NOVA CENTRAL SINDICAL
DE TRABALHADORES
DO ESTADO DO PARANÁ

UNICIDADE
DESENVOLVIMENTO
JUSTIÇA SOCIAL

por Barbara Brakarz*

Mudanças climáticas. Sustentabilidade. Conservação. Biodiversidade. Transição energética. Crescimento verde. Carbono. Nunca se falou tanto desses temas no Brasil e no mundo, e não é preciso estar presente nos fóruns globais relacionados ao clima e ao meio ambiente para perceber que essa agenda se instalou em definitivo no debate público e fazem parte agora do nosso dia a dia – não sem resistências, embates, divergências sobre modelos a seguir, prioridades a escolher, diferentes caminhos possíveis a adotar. O grande desafio no futuro imediato é justamente trilhar esses caminhos, de modo que possamos converter em solução o que hoje é um problema a resolver.

O problema, sabemos bem. Para resumi-lo em poucas palavras: a mudança climática e seus efeitos sobre o planeta e suas desigualdades, e um modelo de desenvolvimento baseado em energia fóssil e insustentável do ponto de vista socioambiental. O potencial: trabalhar para que o Brasil cumpra uma missão na qual muitos acreditam – a possibilidade de reverter o atual quadro e tornar-se exemplo para o mundo. Essa missão não só é compatível com a de virar uma potência verde, mas intrinsecamente entrelaçada.

Nada disso, porém, sairá efetivamente do campo das promessas e futuros potenciais sem encontrar tais caminhos. É tarefa primordial para um país que tem a maior floresta tropical e um dos maiores serviços ecossistêmicos do planeta, uma matriz energética diversificada, uma economia do campo e da indústria pujantes, um setor financeiro robusto e uma variedade de biomas a conservar e gerar valor – da Amazônia ao Cerrado, da Mata Atlântica ao Pantanal, do Pampa à Caatinga. É onde entra uma das soluções mais eficazes: fortalecer e ampliar os negócios florestais e rurais sustentáveis e concretizar o potencial de um modelo econômico baseado na bioeconomia, cujos protagonistas são os negócios de base florestal e o saber tradicional.

Esses negócios, desenvolvidos com base no uso de recursos da sociobiodiversidade brasileira, sempre foram vistos como uma forma de conservar nosso rico patrimônio biológico e cultural. Além de contribuir para a manutenção de biomas ameaçados que sustentam a vida no planeta, também são opção para gerar renda e o bem-viver para as populações que ali vivem.

Engana-se, porém, que pensar o fortalecimento desse ecossistema de negócios de base comunitária significa restringir-se ao campo e à floresta. Não. A formação de alianças estratégicas, a construção de pontes entre mundos aparentemente distintos (mercados privados e negócios comunitários), a busca de soluções financeiras inovadoras e o fortalecimento de cadeias produtivas amplas integram o roteiro de necessidades. Necessidades, aliás, andam lado a lado do potencial existente. Em 2018, a Conexsus, organização não-governamental que foi criada com a missão de ativar o ecossistema de negócios de impacto socioambiental, mapeou e qualificou, por meio do ‘Desafio Conexsus’ mais de mil associações produtivas, pequenos negócios e cooperativas espalhadas por todos os biomas do país. Juntas, elas impactam diretamente a vida de mais de 500 mil pessoas que se dedicam à agricultura familiar e ao extrativismo. No entanto, esses negócios requerem apoio para se crescerem e acessar os mercados que estão demandando esses produtos de valor social e ambiental não só monetário, mas também sociocultural.

Para isso, esses negócios precisam se conectar com mercados, representados por empresas de diferentes portes, que operam segundo as regras comerciais convencionais, e também os mercados alternativos, representados por modelos colaborativos e voltados à economia solidária. Se é verdade que, ao longo dos últimos anos, várias tentativas esbarraram nas dificuldades de conciliação entre as lógicas com que operam as empresas compradoras, bem como no desconhecimento dos produtos e insumos pelo mercado consumidor, também é verdade que houve exemplos de sucesso. Como exemplo convém citar uma parceria que fizemos com organizações não governamentais WWF e Memorial Chico Mendes e a empresa Michelin, num projeto que vem permitindo financiar 10 associações fornecedoras da borracha para a fabricante de pneu.

Um braço opera o financiamento, outro fornece capital filantrópico catalítico para absorver eventuais primeiras perdas e os custos de operação, e mais outra assessora as comunidades extrativistas, enquanto a empresa se compromete a comprar a borracha, como garantia de pagamento dos financiamentos. É um arranjo inovador, baseado em relações comerciais e com foco em benefícios para todos os atores envolvidos. Com a vantagem de ser economicamente viável, socialmente responsável e ambientalmente sustentável, uma vez que tais negócios permitem uma empresa de grande porte atender a um mercado nacional e internacional relevante, e evitar o consumo predatório de recursos naturais. A floresta permanece em pé. A Conexsus entra destravar o acesso a crédito das associações, incipientes ou renascendo, que dificilmente têm acesso a linhas de crédito rural públicas ou privadas, associado ao fortalecimento da gestão e modelagem de negócios das organizações. O resultado tem sido um importante movimento de ressurgimento dessa cadeia socioprodutiva na Amazônia.

Uma cadeia que é compatível com a floresta em pé e conecta-se com a história da Amazônia – região rica em extração de látex, matéria-prima da produção da borracha. O ciclo da borracha, afinal, foi o primeiro grande ciclo econômico brasileiro, remontando ao final do século 19 e início do século 20. A borracha ganharia um segundo ciclo, nos anos 1940. Em plena Segunda Guerra Mundial, havia mais de uma frente de combate para brasileiros: a luta dos pracinhas, em solo europeu, e os chamados soldados da borracha, um exército de migrantes, especialmente nordestinos, fugidos da seca, que foram enviados para a Amazônia com a missão de fazer extração de látex e assim abastecer o mercado internacional. Aquele exército foi formado pelo Estado brasileiro à custa de promessas e chantagem e acabou abandonado à própria sorte.

Aquele foi um entre tantos erros cometidos no passado na exploração da floresta. A mobilização das pequenas associações no presente, acesso ao crédito por meio da estruturação e operação de finanças de impacto para viabilizar esses negócios e meios de vida traz o desenvolvimento socioeconômico para as comunidades. E para os mercados se torna evidência – entre muitas – de que a relação com os recursos naturais florestais pode ser diferente.

As finanças climáticas combinam recursos com diferentes propósitos como filantropia, investimento com retorno financeiro ou ainda financiamento de organismos multilaterais. Mecanismos de financiamento, estabelecidos ou regulados internacionalmente, para apoiar países na transição climática e no combate aos seus efeitos.

O objetivo do financiamento climático é fornecer recursos financeiros e técnicos para projetos e programas que promovam a redução de emissões de gases de efeito estufa, a proteção contra os impactos das mudanças climáticas, o respeito com os povos, comunidades e populações locais e a promoção de uma transição energética justa e sustentável. É possível. O financiamento climático é o financiamento necessário.


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