por NCSTPR | 08/08/25 | Ultimas Notícias
Recentemente, veio à tona mais um escândalo envolvendo o INSS: a identificação de descontos ilegais nos proventos de aproximadamente 4 milhões de aposentados e pensionistas [1]. As deduções fraudulentas foram lançadas sob a rubrica de supostas contribuições assistenciais, revelando um esquema criminoso que gerou prejuízo estimado em mais de R$ 6 bilhões [2] aos beneficiários e ao erário público.
O acontecimento surpreende pela abrangência, todavia, a vinculação do principal órgão de previdência e assistência social no Brasil em práticas fraudulentas é recorrente e amplamente divulgada pela mídia, desde episódios envolvendo a venda ilegal de dados dos segurados até irregularidades na concessão de benefícios [3].
Além de demonstrar a crise de confiança nas instituições, esse episódio expõe uma dimensão frequentemente negligenciada — e por vezes considerada superada: a da marginalização digital. Com o avanço das tecnologias na denominada Sociedade 5.0, a problemática é comum e erroneamente encarada por juristas e legisladores sob uma perspectiva dualista, ou seja, a do acesso versus o não acesso [4].
Acesso facilitado via digital. Mas nem tanto
Ao elencar o acesso remoto, via aplicativo ou site, como canal prioritário de intermediação entre o segurado e a agência [5], presume-se que as barreiras de acesso já estariam plenamente superadas, já que 89% da população brasileira tem acesso à internet [6]. Apesar disso, estudos mais recentes demonstram que a questão do acesso é apenas uma das abordagens da divisão digital. O uso pleno da internet e das novas tecnologias é um fenômeno complexo, multidisciplinar e que perpassa por pelo menos três desafios: o acesso, a qualidade da conexão e o proveito obtido através da navegação [7].
Por óbvio, a popularização da internet e dos aparelhos celulares ocasionou um aumento do acesso a serviços de comunicação. Ao mesmo tempo, também tornou mais complexo o uso, já que grande parte das atividades da vida civil passaram a depender das plataformas digitais.
É justamente no contexto da transformação digital no acesso a direitos previdenciários e assistenciais que reside um dos grandes paradoxos da proteção social: são as pessoas com menos habilidades as que mais dependem desses serviços [8] e que, hoje, possuem o acesso condicionado às plataformas digitais.
À luz disso, o relatório da Corregedoria Geral da União (CGU) que apurou as fraudes nos benefícios previdenciários demonstrou que os descontos indevidos apenas poderiam ser identificados a partir do extrato do benefício, cuja via impressa era anteriormente fornecida aos beneficiários nas agências da previdência social. Contudo, com a transformação digital do INSS, esse serviço passou a ser oferecido exclusivamente em formato digital, o que dificultou o acesso dos segurados às informações e, por consequência, à detecção das irregularidades aqui mencionadas.
Ademais, a auditoria realizada pela CGU, ao detectar o aumento repentino de contribuições assistenciais nos benefícios, realizou entrevistas aos beneficiários do INSS, as quais concluíram que 42,4% não conheciam o aplicativo “Meu INSS”; 25,1% afirmaram ter conhecimento sobre ele, mas nunca o utilizaram; enquanto 32,4% relataram já tê-lo utilizado [9].
Transformação digital facilitou ilegalidades
No que se refere à vulnerabilidade dos beneficiários do INSS expostos à situação de fraude, a Corregedoria reconheceu que a transformação digital da previdência social, somada à ausência de controle interno, facilitou a realização dos descontos associativos ilegais. Além disso, os beneficiários sequer conseguiram identificar a ocorrência de fraude, tendo em vista a ausência de habilidades digitais necessárias para tanto. Sobre o aspecto, o relatório conclui que:
[…] a própria fragilidade inerente ao perfil dos beneficiários, na sua grande maioria formada por idosos, com maior dificuldade de acesso a canais digitais, associada à deficiência dos instrumentos de controle do INSS, tornam esses beneficiários suscetíveis à atuação de terceiros agindo com o objetivo de obter, sem o devido esclarecimento aos beneficiários, a documentação relativa à filiação e à autorização para o desconto associativo [10].
Esse episódio ilustra como o nível de apropriação das novas tecnologias influencia diretamente no exercício da cidadania. Além disso, ainda joga luz aos conflitos relacionados à autoridade, conhecimento e poder nos dias atuais. O perigo da falta de conhecimento sobre o uso dos próprios dados coloca em xeque a autonomia humana, uma vez que “a concentração de conhecimento sem precedentes produz uma concentração de poder sem precedentes” [11].
As pessoas idosas são a maior parcela beneficiária da previdência social no Brasil. Além disso, o benefício mais concedido atualmente pelo INSS é a aposentadoria por idade [12]. Esses dados revelam que, além do critério etário, também há um parâmetro de classe social que muito diz sobre a maioria dos beneficiários de políticas públicas previdenciárias no Brasil. Infere-se, portanto, que há um grau de homogeneidade entre os denominados marginalizados digitais e os titulares de direitos previdenciários e assistenciais.
Os cidadãos considerados marginalizados digitais não enfrentam somente o desafio do acesso. Como dito, os potenciais benefícios pelo uso da rede são mínimos quando comparados aos obtidos pelos denominados nativos digitais. As limitadas capacidades digitais também refletem em menores condições de se protegerem de ataques cibernéticos e crimes praticados no entorno digital.
Falhas negligenciadas pelo poder público
As recentes denúncias envolvendo fraudes no INSS revelam, obviamente, falhas operacionais, mas também evidenciam o quanto o aspecto humano na adoção de tecnologias tem sido negligenciado pelo poder público. Ao condicionar o acesso a direitos sociais às plataformas digitais, sem qualquer garantia de domínio técnico dos usuários, o INSS inverte a lógica do princípio constitucional da universalidade da proteção social. Nesse processo, os grupos mais vulneráveis — em especial os idosos e a população de baixa renda — permanecem à margem da transformação digital, ainda que formalmente incluídos.
Tal constatação está no cerne das ADPFs 1.234 e 1.236, propostas pelo presidente da República ao Supremo Tribunal Federal, com os objetivos respectivos de restituir integralmente os valores descontados indevidamente aos beneficiários e de questionar a omissão estatal na garantia de acessibilidade digital aos serviços previdenciários.
A arguição da ADPF 1.236 sustenta que o modelo atual de gestão digital do INSS viola direitos fundamentais, como a dignidade da pessoa humana, o acesso à informação e à previdência social. Além disso, pelo perfil dos cidadãos lesados, há um maior risco de sucumbir à advocacia predatória, tendo em vista a existência de milhões de segurados potencialmente afetados pelas ditas fraudes.
Agravamento da situação
Por fim, prevê-se um agravamento da situação, que ainda é objeto da investigação policial, no que se refere às frequentes tentativas de estelionato via WhatsApp, em que golpistas contatam beneficiários — a partir do vazamento de informações na rede — e se passam por órgãos oficiais, prometendo indenizações superfaturadas em troca de transferências bancárias. Em razão disso, o beneficiário já vítima dos descontos indevidos em sua aposentadoria ou pensão pode vir, futuramente, a ser alvo de falsas promessas de restituições nas plataformas digitais.
Uma tentativa de coibir tais práticas ilegais, inclusive, já foi empreendida pelo senador Paulo Paim (PT-RS) no projeto de Lei 74/2023. A proposta prevê o condicionamento de validade a contratos de empréstimo a idosos com 80 anos à assinatura manuscrita, garantindo, assim, o consentimento ativo do aderente e autodeterminação informativa previstos na LGPD.
Este lamentável incidente nos coloca diante da urgente necessidade de voltar a atenção à proteção dos direitos fundamentais no entorno digital. Portugal, por exemplo, aprovou a Carta Portuguesa de Direitos Humanos na Era Digital, que assegura, além da proteção dos direitos fundamentais preexistentes no ambiente digital, a proteção de novas manifestações de direitos, considerando as transformações provocadas pela Era Digital.
Marcos regulatórios de ambientes digitais
Enquanto isso, o Brasil carece de marcos regulatórios, tanto em relação ao exercício de direitos no ambiente digital e seu acesso, quanto sobre o uso ético da inteligência artificial [13]. A lógica que orienta tais transformações não pode seguir pautada exclusivamente pela modernização tecnológica dissociada da realidade social. Conforme o próprio preâmbulo da Constituição, o papel do Estado democrático é justamente a garantia dos direitos fundamentais, dos quais a proteção social é parte indissociável.
Além disso, as tecnologias — apresentadas como soluções — estão se tornando, isso sim, um obstáculo ao exercício da cidadania. Por fim, cabe parafrasear uma brilhante passagem do sociólogo holandês Jan van Dijk, que indica que “dar um celular e conexão de internet a alguém não resolve os problemas da sociedade moderna, seria mais correto dizer que é aí que eles começam” [14].
Referências Bibliográficas
MENDES, Beatriz Lourenço. Marginalização digital e governo eletrônico: como garantir direitos previdenciários e assistenciais na cibersociedade?. Granada: Universidad de Granada, 2024. Disponível aqui.
RAGNEDDA, Massimo; GLADKOVA, Anna (Ed.). Digital inequalities in the Global South. London, United Kingdom: Palgrave Macmillan, 2020.
VAN DEURSEN, Alexander M; VAN DIJK, Jan AGM. Digital skills: Unlocking the information society. Springer, 2014.
ZUBOFF, Shoshana. A era do capitalismo de vigilância. Intrínseca, 2018, p. 225
[1] “INSS estima 4,1 milhões de possíveis vítimas de descontos irregulares; plano de ressarcimento começa a ser discutido”. Disponível aqui.
[2] “Operação combate descontos não autorizados de aposentados e pensionistas; valor pode chegar a R$6,3 bi”. Disponível aqui.
[3] INSS atende OAB e retira bloqueio em caso de negativa de pedido por robô”, publicado terça-feira, 1 de novembro de 2022 às 18h25. OAB. Disponível aqui. Vide também: “Robôs do INSS e o indeferimento automático de benefícios”, em Migalhas. Disponível aqui..
[4]RAGNEDDA, Massimo; GLADKOVA, Anna (Ed.). Digital inequalities in the Global South. London, United Kingdom: Palgrave Macmillan, 2020.
[5] Art. 14. A prestação digital dos serviços públicos deverá ocorrer por meio de tecnologias de amplo acesso pela população, inclusive pela de baixa renda ou residente em áreas rurais e isoladas, sem prejuízo do direito do cidadão a atendimento presencial. Parágrafo único. O acesso à prestação digital dos serviços públicos será realizado, preferencialmente, por meio do autosserviço. (Lei nº 14.129, de 29 de março de 2021).
[6] TIC Domicílios 2024 – Indivíduos. Aqui
[7] VAN DEURSEN, Alexander M; VAN DIJK, Jan AGM. Digital skills: Unlocking the information society. Springer, 2014.
[8] Conforme defendi na minha tese doutoral “Marginalização Digital e governo eletrônico: como garantir direitos previdenciários e assistenciais na cibersociedade?”, a previdência e a assistência social não são apenas “serviços” prestados pelo Estado, mas, antes, direitos fundamentais sociais subjetivos. Sendo assim, o condicionamento do acesso a tais direitos sociais viola os princípios constitucionais da igualdade e da universalidade da cobertura e do atendimento.
[9] Relatório de Avaliação. Instituto Nacional do Seguro Social. Exercícios de 2023 e 2024. Controladoria-Geral da União, 2024.
[10] Relatório de Avaliação. Instituto Nacional do Seguro Social. 2024. Controladoria-Geral da União, p. 23.
[11] ZUBOFF, Shoshana. A era do capitalismo de vigilância. Intrínseca, 2018, p. 225.
[12] Anuário da Previdência Social 2023. Disponível aqui.
[13] Quanto ao processo de regulação da inteligência artificial no Brasil, cita-se o PL 2338/2023, que se encontra em tramitação.
[14] VAN DEURSEN, Alexander M; VAN DIJK, Jan AGM. Digital skills: Unlocking the information society. Springer, 2014.
por NCSTPR | 07/08/25 | Ultimas Notícias
Thais Folgosi Françoso e Richard Abecassis
Alterações na NR-1 exigem que empresas gerenciem riscos psicossociais, promovendo saúde mental no trabalho e alinhando-se a normas de ESG e bem-estar.
Semanas atrás, publicamos o artigo “Um breve paralelo entre a “tributação do pecado” e o ambiente de trabalho”, em que abordamos a abrangência do conceito “saúde” nos ambientes de trabalho, seus reflexos na saúde pública e previdência social, fazendo uma analogia do tema com o Imposto Seletivo (ou “Imposto do Pecado”), recém implementado com a reforma tributária.
Nessa linha de proteção à saúde, visando a preservação da saúde do trabalhador e o combate a práticas abusivas no ambiente do trabalho, recentemente, entraram em vigor alterações da NR-1, do MTE – Ministério do Trabalho e Emprego, que dispõe sobre os conceitos e gerenciamento de riscos ocupacionais, incluindo, nesta última atualização, os fatores de risco psicossociais relacionados ao trabalho.
Em consonância com a evolução legislativa na área trabalhista e com a realidade atual do mercado de trabalho, em que os afastamentos de empregados por questões psicossociais têm crescido exponencialmente, a NR-1 passou a exigir que as empresas adotem medidas de avaliação e gerenciamento de riscos ocupacionais com inclusão dos fatores de risco psicossociais.
Mas quais são os fatores de risco psicossociais, para o efetivo cumprimento da norma?
A resposta não é objetiva e tampouco está expressa na NR-1, que traça, apenas, algumas diretrizes quanto às obrigações das empresas, especialmente sobre a constituição de Programa de Gerenciamento de Riscos, condições de trabalho e o processo de identificação de perigos e avaliação de riscos ocupacionais, que devem incluir os elementos de riscos psicossociais relacionados ao trabalho.
Há referência, também, sobre a NR-17, que, em determinada passagem, trata da vedação de “obrigar o trabalhador ao uso, permanente ou temporário, de vestimentas ou propagandas ou maquilagem temática que causem constrangimento ou firam sua dignidade pessoal”, mas não é abrangente quanto aos fatores psicossociais que podem ser muitos.
Considerando, portanto, que a NR-1 já está em vigência desde o último dia 26 de maio, paira a dúvida sobre qual seria a forma prática de sua aplicação, para efetiva implementação, vez que, diferentemente dos riscos fisiológicos, em que as normas regulamentadoras são precisas ao descreverem os riscos, no caso dos psicossociais não há uma definição exata.
Inicialmente, vale lembrar que a Constituição Federal veda o tratamento desumano ou degradante, garantindo a inclusão, no ambiente de trabalho; ainda, socorrendo-se à CLT, verifica-se que, desde a reforma trabalhista de 2017, passou-se a tratar dos danos extrapatrimoniais nas relações de trabalho, definidos como “a ação ou omissão que ofenda a esfera moral ou existencial da pessoa física ou jurídica”, elencando os bens que devem ser tutelados, como a honra, a imagem, a intimidade, a liberdade de ação, a autoestima, a sexualidade, a saúde, o lazer e a integridade física.
Ademais, observa-se que, desde alteração introduzida pela lei 14.611, de 2023, a CLT passou a ser expressa sobre a possibilidade de reparação dos danos morais quando há discriminação por motivo de sexo, raça, etnia, origem ou idade.
Pouco antes, vale lembrar, pela lei 14.457, que instituiu o “Programa Emprega + Mulheres”, foi também incluída a obrigação da constituição da CIPA+A, com regras relacionadas à prevenção e ao combate ao assédio sexual e às demais formas de violência no âmbito do trabalho, visando “a promoção de um ambiente laboral sadio, seguro e que favoreça a inserção e a manutenção de mulheres no mercado de trabalho”.
Todas as regras acima destacadas, certamente, já aceleram o cumprimento da NR-1, desde que implementadas de fato pelas empresas, pois visam prevenir e combater riscos psicossociais e garantir ambientes saudáveis de trabalho.
Mas não é só. A lei 14.831, de 2024, que instituiu o Certificado Empresa Promotora da Saúde Mental e os requisitos para sua concessão, trouxe, de forma mais clara, o que se espera de ações e políticas voltadas à promoção da saúde mental e bem-estar dos trabalhadores. Há, com isso, um norte menos subjetivo para direcionar as medidas aplicáveis, visando o efetivo cumprimento da NR-1.
Dentre essas ações, estão a implementação de um programa de promoção da saúde mental no ambiente de trabalho, a oferta de acesso a recursos de apoio psicológico e psiquiátrico aos trabalhadores, os treinamentos e conscientização sobre a importância da saúde mental, a capacitação de lideranças e o combate à discriminação e ao assédio em todas as suas formas.
Ainda, as políticas deverão promover o ambiente de trabalho seguro e saudável, incentivar o equilíbrio entre a vida pessoal e a profissional e, ainda, incentivar a prática de atividades físicas, de lazer, de alimentação de qualidade e interação saudável no ambiente de trabalho, adotando-se uma comunicação integrativa.
A aplicação da NR-1 e das normas que já tratam dos fatores e riscos psicossociais nas relações de trabalho, não só trará empregados mais saudáveis, com impacto direto em nosso sistema de saúde pública e previdência social, mas também alcançará resultados positivos para as empresas e para a sociedade, além de atender a um dos objetivos sustentáveis definidos pela ONU, relativo ao pilar social de ESG, o que demonstra a relevância do tema e a urgência de sua implementação pelo mercado.
Thais Folgosi Françoso
Sócia do Fernandes, Figueiredo, Françoso e Petros Advogados, responsável pelas áreas de contencioso tributário, procedimento administrativo tributário e compliance.
Fernandes, Figueiredo, Françoso e Petros Advogados
Richard Abecassis
Advogado do Fernandes, Figueiredo, Françoso e Petros Advogados, responsável pelas áreas trabalhista, tributária e de recuperação de empresas.
MIGALHAS
https://www.migalhas.com.br/depeso/436195/e-agora-como-aplicar-a-nr-1-aos-riscos-psicossociais
por NCSTPR | 07/08/25 | Ultimas Notícias
Corte do Trabalho considerou que visitas eram autônomas e sem fiscalização do empregador.
Da Redação
Vendedora externa da Hypera Pharma não receberá horas extras, conforme decidiu a 1ª turma do TST. O colegiado entendeu que o tablet utilizado pela trabalhadora não permite, por si só, o controle da jornada, especialmente diante da autonomia da empregada para definir o próprio roteiro de visitas a clientes.
Trabalho Externo
A trabalhadora exercia a função de propagandista-vendedora e afirmou que realizava visitas a consultórios, clínicas e hospitais com o objetivo de divulgar os produtos da empresa. Segundo ela, as visitas seguiam uma agenda previamente aprovada pela gerência, e sua jornada diária era, em média, das 13h às 22h30, com um intervalo de no máximo 30 minutos.
A vendedora sustentou que a empresa fornecia um iPad com sistema informatizado para registrar e enviar todas as visitas realizadas. Para ela, o equipamento permitiria o controle telemático da duração do trabalho, o que afastaria a aplicação do art. 62 da CLT. Este dispositivo exclui do regime de controle de jornada os empregados que exercem atividade externa incompatível com a fixação de horário.
Em defesa, a Hypera alegou que não interferia nem fiscalizava o roteiro da vendedora e que não tinha acesso remoto ao tablet, o que impossibilitaria a verificação de sua localização exata.
TST negou horas extras por entender que tablet não comprova jornada de vendedora.
Caso na Justiça
O pedido foi rejeitado na 1ª instância pelo juízo da 26ª vara de São Paulo/SP, e a sentença foi mantida pelo TRT da 2ª região. Para o tribunal, o fato de o tablet estar equipado com software para registrar visitas não configura, por si só, controle efetivo da jornada.
No julgamento do recurso de revista, o relator, ministro Dezena da Silva, concluiu que não houve prova de que fosse possível fiscalizar a jornada da vendedora. Ele observou que, embora o tablet contasse com software de vendas, sua utilização não bastava para demonstrar o controle da jornada, pois o número de visitas diárias, o tempo de duração de cada uma delas e o momento da anotação (início e fim) eram aspectos controversos.
O ministro também destacou que a existência de GPS no dispositivo não permite, por si só, mensurar o número de visitas ou o tempo gasto em cada uma, especialmente porque o roteiro da trabalhadora era definido por ela mesma, sem ingerência da empresa.
Além disso, testemunhas informaram que a vendedora não era obrigada a comparecer à sede da empresa no início ou fim do expediente e que as reuniões com a equipe ocorriam apenas semestralmente.
O entendimento da maioria prevaleceu contra o voto vencido do ministro Hugo Scheuermann.
Processo: 1001476-35.2019.5.02.0026
Com informações do TST.
MIGALHAS
https://www.migalhas.com.br/quentes/436282/tst-uso-de-tablet-nao-comprova-horas-extras-de-vendedora-externa
por NCSTPR | 07/08/25 | Ultimas Notícias
A síndrome de burnout, também conhecida como síndrome do esgotamento profissional, consta na lista de doenças ocupacionais de acordo com a Classificação Internacional de Doenças (CID), da Organização Mundial da Saúde (OMS) [1], de sorte que os trabalhadores que forem diagnosticados com essa doença terão os mesmos direitos trabalhistas e previdenciários, em comparação com as demais doenças que possuam relação com o trabalho.
Dados estatísticos
De acordo com uma pesquisa realizada em 2024, o Brasil constatou mais de 470 mil afastamentos do trabalho por transtornos mentais, quantitativo esse que confirma que, atualmente, o país tem o maior número de afastamento por ansiedade e depressão dos últimos 10 anos [2].
Já outro estudo feito pela Associação Nacional de Medicina do Trabalho (Anamy) indicou que cerca de 30% das pessoas ocupadas em território nacional sofrem com a doença, ocupando, portanto, a segunda posição no ranking mundial de casos [3]. Aliás, durante a pandemia do coronavírus houve um aumento de 136% dos afastamentos pela síndrome de burnout [4].
Em outra pesquisa da International Stress Management Association no Brasil revelou que este problema já afeta 32% dos trabalhadores brasileiros [5].
Nesse sentido, muitas são as dúvidas diárias que surgem com relação à emissão do comunicado de acidente de trabalho (CAT) para esses casos e, se realmente, trata-se de uma obrigação para os empregadores. Por isso, dada a importância e relevância do assunto, a temática foi indicada por você, leitor(a), para o artigo da semana, na coluna Prática Trabalhista da revista eletrônica Consultor Jurídico [6], razão pela qual agradecemos o contato.
Lição de especialista
A síndrome de burnout está relacionada com o trabalho e, por isso, passou a ser classificada como uma doença ocupacional.
Nesse sentido, oportunos são os ensinamentos de Maria José Gianella Cataldi[7] sobre doenças consideradas acidentes de trabalho:
“São consideradas como acidente de trabalho as seguintes entidades mórbidas: I- doença profissional, assim entendida a produzida ou desencadeada pelo exercício do trabalho peculiar a determinada atividade e constante da respectiva relação elaborada pelo Ministério do Trabalho e Previdência Social; II-doença do trabalho, assim entendida a adquirida ou desencadeada em função de condições especiais em que o trabalho é realizado e com ele se relacione diretamente, constante da relação mencionada no inciso I.(…).
A doença profissional ou do trabalho caracteriza-se quando, formal o diagnóstico de afecção, ou de intoxicação, se verificar que o empregado exercia a atividade que o expunha ao agente patogênico. O legislador suprimiu, em termos, a incidência dos benefícios acidentários nos casos de doenças profissionais atípicas, de sorte que, quando da equiparação ao acidente típico, deu sentido idêntico para doença profissional e doença do trabalho”.
Emissão da CAT
Sabe-se que a CAT é um documento onde são registrados as doenças e os acidentes que acontecem no ambiente de trabalho. A partir dele é que o trabalhador poderá receber pelo INSS benefícios previdenciários, bem como ter assegurado os seus direitos trabalhistas.
Do ponto de vista legislativo no Brasil, a Lei nº 8.213/91 dispõe em seu artigo 22 [8] que a empresa e/ou empregador doméstico tem o dever de comunicar junto a Previdência Social o acidente de trabalho, sob pena de multa. Vale dizer, a emissão da CAT é obrigatória por força legal, ainda que não haja a exigência de afastamento do empregado.
À vista disso, impende destaca que tal comunicação poderá ser feita: 1) pelo próprio trabalhador e seus dependentes; 2) pelo empregador; 3) pelo sindicato da categoria; 4) pelo médico que registrou o atendimento após o acidente/doença ocupacional; e 5) por uma autoridade pública.
Para tanto, deverão ser apresentados os seguintes documentos: 1) Informações do empregador (Razão social ou nome, tipo e número do documento, CNAE, Endereço, CEP e telefone); 2) Informações da pessoa empregada acidentada (dados pessoais, salário, número da carteira de trabalho, identidade, CPF, NIT/PIS/Pasep, endereço, CEP, telefone, CBO e área); 3) dados sobre o acidente; 4) dados sobre ocorrência policial, se houver; 5) dados sobre o atendimento emergencial e médico recebido; e 6) dados médicos referente ao acidente [9].
Portanto, com abertura da CAT, o trabalhador terá resguardado os seus direitos, facilitando, inclusive, a comprovação junto a perícia médica do INSS.
Jurisprudência trabalhista
Em se tratando de doença ocupacional e estabilidade provisória no emprego, segundo uma pesquisa feita pelo TST, no biênio entre 25/3/2023 até 25/3/2025, constatou-se a existência de 33 acórdãos e 2.084 decisões monocráticas envolvendo esta temática [10].
Por estas razões, recentemente, a Corte Superior Trabalhista reafirmou a sua jurisprudência fixando a seguinte tese ao julgar o RR-0020465-17.2022.5.04.0521: “Para fins de garantia provisória de emprego prevista no artigo 118 da Lei nº 8.213/1991, não é necessário o afastamento por período superior a 15 (quinze) dias ou a percepção de auxílio-doença acidentário, desde que reconhecido, após a cessação do contrato de trabalho, o nexo causal ou concausal entre a doença ocupacional e as atividades desempenhadas no curso da relação de emprego”.
Nesse sentido, considerando a nova tese vinculante (Tema 125) que passa a ser obrigatória para os demais órgãos da Justiça do Trabalho, uma vez constatada, em tese, a relação de concausalidade entre a enfermidade que acometeu o trabalhador e as atividades desenvolvidas na empresa, após a despedida, ainda que não tenha havido o afastamento do emprego por mais de 15 dias, nem o consequente recebimento do auxílio-doença acidentário, surgirá o direito à estabilidade legal de no mínimo 12 meses.
Ao definir a tese, o ministro relator ponderou:
“Neste ponto, faz-se necessário registrar que as doenças ocupacionais geralmente não se manifestam de forma imediata, possuindo características diferenciadas e graus de evolução distintos, razão pela qual, em muitos dos casos, não há o efetivo recebimento de auxílio-doença acidentário antes da extinção do contrato de trabalho ou o afastamento superior a quinze dias.
Desta feita, comprovado que o ambiente laboral ou o exercício das atividades contribuíram, ao menos, de forma concorrente e relevante para o desenvolvimento da doença ocupacional, atuando como causa ou concausa, tornam-se despiciendos o afastamento do empregado por mais de quinze dias e a percepção do auxílio-doença acidentário para auferir o direito à estabilidade provisória prevista no art. 118 da Lei nº 8.213/91”.
Conclusão
Portanto, para além do cumprimento dos deveres de manter um meio ambiente laboral saudável, em casos que o trabalhador seja acometido pela síndrome de burnout, a empresa deverá adotar as medidas cabíveis para assegurar os seus direitos, comunicando o fato junto ao INSS. Lembrando ainda que durante o período de afastamento o contrato de trabalho ficará suspenso e o trabalhador não poderá ser dispensado, sob pena de tal procedimento ser declarado nulo pelo Poder Judiciário Trabalhista.
[1] Disponível em https://www.cnnbrasil.com.br/politica/sindrome-do-burnout-ganha-nova-classificacao-na-oms/. Acesso em 05/08/2025.
[2] Disponível em https://g1.globo.com/trabalho-e-carreira/noticia/2025/03/10/crise-de-saude-mental-brasil-tem-maior-numero-de-afastamentos-por-ansiedade-e-depressao-em-10-anos.ghtml. Acesso em 05/08/2025.
[3] Disponível em https://www.ip.usp.br/site/noticia/brasil-e-o-segundo-pais-com-mais-casos-de-burnout-e-so-perde-para-o-japao/. Acesso em 05/08/2025.
[4] Disponível em https://www.bbc.com/portuguese/articles/cnk4p78q03vo. Acesso em 05/08/2025.
[5] Disponível em https://g1.globo.com/saude/bem-estar/noticia/2025/06/21/burnout-nao-e-frescura-entenda-a-exaustao-cronica-ligada-ao-trabalho-quais-os-sintomas-e-como-agir.ghtml. Acesso em 05/08/2025.
[6] Se você deseja que algum tema em especial seja objeto de análise pela coluna Prática Trabalhista da ConJur, entre em contato diretamente com os colunistas e traga sua sugestão para a próxima semana.
[7] O stress no meio ambiente do trabalho. – Maria José Gianella Cataldi. 4. Ed. ver. Atual. e ampl. – São Paulo: Tompson Reuters Brasil. Página 104/105.
[8] Lei nº 8.213/91, Art. 22. A empresa ou o empregador doméstico deverão comunicar o acidente do trabalho à Previdência Social até o primeiro dia útil seguinte ao da ocorrência e, em caso de morte, de imediato, à autoridade competente, sob pena de multa variável entre o limite mínimo e o limite máximo do salário de contribuição, sucessivamente aumentada nas reincidências, aplicada e cobrada pela Previdência Social.
[9] Disponível em https://www.gov.br/pt-br/servicos/registrar-comunicacao-de-acidente-de-trabalho-cat . Acesso em 05/08/2025.
[10] Disponível em https://jurisprudencia-backend2.tst.jus.br/rest/documentos/17f7d15317ef2d2f434bb0f1b1b7e762. Acesso em 05/08/2025.
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é advogado de Calcini Advogados. Graduação em Direito pela Universidade Braz Cubas. Especialista em Direito Material e Processual do Trabalho pela Escola Paulista de Direito. Especialista em Direito Contratual pela PUC-SP. Especialista em Diretos Humanos e Governança Econômica pela Universidade de Castilla-La Mancha (Espanha). Especialista em Direitos Humanos pelo Centro de Direitos Humanos (IGC – IUS Gentium Coninbrigae), da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra (Portugal). Pós-graduando em Direito do Trabalho pela Faculdade de Direito da USP (Universidade de São Paulo). Pesquisador do Núcleo de pesquisa e extensão: “O Trabalho Além do Direito do Trabalho” do Departamento de Direito do Trabalho e da Seguridade Social da USP, coordenado pelo professor Guilherme Guimarães Feliciano.
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é professor, advogado, parecerista e consultor trabalhista, sócio fundador de Calcini Advogados, com atuação estratégica e especializada nos tribunais (TRTs, TST e STF), docente da pós-graduação em Direito do Trabalho do Insper, coordenador trabalhista da Editora Mizuno, membro do comitê técnico da revista Síntese Trabalhista e Previdenciária, membro e pesquisador do Grupo de Estudos de Direito Contemporâneo do Trabalho e da Seguridade Social, da Universidade de São Paulo (Getrab-USP), do Gedtrab-FDRP/USP e da Cielo Laboral.
CONJUR
https://www.conjur.com.br/2025-ago-07/sindrome-de-burnout-obrigatoriedade-de-emissao-da-cat-e-as-repercussoes-no-contrato-de-trabalho/
por NCSTPR | 07/08/25 | Ultimas Notícias
Ao menos 563 trabalhadores foram resgatados de condições análogas à escravidão em Porto Alegre do Norte (MT). A informação foi divulgada pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) e Ministério Público do Trabalho (MPT) nesta quinta-feira (7).
Auditores-fiscais encontraram trabalhadores recrutados das regiões norte e nordeste do país em situação degradante, em um canteiro de obras na zona rural do município. A operação teve início no dia 20 de julho e revelaram um quadro alarmante de condições degradantes de trabalho na construção de uma usina de etanol.
Segundo a fiscalização, um incêndio que atingiu parte dos alojamentos teria sido provocado por trabalhadores como forma de protesto contra as constantes falhas no fornecimento de energia elétrica e água potável.
As condições comprometia a saúde e o conforto nos alojamentos, além de impedir o descanso adequado diante do calor extremo da região. O incêndio revelou um cenário alarmante de precariedade e violações trabalhistas.
Os dormitórios mediam apenas 12 m² e abrigavam até quatro pessoas, sem ventilação adequada ou climatização.
Após o incêndio, parte dos trabalhadores foram transferidos para casas e hotéis da região, a cerca de 30 quilômetros do local da obra.
No entanto, muitos continuaram em situação degradante: dormindo em colchões no chão, sem camas, roupas de cama ou espaços adequados para guardar os poucos pertences que lhes restaram.
De acordo com o MTE, alguns operários perderam todos os bens pessoais no incêndio. Um grupo chegou a ser realocado em um ginásio de esportes de uma cidade vizinha.
Além das condições precárias, a fiscalização constatou que a empresa não emitiu as Comunicações de Acidente de Trabalho (CATs) para os trabalhadores feridos no incêndio, prejudicando o acesso a benefícios previdenciários e acompanhamento médico.
Aliciamento, dívidas e falsas promessas
A investigação também identificou um esquema de aliciamento e servidão por dívida, com fortes indícios de tráfico de pessoas. Sem conseguir contratar localmente, a empresa promoveu um recrutamento massivo em estados do Norte e Nordeste.
O recrutamento era feito por meio de carros de som e mensagens em grupos de WhatsApp, com promessas enganosas de altos ganhos com horas extras. Muitos trabalhadores relataram ter pago valores a intermediários para conseguir a vaga e arcaram com os custos da viagem e alimentação.
Em outros casos, a empresa cobriu as despesas da viagem, mas os valores foram integralmente descontados dos salários — prática considerada ilegal e abusiva que transfere aos trabalhadores o risco do empreendimento.
Outro ponto grave foi a descoberta de um sistema paralelo de controle de jornada, conhecido como “ponto 2”. Nele, eram registradas horas extras que não constavam nos controles oficiais. Esses pagamentos eram feitos em dinheiro vivo ou cheques, sem registro em contracheque, recolhimento de FGTS ou contribuições previdenciárias.
Os auditores ouviram relatos de operários que trabalhavam semanas seguidas, inclusive aos domingos, sem qualquer folga, em total descumprimento da legislação trabalhista. As horas extras, prometidas na contratação, faziam parte de uma falsa promessa de altos rendimentos.
Apesar da gravidade das infrações, a empresa manifestou interesse em firmar um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com o Ministério Público do Trabalho. Entre as medidas compensatórias previstas estão:
- Custeio do retorno dos trabalhadores aos seus estados de origem;
- Devolução dos valores cobrados indevidamente cobrados pela viagem de vinda;
- Pagamento de R$ 1.000,00 a cada trabalhador como indenização pelos bens pessoais perdidos.
A fiscalização também garantiu o pagamento de todas as verbas rescisórias, incluindo salários pagos “por fora”, horas extras, férias proporcionais, 13º salário, FGTS e demais direitos.
Os trabalhadores resgatados receberão o seguro-desemprego em modalidade especial, prevista para vítimas de trabalho análogo ao de escravo (entenda mais abaixo).
O que é trabalho análogo à escravidão?
O Código Penal define como trabalho análogo à escravidão aquele que é “caracterizado pela submissão de alguém a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva, quer sujeitando-o a condições degradantes de trabalho, quer restringindo, por qualquer meio, sua locomoção em razão de dívida contraída com o empregador ou seu preposto”.
Todo trabalhador resgatado por um auditor-fiscal do Trabalho tem, por lei, direito ao benefício chamado Seguro-Desemprego do Trabalhador Resgatado (SDTR), que é pago em três parcelas no valor de um salário-mínimo cada.
Esse benefício, somado à garantia dos direitos trabalhistas cobrados dos empregadores, busca oferecer condições básicas para que o trabalhador ou trabalhadora possa recomeçar sua vida após sofrer uma grave violação de direitos.
Além disso, a pessoa resgatada é encaminhada à rede de Assistência Social, onde recebe acolhimento e é direcionada para as políticas públicas mais adequadas ao seu perfil e necessidades específicas.
⚠️ COMO DENUNCIAR? – Existe um canal específico para denúncias de trabalho análogo à escravidão: é o Sistema Ipê, disponível pela internet. O denunciante não precisa se identificar, basta acessar o sistema e inserir o maior número possível de informações.
por NCSTPR | 07/08/25 | Ultimas Notícias
A Subseção II Especializada em Dissídios Individuais (SDI-2) do Tribunal Superior do Trabalho anulou uma sentença homologatória de acordo firmado entre uma ex-empregada e a Metalúrgica Turbina Ltda., após concluir que o processo foi usado de forma simulada para proteger o patrimônio da empresa em prejuízo de terceiros.
Reconhecimento automático e imóvel penhorado
No caso, a empresa reconheceu, de imediato, o crédito postulado pela autora, no valor de R$ 252 mil, além de honorários de quase R$ 38 mil. Não houve apresentação de defesa, contestação dos valores ou discussão sobre prescrição. Como garantia de pagamento, foi indicado um imóvel que já estava penhorado em diversas execuções fiscais, com débitos que somam mais de R$ 3 milhões.
O Ministério Público do Trabalho, em São Paulo, apontou que o mesmo padrão se repetiu em pelo menos 17 outras ações. Em todos os casos, a empresa reconhecia praticamente a integralidade dos pedidos, sem resistência, e indicava o mesmo bem como garantia — mesmo sabendo que ele já estava comprometido judicialmente. Segundo o MPT, isso permitia que os créditos trabalhistas, por terem natureza preferencial, fossem utilizados como escudo contra credores fiscais e outros débitos.
Colusão evidenciada pelo conjunto de provas
A existência de vínculo real entre a autora e a empresa não foi suficiente para afastar o vício de colusão. Para a relatora do caso na SDI-2, ministra Morgana de Almeida Richa, o comportamento processual das partes indicou desvio de finalidade. Segundo a ministra, o processo foi utilizado não para resolver conflito legítimo, mas como instrumento para proteger o patrimônio da empresa contra credores não trabalhistas, como o Fisco e a Previdência Social.
A ministra levou em conta elementos como a atuação processual coordenada, o patrocínio das ações por um mesmo advogado, os valores elevados reconhecidos sem comprovação documental e a ausência de litigiosidade real. Também pesou o fato de o imóvel ofertado como garantia estar envolvido em mais de 30 ações judiciais, a maioria execuções fiscais.
Acordo anulado
Diante do conjunto probatório, a relatora votou no sentido de julgar procedente a ação rescisória, com base no artigo 966, inciso III, do Código de Processo Civil. Por unanimidade, a SDI-2 acompanhou a ministra Morgana Richa para extinguir o processo original sem resolução do mérito, aplicando a Orientação Jurisprudencial 94 da própria SDI-2, que trata de simulação processual com intuito de fraudar a lei.
Houve a apresentação de embargos de declaração, ainda não julgados pelo colegiado.
Processo: ROT – 1249-59.2022.5.12.0000
(Bruno Vilar/GS)
TRT JUS
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