O presidente Luiz Inácio Lula da Silva se reuniu nesta quarta-feira, no Rio de Janeiro, com o diretor-geral da Organização Internacional do Trabalho (OIT), Gilbert F. Houngbo. A conversa ocorreu no contexto do evento de pré-lançamento da Aliança Global Contra a Fome e Pobreza, destacando a prioridade brasileira na presidência do G20.
Durante o encontro, Lula e Houngbo discutiram as recentes mudanças no mundo do trabalho, com um foco particular na regulação das atividades de motoristas por aplicativo. Lula revelou a iniciativa do Governo Federal de propor um projeto de lei ao Congresso para assegurar direitos mínimos aos motoristas de aplicativos, visando combater a precariedade laboral na categoria.
Este encontro bilateral ocorre 40 dias após a reunião de Lula com Houngbo em Genebra, na Suíça, durante o Fórum Inaugural da Coalizão Global para Justiça Social, em 13 de junho passado. Naquela ocasião, Lula enfatizou a necessidade de enfrentar as desigualdades sociais, integrando direitos trabalhistas aos direitos humanos, expandindo o acesso aos meios produtivos e promovendo o trabalho decente. Ele destacou as preocupações com a precariedade nas novas formas de emprego, especialmente no contexto das plataformas digitais.
Aliança Global contra a Fome e a Pobreza
A Aliança Global Contra a Fome e a Pobreza é uma iniciativa de Lula, inicialmente proposta na Cúpula do G20 em Nova Delhi, na Índia, no ano passado. Durante a atual presidência brasileira do G20, a ideia tem sido trabalhada intensamente. Uma Força-Tarefa, composta pelo Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS), Ministério das Relações Exteriores (MRE) e Ministério da Fazenda (MF), realizou várias reuniões para obter um consenso entre mais de 50 delegações internacionais sobre os documentos fundacionais da Aliança.
Agora, a Aliança está aberta à adesão de governos, organizações internacionais, instituições acadêmicas, fundos e bancos de desenvolvimento, bem como instituições filantrópicas. O objetivo é unir esforços globais para combater a fome e a pobreza, promovendo políticas de desenvolvimento sustentável e justiça social.
Próximos passos
A reunião entre Lula e Houngbo reforça o compromisso do Brasil com a promoção de um mercado de trabalho mais justo e com a luta contra a fome e a pobreza em escala global. A iniciativa de regulamentar as atividades de motoristas por aplicativo marca um passo significativo na proteção dos direitos trabalhistas no Brasil, refletindo a visão do governo de enfrentar os desafios contemporâneos do trabalho com soluções inclusivas e sustentáveis.
O evento de pré-lançamento da Aliança Global Contra a Fome e a Pobreza também destaca a importância da cooperação internacional e do engajamento multissetorial para alcançar objetivos comuns de desenvolvimento humano e justiça social.
Ranking com dez dos 12 países do continente coloca brasileiro na primeira posição, com 53,6% de avaliação boa ou muito boa, segundo pesquisa feita por consultoria argentina
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva é o mais bem avaliado da América do Sul em julho, com 53,6% de opiniões positivas sobre o seu desempenho, de acordo com pesquisa mensal da CB Consultoria de Opinião Pública, da Argentina.
A pesquisa — elaborada com dez dos 12 países do continente, exceto Suriname e Guiana — considera as avaliações sobre a imagem interna dos presidentes. Lula obteve a melhor colocação na soma das alternativas “boa” e “muito boa”. As negativas (ruim/muito ruim) ficaram em 42,9%.
Analisando as sondagens anteriores, o presidente brasileiro vem numa trajetória ascendente: entre março e maio, esteve entre a quinta e a quarta colocação, passando para a terceira em junho.
O segundo da lista é Javier Milei, da Argentina, com 52,1% de aprovação e 44,7%. Na sequência, vêm Daniel Noboa, do Equador, com 51,5% contra 45,4%; Luis Arce, da Bolívia, com 49,8% contra 47,3% e Luis Lacalle Pou, do Uruguai, com 48,7% ante 47,9%.
Os que ficaram nas piores posições foram Gustavo Petro, da Colômbia, com 32,3% de avaliação boa/muito boa e 62,9 de ruim/muito ruim; Dina Boluarte, do Peru, com 32,5% e 62,2% respectivamente; Gabriel Boric, do Chile, com 36,3% e 60,6%; Nicolás Maduro, com 37,6% e 58,9% e Santiago Peña, do Paraguai, com 45,2% e 51,1%.
O levantamento foi feito de maneira online entre os dias 16 e 20 de julho, com 1.471 brasileiros maiores de 18 anos.
A renomada economista Clara E. Mattei, autora de A ordem do capital: como economistas inventaram a austeridade e abriram caminho para o fascismo, chega ao Brasil para debater a austeridade enquanto um projeto político dentro da estrutura do capitalismo.
Professora do Departamento de Economia da The New School for Social Research, Clara E. Mattei faz um estudo inovador sobre a forma como diferentes países e governos enfrentaram crises financeiras, aplicando cortes em políticas públicas e precarizando as relações de trabalho, além de seus efeitos devastadores ao longo da história.
Confira as informações sobre as atividades no Brasil:
Rio de Janeiro
Sexta-feira, 26/07, às 9h
Aula inaugural A ordem do capital: como economistas inventaram a austeridade e abriram caminho para o fascismo
Centro de Tecnologia
Auditório G122 da COPPE – CT/UFRJ
Av. Athos da Silveira Ramos, 149, Bloco G – Cidade Universitária
Sexta-feira, 26/07, às 14h
States of the Future
Mesa de Diálogo: Futuro do Estado e da Democracia
BNDES
Av. República do Chile, 100 – Centro
Transmissão ao vivo pelos canais no YouTube do BNDES, //www.youtube.com/@gestaogov_br” style=”box-sizing: border-box; background-color: transparent; color: rgb(132, 59, 48); border-bottom: 2px solid rgb(238, 238, 238); transition: border 0.2s ease-in-out 0s;”>MGI e OEI
Belo Horizonte
Segunda-feira, 29/07, às 14h
Seminário: O potencial revolucionário da política econômica histórica
Com Clara Mattei e mediação de Clara Brenck
Faculdade de Ciências Econômicas da UFMG – FACE
Auditório 1
Av. Pres. Antônio Carlos, 6627 – Pampulha
Segunda-feira, 29/07, às 19h
Lançamento do livro A ordem do capital
Bate-papo seguido de sessão de autógrafos
Restaurante Salumeria Central
Rua Sapucaí, 527- Floresta
São Paulo
Terça-feira, 30/07, às 15h
Encontro com Clara E. Mattei
Fundação Escola de Sociologia e Política
Sala Florestan Fernandes
Rua General Jardim, 522 – Vila Buarque
Transmissão on-line pelos canais do YouTube da Boitempo, FESPSP e FPA
Terça-feira, 30/07, às 19h
Fascismo e austeridade econômica
Lançamento seguido de sessão de autógrafos
Com Clara E. Mattei, Luiza Nassif Pires (Made/USP) e mediação de Eleonora de Lucena
Livraria Tapera Taperá
Av. São Luís, 187 – 2º andar, loja 29 – República
Com transmissão ao vivo nos canais do YouTube da Boitempo e da Tapera Taperá
Em setembro de 2023, quando Erich* começou a trabalhar em uma unidade da rede de mercados OXXO, na região central de São Paulo, seu turno era o da noite. Na primeira semana de emprego, sofreu um assalto. “Eram três indivíduos, dois deles entraram na loja e um ficou do lado de fora, observando se vinha polícia”, relata. Depois, vieram o segundo, o terceiro, o quarto, o quinto… Foram sete assaltos desde o início do seu contrato com a empresa, ele me conta em uma entrevista por telefone, na qual pede para seu nome verdadeiro não ser publicado, por receio de represálias. “Meu intuito é sair da OXXO, mas enquanto não arrumo nada, não posso pedir contas assim, com uma mão na frente e outra atrás.”
Erich conta que passou meses trabalhando sozinho, entre setembro de 2023 e janeiro deste ano, e só então a empresa contratou um segundo funcionário para dividir as tarefas. “Mas, na primeira noite de trabalho, a loja foi assaltada”. No geral, explica, os assaltos ocorrem no meio da madrugada, principalmente entre duas e três da manhã. “Já teve um que foi com faca, outro com martelo, com arma de fogo…”
O último, relembra, foi o mais violento. “O cara estava com uma faca escondida no punho da camisa. Eu entrei em uma briga corporal com ele, que sacou a faca, mas consegui me desvencilhar. Foi feio, ele me deu um soco, fiquei um pouco machucado no braço.” O trabalhador diz que, por sorte, nunca se feriu gravemente, mas os ataques deixaram traumas. Quando está sozinho na loja, a entrada de qualquer pessoa o deixa nervoso. “Eu me assusto todos os dias, virei uma pessoa extremamente desconfiada. Não é normal você chegar no trabalho e já ficar aflito. A qualquer momento, quando chega alguém na loja, meu coração começa a acelerar. Eu atribuo isso à OXXO porque a gente não recebe nenhum tipo de tratamento de saúde mental. E quem sofre mesmo é quem trabalha de madrugada”, desabafa.
Assaltos, furtos e agressões
Erich é um dos 14 funcionários da OXXO com os quais a reportagem do Joio conversou para entender como são as condições laborais e de segurança nas lojas da rede. Nove deles trabalham na capital; dois na Grande São Paulo: Guarulhos e Santo André; outro, em Praia Grande, no litoral paulista, e dois no interior do estado: Campinas e Piracicaba. Todos pediram para não ser identificados e tiveram seus nomes trocados pela reportagem.
Uma das principais reclamações é a ausência de um funcionário de segurança nas lojas, sobretudo no período da noite, deixando-os, assim, vulneráveis a assaltos, furtos e agressões. Além disso, as queixas são de que o quadro de empregados é muito restrito, que eles são superexplorados e acumulam muitas funções para além da de atendentes, para a qual foram contratados. E a tensão que passam com assaltos, roubos e acúmulo de função afeta diretamente a saúde mental de quem trabalha na OXXO.
Taís*, atendente de uma unidade da região central de São Paulo, trabalha na rede desde janeiro deste ano. Segundo ela, até havia um segurança no período da tarde na loja para onde foi alocada, mas ele ia embora quando anoitecia. “A gente ia ficando com medo.” A sugestão dos superiores, diz, foi de que os atendentes se revezassem na porta, assumindo a função de segurança. “Eu neguei, falei que essa não era minha função, além de tantas outras que eu faço ali, porque a gente é contratado para ser atendente, mas executa várias outras tarefas e não é remunerado por elas”, denuncia.
Em Campinas, no interior de São Paulo, Larissa* iniciou o treinamento para ser vendedora da OXXO trabalhando em várias unidades da cidade. “Eu ficava o tempo todo muito em alerta, com medo. Logo depois que parei de trabalhar na primeira loja, ela foi assaltada”, conta. “E, aos domingos, quando não tem tanto movimento, me deixavam sozinha. É quando você está mais vulnerável. E eles não se importam. O foco é só vender e acabou.”
Larissa conta que também sofreu assédios e pressões. “Largavam a gente sozinha na loja e tínhamos que fazer tudo. Tem vários desvios de função. E ainda era obrigada a me proteger de alguém que poderia entrar na loja a qualquer hora, roubar e fazer alguma coisa comigo.”
Desde que abriu sua primeira loja no Brasil, em dezembro de 2020, a rede de mercados não para de se multiplicar. Hoje, a OXXO tem 500 lojas, está presente em 17 cidades do estado de São Paulo e emprega mais de 4 mil pessoas, de acordo com sua assessoria de imprensa.
Em março deste ano, a unidade de número 500 foi inaugurada, no bairro da Aclimação, na capital paulista. “O formato de proximidade conversa diretamente com o perfil do brasileiro, que preza pelo tempo e praticidade, perto de suas residências ou do trabalho. Por isso, direcionamos a nossa estratégia, nesses primeiros anos de atuação, em uma expansão rápida e eficiente. O processo é pautado por inteligência de dados e nas necessidades do cliente cotidiana”, disse, em entrevista à imprensa, Hugo Curriel, CEO do Grupo Nós, detentor das marcas OXXO e Shell Select.
Como o Joio contou em reportagem publicada em abril de 2022, o Grupo Nós nasceu de um consórcio entre a Raízen, licenciada da marca Shell, e a Fomento Económico Mexicano (Femsa) – empresa que é a maior engarrafadora da Coca-Cola do mundo.
Ações judiciais
Todos os funcionários entrevistados mencionaram que a empresa os contratou para o cargo de atendente, mas que, na prática, eram pressionados a assumir outras tarefas. “A gente tinha de cuidar da padaria, ser estoquista, entrar na câmara fria para arrumar estoque, fazer a limpeza da loja, limpeza dos fornos, lavar banheiro, operar o caixa e receber mercadoria…”, conta Larissa.
Regina*, atendente de uma loja da região Sul do município de São Paulo, diz que o ritmo de trabalho é “frenético”. “E os donos da OXXO só querem saber de números, só querem saber de abrir loja, só sabem falar de metas e nos pressionar. Como fica a cabeça dos funcionários?”, questiona.
O acúmulo de funções e as situações de violência e insegurança têm gerado demandas judiciais contra a OXXO. Uma pesquisa na página do JusBrasil, realizada no dia 1º de julho, mostra que a empresa é citada em 965 processos, a maioria deles como ré em ações trabalhistas no Tribunal de São Paulo – que abrange a capital, Guarulhos, ABC, Osasco e Baixada Santista – e no de Campinas, que abrange as demais cidades paulistas.
O advogado Fabricio Pires da Costa representa alguns funcionários que estão processando a OXXO por acúmulo de funções e insegurança. “No que eles mais pecam é na exposição ao risco de assaltos. Eles não oferecem segurança, dizem que tem uma empresa terceirizada de vigilância. Mas, na realidade, essa ronda que eles fazem lá quase não é efetiva, porque não protege em nada o trabalhador”, relata. Além disso, as condições são péssimas, diz. “Eles visam lucro e enxergam o empregado como um número.”
Uma das funcionárias que o advogado representa, Marina*, está processando a rede por danos morais. De acordo com a ação, além do acúmulo de funções, ela foi submetida “a situações de profundo abalo emocional ao passar por atos de violência e à exposição de diversos assaltos à mão armada”. Na ação, a defesa argumenta que a ausência de medidas de vigilância casada à intensa movimentação da loja em que Marina trabalha gera um paradoxo: ela precisa lidar diariamente com altos valores monetários, sem segurança para tal.
De acordo com o Ministério Público do Trabalho (MPT), há alguns processos contra a OXXO sob sigilo e alguns arquivados. Existem duas denúncias de não cumprimento de cota de contratação de aprendiz e reserva de cargo para pessoas com deficiência. Procuramos a Secretaria de Segurança Pública (SSP) do Estado de São Paulo para solicitar dados de boletins de ocorrência por assalto nas lojas da rede da capital, pedido que foi feito também por Lei de Acesso à Informação, mas a SSP não forneceu informações a respeito.
Visitas diárias e roubos
Além dos assaltos, os funcionários também lidam quase diariamente com os furtos que acontecem nas lojas, conta Regina. Ela diz que é a segunda vez que trabalha na rede de mercados. A loja onde é funcionária recebe “visitas” diárias de um homem, sempre segurando uma faca ou uma chave de fenda. “Ele rouba garrafas de Heineken. Consegue levar um fardo de 24 unidades”, diz.
A orientação da OXXO, afirma, é para deixar levar a mercadoria e, depois, “abrir um chamado, um protocolo”, que é um registro interno dos funcionários, dos itens que foram furtados. “Perdi as contas de quantos chamados já abri, o caderno está lotado”, desabafa Regina. Seu medo, revela, é ser agredida.“Já ouvi relatos de funcionários que foram baleados, então nosso receio é esse”, diz. “Eu tenho ansiedade desde a minha primeira passagem pela empresa. Recentemente, estava insustentável, eu tremia, eu chorava, para você ver o nível da minha ansiedade.”
Erich também perdeu as contas de quantos chamados abriu, e afirma que a loja não se preocupa com a integridade dos funcionários. “Quando acontecem assaltos e furtos, os nossos líderes não perguntam se você está bem, eles perguntam se você abriu um chamado e o que levaram”, denuncia. “Líderes” são como os supervisores são chamados dentro das unidades do mercado.
Outra ação que corre na Justiça do Trabalho contra a OXXO é movida por Gisele*, que trabalhou numa filial em Santo André. De acordo com a ação por dano moral e adicional de insalubridade, a jovem trabalhava sob “extrema pressão e rigor excessivo, pois recebia da líder e da encarregada a orientação de reagir a eventuais furtos e assaltos que viessem acontecer dentro da loja, colocando-a em acentuado risco.”
O advogado Rafael Vassoler conta, em entrevista, que Gisele também foi submetida a acúmulo de função, pois além de atuar como atendente de loja, trabalhava como auxiliar de limpeza, lavando banheiros, vidros e até limpando fornos e fermentadoras.
“Ela esteve exposta a produtos como cloro, água sanitária, detergentes, desengordurantes, saponáceos e demais produtos de limpeza que continham álcalis cáusticos, mas nunca teve adicional de insalubridade e, tampouco, recebeu equipamentos de proteção individual (EPI).” Além disso, ela teria levado um tapa no queixo dado por sua líder. O teor das ameaças era sempre de agressões: a supervisora teria dito que “se trabalhasse no horário dela ia bater nela de manhã, de tarde e de noite.”
Portas trancadas, “barreiras” e tensão
Numa noite fria do mês de junho, rodei pelo centro de São Paulo e visitei diversas lojas da OXXO. Começo pela unidade da rua Major Sertório, depois sigo para a da Rego Freitas, largo do Arouche, avenida São Luís, Major Diogo, Maria Paula, Libero Badaró… A ideia é ver se as lojas têm ou não segurança, quantos funcionários há em cada uma, e tentar marcar alguma entrevista com trabalhadores. Em algumas, apenas entro, observo e saio. Em outras, onde há pouco movimento ou quando o funcionário está em um local onde a abordagem é mais fácil, puxo assunto, explico a pauta e peço o telefone para uma futura entrevista. Alguns são receptivos, outros já dizem que preferem não falar.
Duas das lojas onde fui estavam com as portas trancadas. Um dos mercados tinha uma espécie de barreira formada por uma mesa com alguns produtos em cima. Algumas lojas chegam a fazer vendas de portas fechadas mesmo, atendendo os clientes por uma pequena janela aberta. Em outras lojas, havia mais de um funcionário, mas apenas em duas havia a figura do segurança. O clima de abandono das lojas combina com o abandono do centro e das pessoas em situação de rua que vivem ali.
De acordo com Ricardo Patah, presidente do Sindicato dos Comerciários de São Paulo, a entidade foi procurada pelos trabalhadores, que reclamaram da falta de segurança nas lojas da OXXO. “Começamos a ter denúncias de que as lojas muitas vezes eram assaltadas e as pessoas se sentiam inseguras. Então, desde o ano passado nós tivemos três ou quatro reuniões de trabalho com a empresa no sentido de ter alguma solução razoável”, diz.
Segundo Patah, a partir das negociações do sindicato, iniciou-se, por parte da OXXO, um processo de monitoramento e ronda. “Desde então, começou a ter uma melhora. A empresa só começou a mudar sua postura graças ao sindicato”, afirma.
A ronda à qual o presidente do sindicato se refere é um funcionário de segurança que passa pelas lojas de moto. Além dele, a outra modalidade de segurança é o fiscal, que fica no período da noite e da madrugada em algumas das lojas. De acordo com os funcionários entrevistados, no entanto, a ronda não é efetiva, já que há apenas um funcionário responsável pela segurança de várias lojas.
A reportagem teve acesso à ata de uma reunião realizada entre o sindicato e o Grupo Nós, em junho deste ano, na qual a empresa afirma estar executando “o plano apresentado quanto à medidas para a mitigação de riscos existentes, como colocar portas de vidros nas lojas, conectando câmeras integradas junto à Polícia Militar”. No documento, também consta a promessa de instalação de uma central de monitoramento. Por meio da assessoria da Secretaria de Segurança Pública, a PM de São Paulo informou que não recebeu tal solicitação.
O sofrimento do precariado
Mesmo sendo contratados sob o regime de CLT, os funcionários da OXXO podem ser enquadrados no conceito de precariado. A avaliação é do sociólogo Ruy Braga, professor e chefe do Departamento de Sociologia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP, estudioso do mundo do trabalho e autor de livros sobre o precariado, que é, na sua definição, a camada da população que vive nas condições mais precárias dentre os trabalhadores.
“Essa mistura de flexibilização da jornada, com condições muito precárias de inserção nos postos de trabalho, acúmulo de funções e, sobretudo, exposição à violência urbana tem um impacto bastante flagrante, principalmente nesses negócios espalhados pela cidade”, analisa. O sociólogo acredita que a forma de contratação laboral dentro na rede de mercados, que chegou ao Brasil em 2020, três anos depois da reforma trabalhista entrar em vigor, foi beneficiada pelo afrouxamento da legislação. Mesmo sem ter feito pesquisa específica sobre a OXXO, Braga afirma que estudos de outros países e setores demonstram que os efeitos psicológicos desse tipo de ocupação são “devastadores”. “Há um nível muito alto de estresse, e há síndromes ligadas ao trabalho precário, como a síndrome de burnout”, diz, citando a Síndrome do Esgotamento Profissional, distúrbio emocional com sintomas de exaustão extrema, estresse e esgotamento físico resultante de situações de trabalho desgastante. “É muito compreensível que a gente observe o aumento de ações na Justiça do Trabalho – e também reclamações nas redes sociais”, avalia.
Procurada, a OXXO disse, por meio de sua assessoria, que “está ciente dos problemas da sociedade e busca diariamente novas estratégia de segurança, além de investir em tecnologia e inteligência para desenvolver ações preventivas nas unidades, bem como parcerias com os órgãos públicos, instituições do setor e demais players do varejo para contribuir na construção de um ambiente cada vez mais seguro para nossos colaboradores, clientes e comunidade”.
Fonte: O Joio e o Trigo
Texto: Tatiana Merlino
Data original da publicação: 17/07/2024
“O TRABALHADOR entra bem na empresa e sai atrofiado”, diz Antônio*, que atuou por dois anos como operador de máquinas no frigorífico da Marfrig em Ji-Paraná, em Rondônia, até cair de uma altura de seis metros. Cinco anos depois do acidente, em 2023, ele ainda não conseguia andar mais de 200 metros sem sentir dor.
“Eu não dava conta do trabalho, deixava as peças caírem pela dor nos braços”, conta Marlene*, que trabalhou refilando carne na JBS em São Miguel do Guaporé, em Rondônia.
“OTRABALHADOR entra bem na empresa e sai atrofiado”, diz Antônio*, que atuou por dois anos como operador de máquinas no frigorífico da Marfrig em Ji-Paraná, em Rondônia, até cair de uma altura de seis metros. Cinco anos depois do acidente, em 2023, ele ainda não conseguia andar mais de 200 metros sem sentir dor.
“Eu não dava conta do trabalho, deixava as peças caírem pela dor nos braços”, conta Marlene*, que trabalhou refilando carne na JBS em São Miguel do Guaporé, em Rondônia.
Ana*, ex-empregada da Marfrig na unidade de Bataguassu (MS) foi diagnosticada com tendinite depois de dez anos de serviço. “Eu sentia muita dor durante o trabalho, mas fui levando até não aguentar mais segurar um garfo. Hoje não dou conta de lavar nem um sapato”, revela.
A produção de carne é um dos pilares da economia brasileira. O país sedia três dos maiores produtores de proteína animal do planeta: JBS, Marfrig e Minerva. A cadeia produtiva completa da carne responde por 10% do PIB nacional. Mas essa pujança não se reflete em segurança e saúde para o trabalhador, segundo investigação do Programa de Pesquisa da Repórter Brasil, cuja íntegra está publicada em um relatório ‘Fábrica de acidentes’, desenvolvido em parceria com a organização dos Países Baixos SOMO. O relatório também está disponível em inglês neste link.
Em 2019, os empregados da indústria da carne no Brasil sofreram quatro vezes mais acidentes de trabalho e tiveram dez vezes mais doenças profissionais do que o trabalhador brasileiro médio. Comparada às estatísticas internacionais disponíveis, a incidência de acidentes não fatais e fatais nos frigoríficos brasileiros é elevada.
“É uma fábrica de acidentes e lesões”, confirma Marcos Cardoso dos Santos, presidente do Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias de Alimentação do Estado de Rondônia (Sintra Intra).
Setor pujante da economia brasileira, a produção de carne tem impactos relevantes sobre a saúde e a segurança dos trabalhadores (Fotos: Isabel Harari)
Quase 140 mil pessoas trabalham em frigoríficos de bovinos no Brasil, segundo dados publicados pela Relação Anual de Informações Sociais, do Ministério do Trabalho e Emprego. Além do abate em si, há setores como a desossa, o corte e a embalagem dos pedaços de carne – é um serviço que exige manuseio de objetos perfurocortantes como serras e facas, e muitas horas em ambientes com temperaturas extremas. Os movimentos são repetidos inúmeras vezes à medida em que as carcaças são carregadas ao longo da linha de produção por esteiras, e é preciso seguir o ritmo imposto pelas máquinas.
“Eu sentia muita dor na caixa do peito, não aguentava respirar. E também dor no ombro e nas mãos”, diz um trabalhador. “A faca ‘escapou’ e cortei a mão”, revela o outro. “Quem tem mais de quatro anos de firma, e usa faca, sempre tem dor”, reclama mais um. “Eu não aguentava puxar as peças da esteira. A enfermeira dava paracetamol, cataflan, e mandava de volta para o trabalho”, completa uma quarta pessoa – todas entrevistadas sob condição de anonimato.
A Repórter Brasil foi a campo e realizou 63 entrevistas com empregados e ex-empregados de frigoríficos para ouvir suas avaliações sobre o trabalho. A grande maioria (84%) dos entrevistados diz ter doenças relacionadas ao trabalho, e muitos deles (40%) sofreram acidentes de trabalho. Quase todos (93%) relatam desconforto térmico, a grande maioria (87%) faz horas extras, e menos da metade faz as pausas obrigatórias, sendo que há consenso entre especialistas de que esses fatores podem levar a mais acidentes e doenças.
“O ritmo de trabalho intenso, em ambiente confinado que combina diversos fatores de risco, leva ao adoecimento, a acidentes e a mortes”, confirma Leomar Daroncho, procurador do Ministério Público do Trabalho (MPT).
Em nota, a Marfrig afirmou que cumpre todas as normas de segurança e medicina do trabalho, e que conta, em seu quadro de funcionários, “profissionais especialistas em fisioterapia e em ergonomia, médico do trabalho, enfermeiro, engenheiro e técnico do trabalho”. “As atividades dos colaboradores são realizadas dentro dos parâmetros normativos de segurança, ergonomia e saúde, sem a existência de ritmo intenso, estipulação de metas ou imposição de jornadas extenuantes de trabalho”, completa.
A JBS frisou que segue as normas previstas em legislações civis e trabalhistas que são “revisadas anualmente com base em indicadores de saúde e segurança, como rotatividade, absenteísmo e horas extras, assim como apontamentos feitos pelos funcionários”.
A Minerva também afirmou seguir medidas de saúde e segurança no trabalho. Em nota, disse que “busca ainda garantir um ambiente de trabalho de segurança e bem-estar, promovendo capacitação, iniciativas para a melhoria da qualidade de vida e seguindo um conjunto de diretrizes que englobam desde seu próprio Código de Ética – Guia de Conduta até as legislações trabalhistas de cada país em que atua”.
As manifestações na íntegra das empresas podem ser acessadas aqui.
Norma que reduziu riscos esteve ameaçada por Bolsonaro
As precárias condições de trabalho em frigoríficos não são novidade. Tanto que em abril de 2013, após mais de uma década de debates, o governo publicou a Norma Regulamentadora nº 36 do Ministério do Trabalho e Emprego, um texto técnico que regulamenta o trabalho nas plantas de abate. A NR-36, como é mais conhecida no meio, estabeleceu parâmetros de saúde e segurança para os trabalhadores do setor, na época muito criticado pelo ritmo intenso de produção imposto pelos empregadores.
“Foi uma luta de anos, demonstrando o quadro de severas consequências sobre a saúde e a vida de trabalhadores, mas resultou no consenso entre empregadores, trabalhadores e governo para a construção de balizas que protegessem, minimamente, os trabalhadores de frigoríficos”, recorda Daroncho, do MPT.
Teresa* e Leandro* trabalharam em um grande frigorífico no centro-oeste há mais de dez anos, antes da implementação da NR-36. Naquela época, contam, não existiam pausas ao longo da jornada e se fazia hora extra todos os dias. “O ritmo de trabalho era pauleira. Eu fazia o serviço de três pessoas”, relata o funcionário. A intensidade cobrou um preço: Teresa ainda sente dores nas costas e braços, e seu dedo da mão não dobra mais: “a vida da gente ficava muito presa lá dentro”, desabafa.
Trabalho em frigoríficos possui norma específica para garantir segurança e saúde dos empregados, mas dez anos depois, acidentes e afastamentos ainda são realidade (Fotos: Isabel Harari)
Os dados indicam um cenário melhor após a entrada em vigor da NR-36. Historicamente, a principal causa de afastamentos do trabalho no setor são doenças osteomusculares e de tecido conjuntivo – problemas como lesões nos músculos, tendões e articulações. Mas essas ocorrências caíram de 1,7 mil em 2012, para 923, em 2022. Já as fraturas, segundo motivo no ranking de afastamentos do INSS em frigoríficos, passaram de 1,3 mil para pouco mais de mil casos em dez anos.
“Não temos dúvida que a NR-36 evitou milhares de acidentes, mutilações e óbitos dentro dos frigoríficos”, disse o presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores da Alimentação, Artur Bueno, em um evento que marcou os dez anos da normativa, realizado em 2023.
A celebração também refletia uma vitória mais recente: em janeiro de 2022, uma liminar freou um plano do governo do então presidente Jair Bolsonaro (PL) de fazer mudanças na NR-36. O projeto de revisão da norma, que foi apoiado por entidades que representam os frigoríficos, previa, entre outros pontos, uma mudança no regime de pausas estabelecido pela norma regulamentadora – as empresas são obrigadas a conceder um descanso total de 60 minutos ao dia, distribuídos em seis pausas de dez minutos ou em três pausas de 20 minutos para a recuperação física dos trabalhadores.
Mais da metade dos frigoríficos foi autuada recentemente
No período de 2017 a 2020, de 1.437 plantas de abate auditadas no setor frigorífico, 64% foram autuadas por falta de atendimento aos requisitos da NR-36. “Ainda há necessidade de avançar, especialmente com relação às lesões por esforço repetitivo, o respeito às pausas e inibição da contaminação dos trabalhadores por vazamento de gases tóxicos como, amônia”, destaca Rogério Araújo, auditor fiscal do trabalho do Ministério Público do Trabalho (MTE).
Exemplo: um laudo pericial do Ministério Público do Trabalho (MPT) feito em novembro de 2022 após uma ação de fiscalização na unidade de Bataguassu (MS) da Marfrig – a mesma em que Ana* trabalhou – revela irregularidades em relação à ergonomia, disponibilização de Equipamentos de Proteção Individual e medidas de proteção para a manipulação dos maquinários no frigorífico. “A Marfrig de Bataguassu não vem adotando medidas suficientes de redução e/ou eliminação dos riscos”, conclui o texto.
Laudo do Ministério Público do Trabalho identificou problemas de ergonomia e EPIs na Marfrig de Bataguassu (MS) (Foto: Ministério Público do Trabalho)
Outra vistoria do MPT em 2019 já havia “constatado a presença de situações de risco grave e iminente, colocando em risco a integridade física, a saúde e a vida das pessoas”. O órgão levantou que entre 2018 e 2019 foram fornecidos mais de 1,5 mil atestados por doenças osteomusculares na unidade de Bataguassu, número considerado elevado frente aos 1,3 mil trabalhadores da unidade.
Em agosto de de 2023, o MPT também concluiu que a JBS apresenta “resistência em implementar medidas que afetem diretamente os custos e a produção das unidades frigoríficas” em Rondônia. Além disso, o órgão afirma que a empresa foi “incapaz de comprovar que mantém a temperatura dos ambientes de trabalho dentro dos limites de tolerância, realiza o controle adequado das pausas e possui parâmetros de produtividade compatíveis com a capacidade laboral de cada trabalhador”. A ação trabalhista, iniciada em 2010, determinou o pagamento de multa de R$ 552,2 mil pela empresa.
Vistoria do Ministério Público do Trabalho identificou irregularidades na planta da JBS em Vilhena (RO) (Foto: Ministério Público do Trabalho)
Parte dos prejuízos com o descumprimento de normas trabalhistas, como a NR-36, recaem sobre os cofres públicos. Em 2021, o governo federal desembolsou R$ 1,8 bilhão com auxílio doença por acidente de trabalho ocorridos no país, em todos os setores econômicos – as despesas acumuladas desde 2012 já bateram R$ 23,4 bilhões. “Acidente de trabalho é algo que precisa ser combatido, é algo interligado com o subdesenvolvimento da nação”, diz Alberto Balazeiro, do Tribunal Superior do Trabalho. “É preciso compreender que além do drama de uma família, que é irreparável, existe um drama geracional, social, de gravidade imensa”, completa.
Em relação às irregularidades encontradas em suas plantas em Vilhena e Porto Velho, a JBS disse que “o tema é anterior à publicação da NR dos Frigoríficos (NR36). Não há laudo que indique descumprimento das normas em vigência”. Já a Marfrig afirmou que “a maioria absoluta dos itens de segurança e de ergonomia foram considerados adequados pela fiscalização e que as melhorias sugeridas estão sendo colocadas em prática”. As respostas podem ser lidas na íntegra aqui.
*Nomes fictícios para preservar as identidades dos trabalhadores
Fonte: Repórter Brasil
Texto: Isabel Harari
Data original da publicação: 23/07/2024
Ao analisar o caso, 2ª turma do Tribunal destacou a transferência indevida de responsabilidades para funcionária.
Da Redação
2ª turma do TST manteve a decisão que condena a empresa varejista Lojas CEM, localizada em Várzea Paulista/SP, a pagar um adicional salarial de 5% a uma auxiliar de limpeza. A decisão se baseia no fato de a funcionária ser obrigada a chegar ao trabalho mais cedo do que o horário registrado em seu contrato para acompanhar a abertura da loja.
A auxiliar de limpeza, em sua reclamação trabalhista, alegou ser obrigada a iniciar suas atividades às 6h40 da manhã, embora só pudesse registrar sua entrada no sistema de ponto a partir das 7h. Segundo seu relato, a funcionária era instruída a se posicionar na esquina da loja antes da chegada do gerente, com o objetivo de observar o movimento e identificar qualquer atividade suspeita, além de acompanhar a entrada do gerente no estabelecimento.
Essa prática, de acordo com a reclamante, era justificada pelo empregador como uma medida de segurança para evitar possíveis sequestros ou assaltos. Diante disso, a trabalhadora pleiteou o pagamento de horas extras e um adicional salarial em virtude do acúmulo de funções.
A vara do Trabalho de Campo Limpo Paulista/SP, responsável por analisar o caso em primeira instância, deferiu o pedido de horas extras, determinando que a jornada de trabalho da funcionária se iniciava às 6h40. No entanto, a Vara do Trabalho não se manifestou sobre o pedido de adicional por acúmulo de funções. O caso foi então remetido ao TRT da 15ª região, que, em sua análise, considerou que a tarefa de garantir a segurança do gerente não era compatível com as atividades descritas no contrato de trabalho da auxiliar de limpeza.
Diante disso, o Tribunal condenou a empresa ao pagamento de um adicional de 5% sobre o salário base da trabalhadora, valor este que deveria incidir sobre outras verbas salariais.
A empresa Lojas CEM apresentou recurso ao TST contra a condenação imposta pelo TRT da 15ª região. A relatora do caso no TST, desembargadora convocada Margareth Rodrigues Costa, em seu voto, destacou que a responsabilidade pela abertura da loja era do gerente, mas que essa função foi indevidamente transferida para a auxiliar de limpeza.
Para a relatora, essa transferência de responsabilidade obrigou a funcionária a iniciar sua jornada de trabalho antes do horário previsto e a assumir riscos à sua segurança.