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IMPARCIALIDADE EM DEBATE

Um país que admite a atuação de juízes parciais não pode ser considerado uma democracia de fato, pois decisões enviesadas são o ponto de partida para a quebra das garantias previstas pela Constituição e pela legislação processual. E, partindo dessa premissa, a decisão do Supremo Tribunal Federal de declarar a suspeição do ex-juiz Sergio Moro nos processos que envolvem o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva pode ser um divisor de águas na Justiça e na opinião pública.

Para Alberto Toron, suspeição de Moro pode ser divisor de águas no Judiciário

Essa foi a avaliação dos especialistas que participaram do evento online “Sem imparcialidade não há democracia!”, transmitida no fim da tarde desta quarta (9/3) pela Conjur.

Mediado pela advogada e ex-desembargadora do TRF-3 Cecília Mello, o encontro contou com a participação de Alberto Zacharias Toron, advogado, professor de Direito Penal (Faap) e ex-secretário-geral do Conselho Federal da OAB; Georges Abboud, advogado e professor de Direito Constitucional do IDP e de Processo Civil da PUC-SP; Lenio Luiz Streck, advogado, professor da pós-graduação em Direito da UniSinos e ex-procurador de Justiça; e Marina Coelho Araújo, advogada, professora no Insper e presidente do IBCCrim.

Primeiro a discorrer sobre o tema do debate, Abboud mostrou como a parcialidade do julgador pode prejudicar o sistema de Justiça e a própria democracia.

“Se um juiz é parcial, ele fatalmente não vai assegurar um contraditório efetivo, assim como não irá garantir a ampla defesa e não fará uma análise devidamente motivada do material probatório”, explicou. “Ou seja, a imparcialidade do julgador é condição sine qua non para a produção de todas as demais garantias”.

Na mesma linha, Marina Araújo recorreu à doutrina ao afirmar que “a imparciliadade é da essência do Processo Penal, pois sem ela não há processo”. Em seguida, deu exemplos de como a legislação concretiza a exigência de isenção por parte do julgador.

“Três artigos tratam disso: primeiro os artigos 252 e 254 do Código de Processo Penal, que trazem hipóteses de impedimento e de suspeição, respectivamente. E há ainda o artigo 145 do Código de Processo Civil, que também trata de suspeição”.

Ela destacou, porém, que os advogados frequentemente se deparam com dificuldades na hora de apontar problemas relacionados à isenção do juiz. “As hipóteses de suspeição e impedimento que dificultam nosso trabalho são aquelas caracterizadas pela soma dos atos realizados que não acontecem de forma ilícita, mas que, no seu conjunto, mostram o bias, o viés do juiz”, observou a advogada.

Constrangimento
Sobre a questão dos obstáculos enfrentados pelos advogados, Toron acrescentou que a defesa também pode se ver constrangida por outro fator na hora de questionar a conduta do juiz.

“Mesmo identificando uma hipótese de parcialidade, o advogado muitas vezes não argui o magistrado, porque ele teme pela sorte do seu cliente, quando não pela sua própria sorte. Pense numa cidade do interior que só tenha um juiz”, disse o criminalista.

Questionado sobre um eventual legado positivo do reconhecimento feito pelo STF da atuação parcial do ex-juiz Sergio Moro no julgamento do ex-presidente Lula, Toron relativizou o caso, mas se mostrou otimista.

“O Habeas Corpus concedido em favor do presidente Lula é um marco para a democracia no país e reafirma o caráter contramajoritário do STF. Não acaba com a postura defensiva do Judiciário, mas permite avançar”, afirmou ele.

Já Lenio Streck disse acreditar que as mudanças só virão de forma efetiva se os juristas atuarem para “constranger”, com base na doutrina, os adeptos da parcialidade. “Quando a doutrina não constrange — e nós fizemos isso na suspeição do Sergio Moro — o Direito degenera — veja o exemplo dos nazistas”, concluiu o professor.

Clique aqui para assistir ao debate ou veja abaixo: