por NCSTPR | 10/06/25 | Ultimas Notícias
No cenário contemporâneo, é imprescindível que o Direito do Trabalho acompanhe as transformações atuais.
Desde o último 12 de abril, quando o ministro Gilmar Mendes determinou a suspensão das ações trabalhistas que versem sobre vínculo empregatício e contratação de trabalhador autônomo ou pessoa jurídica para a prestação de serviços, passaram a circular inúmeras notícias, opiniões e artigos sobre os debates jurídicos que envolvem o ARE 1.532.603 (Tema 1.389), do Supremo Tribunal Federal (STF).
Dentre as reflexões, ressurge uma argumentação há muito conhecida: a precarização das relações de trabalho e o aviltamento da força de trabalho.
Essa argumentação é protagonista nos julgamentos de âmbito trabalhista – basta analisar as opiniões publicadas à época dos julgamentos da ADPF 324 e do Tema 725 (licitude da terceirização de atividade-fim), do Tema 1.046 (prevalência do negociado sobre o legislado) e, agora, do Tema 1.389 (licitude da contratação de pessoa jurídica ou trabalhador autônomo), todos pelo STF.
Após o julgamento do Tema 725, houve uma proliferação de Reclamações Constitucionais dirigidas ao STF, questionando, à luz desses precedentes, decisões da Justiça do Trabalho que reconhecem (ou não) o vínculo empregatício entre empresas e trabalhadores autônomos ou pessoa jurídica, contratados para a prestação de serviços.
Naturalmente, a multiplicação dessas demandas culminou no reconhecimento da repercussão geral do ARE 1.532.603, no qual se julgará a “Competência e ônus da prova nos processos que discutem a existência de fraude no contrato civil/comercial de prestação de serviços; e a licitude da contratação de pessoa jurídica ou trabalhador autônomo para essa finalidade”.
Não se nega que a questão jurídica a ser dirimida pelo STF envolve os mais variados contornos fáticos. Nesse contexto, é oportuno debruçar-se sobre uma realidade, especialmente nas metrópoles brasileiras, ainda insuficientemente explorada: a pactuação de prestação de serviços por profissionais liberais para a execução de trabalho intelectual.
Antes de se adentrar no cerne da prestação de serviços de natureza intelectual, cabe tecer breves considerações sobre os conceitos de “terceirização” e “pejotização”, os quais, no contexto jurídico atual, têm sido frequentemente confundidos.
A terceirização consiste, em síntese, na contratação de pessoa jurídica para prestar serviços especializados à contratante (tomadora de serviços). Exemplo típico é o de uma empresa automobilística que contrata outra empresa para fabricar peças que, posteriormente, comporão o produto a ser ofertado ao mercado: o veículo automotor.
Essa modalidade de contratação não isenta a responsabilização das partes na esfera trabalhista, caso adotem práticas irregulares, cabendo às tomadoras de serviços fiscalizar e exigir da prestadora o cumprimento dos encargos trabalhistas e previdenciários relativos aos empregados colocados à disposição da contratante – sob pena, em regra, de serem subsidiariamente responsáveis pelo pagamento de eventuais verbas trabalhistas deferidas em juízo.
Já na pejotização, a Justiça do Trabalho a conceitua como a contratação de trabalhador por intermédio de pessoa jurídica, com o objetivo de mascarar a relação empregatícia e se esquivar do pagamento de encargos trabalhistas e previdenciários – originando o neologismo “pejotizar”, isto é, transformar um trabalhador, pessoa física, em pessoa jurídica.
Essa conceituação – que visa, precipuamente, sonegar direitos trabalhistas e previdenciários – conta com um elemento fulcral para sua configuração: a má-fé. Ou seja, o objetivo de fraudar direitos inerentes a uma relação empregatícia.
Ao processar e julgar demandas envolvendo pedidos de reconhecimento de vínculo empregatício, a Justiça do Trabalho tem reconhecido a existência de pejotização sempre que verificada a presença dos requisitos previstos nos artigos 2º e 3º da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT): pessoalidade, onerosidade, habitualidade e, especialmente, subordinação jurídica.
Em outras palavras, a demonstração da coexistência dos elementos caracterizadores da relação empregatícia é suficiente para que se reconheça a fraude na contratação, configurando a pejotização e, por consequência, o vínculo empregatício entre prestador e tomador de serviços.
Não se ignora a realidade de contratações como “PJ” de trabalhadores com baixo grau de instrução, à margem da tutela celetista, nem as situações em que há deliberada subordinação jurídica, nos termos da legislação. Porém, é necessário distinguir essas hipóteses da situação dos trabalhadores financeira e intelectualmente hipersuficientes, com elevado nível lógico e acadêmico, que atuam em plena Era Digital.
Daí ser tão relevante abordar o conceito aristotélico de equidade, que inspira o princípio constitucional da isonomia (artigo 5º, caput, da Constituição), consistente na máxima “tratar todos igualmente, na medida de suas desigualdades”.
Nesse contexto, o protecionismo do Poder Judiciário em ações trabalhistas ajuizadas por profissionais liberais, como advogados, arquitetos e médicos, não pode ser equiparado aos casos de reclamantes com reduzido grau de instrução, que executam tarefas essencialmente manuais, sem exigência de raciocínio lógico especializado ou análise estratégica.
Não se pode perder de vista que, em um mundo globalizado, é comum que as atribuições de profissionais liberais envolvam o atendimento a clientes, parceiros, prestadores e tomadores de serviços da contratante, não se restringindo ao atendimento de demandas internas da empresa contratante.
A evolução tecnológica e a modernização das estruturas empresariais, assim como a consolidação, em escala global, do modelo híbrido e remoto de trabalho (home office), demandam um novo olhar e a consequente adequação hermenêutica às relações profissionais.
No tocante à vivência corporativa, as reclamações ajuizadas por tais profissionais comumente sustentam, como indício de subordinação jurídica, a participação em processos seletivos, a revisão de trabalhos e a comunicação de atrasos e ausências. Essas alegações devem ser analisadas com parcimônia, inclusive para que não se infantilize reclamantes que, além de notoriamente qualificados, possuem alto grau de discernimento e ocupam posição social privilegiada – diferentemente de reclamantes em situação de hipossuficiência.
É crucial avaliar o conjunto fático-probatório de cada demanda e questionar se, de fato, houve processo seletivo com características típicas da relação de emprego (como a realização de exame médico admissional) ou mera análise de perfil e expertise; se a revisão de trabalhos decorre de subordinação hierárquica ou da adequação às expectativas do cliente; se há exigência de autorização para atrasos e ausências sem prejuízo da remuneração, ou basta comunicá-los para fins organizacionais.
Afinal, toda relação – comercial e empregatícia – pressupõe cooperação entre as partes, exigindo alinhamento de expectativas, objetivos, interesses, dinâmicas e formas de organização. A ausência desses elementos não apenas dificulta a manutenção do vínculo entre partes específicas, como compromete a continuidade da própria atividade empresarial, que, ao se engessar em metodologias ultrapassadas, acaba por repelir oportunidades de negócio aptas a viabilizar a obtenção de lucro e, por consequência, a geração de empregos, de renda e a circulação de capital.
No cenário contemporâneo, marcado pela inovação tecnológica e pela diversificação das formas de prestação de serviços, é imprescindível que o Direito do Trabalho acompanhe essas transformações, sem perder de vista sua função primordial de proteção, mas também sem desconsiderar as novas realidades sociais, econômicas e profissionais.
A análise das reclamações que envolvem profissionais liberais deve ser feita com apurada sensibilidade jurídica, a fim de distinguir fraudes de contratações legítimas, respeitando os princípios da boa-fé, da livre iniciativa e da autonomia da vontade. Ignorar tais nuances é comprometer a credibilidade do próprio sistema jurídico, além de gerar insegurança nas relações negociais lícitas, contribuindo para a retração de investimentos e a informalização de vínculos.
Aline Canonici é sócia da área trabalhista do Castro Barros Advogados, bacharel em Direito pela PUC-Campinas e pós-graduada em Direito do Trabalho pela FGV
Marcus Brumano é sócio e head da área trabalhista do Castro Barros Advogados, bacharel em Direito pela PUC-Rio e pós-graduado em Direito do Trabalho e Direito Processual do Trabalho pela Universidade Gama Filho
DM TEM DEBATE
https://www.dmtemdebate.com.br/pejotizacao-e-contratacao-de-profissionais-liberais/
por NCSTPR | 10/06/25 | Ultimas Notícias
Foi divulgada a primeira decisão do Supremo Tribunal de Justiça de Portugal sobre o trabalho para plataformas digitais. Na linha de seus congêneres da Espanha e da França, e muito ao contrário dos posicionamentos do Supremo Tribunal Federal (STF) na matéria, como veremos logo a seguir, o tribunal entendeu pela existência da relação de emprego entre entregador (estafeta, em Portugal) e a plataforma de entregas Glovo. Uma comparação com as decisões do STF sobre a matéria nos deixa incrédulos e envergonhados.
A ação foi ajuizada pelo Ministério Público, a partir de uma “ação especial de reconhecimento da existência de contrato de emprego” oriunda da atuação administrativa da Inspeção do Trabalho, lá chamada de Autoridade das Condições de Trabalho (ACT).
Após a constatação pela fiscalização da existência de simulação de contrato autônomo, o caso é encaminhado para o Ministério Público, que então ajuizou diversas ações para a tutela de direitos individuais dos trabalhadores. Uma dessas centenas de ações ajuizadas pelo parquet foi a que chegou agora ao Supremo Tribunal. Essa ação, especificamente, tinha tido os pedidos julgados improcedentes na primeira instância e no grau de apelação.
A partir da análise do acórdão do Supremo português, o que imediatamente salta aos olhos é o diálogo da corte com o Direito do Trabalho, baseado na lei e na doutrina trabalhista do país e europeia. Foram citados na decisão sete renomados autores portugueses e um francês.
Talvez em razão de estarmos muito mal acostumados, e com certeza devido a esse diálogo com a doutrina citado acima, chega a impressionar a profundidade e a consistência jurídica da análise do caso pela corte europeia.
O Supremo português inicia com abordagem dos elementos da presunção de laboralidade, destacando os indícios de subordinação, entre eles a direção, supervisão e controle, “essenciais da relação laboral”. Apresenta, logo após, que há de ser considerada a “forte inserção do estafeta na organização algorítmica” da empresa.
Também entendeu de especial relevo que a plataforma digital e o aplicativo, este último como instrumento de trabalho do entregador, são geridas e exploradas pela empresa e que toda a atividade laboral está condicionada pela efetiva ligação e conexão a essas ferramentas digitais de propriedade e controle da empresa. Afirmaram os julgadores que “há também a considerar o facto de o estafeta não ter qualquer obrigação de resultado para com a contraparte, bem como a circunstância de ele não assumir algum risco financeiro ou económico”.
Aponta, de forma correta com a doutrina trabalhista mundial, que o fato do trabalhador escolher a área em que trabalha, poder recusar serviços e conectar-se ou desconectar-se sempre que entenda, sem cumprir horário predefinido e sem limite de tempo mínimo de disponibilidade não assume relevo decisivo pois, “independentemente da margem de liberdade reconhecida ao estafeta no exercício da sua atividade, é indiscutível que esta é desenvolvida num quadro de regras específicas definidas pela empresa, a qual – nos termos que tem por adequados e consentâneos com a prossecução do seu modelo de negócio – também controla e supervisiona a atuação da contraparte, tal como tem a possibilidade de exercer o poder disciplinar, mediante a suspensão ou desativação da respetiva conta”.
Corretamente indicou que a não fixação de horário de trabalho não é elemento essencial da relação de emprego, indicando a existência da dependência econômica e do trabalho regular, apontando que a remuneração por peça é uma forma de cálculo modificada do salário por tempo, como há décadas a doutrina afirma e há mais de 150 anos demonstrou Karl Marx.
Os magistrados supremos portugueses disseram ainda que as plataformas digitais controlam e supervisionam o trabalho, e ainda detêm poder punitivo aos trabalhadores, o que denota a completa inserção do trabalhador na organização algorítmica da empresa.
O Supremo luso entendeu que, apesar de o pagamento de taxas pelo trabalhador pela utilização da plataforma poderia indicar a existência de um contrato autônomo, “o recurso a cláusulas contratuais com características de autonomia se encontra com frequência associado ao abuso do estatuto de trabalhador independente e às relações de trabalho encobertas, o que chamou expressamente, um flagelo que as legislações europeias estão tentando combater, reconhecendo o vínculo empregatício, por não ter a empresa ilidido a presunção de laboralidade.
A nossa perplexidade pela qualidade da decisão nos leva a fazermos uma comparação com o tribunal homônimo brasileiro. Tomemos, para isso, um acórdão da 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal como exemplo, em julgamento de Agravo Regimental aviado pela Procuradoria Geral da República (PGR) em reclamação que cassou decisão da Justiça do Trabalho que reconhecia o vínculo empregatício de entregador com a empresa Rappi.
Bem ao contrário da decisão portuguesa, não há no acórdão brasileiro a citação de nenhum doutrinador, de qualquer área do Direito que seja, muito menos do Direito do Trabalho. Só há citações de julgados anteriores da própria corte. Ou seja, é uma decisão puramente autorreferenciada.
Já a decisão do Tribunal Superior do Trabalho (TST) que derrubou não só analisou detidamente os requisitos da relação de emprego, e apontou os dispositivos legais, inclusive que expressamente falam da subordinação algorítmica (artigo 6º, parágrafo único, CLT), como apontava elementos da OIT e da ONU, além do diálogo com a doutrina trabalhista brasileira.
A decisão do Supremo Tribunal Federal, por sua vez, baseou-se puramente no Tema 725, pelo qual foi afirmada a constitucionalidade da terceirização de atividade fim e “de qualquer outra forma de divisão do trabalho entre pessoas jurídicas distintas”.
Afirmou que “no caso em análise, ao reconhecer o vínculo de emprego, a Justiça do Trabalho desconsiderou os aspectos jurídicos relacionados à questão, em especial os precedentes do Supremo Tribunal Federal que consagram a liberdade econômica, de organização das atividades produtivas e admitem outras formas de contratação de prestação de serviços”.
Pasme-se: essa é toda a fundamentação existente no acórdão. São dois parágrafos curtos, que derrubaram uma decisão da Justiça do Trabalho que só a ementa tinha nove páginas.
Assim, enquanto a decisão europeia analisa toda a complexidade da situação, com decisão robusta e resguardada por fontes doutrinárias e legais de peso, a brasileira trata o caso com a profundidade de um pires, uma ausência completa de diálogo com o mundo exterior, jurídico ou não, além de demonstrar uma falta de compreensão impressionante das consequências de sua decisão.
A decisão portuguesa está de acordo com a lei e a doutrina trabalhista de Portugal e do mundo, além de estar antenada com as transformações do trabalho no século 21 e a proteção de direitos humanos e fundamentais dos trabalhadores. O Supremo dos trópicos, por sua vez, demonstra estar na vanguarda do atraso.
A Suprema Corte brasileira parece sonhar com um retorno ao século 19, com relações de trabalho reguladas pelo Código Comercial, como muitas vezes os julgadores chegam a expressar. Até quando teremos uma Suprema Corte que não consegue perceber que já não somos colônia e que temos uma Constituição cujo projeto é justamente que deixemos nossa condição periférica? Será que um dia não teremos mais que invejar e admirar decisões europeias e nos envergonhar das decisões da nossa corte suprema?
Rodrigo de Lacerda Carelli é procurador do Trabalho no Rio de Janeiro, professor de Direito do Trabalho e Processo do Trabalho na UFRJ e integrante do Coletivo Transforma MP
DM TEM DEBATE
https://www.dmtemdebate.com.br/stf-vs-supremo-de-portugal-comparando-decisoes-sobre-entregadores-de-plataformas/
por NCSTPR | 10/06/25 | Ultimas Notícias
Neuriberg Dias*
Enquanto parte do Congresso Nacional — especialmente parlamentares de oposição ao governo Lula e à organização dos trabalhadores — atua para interditar o debate sobre a modernização do sistema sindical brasileiro, ganha destaque a atuação propositiva do deputado Luiz Gastão (PSD-CE). Em diálogo permanente com entidades laborais e patronais, o parlamentar busca construir uma proposta pactuada na forma de projeto de lei capaz de inaugurar um novo capítulo na história das relações coletivas de trabalho no país.
Em linhas gerais, a proposta em construção prevê a criação do Conselho Superior de Promoção da Negociação Coletiva (CSPNC), das Câmaras de Autorregulação Sindical (CAS) e promove alterações legislativas voltadas à democratização, transparência e fortalecimento institucional do sistema sindical. O CSPNC será um órgão bipartite e paritário, com representantes de trabalhadores e empregadores, e terá como missão principal fomentar o diálogo social, ampliar a negociação coletiva e propor medidas de aprimoramento ao Poder Executivo e ao Congresso Nacional. Entre suas competências estarão a mediação de conflitos coletivos, o estímulo à autocomposição, a organização de um sistema unificado de registro de instrumentos coletivos e a proposição de políticas públicas voltadas ao fortalecimento das relações coletivas.
As Câmaras de Autorregulação Sindical — uma de trabalhadores e outra de empregadores — serão compostas, respectivamente, por centrais sindicais e confederações patronais. Terão atribuições voltadas à promoção da autorregulação, à defesa da liberdade e da unicidade sindical, à resolução de conflitos de representação, à definição de critérios para a contribuição assistencial e à articulação de políticas de transparência. Também poderão propor atualizações no Quadro de Atividades e Categorias da CLT, adequando-o à realidade contemporânea do mundo do trabalho e aos desafios de um sindicalismo mais eficaz e representativo.
A regulamentação da contribuição assistencial é tratada com atenção especial. A proposta determina que qualquer cobrança será válida apenas mediante aprovação expressa em assembleia geral da categoria, com ampla divulgação e participação, inclusive de trabalhadores não sindicalizados. Estabelece regras claras para o exercício do direito de oposição, critérios de rateio entre entidades (sindicatos, federações, confederações e centrais), além da obrigatoriedade de manutenção de portais de transparência com informações detalhadas sobre a destinação dos recursos — elementos que contribuem para consolidar uma nova cultura de legitimidade, responsabilidade e prestação de contas no financiamento sindical.
O texto também propõe que as centrais sindicais e confederações patronais assumam papel estratégico, ao indicarem os representantes que comporão o CSPNC, coordenarem os critérios de representatividade e formularem as regras de autorregulação. Uma mudança importante é a elevação do índice mínimo de representatividade das centrais sindicais para 7% de trabalhadores sindicalizados no plano nacional, conforme critérios definidos pelas próprias entidades em instância técnica — promovendo, assim, coerência com a realidade do sindicalismo brasileiro.
Além disso, a proposta permite a constituição de consórcios entre entidades sindicais para execução de atividades conjuntas — excluindo, porém, a representação e a negociação coletiva —, e introduz dispositivos que reforçam a segurança jurídica da atuação sindical, combatem práticas antissindicais e criam mecanismos institucionais para a resolução de disputas. Tais medidas fortalecem a capacidade das entidades sindicais atuarem de forma coordenada, eficiente e com maior legitimidade institucional.
O projeto encabeçado pelo deputado Luiz Gastão poderá representar um contraponto claro e realista às propostas que atualmente tramitam no Parlamento e que visam restringir o papel das entidades representativas dos trabalhadores — como os PLs 1663/2023, 2099/2023 e 2830/2019 —, retomando uma agenda de desmonte semelhante à promovida pela reforma trabalhista de 2017. Em contraste, essa nova proposta valoriza o fortalecimento da negociação coletiva e da mediação institucional como pilares de um modelo sindical funcional e constitucionalmente adequado.
Nesse processo, merece igualmente destaque a atuação do deputado Luiz Carlos Motta (PL-SP), relator dos Projetos de Lei 5795/2016 e 5552/2019. Algumas dessas proposições convergem com pontos centrais da iniciativa do deputado Gastão, como a criação de conselhos nacionais e de mecanismos de custeio sindical. Sua experiência como sindicalista e seu trabalho como membro da Comissão de Trabalho da Câmara dos Deputados — onde tramitam mais de 37 proposições correlatas também sob seu exame — têm sido fundamentais para mediar a construção de uma nova base legislativa para o sindicalismo, em meio a uma correlação de forças desfavorável à modificação de aspectos estruturais da Lei 13.467/2017¹, conhecida como reforma trabalhista.
Trata-se, portanto, de iniciativas como a deputado Gastão e as relatadas pelo deputado Motta, em construção com responsabilidade, maturidade e compromisso, que devem ser avaliadas pelo movimento sindical. Diante da iminência de votações de projetos regressivos no Congresso Nacional, é essencial que o campo sindical se apresente com uma proposta unificada, robusta e legitimada, capaz de disputar rumos e consolidar a negociação coletiva como instrumento legítimo, moderno e eficaz de regulação das relações de trabalho. É essa construção que poderá impedir a retomada de projetos de desestruturação do sistema sindical brasileiro e garantir sua adaptação ao mundo do trabalho contemporâneo, assegurando direitos e promovendo desenvolvimento social e econômico.
*Jornalista, Analista Político e Diretor de Documentação do DIAP.
¹ Pontos críticos da reforma trabalhista, destacam-se: 1) a flexibilização de direitos trabalhistas previstos em lei, preservando-se apenas aqueles expressamente assegurados pela Constituição Federal; 2) a ampliação das possibilidades de terceirização e de pejotização, com a contratação de trabalhadores como pessoas jurídicas, sem vínculo empregatício; 3) a criação de novas formas de contratação, especialmente a do trabalhador autônomo exclusivo e a do contrato intermitente; 4) as restrições de acesso à Justiça do Trabalho, que comprometeram a proteção judicial dos direitos trabalhistas; 5) a retirada de poderes, atribuições e prerrogativas das entidades sindicais como o fim da homologação das rescisões de contrato de trabalho, fim da ultratividade de acordos coletivos e ampliação de acordos individuais; 6) a universalização da negociação coletiva sem os limites ou proteções da legislação, o que fragiliza direitos historicamente conquistados; e 7) a autorização de negociação direta entre empregadores e empregados para redução ou supressão de direitos, à margem da atuação sindical.
Fonte: https://www.diap.org.br/index.php/noticias/artigos/92265-um-novo-capitulo-para-o-sindicalismo
por NCSTPR | 10/06/25 | Ultimas Notícias
As mulheres que assumem sozinhas a responsabilidade de criar seus filhos acabam muitas vezes tendo de enfrentar situações humilhantes em seus empregos para poder manter sua fonte de renda. Nesse universo de brasileiras, 43% dizem já ter passado por alguma situação de abuso ou desrespeito no trabalho, frente a 37% que vivem outro contexto materno.
Além disso, 52% admitem aceitar mais situações desse tipo do que gostariam no ambiente profissional. Os dados fazem parte de pesquisa recém-divulgada, feita pela MindMiners para o Universa Talks, do portal UOL.
“A urgência de pagar o aluguel, a creche, a comida, o remédio, faz com que muitas mães solo engulam sapos todos os dias. Desde o olhar torto quando precisam sair mais cedo até a piadinha misógina disfarçada de descontração. Aceitam o desconforto porque o medo de perder a renda é maior que o incômodo. E isso não é escolha, é sobrevivência”, disse Cris Guterres, colunista do Universa, ao avaliar a pesquisa.
De acordo com o Censo 2022 do IBGE, mais de 10,3 milhões de casas são chefiadas por mulheres que moram apenas com os filhos — a grande maioria (78%), segundo a Fundação Getúlio Vargas, é de negras.
Ou seja, pegando o segmento geral das mulheres, é possível dizer que três em cada dez brasileiras que chefiam seu lar são, também, mães solo. Já no caso dos homens, o número é cerca de seis vezes menor: 1,6 milhão é de pais sozinhos.
Ainda de acordo com o IBGE, o percentual de mulheres responsáveis por unidades domiciliares, tendo ou não filho, teve aumento expressivo entre 2010 e 2022, subindo de 38,7% para 49,1%.
O IBGE também aponta que em 2022, o percentual das pessoas abaixo da linha da pobreza (renda diária per capita de até R$ 33,8) que viviam um arranjo familiar formado por mulher preta ou parda, sem cônjuge e com filho(s) de até 14 anos, é de 72%, percentual que cai para 52% no caso em que a mulher é branca.
VERMELHO
https://vermelho.org.br/2025/06/09/mais-de-40-das-maes-solo-ja-enfrentaram-abusos-ou-desrespeito-no-trabalho/
por NCSTPR | 10/06/25 | Ultimas Notícias
A nova edição da pesquisa Panorama Mulheres 2025, realizada pelo Instituto Talenses Group e pelo Núcleo de Estudos de Gênero do Insper, revela que a igualdade de gênero segue distante do topo das organizações brasileiras. Das 310 empresas analisadas, apenas 17,4% têm mulheres na presidência — número que permanece inalterado há anos. Nos conselhos administrativos, o índice é semelhante: 17,1%.
Apesar de representarem a maioria entre os servidores públicos e de apresentarem desempenho profissional consolidado, as mulheres ocupam apenas 28% das secretarias estaduais e municipais, e sua presença no governo federal vai de 45,2% entre servidores a apenas 23% entre ministros. A sub-representação se agrava com recortes de raça e deficiência: mulheres negras e indígenas continuam invisíveis na alta gestão, e somente 8 empresas informaram ter mulheres com deficiência em cargos de liderança.
“Embora se trate a agenda de gênero como superada, os dados mostram o contrário. A sub-representação feminina, especialmente de mulheres negras, indígenas e com deficiência, persiste ao longo do tempo. Isso evidencia um problema ainda não resolvido”, afirma Ana Diniz, coordenadora do Núcleo de Estudos de Gênero do Insper.
O funil da liderança: quanto mais alto, menos mulheres
O estudo, divulgado nesta segunda-feira (9), revela que a desigualdade aumenta à medida que se sobe na hierarquia. Em 2024, apenas 20% das vice-presidências foram ocupadas por mulheres — uma queda expressiva frente aos 34% em 2022. Já nas diretorias, houve avanço de 26% para 30%. Ainda assim, 58,9% das empresas não possuem nenhuma mulher na vice-presidência, e 32,5% não têm diretoras.
Além disso, dos cargos de alta gestão ocupados por mulheres, cerca de 89% são preenchidos por brancas. Apenas 37,8% das secretárias estaduais ou municipais se declaram negras, e menos de 2% são mulheres com deficiência. Entre as 310 empresas ouvidas, só 8 indicaram ter ao menos uma mulher com deficiência em posição de liderança.
As barreiras se acumulam. Mães relatam dificuldades em conciliar a maternidade com a progressão de carreira e enfrentam julgamentos sobre produtividade. Mulheres com deficiência, por sua vez, sofrem com estigmas, exclusão sutil e ausência de acessibilidade atitudinal e estrutural nas empresas. “Não queremos ser vistas como exceções ou inspirações forçadas. Queremos ser reconhecidas como profissionais completas, com potencial de liderança”, afirma Julia Piccolomini, analista de ESG e presidente da Parada do Orgulho da Pessoa com Deficiência.
A pesquisa também destaca a segregação funcional: mulheres estão concentradas em áreas como Recursos Humanos e Comunicação, enquanto Finanças e Operações — rotas preferenciais para a presidência — seguem dominadas por homens. “Áreas como Finanças e Operações são vistas como mais duras, mais pragmáticas e, por isso, associadas a um perfil mais masculino. Isso dificulta o acesso das mulheres a essas funções”, analisa Carla Fava.
Equidade exige estrutura, interseccionalidade e vontade política
A presença feminina, por si só, não garante mudanças. Apenas 24,5% das empresas combinam práticas ESG, compromissos públicos e planos de ação estruturados. A maioria das ações ainda se limita a canais de denúncia, políticas de recrutamento e licenças estendidas. Apenas 29,2% mencionam políticas voltadas à promoção de mulheres a cargos estratégicos, e menos de um quarto têm ações específicas para formação de mulheres em áreas tradicionalmente masculinas.
Ana Diniz, coordenadora do Núcleo de Estudos de Gênero do Insper, destaca: “Embora se trate a agenda de gênero como superada, os dados mostram o contrário. Observamos uma estagnação preocupante. A combinação entre discurso, estrutura e ação é o único caminho para transformar essa realidade”
Com a exigência regulatória da B3, que obrigará empresas listadas na bolsa a terem pelo menos uma mulher e um membro de comunidades sub-representadas em seus conselhos ou diretorias até 2026, o desafio agora é transformar cumprimento formal em mudança estrutural.
“A diversidade que importa não é apenas quantitativa, mas qualitativa”, reforça Jandaraci Araújo, do Instituto Conselheira 101. “Quando uma mulher chega ao poder, ela não chega sozinha. Mas para mudar o topo, precisamos de coragem política e compromisso institucional”.
Para ver a íntegra do estudo, clique aqui.
VERMELHO
https://vermelho.org.br/2025/06/09/panorama-2025-escancara-exclusao-de-mulheres-no-topo-das-empresas/
por NCSTPR | 10/06/25 | Ultimas Notícias
Para 3ª Turma, doença gera estigma e gera presunção de que dispensa foi discriminatória
Resumo:
- Uma vendedora da Seara Alimentos foi dispensada dois meses após retornar de licença para tratar depressão.
- O pedido de indenização havia sido rejeitado no TRT-15, mas a condenação foi restabelecida pela 3ª Turma do TST.
- O colegiado aplicou a jurisprudência do TST que presume que a dispensa, nesses casos, é discriminatória.
Uma vendedora da Seara Alimentos Ltda. deverá receber R$ 20 mil de indenização por ter sido dispensada dois meses após retornar de licença médica para tratar depressão. A Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho levou em conta a frequente associação de estigma social aos transtornos mentais, inclusive o depressivo, o que leva o caso a se enquadrar no entendimento do Tribunal a respeito da dispensa discriminatória.
Quadro depressivo levou a afastamento
A vendedora foi contratada em abril de 2018 e dispensada um ano depois. Na reclamação trabalhista, ela disse que já sofria de depressão antes da admissão e que, em setembro de 2018, teve de retomar seu tratamento de forma mais intensa, levando-a a se afastar pelo INSS. Ao retornar, a empresa a colocou apenas para acompanhar outro vendedor até a dispensa. Segundo ela, a medida teve motivação discriminatória em razão de seu histórico de transtorno depressivo.
O juízo de primeiro grau entendeu que a doença, por seu caráter estigmatizante, se enquadrava na Súmula 443 do TST, e concedeu indenização por danos morais.. De acordo com o verbete, a dispensa de alguém com doença grave que suscite estigma ou preconceito leva à presunção de discriminação e, por conseguinte, dá direito à reintegração no emprego.
O Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (Campinas/SP), porém, reformou a decisão, levando em conta que a trabalhadora havia sido considerada apta para retornar ao trabalho e que a depressão não estava relacionada ao ambiente laboral.
Empresa não comprovou outro motivo para demissão
O relator do recurso da trabalhadora, ministro Lelio Bentes Corrêa, com base no conjunto de provas, assinalou que foram comprovadas a gravidade do transtorno depressivo e sua natureza estigmatizante, bem como a ciência pela empresa do estado de saúde da trabalhadora. Nessas circunstâncias, presume-se discriminatória a dispensa, mormente sobretudo por ter ocorrido menos de dois meses após o retorno da licença de três meses para tratamento da doença. Segundo ele, caberia à empresa comprovar que desconhecia a doença com a qual a empregada convivia por mais de 20 anos ou apontar um motivo lícito para a dispensa — o que não ocorreu.
Transtornos mentais geram estigma social
Com base na literatura médico-científica e em estudos no campo das ciências sociais, o ministro destacou que é frequente associação de estigma social aos transtornos mentais, e que isso é reconhecido pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e pela Organização Pan-Americana de Saúde (Opas). O relator também ressaltou que o direito à não discriminação tem fundamento constitucional e está protegido por tratados internacionais de direitos humanos ratificados pelo Brasil, como a Convenção 111 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).
Por unanimidade, a Turma restabeleceu a sentença.
(Bruno Vilar/CF)
Processo: RRAg-11714-45.2019.5.15.0099
TST JUS
https://www.tst.jus.br/en/-/frigor%C3%ADfico-vai-indenizar-vendedora-dispensada-ao-voltar-de-licen%C3%A7a-por-depress%C3%A3o%C2%A0