentos previdenciários que o trabalhador será considerado segurado do INSS, fazendo jus a benefícios como auxílio-maternidade, benefício por incapacidade, aposentadoria e pensão por morte aos seus dependentes em caso de falecimento.
Deste modo, conclui-se que é de suma importância a divulgação da informação de que os trabalhadores de aplicativo devem verter contribuições para a Previdência Social, podendo se inscreverem como MEI, o que possibilita recolhimento em valores menores, porém, como já explicado, alguns requisitos devem ser preenchidos.
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Paula Jaeger
Sócia no escritório Becker e Jaeger Advogados. Doutoranda e Mestre em Direito pela PUCRS, especialista em Direito do Trabalho pela UFRGS
Migalhas: https://www.migalhas.com.br/depeso/390000/trabalhadores-de-plataformas-digitais-e-previdencia-social