As ações que tramitam perante a Justiça do Trabalho de Minas, em sua maioria, são ajuizadas por empregados ou ex-empregados. Esse é o perfil dos usuários mais freqüentes da JT: são trabalhadores assalariados que acionam o Judiciário para reivindicar direitos que julgam possuir. Mas, tanto o empregado como o empregador podem recorrer à Justiça do Trabalho sempre que se sentirem prejudicados em seus direitos. Atuando na 5ª Vara do Trabalho de Betim, o juiz substituto Henrique Alves Vilela examinou uma dessas raras ações movidas por empregador contra empregado. O comerciante ajuizou uma ação cautelar contra a balconista do seu estabelecimento, atribuindo a ela o crime de apropriação indébita. Na ação, o comerciante pediu o bloqueio da conta de sua empregada, ao argumento de que ela se apropriou de dinheiro pertencente ao patrão. Porém, no decorrer do processo, o magistrado descobriu que quem praticou irregularidades foi o próprio empregador e, como não havia provas do alegado crime de apropriação indébita, concluiu o julgador que tudo não passou de mera acusação infundada.
O autor da ação é proprietário de uma casa de carnes, localizada em uma cidade do interior de Minas, e mantinha uma empregada em seu estabelecimento trabalhando como balconista. O comerciante informou que entregou à balconista a quantia de R$2.500,00, em dinheiro, para ser depositada na conta dele. Mais de um mês depois, o comerciante novamente entregou à balconista dois cheques, um no valor de R$300,00 e outro no valor de R$700,00, para serem também depositados na conta dele. Porém, de acordo com a versão apresentada pelo comerciante, a balconista teria efetuado o depósito desses valores em sua própria conta poupança, cometendo, assim, o crime de apropriação indébita. Diante desse quadro, o comerciante imaginou que a balconista poderia sacar a quantia e se mudar da cidade. Por essa razão, ele pediu a concessão de liminar para bloquear a importância de R$3.500,00 na conta que a balconista possuía junto ao Banco do Brasil, até a decisão final do Juízo. Em defesa, a balconista confirmou que depositou R$2.500,00 em conta poupança, aberta na data do depósito, mas negou que a quantia pertencesse ao comerciante. Ela acrescentou ainda que os cheques foram repassados pelo comerciante para o pagamento de salário e de uma indenização decorrente da rescisão do contrato de trabalho.
O magistrado constatou a existência desses depósitos, mas, segundo ele, não há como afirmar que a balconista se apropriou indevidamente da quantia, pois o comerciante não produziu nenhuma prova nesse sentido. Muito pelo contrário, na avaliação do julgador, as evidências apontam para a inocência da balconista: Ora, se a Ré realmente tivesse se apropriado, de forma indevida, da quantia de R$ 2.500,00, porque o Autor lhe confiaria uma segunda quantia, agora de R$1.000,00, mais de um mês depois? – questionou o magistrado. No mais, ficou comprovado no processo que existia um vínculo de emprego entre as partes, ainda que sem anotação na CTPS, e o comerciante não demonstrou o pagamento das verbas rescisórias por meio de outro valor que não seja aquele constante dos cheques. No entender do juiz, essa ausência de provas conduz à conclusão de que são verdadeiras as afirmações da balconista, no sentido de que o valor dos cheques lhe foi repassado para a quitação de salários e verbas rescisórias. Portanto, como não ficou comprovado que a balconista teria praticado crime de apropriação indébita, o juiz sentenciante rejeitou o pedido de bloqueio de valores em sua conta bancária.
O autor da ação afirmou que não tem condições de arcar com os custos do processo, tanto que lhe foi nomeado um defensor dativo. Mas, o julgador explicou que a norma referente à justiça gratuita não se aplica ao empregador. Na Justiça do Trabalho, os benefícios da gratuidade de justiça são conferidos àqueles trabalhadores que recebem salário igual ou inferior ao dobro do mínimo legal, ou que declararem, sob as penas da lei, que não estão em condições de pagar as custas do processo sem prejuízo do sustento próprio ou de sua família, o que não é o caso do comerciante autor da ação. Por fim, como ele acabou confessando que manteve empregada sem o devido registro na CTPS, a sentença determinou a expedição de ofício para a Delegacia Regional do Trabalho noticiando esse fato, acompanhado de cópia do boletim de ocorrência. Não cabe mais recurso da decisão.