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Evento promovido pelo Instituto Humanitas Unisinos – IHU reflete sobre os desafios de construir um futuro comum para os jovens brasileiros

Os dados apresentados pela Síntese de Indicadores Sociais 2023, publicada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), corroboram as pesquisas realizadas na última década sobre o crescente número de jovens brasileiros que nem trabalham nem estudam, classificados como nem-nem. Segundo o IBGE, 10,9 milhões dos 48,9 milhões de jovens brasileiros entre 15 e 29 anos não estavam nem estudando nem trabalhando em 2022. O número, de acordo com a comparação do demógrafo José Eustáquio Diniz Alves, “é maior do que todo o volume da população de Portugal, que era de 10,3 milhões de habitantes em 2022”. A análise dos dados, na avaliação de Alves, indica que “o Brasil tem milhões de jovens sem os direitos ao emprego e à educação, fato que representa um grande desperdício do potencial produtivo do país. Jovens sem perspectiva serão idosos sem esperança”, sublinha.

Esta condição, que expressa apenas uma parcela da realidade vivenciada pelos jovens brasileiros, suscita inúmeras questões sobre o presente e futuro da população brasileira e, consequentemente, sobre o desenvolvimento do país como um todo. Uma delas fomenta a promoção do Ciclo de Estudos Juventudes e o espírito do tempo e do espaço. Desafios tecnopolíticos e socioambientais, promovido pelo Instituto Humanitas Unisinos – IHU neste semestre: Será possível pensar em políticas progressistas e em um futuro comum, ou essas questões hoje geram desencantamento entre os jovens?

Se, de um lado, a situação da geração nem-nem é de desalento, de outro, a condição de uma “parcela significativa” dos jovens empregados no país é preocupante não só por causa dos baixos salários e da falta de perspectiva, mas das jornadas exaustivas, sem políticas de proteção e fiscalização, que estão comprometendo a saúde dos jovens trabalhadores, alertou a socióloga Helena Wendel Abramo, em artigo publicado na página eletrônica do IHU no mês passado. “Os jovens são o segmento etário mais afetado pelos agravos na saúde provocados pelo trabalho”, diz.

O Dossiê sobre a Saúde dos Jovens Trabalhadores, produzido pela Agenda Jovem da Fiocruz em parceria com a Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio, apresenta um panorama sobre a situação. “Cerca de um terço de todos os acidentes de trabalho registrados no SUS entre 2016 e 2022 atingiram jovens. Dos acidentes de trânsito ocorridos com pessoas entre 25 e 29 anos, notoriamente uma das principais causas de mortalidade e lesões incapacitantes nessa faixa etária, 43% estão relacionados com o trabalho exercido pelas vítimas. Metade dos jovens ocupados encontram pelo menos um elemento nocivo à saúde em seu ambiente de trabalho”.

Casos de transtornos mentais também estão sendo notificados no Sistema de Informações de Agravos de Notificação (SINAN). “No período de 2016 a 2022, foram notificados 10.350 casos de transtornos mentais relacionados ao trabalho, sendo 1.908 em pessoas na faixa etária dos 15 aos 29 anos (18,43% do total das notificações). Mais da metade (53,4%) das notificações foi de pessoas registradas com carteira assinada. Os jovens trabalhadores de serviços administrativos compõem o grupo com as maiores notificações e, na sequência, os jovens trabalhadores dos serviços, vendedores do comércio em lojas e mercados”, relata a socióloga.

Os jovens são o segmento etário mais afetado pelos agravos na saúde provocados pelo trabalho — Helena Wendel Abramo

Os transtornos mentais, explica, estão associados à “sobrecarga e a exaustão dos jovens diante da sobreposição de diferentes tarefas e responsabilidades assumidas por eles, incluindo as do trabalho: mais da metade dos 68 mil respondentes disseram que se sentem sobrecarregados e exaustos (sobretudo as jovens mulheres, entre as quais cerca de 2/3 manifestam tais queixas), além de altas parcelas dos que disseram passar por situações de ansiedade, insônia, depressão e pensamento suicida”.

Esta temática será abordada pela socióloga Helena Wendel Abramo, pesquisadora da condição juvenil, e pelo pesquisador Erik Chiconelli Gomes, da Universidade de São Paulo (USP), especialista em História econômica do trabalho, na primeira mesa de debate do Ciclo de Estudos Juventudes e o espírito do tempo e do espaço. Desafios tecnopolíticos e socioambientais, intitulada O desemprego, digitalização e precarização do mercado de trabalho juvenil. O evento será transmitido na página eletrônica do IHU, no YouTube e nas redes sociais em 08-04-2024, às 10h.

Crianças “trampam” na “biqueira”

cooptação de crianças e jovens pelo tráfico de drogas é outra dimensão da realidade das juventudes no país. O tema será abordado no Ciclo de Estudos pela socióloga e pesquisadora do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap), Ana Paula Galdeano Cruz. A palestra, intitulada A juventude brasileira e o trabalho no tráfico de drogas, será transmitida em 03 de junho, às 10h, no site do IHU, YouTube e redes sociais.

Ana Paula pesquisa a exploração do trabalho infantil pelo tráfico de drogas. Nas entrevistas realizadas com as crianças, conta, elas dizem que “‘trampam’ na ‘biqueira’, o que mostra que compreendem essa atividade como um trabalho”. De acordo com a pesquisadora, a organização do tráfico no aliciamento dos jovens é semelhante à flexibilização do trabalho no mundo contemporâneo. “Os adolescentes recebem por comissões, como é típico de vários trabalhos no mercado formal. O trabalho dele é flexível, assim, o adolescente que vende drogas na cidade de São Paulo pode flexibilizar seu trabalho, chamar outro adolescente para trabalhar com ele e os dois dividem a comissão. O próprio nome desse local, que geralmente é chamado de ‘boca de fumo’ ou ‘biqueira’, é muitas vezes denominado por esses adolescentes como lojinhas, o que traz, com muita clareza, a ideia de que se trata de um comércio”, destaca.

A escolha dos jovens por este caminho também demonstra a vulnerabilidade a que estão submetidos, com famílias vivendo à margem da sociedade salarial, e o desejo de um modo de vida mais autônomo e rentável financeiramente. “Os adolescentes dizem que este é um trabalho que possibilita autonomia, que rende muito mais do ponto de vista financeiro do que os trabalhos subalternos, que seus pais em geral praticam. Algumas das mães desses adolescentes catam latas, se dedicam ao trabalho com recicláveis, algumas são faxineiras ou empregadas domésticas, que, mesmo trabalhando na mesma casa três vezes por semana, não têm carteira assinada, conforme preconiza a legislação. Esses adolescentes se recusam a seguir essa trajetória geracional de trabalhos subalternos. E o trabalho no tráfico possibilita autonomia na medida em que permite, muitas vezes, subir na carreira, o que os trabalhos subalternos, que em geral estão disponíveis a eles, não permitem”, exemplifica.

Os adolescentes dizem que este é um trabalho que possibilita autonomia, que rende muito mais do ponto de vista financeiro do que os trabalhos subalternos, que seus pais em geral praticam – Ana Paula Galdeano Cruz

Os jovens trabalhadores do tráfico, ressalta a pesquisadora, vivem e atuam nas periferias urbanas das capitais e regiões metropolitanas do país. “Isso facilita toda forma de coerção, tanto do policial quanto do dono da ‘biqueira’. Nossa pesquisa na área de geoprocessamento mostra que os adolescentes são pegos muito próximo aos seus locais de moradia”, complementa.

A perpetuação do envolvimento de jovens e crianças com o tráfico tem como causa problemas estruturais não sanados na sociedade brasileira. “Muitas dessas famílias que se instalaram nas periferias urbanas são famílias trabalhadoras e que ao longo das gerações viram seus filhos se envolver com o mundo do crime, o que foi crescendo ao longo das décadas. Outras famílias chegaram a São Paulo e ocuparam regiões muito mais precárias do ponto de vista do desenvolvimento urbano, assim se instalaram nas favelas e de lá jamais conseguiram sair, embora sejam trabalhadores, com pessoas que trabalham em casas de família, no comércio e nos serviços”, contextualiza.

Ciclo

O objetivo do Ciclo de Estudos Juventudes e o espírito do tempo e do espaço. Desafios tecnopolíticos e socioambientais é debater de forma transdisciplinar aspectos sociológicos das juventudes, seus papéis e suas perspectivas no contexto contemporâneo de transformações políticas, ecológicas e econômicas. A programação do Ciclo de Estudos está disponível aqui e será atualizada no início do semestre letivo na página do evento.

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